LIÇÕES DE BIA (Quem merece maior reprovação, Bia ou aqueles que correm atrás de nota, meramente copiando e colando? )
Numa tarde de outono, o aroma de livros novos preenchia a sala de aula do segundo ano do Ensino Médio no Colégio Estadual. As folhas douradas das árvores sedentas dançavam do lado de fora, enquanto eu, professor de Língua Portuguesa, enfrentava um desafio que mudaria minha perspectiva sobre educação.
Meu olhar cruzou com o de Bia, uma jovem de olhos brilhantes e sorriso desafiador, cuja presença esporádica nas aulas era um enigma que eu ansiava decifrar. Movido pela convicção de que poderia reconduzi-la ao caminho do aprendizado, decidi abordá-la após a aula.
"Bia", chamei-a com um misto de preocupação e esperança, "o que você pensa sobre sua dedicação aos estudos e seu comportamento desfavorável?"
Sua resposta veio rápida como um raio: — "Creio que não é só de disciplina que um bom aluno precisa, professor."
Intrigado, continuei nosso diálogo, navegando por temas como a competência dos professores e o regimento escolar. Bia respondia com uma segurança desconcertante, como se cada palavra fosse uma peça de um quebra-cabeça que eu ainda não conseguia montar.
Então, num lampejo de otimismo, lancei a pergunta que acreditava ser o xeque-mate: "Então você planeja ser uma boa aluna, tornar-se um exemplo de dedicação e ser coroada com uma merecida aprovação em todas as matérias?"
O que se seguiu foi como um balde de água fria em minhas expectativas. Bia, com um brilho travesso nos olhos, declarou: — "Tornar-me uma boa aluna e ser alguém na vida? Jamais! Estou aqui para me divertir, comer, socializar e zoar. Aprender? Só o mínimo possível! A verdadeira escola da vida está lá fora, nas ruas."
Naquele momento, senti o peso de anos de docência desmoronar sobre meus ombros. Bia não era apenas uma aluna rebelde; ela era o espelho de uma realidade que eu, em minha torre de marfim acadêmica, me recusava a enxergar. Ela simplesmente acreditava que poderia incluir a vida escolar entre seus lazeres, quebrando normas e ainda fazendo "sucesso" na comunidade escolar.
Enquanto os dias se passavam, observei outros alunos - os "exemplares" que copiavam e colavam trabalhos, os que mendigavam notas sem interesse real pelo conhecimento. Percebi que muitos sofriam do mesmo "desvio focal" que Bia, vendo a escola apenas como um passatempo, sem compreender sua verdadeira importância.
Esta experiência me fez refletir profundamente sobre o propósito da educação. Não se trata apenas de notas ou presença, mas de despertar mentes, cultivar o pensamento crítico e preparar jovens para os desafios da vida real. Me perguntei: quem merece maior reprovação? Bia, com sua honestidade crua, ou aqueles que fingem jogar o jogo da educação?
Hoje, quando olho para minha sala de aula, não vejo mais apenas alunos. Vejo indivíduos complexos, cada um com sua história, seus sonhos e suas batalhas internas. E me questiono: como posso, como educador, construir pontes entre o conhecimento acadêmico e a realidade pulsante que existe além dos muros da escola?
A jornada de Bia e de tantos outros me ensinou que a verdadeira educação transcende as paredes da sala de aula. É um convite constante à reflexão, à adaptação e, acima de tudo, à compreensão do mundo através dos olhos daqueles que estamos formando.
Que possamos, como educadores e sociedade, repensar nossas práticas e expectativas. Pois só assim poderemos verdadeiramente cumprir nossa missão: não apenas ensinar, mas inspirar, transformar e preparar nossos jovens para serem protagonistas de suas próprias histórias. Ser professor é mais do que transmitir conteúdo; é também despertar nos alunos a paixão pelo conhecimento e a consciência de que a educação é a chave para um futuro melhor.
Questões Discursivas:
Questão 1:
O texto apresenta um confronto entre a visão tradicional de educação e a perspectiva de uma aluna que questiona o sistema. Como essa experiência impactou a visão do professor sobre seu papel e a função da escola na sociedade?
Esta questão convida os alunos a refletir sobre a importância de desafiar as normas e a necessidade de repensar o papel da educação na formação de cidadãos críticos e engajados.
Questão 2:
O texto levanta a questão: "Quem merece maior reprovação? Bia, com sua honestidade crua, ou aqueles que fingem jogar o jogo da educação?" A partir dessa reflexão, como a escola pode lidar com a diversidade de atitudes e expectativas dos alunos, buscando promover o aprendizado significativo?
Esta questão incentiva os alunos a pensar sobre os desafios da inclusão e da diversidade em sala de aula, e a importância de criar um ambiente de aprendizagem que respeite as individualidades e promova o engajamento de todos os estudantes.