"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

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MINHAS PÉROLAS

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

O Ventilador da Discórdia e a Fuga para o Digital: Uma Crônica da Rendição ("Um ventilador espalha o calor e as notas da sinfonia." — Winston)

 


O Ventilador da Discórdia e a Fuga para o Digital: Uma Crônica da Rendição ("Um ventilador espalha o calor e as notas da sinfonia." — Winston)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

No "velho normal", a cena era recorrente: o ventilador giratório, instalado no "fundão" da sala de aula, no alto da parede, voltado para baixo, soprava mais do que ar. Soprava o egoísmo de dois alunos controladores, movidos pelo desejo de desforra: o "vício na gratuidade". Era um velho ventilador público, ironicamente "adestrado a não ventilar para todos". Seu barulho, contudo, atrapalhava toda a sala; era um equipamento "didático" que nem "facilitava o ensino".

Muitas vezes, pedi que o desligassem, e a resposta era desrespeito; eu era tachado de desumano. Talvez fosse essa a razão por que eles não "duravam muito tempo fixados na parede de placa de cimento". Outros, revoltados, se vingavam no equipamento quando ninguém estava olhando. Era um custo-benefício injusto naquela escola pública "sem juízo", comprado com o dinheiro de todos para o benefício dos "piores" alunos — aqueles que brigam por qualquer conforto sem se importar com o coletivo. A aula se perdia, pois o professor precisava discursar longamente para convencê-los a desligá-lo, explicando que o calor prejudica menos que o barulho de "helicóptero".

O calor da inconveniência era forte e vencia a prudência. Chegamos, então, à rendição: o ruído metálico da discórdia venceu, e o cooler silencioso refrigerava somente o notebook proibido em sala de aula. A "congregação virtual diz amém".

E então chegamos à transição que mudou tudo: o notebook virou porta de entrada para o EAD, e de repente a sala física se esvaziou de corpo e de ética. Mas esses alunos “egoístas” também são vítimas de um sistema que os ensinou, desde cedo, que conforto individual vale mais que bem coletivo. São produtos, não apenas produtores, dessa lógica. O problema não é o EAD como ferramenta, mas sua transformação em fuga generalizada de um espaço público que desistimos de consertar.

O egoísmo estudantil tem causas profundas: o neoliberalismo educacional, a curricularização da competição e a ausência de formação cidadã. Precisaríamos de salas com no máximo 20 alunos, ventilação adequada e currículos que ensinem democracia praticando-a — decidindo coletivamente desde horários de uso do ventilador até temas de estudo. Exigiria professores valorizados, financeira e simbolicamente, capazes de mediar conflitos ao invés de apenas sobrevê-los. Demandaria pais que entendam a educação como formação ética, não apenas trampolim para vestibular.

Mas será que essa "saída", tão entusiasticamente aplaudida, não é, na verdade, uma nova forma de covardia social? A Educação a Distância ou o Homeschooling, embora apresentados como soluções lógicas, representam, ironicamente, a vitória final daquele mesmo egoísmo que destruiu o espaço comum. Em vez de lutar para que o ventilador público funcionasse para todos — consertando a ineficiência e educando a convivência —, talvez a Educação a Distância nos favoreça com isolamento digital, onde cada um se torna seu próprio senhor usufruindo do seu ventilador silencioso. Fugimos do ruído da discórdia, mas abrimos mão do desafio de construir a ética compartilhada.

A questão não é se o ventilador girará para todos, mas se ainda somos capazes de imaginar um "todos" que valha a pena construir. Enquanto não formos, cada cooler silencioso em cada sala virtual será apenas mais uma capitulação disfarçada de inovação.


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O texto toca em pontos cruciais sobre a vida em sociedade, o papel da escola e os desafios da convivência na era digital. Como professor de Sociologia do Ensino Médio, preparei 5 questões discursivas simples e diretas para alinharmos os conceitos sociológicos às ideias que o texto apresenta. Questões Discursivas de Sociologia (Análise da Convivência e Espaço Público)

Texto Base: A crônica "O Ventilador da Discórdia e a Fuga para o Digital"

1. O Individualismo e o Uso do Bem Público:

O texto descreve o comportamento dos "dois alunos controladores" como o egoísmo e o "vício na gratuidade" no uso de um ventilador público. Em termos sociológicos, defina o conceito de "bem público" e explique como o comportamento dos alunos ilustra o conflito entre o interesse individual e o uso coletivo, conforme é analisado no texto.

2. O Papel da Escola como Espaço de Socialização:

O autor sugere que a escola pública no texto é um ambiente "sem juízo" onde os alunos não aprendem a se importar com o coletivo. Qual é o papel tradicional da escola como agência de socialização na formação da ética e da cidadania? Explique como a situação descrita (o professor "discursar longamente para convencê-los") demonstra uma falha nesse processo de socialização.

3. O Conceito de Desigualdade e "Piores Alunos":

O texto afirma que o ventilador beneficiava os "piores" alunos, que brigavam por conforto sem se importar com os outros. Analisando o trecho "custo-benefício injusto na escola pública", discuta brevemente se o problema central é apenas o mau comportamento individual ou se reflete, também, uma desigualdade estrutural mais ampla que precariza o ambiente escolar.

4. O Individualismo e a Crítica ao Neoliberalismo Educacional:

O autor sugere que o egoísmo estudantil tem causas profundas ligadas ao "neoliberalismo educacional" e à "curricularização da competição". Explique o que esses termos significam no contexto da Sociologia da Educação e como eles podem incentivar o foco no desempenho individual em detrimento da solidariedade (ética compartilhada).

5. A Fuga Digital e a "Covardia Social":

A conclusão do texto questiona se a adesão à Educação a Distância (EAD) e ao Homeschooling não é uma "nova forma de covardia social". Com base na sua leitura sociológica do texto, defina o que o autor entende por "covardia social" nesse contexto e explique por que a tecnologia (o cooler silencioso e o notebook individual) é vista como uma capitulação (rendição) disfarçada de inovação.

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quarta-feira, 12 de outubro de 2022

DIFAMADORES LEVIANOS DO GOVERNO ("Missão de hoje: não reclamar da vida, se eu reclamar estarei conspirando contra Deus!" — Kacique Belina)

 


DIFAMADORES LEVIANOS DO GOVERNO ("Missão de hoje: não reclamar da vida, se eu reclamar estarei conspirando contra Deus!" — Kacique Belina)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Deus não permitirá que o Messias Bolsonaro seja desonrado em sua presidência. Um homem levantado, de fato, para combater a corrupção endêmica do país e defender os princípios bíblicos. Um líder que, embora imperfeito em sua humanidade, carrega o peso de uma missão considerada perfeita. É inevitável que esses postulantes "brasileiros", que se levantam contra o governo em pleno momento emergencial, experimentem uma grande queda, pois o Todo-Poderoso remove, em Seu tempo, os empecilhos para que Suas realizações fluam a contento. Muitos já sentem o peso dessa remoção, arrastados pelo desemprego ou acometidos pela covid-19. E é temeroso antever algo ainda pior: a iminência das pragas apocalípticas dos sete selos.

Mas é vital compreender que, nesta luta por um Brasil mais justo e alinhado a princípios éticos, não se pode confundir fé com desumanização, nem transformar divergências políticas em uma guerra santa. O evangelho que nos guia é, antes de tudo, de amor e misericórdia, convocando-nos a uma justiça que eleva a dignidade humana, mesmo daqueles que seguem caminhos opostos. Celebrar a doença ou o desemprego do outro como castigo divino é trair a essência da Palavra, obscurecendo o plano maior de compaixão que deveria iluminar toda autoridade e missão.

Segundo a Palavra de Deus, afrontar o plano do Todo-Poderoso é flertar com o sofrimento. Algumas das passagens mais duras do Novo Testamento são direcionadas àqueles que criticam os governantes civis de forma desrespeitosa — (II Pe 2:10-12; Jd 1:8-10). O Criador, em Sua soberania, ridicularizou a irracionalidade dos que questionam o governo de Seus propósitos, declarando que deveriam ser destruídos como animais brutos – o que, de forma quase irônica, remete ao fato de que muitas doenças recentes também surgiram dos animais: é de animal para animal. O texto sagrado revela que nem mesmo os anjos ousaram falar com desrespeito contra os governantes, pois testemunharam a condenação dos presunçosos e obstinados.

A verdadeira tensão desta crônica, no entanto, está na dificuldade humana de enxergar o inimigo político com a lente da misericórdia que professamos. Se a Palavra condena a insubordinação, também nos adverte a não julgar com a mesma severidade que seremos julgados. Eis o paradoxo: não uma sentença polarizada, mas uma ambiguidade poética, que pede mais reflexão que condenação. O pecado do desrespeito à autoridade não é exclusividade da "esquerda" ou de qualquer rótulo, mas uma falha da condição humana em submissão ao poder, espalhada por todo espectro onde a soberba se ergue contra o propósito divino.

Ainda assim, não se pode ignorar: a esquerda incorre, de modo visível, em um dos pecados que YHWH mais abomina — o desrespeito àqueles que estão investidos de autoridade, com um chamado divino e uma missão digna de honra.


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Como seu professor de Sociologia, vejo que este texto nos oferece ótimos ganchos para discutir a relação complexa entre Política, Religião e Sociedade. Vamos a cinco questões discursivas simples para analisarmos criticamente as ideias apresentadas e as tensões que elas geram no campo social.

Questão 1: Religião e Legitimidade Política

O texto afirma que o líder político (Messias Bolsonaro) foi "levantado" por Deus e carrega uma "missão perfeita".

Com base nos conceitos de Sociologia Política, explique o que significa o uso de argumentos religiosos para justificar ou conferir legitimidade a um governante. Como isso pode influenciar a aceitação (ou rejeição) da autoridade por parte da população?

Questão 2: O Risco da "Guerra Santa" na Política

O segundo parágrafo critica a confusão entre "fé com desumanização" e a transformação de "divergências políticas em uma guerra santa", argumentando que isso trai a essência do evangelho.

Sob a perspectiva sociológica, discuta os riscos para a Democracia e para a coesão social quando os conflitos políticos são interpretados e conduzidos como uma batalha religiosa entre o "bem" e o "mal".

Questão 3: Moralidade e Castigo Social

O texto menciona que o desemprego e a Covid-19 podem ser vistos como "castigo divino" para os opositores do governo.

Analise essa visão à luz da Sociologia. Por que é problemático (ou perigoso) associar questões sociais concretas, como desemprego ou doença, a um julgamento moral ou religioso em uma sociedade plural e laica?

Questão 4: Submissão e Crítica à Autoridade

O texto cita passagens bíblicas que condenam o desrespeito aos governantes civis e fala do "pecado do desrespeito à autoridade".

Em uma sociedade democrática, qual é o papel da crítica e da oposição ao governo? Como a Sociologia do Direito e o conceito de Cidadania equilibram a necessidade de ordem (submissão à autoridade) com o direito de discordar e fiscalizar o poder?

Questão 5: Polarização e Ambiguidade Humana

O penúltimo parágrafo reconhece a "dificuldade humana de enxergar o inimigo político com a lente da misericórdia" e defende a "ambiguidade poética" em vez da "sentença polarizada".

Explique, a partir dos conceitos de Polarização Social ou Identidade de Grupo, por que é tão difícil para os indivíduos (conforme o texto aponta) romper com a visão de "nós contra eles" e enxergar a falha ou o erro como uma "falha da condição humana" que atinge ambos os lados?

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“Enraizado no Magistério: A Tocha que Não se Apaga” ("Pássaro pousado no espantalho(,) aposentado." — Millôr Fernandes)

 


“Enraizado no Magistério: A Tocha que Não se Apaga” ("Pássaro pousado no espantalho(,) aposentado." — Millôr Fernandes)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Na minha essência, enraizado está o dom de lecionar; sou professor por predestinação. Esse é meu trabalho, garantido por concurso na escola pública. O que sei? Sei ensinar o que aprendi em minha trajetória. No entanto, sempre que me encontram, os colegas perguntam quando vou me aposentar, como se já estivessem cansados de mim. Meus cabelos brancos, ao invés de legitimarem minha experiência, parecem desaboná-la. Deduzem que a aposentadoria é o destino inevitável de todos.

No entanto, se me aposentar, o que serei eu? “Isso eles não se perguntam”, porque não são verdadeiros amigos. Querem que eu seja apenas mais um aposentado sustentado pelo governo. Agora lhes pergunto: “quem quer a amizade de um velho aposentado?” Poucos se dispõem a enxergar além da invisibilidade que nos cerca. Por isso, vou adiar esse momento o máximo que puder.

Talvez eu seja, para muitos, apenas um quadro antigo pendurado num corredor cinzento; ainda assim sigo ali, não por vaidade, mas por convicção. Permanecer é um ato de fé no próprio ofício, um modo de provar que a vida não se encerra quando os outros decretam. Mesmo cansado, encontro nas minhas aulas e nos olhares atentos dos que ainda me escutam um sentido maior do que a espera pela aposentadoria. Não quero ser lembrado como um sobrevivente ressentido, mas como alguém que transformou a amargura em testemunho e a invisibilidade em resistência silenciosa. Partirei, sim, um dia — mas não como quem foge, e sim como quem entrega a tocha, confiante de que algo do que semeei ainda florescerá.

Enfim, quando a escola me deixar, eu também me deixarei: “terei uma nova identidade, aposentado do sistema educacional”. Apesar de, pela ineficiência do sistema, já me sentir ser somente isso, resta-me cansar-me deles também. “Mudar-me-ei para o paraíso de poucos” — mas não um paraíso cínico, e sim um lugar onde minha experiência não seja tratada como peso morto, mas como herança viva.

No meu otimismo moderado, “entendo ser o velho um jovem que deu certo”. Espero poder aproveitar muito bem o pouco tempo que me resta, mesmo que seja cercado apenas por lembranças, leituras e conversas sinceras. Quem sabe, assim, “terei um bom preparo para morrer não apenas feliz, mas inteiro – tendo resistido até o último capítulo”. (CiFA


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Esse texto é um relato poderoso e profundo sobre a experiência de ser professor na reta final da carreira. Ele nos permite analisar questões sociais e psicológicas importantes: a identidade no trabalho, a valorização da experiência, a invisibilidade do idoso e a relação com o sistema educacional. Como seu professor de Sociologia, quero que usemos essas ideias para aprimorar nosso olhar crítico. Preparo, então, 5 questões discursivas simples para nosso debate. Lembrem-se de focar nas relações sociais, nas estruturas de poder e na construção da identidade dentro da sociedade.


1. Identidade Social e Trabalho

O autor afirma que a essência de sua identidade está "enraizada" no ofício de professor. A aposentadoria, para ele, representa uma crise: "se me aposentar, o que serei eu?"

Questão: Explique a importância do trabalho na construção da identidade social de um indivíduo. Por que, sociologicamente, a perda do status profissional (como a aposentadoria) pode gerar um vazio ou uma crise de identidade, como sugere o texto?

2. Desvalorização da Experiência e Idadismo

O professor relata que seus "cabelos brancos, ao invés de legitimarem minha experiência, parecem desaboná-la", e que os colegas o veem como alguém que deveria se aposentar logo.

Questão: Analise como a situação descrita reflete o fenômeno social do idadismo (ou preconceito etário) no ambiente de trabalho. De que maneira a sociedade capitalista moderna tende a desvalorizar a experiência acumulada em favor da juventude e da velocidade?

3. O Professor como "Quadro Antigo"

O autor se compara à imagem de "apenas um quadro antigo pendurado num corredor cinzento".

Questão: Qual o significado sociológico dessa metáfora da invisibilidade no contexto da escola pública? Discuta como a rotina e a burocracia do "sistema educacional" podem transformar o educador em uma figura impessoal e marginalizada, apesar de sua convicção e resistência.

4. Aposentadoria como Exclusão Social

O texto critica a visão de que os colegas querem que ele seja "apenas mais um aposentado sustentado pelo governo", e lamenta que "poucos se dispõem a enxergar além da invisibilidade que nos cerca".

Questão: Com base na leitura do texto, comente como a aposentadoria, embora seja um direito, pode ser percebida pelo trabalhador como um ato de exclusão social ou de separação, onde ele perde sua função e sua relevância nas relações interpessoais.

5. Resistência Silenciosa e Legado

Apesar do cansaço, o professor afirma que sua permanência é um "ato de fé no próprio ofício" e um modo de deixar um "testemunho" e uma "herança viva" para os alunos.

Questão: De que forma a atitude de "resistência silenciosa" do professor, ao se recusar a sair de cena prematuramente, pode ser interpretada como uma crítica à eficiência do sistema e uma afirmação do valor humano e pedagógico no ambiente de trabalho?

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terça-feira, 11 de outubro de 2022

LOCKDOWN DESSERVIÇO À POPULAÇÃO. ("Lockdown: confinamento, não serve para controle sanitário, isso é controle social... não perguntem qual é o objetivo, eu não sei!" — Renato Cesar Vargas Martins)

 


domingo, 9 de outubro de 2022

"XX" É UM PAR, MAS "XY" É UM CASAL.("Até os cromossomos têm par, e eu aqui sozinho!" — (Matheus Leminsk)

 


"XX" É UM PAR, MAS "XY" É UM CASAL.("Até os cromossomos têm par, e eu aqui sozinho!" — (Matheus Leminsk)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Quando alguém profere a frase: "não tenho nada contra os gays, quem quiser ser que seja, mas não quero isso para mim e nem para os meus filhos", é um homofóbico de baixa classe quem fala. É, no fundo, um enrustido que resiste à própria carne, um homossexual com medo de sê-lo. Como pode alguém aprovar no outro aquilo que reprova para si mesmo?

Essa ambiguidade não se sustenta: ninguém permanece em cima do muro por muito tempo. Terremotos virão antes do Messias aparecer, e Ele exige as coisas bem definidas — "joio e trigo em molhos separados".

Essas pessoas oferecem apenas uma aceitação hipócrita, disfarçada de tolerância, pois não têm a coragem de assumir o que realmente pensam. A questão é profunda: será que se amam de verdade, e amam os outros na mesma medida? Diante do eufemismo social, acabam reforçando que o lado mais promissor é o da conveniência, rendendo-se à moral vigente. Contudo, para não sofrerem o que infligiram aos outros com seu julgamento, impõem a si mesmos o castigo da libertinagem — e o segredo dessa contradição, vivida na clandestinidade, não tardará a ser revelado.

É nesse ponto que a pergunta sobre a justiça divina se torna inquietante. Dizer que "não sei como Deus vai julgar as pessoas por algo que não são culpadas" pode soar como uma concessão, mas, na verdade, expõe a incoerência de uma moral que reprime em público aquilo que consome em silêncio. A hipocrisia, afinal, não se sustenta apenas no campo psicológico ou religioso; ela se esfacela também diante da natureza biológica, onde a diversidade não é exceção, mas a própria regra da vida.

Por isso, não basta evocar a ciência como um golpe retórico; é preciso fazê-la falar com clareza e densidade. A biologia, longe de ser inimiga da fé ou da moral, demonstra que a vida nunca coube em molduras rígidas.

Observe, por exemplo, o desafio que a genética nos impõe: todos os pares de cromossomos são homossexuais, porém um só é hétero. Se o que eu digo não é verdade, "experimente dizer-me o que acontecerá quando o cromossomo 'Y' desaparecer completamente dos machos". Alguns dirão, com a arrogância de fanáticos da falsa ciência, que o “Y” nunca desaparecerá. Se a permanência é inquestionável, então que se expliquem a síndrome de Noonan e suas implicações.

A evolução não pede licença aos dogmas: 45 cromossomos são também um sinal do futuro dos mamíferos — e, talvez, um lembrete de que a rigidez dos preconceitos humanos é muito mais frágil do que o próprio corpo que os sustenta. A ciência, quando integrada à denúncia social, não fragmenta o discurso; ela o amplia, dando-lhe eco e solidez inquestionáveis.

https://www.youtube.com/watch?v=aN3R1LjWb5A&ab_channel=CanaldoSchwarza - Acessado em 27/09/2025

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Para aprofundarmos essa discussão, preparei 5 questões discursivas e simples. Lembrem-se: o objetivo não é ter uma resposta "certa", mas sim desenvolver a capacidade de análise crítica sobre as complexas dinâmicas sociais.

1. Hipocrisia e Tolerância Condicional

O texto afirma que a frase: "não tenho nada contra os gays, quem quiser ser que seja, mas não quero isso para mim e nem para os meus filhos" revela um tipo de "homofobia de baixa classe" ou "aceitação hipócrita".

Questão: Explique, com base na perspectiva sociológica (e nos conceitos de tolerância e preconceito), por que a aceitação condicional — "aceitar o outro, mas não querer para si ou para os seus" — é vista como uma forma de hipocrisia e não como uma tolerância genuína.

2. Eufemismo Social e Conveniência

O autor menciona que as pessoas, diante do "eufemismo social", agem por "conveniência", rendendo-se à moral vigente para não sofrerem o que infligiram aos outros.

Questão: Defina o que seria o "eufemismo social" no contexto do texto. Como a busca por "conveniência" e o medo do "julgamento" (ou da reação social) podem levar o indivíduo a adotar comportamentos e discursos contraditórios na sociedade?

3. Moral, Religião e Contradição Pessoal

O texto discute a ideia de que a repressão moral pode levar o indivíduo a viver uma "contradição, vivida na clandestinidade", citando o "castigo da libertinagem" imposto a si mesmo.

Questão: Analise como o controle social imposto por normas morais ou religiosas rígidas pode gerar uma incoerência entre o comportamento público (o que se prega) e o comportamento privado (o que se vive), segundo a ideia apresentada pelo autor.

4. O Papel da Biologia e da Ciência no Debate Social

O autor utiliza conceitos da biologia (cromossomos, Síndrome de Noonan) para argumentar que a "diversidade não é exceção, mas a própria regra da vida", desafiando a "rigidez dos preconceitos humanos".

Questão: De que forma a integração de argumentos científicos (como a diversidade biológica) ao debate sociológico sobre sexualidade e preconceito pode influenciar ou fortalecer a denúncia social contra a rigidez moral e os dogmas?

5. A Necessidade Sociológica de Posicionamento

O texto utiliza uma metáfora poderosa: "ninguém permanece em cima do muro por muito tempo" e a referência bíblica do "joio e trigo em molhos separados", para exigir um posicionamento claro.

Questão: Na sua opinião, por que, do ponto de vista sociológico, o autor considera insustentável a posição de "ficar em cima do muro" diante de questões de preconceito e moralidade? Qual a importância de um posicionamento definido para a evolução da sociedade e o combate às desigualdades?

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Perseguido pelo Mundo Cão ("Não sei de nada, mas sinto tudo." — Leila Jácomo)

 


Perseguido pelo Mundo Cão ("Não sei de nada, mas sinto tudo." — Leila Jácomo)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Fico assombrado quando passo nas ruas e os cachorros latem só para mim, correndo como se viessem me enfrentar. Essa pergunta insiste em minha mente: por que reagem a mim e não a outros? Em busca de explicação para esse fenômeno horripilante, percebi que, onde quer que eu esteja, a aproximação é inevitável. Não apenas cães, mas também um bêbado, um maltrapilho ou qualquer figura que julgo assustadora logo se dirige a mim na rua. Procurei relacionar essas atrações indeslindáveis e surgiu uma dúvida persistente: exalo medo pelo cheiro da pele ou são minhas expressões corporais – esses sintomas fóbicos – que os convocam?

O desconcerto aumenta ao entender que não são apenas os cães que me perseguem, mas também as circunstâncias, como se cada esquina conspirasse nesse jogo perverso. Não preciso perguntar em voz alta, pois já sinto dentro de mim a suspeita de que o medo se revela mais no olhar do que no gesto, e isso basta para denunciar minha vulnerabilidade. Não é só um pressentimento, é quase uma sentença: há algo em mim que provoca reação, algo que me escapa. Esse desconforto me acompanha mesmo quando não há ninguém por perto, forçando-me a aceitar que minha presença pode ser um chamado involuntário aos fantasmas alheios.

Penso então nos fluidos invisíveis, correndo como rios subterrâneos entre eu e o mundo. Talvez sejam eles que se infiltram nas frestas do ar e anunciam o que ainda não aconteceu – um cheiro, um sopro, um tremor; não sei. Sinto, porém, que esse fluxo me denuncia antes da palavra. É possível que cães e homens pressintam nesses fluidos não só a morte, mas também a vida que resiste – um coração batendo sob o medo. Se assim for, não sou apenas vítima dessa corrente oculta, mas sua testemunha. E talvez aprender a ouvir meus próprios fluidos seja o primeiro passo para que deixem de gritar por mim.

Se o "agorafóbico" e inseguro sou eu, então eles correm para aquilo que os acalma; cabe-me, por sua vez, reagir ao meu desconforto e procurar distância. Latem para se protegerem de mim ou me cumprimentam, num disfarce de coragem, ao enfrentar o próprio fantasma? Não sei. Sei apenas que talvez tenham sentidos tão apurados que percebem, através de meus — digamos — poderes áureos e sensitivos, o que penso deles. Ou então esses mesmos fluidos correm por nós, anunciando a morte iminente de dentro para fora das entranhas. Tenho medo deles; por isso, morrem de medo de mim. Deve ser isso!

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O texto que acabamos de ler é um convite fascinante para explorar a complexidade da percepção humana e da interação social. Leva-nos a uma jornada introspectiva sobre o medo e como ele molda nossa relação com o mundo e com os outros. Vamos usá-lo como base para refletirmos sobre alguns conceitos sociológicos importantes. Preparei 5 questões que nos ajudarão a aprofundar nossa análise.

1. A Construção Social do Medo: O autor se questiona se exala medo ou se suas expressões corporais e "sintomas fóbicos" convocam reações. Discuta como o medo pode ser uma construção social e como a forma como nos percebemos (nossa autoimagem e inseguranças) pode influenciar a maneira como somos percebidos e interagimos com o ambiente social.

2. Interação Simbólica e Projeção: O texto descreve como bêbados, maltrapilhos e "figuras assustadoras" se aproximam do eu-lírico, que se sente "convocado" por eles. Analise esse fenômeno sob a perspectiva da interação simbólica, explicando como a interpretação dos "sintomas fóbicos" do eu-lírico pode levar a projeções e expectativas de comportamento por parte dos outros, criando uma dinâmica de atração ou repulsa.

3. O Corpo como Campo de Significado Social: O autor reflete sobre se o medo é exalado "pelo cheiro da pele" ou pelas "expressões corporais". De que forma a Sociologia do Corpo entende que o corpo humano não é apenas biológico, mas também um campo de significados sociais que comunica e interage com o ambiente, mesmo de forma não verbal ou inconsciente?

4. Isolamento e Anomia Social: O "desconforto" do eu-lírico o acompanha mesmo "quando não há ninguém por perto" e o força a aceitar que sua presença pode ser um "chamado involuntário aos fantasmas alheios", levando-o a procurar distanciamento. Como essa busca por distanciamento pode se relacionar com o conceito de anomia social ou com sentimentos de isolamento e estranhamento em relação às normas de interação social?

5. A Fronteira entre o Humano e o Animal: O texto explora a percepção dos cães e dos "fluidos invisíveis" que nos conectam. Discuta como a interação do autor com os cães, e sua busca por um sentido mais profundo nessa conexão, reflete a fronteira porosa entre o humano e o animal na nossa sociedade. Como essa relação é permeada por projeções, simbolismos e uma tentativa de compreender o "outro" (seja ele humano ou animal)?

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