“Enraizado no Magistério: A Tocha que Não se Apaga” ("Pássaro pousado no espantalho(,) aposentado." — Millôr Fernandes)
Na minha essência, enraizado está o dom de lecionar; sou professor por predestinação. Esse é meu trabalho, garantido por concurso na escola pública. O que sei? Sei ensinar o que aprendi em minha trajetória. No entanto, sempre que me encontram, os colegas perguntam quando vou me aposentar, como se já estivessem cansados de mim. Meus cabelos brancos, ao invés de legitimarem minha experiência, parecem desaboná-la. Deduzem que a aposentadoria é o destino inevitável de todos.
No entanto, se me aposentar, o que serei eu? “Isso eles não se perguntam”, porque não são verdadeiros amigos. Querem que eu seja apenas mais um aposentado sustentado pelo governo. Agora lhes pergunto: “quem quer a amizade de um velho aposentado?” Poucos se dispõem a enxergar além da invisibilidade que nos cerca. Por isso, vou adiar esse momento o máximo que puder.
Talvez eu seja, para muitos, apenas um quadro antigo pendurado num corredor cinzento; ainda assim sigo ali, não por vaidade, mas por convicção. Permanecer é um ato de fé no próprio ofício, um modo de provar que a vida não se encerra quando os outros decretam. Mesmo cansado, encontro nas minhas aulas e nos olhares atentos dos que ainda me escutam um sentido maior do que a espera pela aposentadoria. Não quero ser lembrado como um sobrevivente ressentido, mas como alguém que transformou a amargura em testemunho e a invisibilidade em resistência silenciosa. Partirei, sim, um dia — mas não como quem foge, e sim como quem entrega a tocha, confiante de que algo do que semeei ainda florescerá.
Enfim, quando a escola me deixar, eu também me deixarei: “terei uma nova identidade, aposentado do sistema educacional”. Apesar de, pela ineficiência do sistema, já me sentir ser somente isso, resta-me cansar-me deles também. “Mudar-me-ei para o paraíso de poucos” — mas não um paraíso cínico, e sim um lugar onde minha experiência não seja tratada como peso morto, mas como herança viva.
No meu otimismo moderado, “entendo ser o velho um jovem que deu certo”. Espero poder aproveitar muito bem o pouco tempo que me resta, mesmo que seja cercado apenas por lembranças, leituras e conversas sinceras. Quem sabe, assim, “terei um bom preparo para morrer não apenas feliz, mas inteiro – tendo resistido até o último capítulo”. (CiFA
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Esse texto é um relato poderoso e profundo sobre a experiência de ser professor na reta final da carreira. Ele nos permite analisar questões sociais e psicológicas importantes: a identidade no trabalho, a valorização da experiência, a invisibilidade do idoso e a relação com o sistema educacional. Como seu professor de Sociologia, quero que usemos essas ideias para aprimorar nosso olhar crítico. Preparo, então, 5 questões discursivas simples para nosso debate. Lembrem-se de focar nas relações sociais, nas estruturas de poder e na construção da identidade dentro da sociedade.
1. Identidade Social e Trabalho
O autor afirma que a essência de sua identidade está "enraizada" no ofício de professor. A aposentadoria, para ele, representa uma crise: "se me aposentar, o que serei eu?"
Questão: Explique a importância do trabalho na construção da identidade social de um indivíduo. Por que, sociologicamente, a perda do status profissional (como a aposentadoria) pode gerar um vazio ou uma crise de identidade, como sugere o texto?
2. Desvalorização da Experiência e Idadismo
O professor relata que seus "cabelos brancos, ao invés de legitimarem minha experiência, parecem desaboná-la", e que os colegas o veem como alguém que deveria se aposentar logo.
Questão: Analise como a situação descrita reflete o fenômeno social do idadismo (ou preconceito etário) no ambiente de trabalho. De que maneira a sociedade capitalista moderna tende a desvalorizar a experiência acumulada em favor da juventude e da velocidade?
3. O Professor como "Quadro Antigo"
O autor se compara à imagem de "apenas um quadro antigo pendurado num corredor cinzento".
Questão: Qual o significado sociológico dessa metáfora da invisibilidade no contexto da escola pública? Discuta como a rotina e a burocracia do "sistema educacional" podem transformar o educador em uma figura impessoal e marginalizada, apesar de sua convicção e resistência.
4. Aposentadoria como Exclusão Social
O texto critica a visão de que os colegas querem que ele seja "apenas mais um aposentado sustentado pelo governo", e lamenta que "poucos se dispõem a enxergar além da invisibilidade que nos cerca".
Questão: Com base na leitura do texto, comente como a aposentadoria, embora seja um direito, pode ser percebida pelo trabalhador como um ato de exclusão social ou de separação, onde ele perde sua função e sua relevância nas relações interpessoais.
5. Resistência Silenciosa e Legado
Apesar do cansaço, o professor afirma que sua permanência é um "ato de fé no próprio ofício" e um modo de deixar um "testemunho" e uma "herança viva" para os alunos.
Questão: De que forma a atitude de "resistência silenciosa" do professor, ao se recusar a sair de cena prematuramente, pode ser interpretada como uma crítica à eficiência do sistema e uma afirmação do valor humano e pedagógico no ambiente de trabalho?
Na minha essência, enraizado está o dom de lecionar; sou professor por predestinação. Esse é meu trabalho, garantido por concurso na escola pública. O que sei? Sei ensinar o que aprendi em minha trajetória. No entanto, sempre que me encontram, os colegas perguntam quando vou me aposentar, como se já estivessem cansados de mim. Meus cabelos brancos, ao invés de legitimarem minha experiência, parecem desaboná-la. Deduzem que a aposentadoria é o destino inevitável de todos.
No entanto, se me aposentar, o que serei eu? “Isso eles não se perguntam”, porque não são verdadeiros amigos. Querem que eu seja apenas mais um aposentado sustentado pelo governo. Agora lhes pergunto: “quem quer a amizade de um velho aposentado?” Poucos se dispõem a enxergar além da invisibilidade que nos cerca. Por isso, vou adiar esse momento o máximo que puder.
Talvez eu seja, para muitos, apenas um quadro antigo pendurado num corredor cinzento; ainda assim sigo ali, não por vaidade, mas por convicção. Permanecer é um ato de fé no próprio ofício, um modo de provar que a vida não se encerra quando os outros decretam. Mesmo cansado, encontro nas minhas aulas e nos olhares atentos dos que ainda me escutam um sentido maior do que a espera pela aposentadoria. Não quero ser lembrado como um sobrevivente ressentido, mas como alguém que transformou a amargura em testemunho e a invisibilidade em resistência silenciosa. Partirei, sim, um dia — mas não como quem foge, e sim como quem entrega a tocha, confiante de que algo do que semeei ainda florescerá.
Enfim, quando a escola me deixar, eu também me deixarei: “terei uma nova identidade, aposentado do sistema educacional”. Apesar de, pela ineficiência do sistema, já me sentir ser somente isso, resta-me cansar-me deles também. “Mudar-me-ei para o paraíso de poucos” — mas não um paraíso cínico, e sim um lugar onde minha experiência não seja tratada como peso morto, mas como herança viva.
No meu otimismo moderado, “entendo ser o velho um jovem que deu certo”. Espero poder aproveitar muito bem o pouco tempo que me resta, mesmo que seja cercado apenas por lembranças, leituras e conversas sinceras. Quem sabe, assim, “terei um bom preparo para morrer não apenas feliz, mas inteiro – tendo resistido até o último capítulo”. (CiFA
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Esse texto é um relato poderoso e profundo sobre a experiência de ser professor na reta final da carreira. Ele nos permite analisar questões sociais e psicológicas importantes: a identidade no trabalho, a valorização da experiência, a invisibilidade do idoso e a relação com o sistema educacional. Como seu professor de Sociologia, quero que usemos essas ideias para aprimorar nosso olhar crítico. Preparo, então, 5 questões discursivas simples para nosso debate. Lembrem-se de focar nas relações sociais, nas estruturas de poder e na construção da identidade dentro da sociedade.
1. Identidade Social e Trabalho
O autor afirma que a essência de sua identidade está "enraizada" no ofício de professor. A aposentadoria, para ele, representa uma crise: "se me aposentar, o que serei eu?"
Questão: Explique a importância do trabalho na construção da identidade social de um indivíduo. Por que, sociologicamente, a perda do status profissional (como a aposentadoria) pode gerar um vazio ou uma crise de identidade, como sugere o texto?
2. Desvalorização da Experiência e Idadismo
O professor relata que seus "cabelos brancos, ao invés de legitimarem minha experiência, parecem desaboná-la", e que os colegas o veem como alguém que deveria se aposentar logo.
Questão: Analise como a situação descrita reflete o fenômeno social do idadismo (ou preconceito etário) no ambiente de trabalho. De que maneira a sociedade capitalista moderna tende a desvalorizar a experiência acumulada em favor da juventude e da velocidade?
3. O Professor como "Quadro Antigo"
O autor se compara à imagem de "apenas um quadro antigo pendurado num corredor cinzento".
Questão: Qual o significado sociológico dessa metáfora da invisibilidade no contexto da escola pública? Discuta como a rotina e a burocracia do "sistema educacional" podem transformar o educador em uma figura impessoal e marginalizada, apesar de sua convicção e resistência.
4. Aposentadoria como Exclusão Social
O texto critica a visão de que os colegas querem que ele seja "apenas mais um aposentado sustentado pelo governo", e lamenta que "poucos se dispõem a enxergar além da invisibilidade que nos cerca".
Questão: Com base na leitura do texto, comente como a aposentadoria, embora seja um direito, pode ser percebida pelo trabalhador como um ato de exclusão social ou de separação, onde ele perde sua função e sua relevância nas relações interpessoais.
5. Resistência Silenciosa e Legado
Apesar do cansaço, o professor afirma que sua permanência é um "ato de fé no próprio ofício" e um modo de deixar um "testemunho" e uma "herança viva" para os alunos.
Questão: De que forma a atitude de "resistência silenciosa" do professor, ao se recusar a sair de cena prematuramente, pode ser interpretada como uma crítica à eficiência do sistema e uma afirmação do valor humano e pedagógico no ambiente de trabalho?


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