Na Escola, o Escândalo Chegou Antes do Fim da Aula ("Uma conduta irrepreensível consiste em manter cada um a sua dignidade sem prejudicar a liberdade alheia." — Voltaire)
Era para ser só mais uma quinta-feira. Aulas dadas, cadernos corrigidos, corredores preenchidos por vozes adolescentes. O frio de maio mal conseguia disfarçar a tensão que, de tempos em tempos, escorre pelas paredes da escola como umidade antiga. Ainda estou vivo, testemunha de um tempo em que a autoridade do professor se dissolve entre denúncias, ruídos e dedos em riste.
Naquela noite, os gritos não vinham da quadra, nem das gargalhadas exageradas que escapam da sala do oitavo ano. Vinham do portão. Um homem transtornado, olhos marejados de raiva. Pai de aluna, disseram depois. Mas, no instante em que ele invadiu a escola, não era pai — era fúria pura, músculo e acusação.
Em poucos segundos, o chão virou campo de batalha. O professor, alvo de denúncias que ninguém ali sabia se eram verdadeiras ou caluniosas, tornou-se também alvo de socos. O coordenador tentou intervir e recebeu sua cota de hematomas. Uma janela foi estilhaçada. E ali, entre cacos de vidro e perguntas sem resposta, a escola virou manchete.
Depois veio o resto: o boletim de ocorrência, as notas oficiais, os nomes registrados nos autos. “Importunação sexual, lesão corporal, ameaça.” Tudo junto, tudo misturado, como se o crime e a consequência tivessem pulado etapas. O professor foi afastado. A aluna, amparada por psicólogos. A escola, cercada por repórteres. E nós, os outros, entre o silêncio e o espanto.
É difícil explicar, para quem nunca viveu por dentro de uma escola, como esses episódios nos atravessam. Não apenas pela violência, mas pela dúvida. E se for verdade? E se não for? Quem protege quem? A justiça tarda ou se atropela? Os corredores seguem os mesmos, os alunos também. Mas algo se quebra quando a suspeita entra pela porta da frente e a confiança sai pelos fundos.
Na sala dos professores, o café esfriou. Alguém comentou que era o terceiro caso semelhante no ano. Outro disse que vai antecipar a aposentadoria. Eu fiquei olhando o nada, lembrando de quando ensinar era apenas ensinar. Agora, parece que precisamos nos proteger antes de tudo.
Quando a polícia chegou, já era tarde. A noite havia caído, e o que restava era uma escola tentando se recompor, como uma criança que leva um tombo e ainda não sabe se chora ou se finge que está tudo bem.
Sigo lecionando, porque ainda acredito. Mas, a cada novo escândalo, percebo que nossa profissão caminha numa linha tênue entre o respeito e a suspeita, entre o ensinar e o se defender. “Que Deus proteja os justos, porque a escola já não consegue.”
https://g1.globo.com/sp/sorocaba-jundiai/noticia/2025/05/26/professor-que-foi-agredido-em-escola-estadual-de-jundiai-e-investigado-por-importunacao-sexual-contra-aluna.ghtml (Acessado em 28/05/2025)
Meu texto lança luz sobre a complexa e delicada situação da violência e da suspeita no ambiente escolar, afetando a confiança e o próprio papel do professor. Para aprofundar essa discussão sob uma perspectiva sociológica, preparei 5 questões discursivas simples:
1 - O texto descreve a invasão da escola por um pai de aluna, culminando em agressão. Como a Sociologia da Violência analisa a irrupção da violência no espaço escolar, tradicionalmente visto como um local de aprendizado e segurança? Quais fatores sociais podem contribuir para a ocorrência de tais atos?
2 - A narrativa destaca a coexistência da agressão ao professor com a acusação de importunação sexual contra ele. Como a Sociologia das Relações de Poder analisa as dinâmicas de poder e as tensões que podem emergir entre diferentes atores da comunidade escolar (professores, alunos, pais), especialmente em contextos de acusação e violência?
3 - O autor menciona a quebra da confiança e o surgimento da dúvida ("E se for verdade? E se não for? Quem protege quem?"). Como a Sociologia da Confiança estuda a construção e a erosão da confiança nas instituições sociais, como a escola? Quais as consequências da perda de confiança nas relações entre professores, alunos e a instituição escolar?
4 - A reação dos professores na sala dos professores ("Alguém comentou que era o terceiro caso semelhante no ano. Outro disse que vai antecipar a aposentadoria.") revela o impacto psicológico e profissional desses eventos. Como a Sociologia do Trabalho e a Sociologia da Educação analisam o impacto da violência e da suspeita na saúde mental e na motivação dos professores?
5 - A frase final, "Que Deus proteja os justos, porque a escola já não consegue," expressa um sentimento de desamparo da instituição escolar. Sob a perspectiva da Sociologia das Instituições, qual o papel da escola na proteção de seus membros, e como a ocorrência de violência e suspeita pode desafiar essa função?
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