O Silêncio da Sala dos Professores ("A educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele." — Hannah Arendt)
Sempre imaginei a sala dos professores como um refúgio. Lá, eu acreditava que poderia respirar depois do turbilhão da sala de aula, trocar confidências, dividir risadas ou ao menos silêncios cúmplices. Mas, com o tempo, descobri que nem sempre é assim. Há dias em que esse espaço, em vez de acolher, sufoca. Às vezes, a sala dos professores adoece mais do que a própria sala de aula.
Vejo colegas que preferem nem descer até lá. Escolhem ficar sozinhos, cercados de provas para corrigir, diários para preencher, relatórios intermináveis. Talvez seja uma forma de escapar daquele ambiente pesado, em que o cansaço se acumula nos olhares e o desânimo se espalha pelas conversas interrompidas. Não é questão de antipatia pessoal ou de uma escola em particular. É o sistema, esse grande mecanismo impessoal, que nos desgasta de tantas maneiras.
As cobranças não cessam. Os índices, as metas, a pressão para “inovar” sem recursos, a sensação de competição entre nós — tudo isso nos distancia quando, na verdade, precisávamos estar mais próximos. Penso, muitas vezes, que os gestores e secretários de educação não percebem a gravidade dessa realidade. Fala-se de currículo, de tecnologia, de rendimento, mas raramente de inteligência emocional. Como se cuidar do coração e da mente fosse luxo. E não é. Pesquisas já mostram: cerca de 70% dos professores admitem algum nível de adoecimento emocional.
Eu mesmo sinto na pele o peso dessa estatística. Tratar da saúde do educador não é capricho, é urgência. É questão de vida, de permanência, de resistência. Quando não se cuida do professor, pouco a pouco ele desiste. Não de repente, mas no silêncio das pequenas renúncias: menos brilho no olhar, menos energia em sala, até que um dia não volte mais.
É por isso que acredito que precisamos de uma mudança cultural, mais profunda que qualquer plano de metas. O primeiro passo talvez seja devolver humanidade ao ofício: transformar as formações em espaços de escuta, abrir brechas para o diálogo real e, sobretudo, ensinar que antes de números, lidamos com pessoas. Curar a sala dos professores significa reaprender a olhar uns para os outros, reconhecer fragilidades, partilhar forças. Só assim poderemos resgatar a dignidade de nossa profissão — e a alegria de ensinar sem carregar o peso de uma solidão adoecida.
E então, o que resta? Uma profissão esvaziada, corredores sem entusiasmo, escolas que sobrevivem sem professores saudáveis. Porque, afinal, "todo mundo tá doente". E quando a sala dos professores deixa de ser lugar de encontro para se tornar espaço de desistência, não é apenas o professor que adoece — é a educação inteira que começa a ceder.
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O texto que acabamos de ler nos faz pensar sobre o dia a dia na escola e o papel do professor. Como vimos, a sala dos professores, que deveria ser um lugar de apoio, pode acabar se tornando um ambiente de adoecimento. Vamos refletir sobre isso a partir da Sociologia.
1 - O texto afirma que a sala dos professores adoece mais do que a sala de aula. Explique qual a principal causa desse adoecimento, segundo o autor.
2 - A crônica menciona que o sistema educacional impõe "cobranças incessantes" e uma "sensação de competição". Discuta como essa competição pode afetar a solidariedade e a colaboração entre os professores.
3 - O autor defende que a "saúde do educador não é capricho, é urgência". Qual a relação, de acordo com o texto, entre a saúde emocional do professor e a qualidade da educação oferecida aos alunos?
4 - A frase "todo mundo tá doente" é uma generalização forte. Explique o que o autor quer dizer com isso e por que ele acredita que o adoecimento dos professores pode levar ao "esvaziamento" da profissão.
5 - O autor propõe uma "mudança cultural" na educação. Cite as propostas dele e explique por que ele as considera essenciais para resgatar a alegria de ensinar.
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