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MINHAS PÉROLAS

sábado, 7 de junho de 2025

O Fardo Invisível: Quando a Escola Vira Substituta ("A escola não é um substituto da vida, mas um meio para se aprender a vivê-la." — John Dewey)

 



O Fardo Invisível: Quando a Escola Vira Substituta ("A escola não é um substituto da vida, mas um meio para se aprender a vivê-la." — John Dewey)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Os primeiros rumores de uma "guarda compartilhada" entre escola e família chegaram-me envoltos em um disfarce de zelo. À primeira vista, parecia um caminho promissor para estreitar laços. Mas, conhecendo o pulsar diário da sala de aula, logo percebi o ardil: a proposta, na verdade, deturpa as funções primordiais da instituição escolar. Senti que estavam, sutilmente, empurrando aos professores um fardo que não lhes pertence, uma sobrecarga camuflada de cuidado que desrespeita os limites sagrados de nossa profissão.

Lembro-me das palavras de Michel Foucault (1975), que concebia a escola como um espaço de disciplinamento e organização de saberes, jamais como uma extensão do lar. Quando testemunho a expectativa de que o professor assuma a responsabilidade pela higiene, saúde e até o transporte dos alunos, vejo a responsabilidade pública sendo transferida para o indivíduo, mascarando as falhas estruturais de um Estado ausente. A pensadora Djamila Ribeiro (2017) captou essa essência com precisão cirúrgica: "não se trata de humanizar a escola, mas de instrumentalizar o professor como agente paliativo de políticas ausentes". É uma forma cruel de nos responsabilizar sem o devido suporte.

A justificativa de que "isso já era rotina" é ainda mais alarmante. Naturalizar o acúmulo de funções, transformando o professor em um faz-tudo, ignora o peso avassalador sobre nossa saúde mental. Sinto isso na pele, e o relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2021) não deixa dúvidas, associando a precarização docente ao aumento alarmante de síndromes de esgotamento. É exaustivo, e o silêncio diante dessa realidade é um cúmplice.

Minha alma ecoa a urgência de Hannah Arendt (1954), que defendia a clareza em "separar a esfera da educação da esfera da assistência". A escola é, e sempre será, um espaço de mediação do conhecimento, um farol a iluminar caminhos intelectuais. Nunca deveria ser um substituto para a família, tampouco uma agência de assistência social.

Essa "guarda compartilhada" revela-se, portanto, uma manobra. Ela transfere para nós, educadores, o ônus de um descompasso que não criamos: a exaustiva jornada de trabalho dos pais e os horários escolares inflexíveis. Isso não é uma solução; é uma grave negligência institucional. Impor o cuidado integral como um dever docente não é mais que romantizar a exploração, distorcendo o papel essencial e nobre da educação.

No fundo, essa proposta é um projeto ideologicamente perverso, que desloca a responsabilidade social e viola os limites éticos e profissionais pelos quais tanto lutamos. Não somos tutores, babás ou enfermeiros. Somos, em nossa essência e paixão, educadores. E é nessa vocação, e somente nela, que a escola pode encontrar seu verdadeiro propósito e sua força transformadora.




Minha crônica faz uma crítica profunda e necessária sobre a sobrecarga de responsabilidades dos professores e a descaracterização do papel da escola. Ela destaca a importância de manter a função educacional clara e separada de outras esferas sociais. Como professor de sociologia, preparei 5 questões simples para aprofundar as ideias do seu texto:


1 - A crônica questiona a ideia de "guarda compartilhada" na escola, argumentando que isso "deturpa as funções primordiais da instituição escolar". Como a Sociologia da Educação define o papel principal da escola na sociedade contemporânea e por que é importante manter essa função bem delimitada?


2 - O texto cita Djamila Ribeiro ao dizer que o professor está sendo "instrumentalizado como agente paliativo de políticas ausentes". De que forma a Sociologia do Trabalho pode analisar a sobrecarga de funções dos professores e como isso afeta a qualidade do ensino e a saúde mental desses profissionais?


3 - A crônica se refere à fala de Hannah Arendt sobre "separar a esfera da educação da esfera da assistência". Explique, com base na Sociologia, por que a escola não deve ser vista como substituta da família ou de outros serviços sociais, e quais seriam as consequências dessa confusão de papéis.


4 - O texto afirma que a "guarda compartilhada" transfere para os educadores o "ônus de um descompasso" entre a jornada dos pais e os horários escolares. Como a Sociologia da Família e a Sociologia Urbana podem analisar as pressões sociais e econômicas que levam as famílias a buscar na escola um apoio que vai além da educação formal?


5 - A crônica conclui que o professor é, em sua essência, um "educador", e não um "tutor, babá ou enfermeiro". Pensando na Sociologia das Profissões, discuta por que é crucial valorizar e proteger a identidade profissional do educador, garantindo que ele possa focar em sua vocação de mediar o conhecimento e transformar vidas.

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