"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

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terça-feira, 21 de novembro de 2023

CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico III(1) "Caminhos da Aprendizagem: Uma Perspectiva Holística"

 


CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico III(1) "Caminhos da Aprendizagem: Uma Perspectiva Holística"

Por Claudeci Ferreira de Andrade

A aprendizagem é um processo fundamental para o desenvolvimento humano e espiritual. Muitos teólogos enfatizam a importância de ouvir, lembrar e aplicar a sabedoria, usando citações bíblicas e exortações para destacar a gravidade de esquecer os ensinamentos. No entanto, é válido considerar uma perspectiva alternativa, que questione a premissa de que lembrar e aplicar todos os ensinamentos é imperativo, e que proponha uma abordagem mais holística da aprendizagem, que valorize a compreensão, a aplicação prática e a busca de uma conexão significativa com os princípios subjacentes.

O filósofo John Dewey argumentou que o valor da aprendizagem está na aplicação prática do conhecimento, não apenas na retenção passiva. Ele observou que a educação deve se concentrar na resolução de problemas do mundo real e no desenvolvimento de habilidades críticas. Essa visão se alinha com o que o apóstolo Tiago escreveu: "Sejam praticantes da palavra, e não apenas ouvintes, enganando-se a si mesmos" (Tiago 1:22). Não se trata apenas de memorizar ensinamentos, mas de compreender profundamente seus princípios e aplicá-los em contextos variados.

Além disso, a ênfase na repetição e memorização pode ser questionada à luz da pesquisa educacional contemporânea. Muitos educadores argumentam que a aprendizagem eficaz envolve a compreensão profunda e a capacidade de aplicar o conhecimento de maneira flexível, em vez de apenas recitar fatos. Essa ideia também pode ser encontrada na Bíblia, quando o salmista diz: "A tua palavra é lâmpada que ilumina os meus passos e luz que clareia o meu caminho" (Salmo 119:105). A palavra de Deus não é apenas um conjunto de regras ou informações, mas uma fonte de orientação e discernimento.

Por fim, a ideia de que a salvação está ligada à retenção de ensinamentos específicos pode ser considerada uma visão restrita da fé. Muitos teólogos argumentam que a fé está mais relacionada à relação pessoal com Deus do que à memorização de doutrinas. Jesus mesmo disse: "Conheçam a verdade, e a verdade os libertará" (João 8:32). A verdade não é apenas um conceito intelectual, mas uma pessoa: Jesus Cristo. Conhecê-lo implica em amá-lo e segui-lo.

Em resumo, embora a retenção e aplicação de ensinamentos sejam importantes em muitos contextos, é fundamental considerar uma abordagem mais holística da aprendizagem, que valorize a compreensão, a aplicação prática e a busca de uma conexão significativa com os princípios subjacentes. Isso pode enriquecer nossa compreensão da sabedoria e da espiritualidade.

domingo, 19 de novembro de 2023

CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(22) A relação entre virtude, pecado e tranquilidade: uma análise crítica

 


CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(22) A relação entre virtude, pecado e tranquilidade: uma análise crítica

Por Claudeci Ferreira de Andrade

É fácil encontrar na boca dos crentes em geral o argumento de que o crime e o comportamento pecaminoso fatalmente levarão à punição e à destruição, afirmando que a tranquilidade e a prosperidade só são alcançadas através de uma vida justa. No entanto, é importante analisar essa ideia sob uma perspectiva crítica, levando em conta as evidências bíblicas, filosóficas e empíricas.

Primeiramente, é válido reconhecer que a lógica de que a virtude sempre leva à recompensa e o pecado, à punição não é uma representação precisa da realidade. Existem inúmeras situações em que indivíduos que cometem atos imorais aparentemente prosperam, enquanto pessoas justas enfrentam dificuldades. A vida nem sempre segue um padrão de recompensas e punições proporcionais às ações. A própria Bíblia reconhece essa questão, como no livro de Jó, em que um homem íntegro sofre calamidades inexplicáveis, enquanto os ímpios parecem desfrutar de bem-estar. O filósofo grego Platão também questionou essa relação causal entre virtude e felicidade, argumentando que a justiça é um bem em si mesmo, independente das consequências externas.

Além disso, a ideia de que a tranquilidade é exclusiva daqueles que seguem estritamente um caminho moral é simplista. Muitos fatores, como saúde, oportunidades econômicas e contextos sociais, podem influenciar a qualidade de vida de uma pessoa. A conexão direta entre moralidade e tranquilidade ignora a complexidade da existência humana. O filósofo francês Jean-Jacques Rousseau criticou essa visão idealizada da virtude, afirmando que ela é incompatível com as condições reais da sociedade humana, marcada pela desigualdade e pela corrupção. A Bíblia também alerta para os perigos de confiar na própria justiça como fonte de paz, pois isso pode levar ao orgulho e à hipocrisia.

É importante também considerar que a abordagem desses fanáticos parece desconsiderar o potencial de redenção e mudança das pessoas. Mesmo aqueles que cometeram erros no passado podem buscar o caminho da virtude e encontrar paz interior. Julgar de maneira definitiva a trajetória de alguém com base em erros passados é limitar a capacidade humana de crescimento e transformação. A Bíblia oferece vários exemplos de pessoas que se arrependeram de seus pecados e foram perdoadas por Deus, como Davi, Pedro e Paulo. O filósofo alemão Immanuel Kant defendeu que a moralidade não depende das circunstâncias passadas, mas da boa vontade presente, que se orienta pelo dever racional.

Em resumo, embora a ideia de que a virtude leva à tranquilidade seja uma noção atraente, a realidade é mais complexa. A vida não se encaixa facilmente em uma narrativa moralista de recompensa e punição. É importante manter uma visão mais ampla e compassiva das experiências humanas, reconhecendo que cada pessoa é única e capaz de mudança e crescimento, independentemente de seu passado.

sábado, 18 de novembro de 2023

CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(21) "Felicidade e Sucesso: O Papel das Circunstâncias Sociais"

 


CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(21) "Felicidade e Sucesso: O Papel das Circunstâncias Sociais"

Por Claudeci Ferreira de Andrade

A felicidade e o sucesso na vida são objetivos que muitas pessoas buscam, mas nem sempre alcançam. Algumas religiões afirmam que a virtude e a piedade são os caminhos para a felicidade, e que Deus recompensa os bons e castiga os maus. No entanto, essa visão pode ser questionada por uma análise mais crítica e abrangente da realidade humana.

A ideia central da religião é de que bons homens vivem melhor, com segurança, confiança e uma vida feliz como resultado de sua piedade e sabedoria. Essa ideia é sustentada por várias passagens bíblicas, como: "Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra" (Mateus 5:5) ou "O temor do Senhor é o princípio da sabedoria" (Provérbios 9:10). No entanto, é possível abordar essa questão de outro ângulo, argumentando que a felicidade e o sucesso na vida não estão exclusivamente ligados à virtude e à piedade, mas também são influenciados por uma série de fatores, incluindo circunstâncias sociais e econômicas.

Ao longo da história, muitos indivíduos virtuosos enfrentaram adversidades e dificuldades, enquanto outros que não eram tão virtuosos alcançaram sucesso e prosperidade. Portanto, a relação entre virtude e felicidade não pode ser vista como uma regra infalível. Como disse o filósofo grego Epicuro: "Não é possível viver prazerosamente sem viver prudente, honrada e justamente; nem viver prudente, honrada e justamente sem viver prazerosamente" (Carta a Meneceu). No entanto, ele também reconheceu que a felicidade depende de fatores externos, como a saúde, a riqueza e os amigos.

Em vez de citar passagens bíblicas e exemplos religiosos, é mais lógico e abrangente observar a diversidade de experiências humanas ao longo do tempo. Muitos filósofos e pensadores argumentam que a felicidade está relacionada a uma combinação de fatores, como acesso a oportunidades, educação, saúde e apoio social. Por exemplo, o filósofo John Stuart Mill argumentou que a busca da felicidade é um direito fundamental e que as circunstâncias sociais, como a igualdade de oportunidades, desempenham um papel crucial na realização da felicidade. Em vez de focar apenas na virtude individual, Mill enfatizou a importância das políticas sociais e econômicas para promover a felicidade geral.

Em resumo, a felicidade e o sucesso na vida são influenciados por uma variedade de fatores, e a relação entre virtude e felicidade não é tão direta como sugere a doutrina religiosa. É importante considerar a complexidade das experiências humanas e a influência das circunstâncias sociais na busca pela felicidade. Como disse o teólogo Martin Luther King Jr.: "A verdadeira medida de um homem não é como ele se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas como ele se mantém em tempos de desafio e controvérsia" (Strength to Love).

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(20) "Reinterpretando o Conceito de Bom e Mau"

 


CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(20) "Reinterpretando o Conceito de Bom e Mau"

Por Claudeci Ferreira de Andrade

A natureza humana é complexa e diversa. Não podemos reduzir as pessoas a categorias simplistas de "bons" e "maus", pois somos seres multifacetados, sujeitos a influências, contextos e escolhas em constante evolução. A Bíblia, que é a fonte de sabedoria para muitos cristãos, não define claramente o que é bom e mau, mas oferece princípios e orientações que podem ser interpretados de maneiras diversas. As definições de moralidade e ética variam ao longo do tempo e entre diferentes culturas e religiões. O que pode ser considerado "bom" em uma sociedade pode não ser o mesmo em outra.

É importante reconhecer que as pessoas têm a capacidade de aprender e crescer, independentemente de suas ações passadas. A ideia de que apenas homens bons são recompensados e homens maus são punidos não leva em consideração a possibilidade de redenção e transformação. A vida não se resume a escolher entre um caminho fácil e popular e um caminho difícil e apertado. Existem inúmeras escolhas e nuances em nossas jornadas individuais. A sabedoria não é uma fórmula mágica que garante sucesso; é uma ferramenta para tomar decisões informadas e éticas ao longo da vida.

Portanto, em vez de categorizar rigidamente as pessoas, é mais produtivo adotar uma abordagem compassiva e inclusiva, reconhecendo a complexidade de nossas experiências e a capacidade de evoluir e crescer ao longo do tempo. Isso nos permite abraçar a diversidade e buscar uma compreensão mais profunda e empática do ser humano.

Como disse o filósofo francês Blaise Pascal: "O coração tem razões que a própria razão desconhece" . Como disse o apóstolo Paulo: "Agora vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então, conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido" . Como disse o escritor russo Fiódor Dostoiévski: "Não há nada mais complexo do que um ser humano" .

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(19) Adultério: pecado ou liberdade?

 


CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(19) Adultério: pecado ou liberdade?

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O adultério é um tema polêmico e controverso, que suscita diversas reações e interpretações. Para os religiosos, em geral, o adultério é visto como um pecado grave e imperdoável, que viola a aliança matrimonial e a vontade de Deus. No entanto, essa visão pode ser questionada sob uma perspectiva mais flexível e humanizada, que considere a complexidade das relações humanas e o potencial de redenção.

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que a interpretação das Escrituras pode variar amplamente, e que a compreensão do adultério como um pecado fatal pode ser contestada. A moralidade não é absoluta, e as sociedades evoluem ao longo do tempo, reinterpretando valores e ética. Além disso, a abordagem do tema parece negligenciar o papel do perdão e da redenção na vida das pessoas.

Nesse sentido, é possível argumentar que o adultério, embora seja uma quebra de confiança em um relacionamento, não deve ser tratado como um pecado irreparável. A ênfase deve ser colocada na importância do arrependimento, da comunicação e do perdão mútuo. As relações humanas são complexas, e as pessoas podem cometer erros, mas também têm a capacidade de aprender com esses erros e buscar a reconciliação.

Essa ideia é apoiada por algumas citações bíblicas e filosóficas, que mostram uma visão mais compreensiva e esperançosa sobre o adultério. Por exemplo, a citação de Lucas 18:25-27 ressalta que, para os homens, certas coisas podem parecer impossíveis, mas para Deus, todas as coisas são possíveis. Isso sugere que a graça e a misericórdia divina podem oferecer uma saída para situações difíceis, como o adultério. O exemplo de Davi, que cometeu adultério e assassinato, mas encontrou o perdão de Deus, destaca a possibilidade de redenção e transformação.

Do ponto de vista filosófico, também há autores que defendem uma visão mais tolerante sobre o adultério. Por exemplo, Henry Louis Mencken afirma que "o adultério é a aplicação dos princípios democráticos ao amor", sugerindo que se trata de uma expressão da liberdade individual. Já Herbert George Wells diz que "o adultério é justificável: a alma necessita de poucas coisas; o corpo, muitas", indicando que se trata de uma necessidade natural.

Portanto, em vez de enfatizar a punição e a condenação, é mais construtivo abordar o adultério com compaixão, compreensão e a crença na capacidade das pessoas de se arrependerem, aprenderem e crescerem. O foco deve ser a restauração das relações e a promoção de valores como o perdão e a reconciliação, em vez de considerar o adultério como um pecado fatal e irremediável.

segunda-feira, 13 de novembro de 2023

CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(18) A complexidade da sexualidade e da religião

 




CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(18) A complexidade da sexualidade e da religião

Por Claudeci Ferreira de Andrade

A sexualidade e a religião são dois temas que geram muitas controvérsias e debates na sociedade contemporânea. Muitas vezes, esses temas são abordados de forma dogmática e excludente, ignorando a diversidade e a complexidade das experiências humanas. Neste ensaio, pretendo analisar criticamente a visão de alguns fanáticos religiosos que afirmam que a relação com uma mulher estranha ou com a Igreja Católica Romana leva à morte e ao inferno, usando como referências teóricas a Bíblia, a psicanálise e a filosofia.

Em primeiro lugar, é preciso questionar o conceito de "mulher estranha" que esses fanáticos usam para se referir a qualquer mulher que não seja sua esposa legítima. Esse conceito é baseado em uma interpretação literal de alguns versículos bíblicos que condenam o adultério e a prostituição, como por exemplo: "Não adulterarás" (Êxodo 20:14) ou "O que se deita com uma prostituta se faz um corpo com ela" (1 Coríntios 6:16). No entanto, essa interpretação desconsidera o contexto histórico e cultural em que esses textos foram escritos, bem como as diferentes formas de expressão da sexualidade humana ao longo da história.

Além disso, essa visão ignora os aspectos psicológicos e afetivos envolvidos na sexualidade, reduzindo-a a uma mera questão de cumprimento ou transgressão de normas morais. Como afirmou Freud, "a sexualidade é o conjunto das condições anatômicas, fisiológicas e psicológico-afetivas que caracterizam o sexo de cada indivíduo" (Freud, 1905). Portanto, a sexualidade não pode ser compreendida apenas como uma função biológica ou um dever conjugal, mas como uma dimensão essencial da subjetividade humana.

Nesse sentido, é importante reconhecer que a sexualidade é uma fonte de prazer, de comunhão e de criatividade, mas também de conflito, de angústia e de culpa. A sexualidade é atravessada por desejos inconscientes, fantasias, pulsões e traumas que nem sempre se adequam às expectativas sociais ou religiosas. Como disse Foucault, "o prazer está espalhado por toda a superfície do corpo" (Foucault, 1976), mas também está sujeito aos jogos de poder e às relações de saber que regulam as condutas sexuais.

Em segundo lugar, é preciso questionar o conceito de "Igreja Católica Romana" que esses fanáticos usam para se referir a uma instituição religiosa que consideram corrupta e idólatra. Esse conceito é baseado em uma visão sectária e intolerante que nega o valor e a legitimidade de outras tradições religiosas que não se enquadram em sua doutrina. Essa visão desrespeita o princípio da liberdade religiosa e da diversidade cultural que são fundamentais para uma sociedade democrática e pluralista.

Além disso, essa visão ignora os aspectos históricos e teológicos envolvidos na religião, reduzindo-a a uma mera questão de obediência ou rebeldia a uma autoridade divina. Como afirmou Mead, "a religião é um sistema simbólico que serve para relacionar um indivíduo com seu universo" (Mead, 1937). Portanto, a religião não pode ser compreendida apenas como um conjunto de dogmas ou rituais, mas como uma forma de expressão da espiritualidade humana.

Nesse sentido, é importante reconhecer que a religião é uma fonte de sentido, de esperança e de transcendência, mas também de dúvida, de crítica e de transformação. A religião é atravessada por crenças diversas, interpretações variadas, conflitos internos e diálogos inter-religiosos que nem sempre se conformam às normas estabelecidas ou às verdades absolutas. Como disse Balzac, "a religião é a poesia dos sentidos" (Balzac, 1832), mas também é um campo de disputas e de negociações que envolvem os interesses humanos.

Em conclusão, embora a Bíblia possa ser usada como uma fonte de inspiração e orientação para a vida sexual e religiosa, é fundamental adotar uma postura crítica e reflexiva, reconhecendo que as pessoas têm crenças e práticas diferentes. A ênfase deve ser colocada no respeito, no diálogo e na compreensão mútua, em vez de fazer generalizações que podem ser prejudiciais e divisivas. A sexualidade e a religião são dimensões complexas e multifacetadas da experiência humana que devem ser vivenciadas com responsabilidade, liberdade e amor.

domingo, 12 de novembro de 2023

CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(17) Desafios e possibilidades da igualdade de gênero na fé evangélica

 


CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico II(17) Desafios e possibilidades da igualdade de gênero na fé evangélica

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O tema da obediência feminina e da condenação do adultério é frequentemente abordado nas igrejas evangélicas, com base em interpretações bíblicas. No entanto, é fundamental analisar esse tema sob uma perspectiva crítica e atualizada, levando em conta os princípios de igualdade de gênero, autonomia e liberdade espiritual. Neste ensaio, pretende-se discutir como esses princípios podem ser conciliados com a moralidade e a ética cristãs.

Em primeiro lugar, é necessário destacar que qualquer forma de submissão cega e opressão de gênero é contrária aos princípios da igualdade e dos direitos humanos. A ideia de que as mulheres têm até três protetores e devem obedecer cegamente a eles perpetua um padrão de desigualdade de gênero que a sociedade moderna repudia. O respeito mútuo e a autonomia são valores fundamentais que não podem ser ignorados. A Bíblia afirma que Deus criou o homem e a mulher à sua imagem e semelhança (Gênesis 1:27), e que ambos são herdeiros da graça divina (Gálatas 3:28). Portanto, não há justificativa para a discriminação ou a dominação de um gênero sobre o outro. Como disse Simone de Beauvoir, "querer ser livre é também querer livres os outros".

Além disso, a condenação do adultério deve ser contextualizada de forma apropriada ao século atual. Embora a fidelidade conjugal seja valorizada em muitas culturas, a ênfase exagerada na virgindade e a ideia de que as mulheres são as únicas responsáveis por manter essa virtude perpetuam estereótipos prejudiciais. A fidelidade no casamento deve ser um compromisso mútuo, não um fardo imposto apenas às mulheres. A Bíblia condena o adultério tanto para o homem quanto para a mulher (Êxodo 20:14), e reconhece que ambos são tentados pela lascívia (Mateus 5:28). Portanto, não há razão para uma moral dupla ou uma culpabilização excessiva das mulheres. Como disse Nelson Mandela, "liberdade parcial não é liberdade".

Por fim, é importante lembrar que as relações espirituais também evoluíram ao longo do tempo. A comparação do afastamento de amar a Deus com o adultério pode ser vista como excessivamente punitiva e limitada. A espiritualidade é uma jornada individual e pessoal, e não deve ser imposta de maneira coercitiva. A Bíblia ensina que Deus é amor (1 João 4:8), e que ele deseja um relacionamento íntimo e sincero com seus filhos (Jeremias 31:3). Portanto, não há espaço para o medo ou a coação na fé cristã. Como disse Immanuel Kant, "você é livre no momento em que não busca fora de si mesmo alguém para resolver os seus problemas".

Em resumo, enquanto a interpretação tradicional do texto bíblico enfatiza valores como obediência e fidelidade, é fundamental reconsiderar esses conceitos à luz dos princípios de igualdade de gênero, autonomia e liberdade espiritual. O entendimento da moralidade e da ética deve evoluir para refletir as complexidades da sociedade contemporânea e o respeito pelas escolhas individuais.