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MINHAS PÉROLAS

sábado, 21 de maio de 2011

NEM SEMPRE IMPORTA O QUE ESTÁ ERRADO (A cada bela impressão que causamos, conquistamos um inimigo. Para ser popular é indispensável ser medíocre. Oscar Wilde)


Crônica

NEM SEMPRE IMPORTA O QUE ESTÁ ERRADO (A cada bela impressão que causamos, conquistamos um inimigo. Para ser popular é indispensável ser medíocre. Oscar Wilde)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Na escola onde leciono, vez ou outra nasce uma estrela. Um brilho discreto, mas constante, que se destaca em meio ao breu da indiferença e da preguiça que, infelizmente, vem se tornando regra. Este ano, ela estava ali, sentada na terceira carteira da fileira do meio, com os olhos atentos e cadernos impecáveis. Inteligente, curiosa, disciplinada. Como não notar?

Pensei que poderia usar aquele talento a favor de todos. Talvez, se eu a elogiasse publicamente, os outros sentissem vontade de imitá-la — e assim se elevassem também. Comecei a fazer isso com naturalidade: destacava suas respostas bem elaboradas, exibia seus trabalhos, associava seu esforço a grandes exemplos de superação. Queria apenas inspirar. Ingenuidade minha.

O efeito foi o contrário. A turma, ao invés de se motivar, armou trincheiras. A inveja, que sempre se esconde nas sombras, se alastrou como mofo nos cantos de um porão esquecido. Os apelidos vieram: “puxa-saco”, “nerd”, “CDF”. E os risos abafados se tornaram zombarias abertas. A perseguição crescia, sutil, mas cruel. E não tardou para que os pais entrassem em cena. Uma mãe me procurou com ares de acusação, dizendo que sua filha estava se sentindo discriminada porque eu elogiava demais a colega. Sem saber se exigia justiça ou privilégio, exigiu que eu parasse.

Foi ali que compreendi o novo jogo: o mérito é perigoso. Ele desestabiliza a falsa harmonia onde todos fingem igualdade, mesmo sem esforço igual. E quem ousa reconhecer os merecedores vira ameaça. Acusaram-me de desprezar os demais, quando, na verdade, eu apenas apontei para um farol em meio à neblina. A recompensa pelo meu zelo foi o silêncio constrangido da coordenação e a clara mensagem: cale-se.

Enquanto isso, os bons pais — aqueles cujos filhos brilham pelo esforço — raramente aparecem. Talvez achem que tudo está bem. Mas os que vêm, com frequência, são os que buscam culpados para as falhas de seus filhos. A escola virou tribunal, e o professor, réu sem direito de defesa.

Recentemente, a aula foi interrompida por uma confusão absurda. Uma menina, do sexto ano, exibiu um vídeo íntimo, gravado em casa. Gargalhadas, provocações, gritaria. E lá estávamos nós, professores, tentando separar brigas, apaziguar ânimos, resolver o que nunca foi nossa atribuição. A coordenadora correu de um lado ao outro, buscando culpados, como se fosse possível resolver uma ferida social com advertências. Enquanto isso, o conteúdo previsto ficou para depois — ou para nunca.

Diante de tudo isso, muitos professores baixam o nível da aula. Querem sobreviver. Querem manter a paz. Preferem agradar a todos, ainda que sacrifiquem os bons alunos, que ficam à margem, desperdiçando tempo, revendo o que já dominam. E aquela minha aluna, a brilhante, de cabelos longos e olhar firme, fala agora em mudar de escola. Cansou de ser o alvo. A luz incomoda.

E eu me pergunto: o que será da educação pública sem os seus luzeiros?

Quem ficará para manter aceso o pouco que ainda nos resta?

A perseguição ao mérito tem efeitos devastadores sobre os estudantes talentosos. Quando o esforço é ridicularizado e a excelência se torna motivo de escárnio, os mais dedicados aprendem cedo a esconder seu brilho para sobreviver. Sentem-se deslocados, culpados por se destacarem, e acabam abafando seus dons em nome de uma aceitação superficial. Essa inversão de valores não apenas silencia talentos individuais, mas molda gerações inteiras a rejeitar a superação, trocando o desafio pelo conformismo. Aos poucos, aprender deixa de ser conquista e passa a ser castigo. E assim, o futuro se constrói sobre a areia movediça da mediocridade consentida.

Por isso, imploro — sim, imploro — aos bons pais: venham à escola. Defendam seus filhos, mas também nos apoiem. Encorajem os professores que se dedicam, que resistem. Não deixem que o silêncio dos bons seja cúmplice do barulho dos maus. Pois, como diz a sabedoria antiga: “Chega-te aos bons, serás um deles; chega-te aos maus, serás pior do que eles.”


https://www.bahianoticias.com.br/justica/noticia/58892-colegio-adventista-e-condenado-a-indenizar-aluna-em-r-12-mil-por-pratica-de-bulliyng.html (Acessado em 20/06/2025)




Minha crônica é um poderoso desabafo sobre os desafios da educação contemporânea, a inversão de valores e a desvalorização do mérito no ambiente escolar. Ela aborda a frustração de um professor que, ao tentar estimular a excelência, se depara com a intolerância, a inveja e a incompreensão, resultando na desmotivação dos alunos dedicados e no esgotamento dos educadores. Como seu professor de sociologia, preparei cinco questões discursivas simples, baseadas nas ideias principais de minha crônica, para aprofundar as discussões sobre esses temas.


1 - A crônica descreve como o elogio a uma aluna exemplar gerou inveja e perseguição por parte dos colegas. Do ponto de vista da Sociologia da Educação, como a cultura escolar e as dinâmicas de grupo podem influenciar a percepção do mérito e do esforço individual, e de que forma a rivalidade ou a pressão por conformidade podem inibir o desenvolvimento da excelência?


2 - O autor se depara com pais que acusam o professor de "discriminação" por elogiar alunos destacados, enquanto os pais de alunos exemplares permanecem ausentes. Com base na Sociologia da Família e da Escola, como as diferentes expectativas e papéis dos pais em relação à educação de seus filhos podem gerar conflitos com a prática pedagógica, e quais as implicações da ausência de apoio para os professores?


3 - O texto evidencia a perda da autonomia e autoridade do professor, que se vê obrigado a "calar-se" e a resolver problemas que extrapolam sua função acadêmica, como brigas e questões de comportamento. Sob a ótica da Sociologia das Profissões, como a sobrecarga de funções e a desvalorização do saber técnico-pedagógico podem levar ao esgotamento docente e à perda de foco na missão principal da escola?


4 - A crônica menciona que muitos professores "baixam o nível da aula" para "agradar a todos" e "manter a paz", sacrificando o aprendizado dos alunos mais dedicados. Utilizando conceitos da Sociologia do Currículo Oculto e da Sociologia Crítica da Educação, discuta como a busca por conformidade e a evitação de conflitos podem inadvertidamente prejudicar a qualidade do ensino e a motivação dos estudantes que buscam desafios intelectuais.


5 - O autor expressa a angústia sobre o que será da "educação pública sem os seus luzeiros", referindo-se aos alunos brilhantes que pensam em sair da escola por perseguição. Com base na Sociologia das Desigualdades Educacionais, analise como a falta de um ambiente que valorize o mérito e o esforço pode contribuir para a evasão de talentos do sistema público de ensino, impactando negativamente o futuro da sociedade.

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