"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

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MINHAS PÉROLAS

sexta-feira, 2 de maio de 2025

Meias Coloridas Não Salvam a Educação ("Amar não basta." — Ideia inspirada em Paulo Freire)

 



Meias Coloridas Não Salvam a Educação ("Amar não basta." — Ideia inspirada em Paulo Freire)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Foi numa terça-feira cinzenta que coloquei, pela primeira vez, minhas meias coloridas para dar aula. Roxo e verde-limão — uma combinação que arrancou sorrisos imediatos dos meus alunos do 7º ano quando me sentei na mesa e deixei que aparecessem sob a barra da calça. A ideia veio de um daqueles workshops motivacionais que a Secretaria de Educação nos obrigava a frequentar mensalmente: “Traga alegria para sua sala de aula”, dizia a palestrante de voz estridente, “e a aprendizagem virá como consequência”.

O experimento funcionou por algumas semanas. As crianças passaram a tentar adivinhar quais meias eu usaria no dia seguinte, e alguns começaram a trazer suas próprias versões coloridas. Criamos até um pequeno ritual antes das provas: “Mostre suas meias, professor, para dar sorte.” E eu mostrava, claro, enquanto distribuía as folhas de questões sobre leitura e interpretação textual que muitos ainda não compreendiam.

Não me entendam mal. Não nego o valor de um olhar acolhedor, de um sorriso que encoraja, da mão estendida que ampara no ambiente escolar. O afeto é fundamental. Mas focar a narrativa apenas nessas experiências sensíveis parece perigosamente obscurecer os verdadeiros entraves da nossa educação – aqueles muros altos e pesados, de natureza estrutural, socioeconômica e institucional, que insistem em limitar o voo de tantos alunos e professores.

O problema é que as meias não resolviam dúvidas gramaticais, nem supriam a falta de carteiras. Não silenciavam o barulho ensurdecedor do ventilador quebrado ou do aparador de grama, que parecia funcionar apenas durante as aulas. Tampouco enchiam a barriga dos cinco alunos que eu sabia que vinham sem café da manhã. A dura realidade é que, quando romantizamos excessivamente o afeto e a ação individual — a criatividade isolada do professor, a meia colorida usada para chamar atenção, o nariz de palhaço que arranca um riso — corremos o sério risco de transformar a exceção em regra.

É o que ocorre, por exemplo, nas reuniões de conselho de classe. Diante das várias reprovações em português e matemática, a coordenadora pedagógica perguntou, com genuína curiosidade: “Mas você não estava usando aquela técnica da afetividade: trajando-se de palhaço que deu tão certo?”

Respirei fundo antes de responder. Queria dizer que meias não são técnica pedagógica. Que meus alunos precisavam de material didático adequado, de recuperação paralela, de professores menos sobrecarregados. Vejo nessa ênfase exagerada no afeto como “solução mágica” um perigo real: o de desresponsabilizar quem detém o poder de promover mudanças — o Estado. É como se disséssemos: “Ah, o importante é o professor amar, ter afeto, o resto se resolve.” E, com isso, esvaziamos o papel fundamental do currículo e reduzimos a atuação docente a um mero exercício emocional.

Em vez de expressar essas reflexões, apenas assenti com a cabeça e prometi tentar “mais estratégias lúdicas” no próximo período. A romantização do cotidiano escolar gera um peso injusto nos ombros do professor. Quando a narrativa oficial insiste que “basta amar” para ensinar, o docente que se dedica, mas enfrenta salas superlotadas e falta de recursos básicos, sente-se culpado por um fracasso que não é seu.

Voltei para casa pensando na Maria, que desenha como ninguém, mas não consegue interpretar um enunciado de matemática porque nunca desenvolveu habilidades básicas de leitura. No João, que falta às aulas para cuidar dos irmãos enquanto a mãe trabalha em dois empregos. E na estrutura escolar que desaba um pouco mais a cada chuva forte — no sentido literal e figurado.

A aprendizagem que realmente transforma exige mais do que vínculo e calor: exige método, conteúdo sólido, criticidade para ler o mundo. Lembrei do Paulo Freire que li na faculdade e que agora, após quinze anos em sala de aula, compreendo com clareza dolorosa: “Amar não basta.” É preciso mais que meias engraçadas ou um nariz de palhaço para construir a educação transformadora que sonhamos.

Não se trata, jamais, de negar o valor do amor e da empatia na relação pedagógica; trata-se de reconhecer seus limites diante de um sistema adoecido. Ensinar exige respeito aos saberes do aluno, sim, mas esse respeito inclui, fundamentalmente, oferecer a ele o acesso ao melhor da ciência, da técnica e da pedagogia disponíveis — e não apenas o calor humano, por mais vital que ele seja.

Amanhã usarei meias pretas comuns. Não porque desisti do afeto — jamais desistirei dele —, mas porque compreendi que meu amor por esses estudantes precisa se manifestar também na minha indignação, na minha exigência por melhores condições, no meu compromisso com um ensino rigoroso e libertador.

Ao final dessa reflexão, chego à mesma conclusão, dura e necessária: educar é, em sua essência mais profunda, um gesto político. Uma ação que se dá no campo das relações humanas, sim, e onde o afeto tem seu lugar, sem dúvida. Amar, sim — um amor que se traduz em cuidado, respeito e dedicação. Mas esse amor precisa vir acompanhado de estrutura, de reflexão crítica sobre a prática e, acima de tudo, de um compromisso coletivo — da sociedade, do Estado, de todos nós.

O afeto na educação não pode ser a cortina colorida que esconde as rachaduras na parede. Deve ser, antes, a força que nos move a derrubar paredes e construir novos espaços — espaços onde nossas crianças tenham o direito não apenas ao sorriso de um professor bem-intencionado, mas a todo o conhecimento e estrutura que merecem.

As meias coloridas continuam na minha gaveta. Talvez eu volte a usá-las algum dia. Mas agora sei que, se o fizer, será apenas como complemento — nunca como substituto — de uma educação verdadeiramente libertadora. Que não nos contentemos com meias coloridas e narizes de palhaço como única resposta. A estrutura da casa precisa de alicerces sólidos, não apenas de cortinas bonitas na janela.


Como seu professor de Sociologia, minha crônica é um material riquíssimo para pensarmos as complexas relações entre o individual, o institucional e o estrutural na educação. Minha experiência com as meias coloridas nos leva a questionar visões simplistas e a olhar para as raízes sociais dos desafios educacionais. Com base nessas ideias, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto aponta que o afeto e a ação individual do professor (como usar meias coloridas) não resolvem problemas como falta de material, salas superlotadas e alunos com fome. Como a Sociologia explica que os problemas da educação estão frequentemente ligados a questões estruturais e socioeconômicas mais amplas, e não apenas à dedicação individual de professores?

2. A crônica critica a "romantização do afeto" por achar que ela "desresponsabiliza" o Estado e ignora a necessidade de "estrutura" e "compromisso coletivo". De que forma a Sociologia analisa a distribuição de responsabilidades pela educação na sociedade e por que é importante olhar para as políticas públicas e o investimento no sistema educacional como um todo?

3. O narrador conclui que "educar é, em sua essência mais profunda, um gesto político". O que significa essa afirmação para a Sociologia? Como a educação pode ser vista como um campo de disputa e de busca por transformações sociais, e não apenas um processo neutro de transmissão de conhecimento?

4. O texto menciona que a ênfase excessiva no afeto pode gerar "culpa" nos professores diante de problemas que não conseguem resolver sozinhos. Como a Sociologia estuda as pressões e os dilemas éticos e emocionais enfrentados por profissionais (como os professores) que atuam em instituições com recursos limitados e desafios sociais complexos?

5. A crônica defende que a aprendizagem de verdade exige "método, conteúdo sólido, criticidade", além de "vínculo e calor". Como a Sociologia da Educação compreende os diferentes elementos necessários para uma educação de qualidade, e por que é importante considerar tanto os aspectos relacionais quanto os curriculares e estruturais?

quinta-feira, 1 de maio de 2025

A Caneta e a Consciência: Diário de um Professor "Insilenciado" ("Resista muito e obedeça pouco." — Rui Barbosa)

 

A Caneta e a Consciência: Diário de um Professor "Insilenciado" ("Resista muito e obedeça pouco." — Rui Barbosa)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Era início de dezembro quando me vi, mais uma vez, diante do diário eletrônico — aquele retrato digital do ano letivo, onde cada nome listado carregava um silêncio profundo. Em muitas linhas, a ausência era completa: de corpo, de alma, de vontade. Eram nomes que atravessaram os meses como sombras, sem deixar marcas de participação, aprendizado ou esforço. Mas não demorou para que, como em todos os anos, surgisse a visita que transforma o diário em campo de tensão.

A diretora entrou na sala. Com sua fala polida e estratégica, comunicou, sem rodeios, que “não podíamos reprovar tantos alunos”. Havia metas a cumprir, índices a preservar, relatórios a compor. “Você vai mudar essas notas, é pelo bem da escola”, disse, com uma naturalidade cortante. O verbo *vai* ecoou como uma ordem indevida — um peso sobre minha consciência.

Naquele instante, minha mente revisitou cada falta, cada trabalho não entregue, cada silêncio em sala de aula. O que me pediam não era um mero ajuste numérico — era um gesto de conivência. Era apagar a verdade com um clique, rasurar a realidade em nome de uma política de resultados imediatos.

A sala dos professores, então, tornou-se uma trincheira muda. Olhares evitavam o confronto. Uns, resignados, justificavam: “é melhor passar do que ter esse aluno de novo”. Outros alegavam não querer problemas. Mas, ali, diante do impasse, compreendi: aprovar sem mérito não é um ato de compaixão — é uma violência contra a educação.

Lembrei-me de Cláudia, uma colega de literatura que há décadas sustenta seus princípios com serenidade. Um dia, diante do mesmo dilema, ela me disse: “Notas não são apenas números. São diagnósticos. E mais: são declarações de princípios. Ao assinar o diário, você declara se aquele aluno aprendeu — ou se você se rendeu.” Suas palavras voltaram como âncora em meio à tempestade.

Naquela noite, em casa, repassei mentalmente não apenas as vivências do ano, mas também a legislação. Recordei que o professor é o único responsável pela atribuição das notas. Que qualquer alteração sem seu consentimento configura falsificação. Não era apenas uma questão ética — era também legal. E, acima de tudo, era moral.

No dia seguinte, entrei na sala da diretora com o diário nas mãos e a convicção no olhar. “As notas estão lançadas conforme a aprendizagem demonstrada”, declarei. “Não posso alterá-las para maquiar índices. Se queremos melhorar resultados, precisamos melhorar o ensino — não fraudar os registros.” Educa-se mais, sim, reprovando os incompetentes — no sentido de reconhecer que a educação é, antes de tudo, compromisso com a verdade e com o esforço legítimo. Aprovar sem mérito é desmoralizar o mérito; é fingir que a ponte foi atravessada por quem sequer saiu da margem. A frase de Chamfort é preciosa: prestígio sem mérito gera aparência sem substância, bajulação sem respeito. Quando a escola aprova sem critério, não forma cidadãos — apenas aduladores do sistema. É na reprovação pedagógica, feita com critério e ética, que o aluno é confrontado com a realidade: não se avança sem preparo. A meritocracia, nesse caso, não é um privilégio, mas uma forma de justiça.

Ela tentou argumentar. Citou a secretaria de educação, os impactos institucionais. Mas não me demovi. Porque sei que promover automaticamente quem não aprendeu é apenas transferir o fracasso para o próximo ano, para outro professor, para uma escola que herdará o aluno ainda mais desestimulado e sem base. É iludir o próprio aluno, impedindo-o de reconhecer seus limites e potencialidades.

Sim, há alunos que se esforçaram apesar de todas as adversidades — familiares, emocionais, econômicas. A esses, devemos respeito. Mas, ao aprovar indiscriminadamente, sem critério, apagamos também a luta deles. Nivelamos por baixo e corroemos o valor da conquista.

Ser professor é, muitas vezes, caminhar na contramão das conveniências institucionais. É dizer “não” quando o sistema clama por obediência cega. É sustentar a verdade do processo educativo, mesmo quando isso implica incompreensão, isolamento ou retaliação. A caneta que carrego não é leve, mas traz consigo o peso da responsabilidade e da esperança.

Deixei a sala da diretora com o coração ainda agitado, mas com a consciência limpa. Reprovar não é castigar. É reconhecer que aprender exige esforço. É oferecer ao aluno a chance de reconstruir, refazer, recomeçar — e não ser empurrado adiante como um número que serve a um gráfico, mas não à vida.

A escola adoece, sim, mas não será com minha conivência. O verdadeiro sucesso educacional não se mede por planilhas ou relatórios. Ele se revela no brilho dos olhos de quem supera dificuldades, na coragem de quem sustenta a integridade mesmo sob pressão, na aprendizagem sólida que, mesmo silenciosa, ecoa no futuro.

Que sejamos lembrados, nós, professores, não pelos diplomas que assinamos, mas pelas verdades que ousamos sustentar. A nota que não se dobra é também a consciência que não se vende.


Como seu professor de Sociologia, ao reler minha crônica, fui levado a pensar sobre as complexas dinâmicas sociais que atravessam o ambiente escolar, especialmente as tensões entre normas institucionais, métricas de desempenho e o trabalho pedagógico real. Com base nessas reflexões, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto descreve a pressão da direção da escola para que o professor altere as notas, visando melhorar os índices de avaliação externa (IDEB). Como a Sociologia analisa a influência de avaliações externas e metas de desempenho na gestão das escolas e nas práticas pedagógicas dos professores?

2. O narrador se posiciona como o responsável pela "verdade do processo educativo" ao atribuir as notas. De que forma a Sociologia entende o papel do professor como um agente de avaliação dentro do sistema escolar, e quais são os desafios éticos e profissionais que podem surgir nesse papel?

3. A crônica critica a "promoção automática" por considerar que ela "ilude o próprio aluno" e "transfere o fracasso". Quais as possíveis consequências sociais, a curto e longo prazo, de políticas educacionais que priorizam a aprovação sobre a aprendizagem efetiva, tanto para os estudantes quanto para o sistema educacional?

4. O texto mostra a tensão entre a conveniência institucional (melhorar índices) e a integridade profissional do professor. Como a Sociologia investiga os dilemas éticos enfrentados por profissionais em diferentes áreas e os fatores sociais que podem levar à pressão por comportamentos que contrariam a ética?

5. O professor decide "resistir" à pressão da diretora, defendendo sua autonomia e o valor da aprendizagem real. De que maneira a Sociologia estuda os atos de resistência individual ou coletiva dentro de instituições e por que, em alguns casos, indivíduos optam por defender seus princípios mesmo diante de possíveis retaliações?

quarta-feira, 30 de abril de 2025

O Direito de Aprender ("A inclusão acontece quando se aprende com as diferenças, não apesar delas." — Mel Ainscow)

 

O Direito de Aprender ("A inclusão acontece quando se aprende com as diferenças, não apesar delas." — Mel Ainscow)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Li a notícia como quem tropeça numa pedra invisível no meio do caminho. Daquelas que nos fazem parar, olhar ao redor e questionar em que mundo, afinal, estamos vivendo. Dois irmãos — crianças, neurodivergentes — tiveram a matrícula recusada por uma escola particular. E não foi por falta de vaga, mas por excesso de preconceito disfarçado de protocolo.

A sentença foi clara. O juiz, com o peso sereno das palavras bem ditas, afirmou que havia discriminação. Determinou a matrícula imediata e fixou indenização por danos morais. A escola, previsivelmente, tentou se justificar: excesso de alunos com necessidades especiais, reorganização interna, orientações da Secretaria de Educação. Mas as provas contavam outra história — em outras turmas, aceitavam-se mais de três alunos com diagnósticos semelhantes. A norma não era o problema. O problema era quem se escondia por trás dela.

Enquanto lia, tentei imaginar a cena: a mãe, com esperança nos olhos, liga para a escola, pergunta sobre a matrícula, fala dos filhos, menciona os laudos. Do outro lado da linha, a resposta — educada, mas atravessada por camadas de indiferença — nega o que deveria ser um direito. Depois disso, silêncio. Descaso. Portas que nunca se abrem.

Na sequência, deparei-me com outro caso. Um menino de nove anos, com autismo nível 2 e não verbal, foi vítima de maus-tratos numa escola pública. A mãe só descobriu o que acontecia quando outra criança, da mesma turma, gravou — escondido na mochila — os gritos e xingamentos das professoras. Era violência pura, vestida de rotina. O tipo de coisa que não aparece no boletim, mas que destrói por dentro.

Não conheço essas mães. Tampouco os filhos. Mas conheço bem esse sentimento de impotência que nos atravessa quando uma instituição que deveria acolher decide excluir. E reconheço com clareza quando um discurso institucional serve apenas de cortina de fumaça para a intolerância.

Enquanto isso, muitos fingem normalidade. Afinal, dizem, as crianças “especiais” já exigem demais, já têm “suas escolas”, “seus profissionais”. Como se inclusão fosse uma concessão — e não um direito. Como se viver fosse um privilégio que precisasse de autorização.

A verdade é que, para muitas famílias, a porta da escola é o primeiro muro. E não há trava mais cruel do que aquela que se instala nas mentes — e se repete nos corredores, nas salas de reunião, nos quadros de aviso.

Não sei quanto tempo ainda levaremos para entender, de verdade, o que significa uma escola para todos. Mas sei que, enquanto houver juízes dispostos a chamar as coisas pelo nome — e cidadãos atentos o bastante para não se calarem — talvez ainda possamos transformar essas manchetes em passado.

Por ora, fecho o jornal e respiro fundo. A crônica da exclusão, infelizmente, ainda é escrita todos os dias. Mas hoje — pelo menos hoje — o ponto final veio acompanhado de justiça.


https://www.migalhas.com.br/quentes/420813/tj-df-condena-df-por-maus-tratos-contra-crianca-autista-em-escola (Acessado em 30/04/2025)


Relendo minha crônica com a sensibilidade de um professor de Sociologia, percebo como ela expõe feridas sociais profundas sobre a inclusão e o respeito nas instituições. Com base nas ideias apresentadas, formulei 5 questões discursivas simples para estimular a reflexão sociológica sobre esses temas:


1. O texto descreve a recusa de matrícula de crianças neurodivergentes, apontando para um "preconceito disfarçado de protocolo". Como a Sociologia analisa de que forma normas ou práticas dentro de instituições (como escolas) podem, intencionalmente ou não, gerar exclusão e discriminação contra certos grupos de pessoas?

2. A crônica contrasta a ideia de uma "escola para todos" com a realidade de portas fechadas ou de maus-tratos a alunos com necessidades especiais. O que significa, sob uma perspectiva sociológica, o direito à educação inclusiva, e quais barreiras sociais, além das legais, dificultam sua plena realização?

3. O narrador menciona a vulnerabilidade das crianças e a falha de algumas instituições em acolher. Como a Sociologia estuda as dinâmicas de poder em ambientes como a escola e como essas dinâmicas podem afetar a experiência de alunos considerados mais vulneráveis, como aqueles com deficiência?

4. A crônica aponta para discursos que parecem justificar a exclusão de crianças "especiais". De que maneira os preconceitos e estereótipos presentes na sociedade influenciam as atitudes das pessoas e das instituições em relação à deficiência, contribuindo para a discriminação?

5. O texto mostra a justiça sendo acionada para garantir direitos e reparar danos. Qual o papel do sistema legal e das decisões judiciais, na visão da Sociologia, na luta contra a discriminação e na busca por maior justiça e igualdade social para grupos que enfrentam preconceito?

terça-feira, 29 de abril de 2025

O Dia Mundial da Educação ("A influência de um professor é para a eternidade; ele nunca pode dizer onde sua influência para." — Henry Adams)

O Dia Mundial da Educação ("A influência de um professor é para a eternidade; ele nunca pode dizer onde sua influência para." — Henry Adams)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Abril chegou ao fim, e com ele se fez presente mais um 28 no calendário: o Dia Mundial da Educação. Para muitos, talvez apenas uma data simbólica; para mim, ressoa com a força de um chamado antigo, vindo do tempo em que o mundo cabia inteiro no pequeno universo de uma casa e na sabedoria contida em pilhas de cadernos. É um dia que me convida a desacelerar e observar com mais atenção os frutos que a educação silenciosamente cultiva ao longo dos anos.

Foi assim que me vi pensando nele — o filho da professora. Não era um menino extraordinário aos olhos apressados do mundo, mas havia nele uma calma determinada, como se carregasse um legado invisível. Sua história com a educação não começou nos bancos escolares, mas em casa, onde a mãe, professora da rede pública, trazia no corpo o cansaço dos dias e, na alma, o perfume do giz. Ela chegava envolta naquele cheiro inconfundível — uma mistura de papel, lápis e o sentido de que, entre aquelas paredes escolares, algo essencial acontecia.

Eu o vi crescer sob a luz das madrugadas, enquanto a mãe corrigia provas, preparava aulas, e, sem palavras, ensinava a lição mais profunda: a da dedicação. Ele brincava de escola com bonecos alinhados em fila, segurando uma régua, imitando os gestos maternos. Naquele chão simples da infância, vi germinar a semente de um respeito sincero por tudo aquilo que a educação representa. Era a mãe quem repetia, com a firmeza serena das mulheres que educam pelo exemplo: "O conhecimento é o único patrimônio que ninguém pode tirar de você."

Essa herança silenciosa moldou o rumo de sua vida. Lembro-me de quando, já adulto, ele falava sobre o momento em que compreendeu seu propósito. Não buscou cargos de prestígio, nem palcos de notoriedade. Em vez disso, encontrou sua missão ao lado de professores, dentro de salas de aula, em bibliotecas improvisadas, em rodas de leitura no chão da escola. Percorre caminhos, conversa com educadores, escuta os estudantes. Tornou-se formador, multiplicador de ideias, alguém que não deseja fama, mas transformação.

Hoje, quando o vejo em ação, percebo que seu trabalho é um eco daquela infância. Seu foco está em diminuir a distância entre o saber e aqueles que o desejam. Promove oficinas de leitura, desenvolve metodologias, procura despertar nas crianças o mesmo fascínio que um dia o guiou. Em cada rosto infantil que ele observa, há um reflexo da própria jornada — olhos famintos por sentido, curiosos diante do mundo. O ciclo virtuoso que começou com sua mãe se perpetua nele, e, de alguma forma, alcança também quem o acompanha de perto.

Neste 28 de abril, enquanto tantos lembram da data como uma formalidade, ele a vive como um compromisso. O Dia Mundial da Educação, instituído em um fórum com a meta de universalizar o ensino de qualidade, é para ele um chamado diário à ação. Ele sabe que as maiores transformações não vêm, necessariamente, dos altos cargos ou dos títulos sonoros, mas de quem insiste em fazer a diferença onde está. A educação que o moldou, que lhe abriu os olhos e o coração, não pode ser um privilégio de poucos; deve ser um direito inegociável de todos.

É por isso que, enquanto houver nele o sopro da vida e a paixão por essa causa, ele continuará. Em Goiás, ou onde for preciso, lutará para que cada criança tenha a chance de descobrir o poder libertador do saber. Porque a educação, quando toca fundo, faz mais do que mudar destinos — "ela molda almas." E almas moldadas pela luz do saber, ao se iluminarem, inevitavelmente iluminam o caminho dos outros, criando uma corrente de esperança que não se interrompe.

Ao final deste dia, ao observá-lo em silêncio, levo comigo uma certeza renovada: na educação, meus caros leitores, repousa nossa mais profunda esperança de um futuro melhor. Não como uma promessa distante, mas como um compromisso diário, tecido com humildade e coragem. Que a história desse filho de professora, que encontrou na educação não apenas seu caminho, mas seu maior patrimônio, nos sirva de lembrete: investir em educação é plantar, hoje, a semente do amanhã que todos desejamos colher. Um futuro onde o conhecimento seja sempre a chave que abre todas as portas.



Como seu professor de Sociologia, preparei 5 questões discursivas e simples, baseadas nas ideias principais da crônica sobre a educação e o "filho da professora". Elas buscam explorar os aspectos sociais que a história apresenta.


1. O texto enfatiza a influência da mãe professora na infância do filho, mostrando como ele aprendeu o valor do conhecimento em casa. Sob a ótica da Sociologia, qual a importância da família como agente de socialização primária na transmissão de valores e saberes, especialmente em relação à educação formal e informal?

2. A crônica sugere que a educação "moldou o rumo de sua vida" e o levou a encontrar um propósito como formador. Como a Sociologia analisa o papel da educação como um fator de mobilidade social e de construção da identidade e do projeto de vida dos indivíduos?

3. O texto valoriza o trabalho da mãe professora e, posteriormente, do filho como alguém que "faz a diferença onde está". De que maneira a Sociologia compreende a função social dos educadores e de outros profissionais que atuam na área da educação para a transformação dos indivíduos e da sociedade?

4. A crônica defende que a educação "deve ser um direito inegociável de todos". Do ponto de vista sociológico, por que o acesso universal à educação de qualidade é considerado essencial para a redução das desigualdades sociais e para a promoção de uma sociedade mais justa?

5. A história mostra como a dedicação da mãe e a paixão do filho pela educação criaram um "ciclo virtuoso" que ilumina o caminho de outros. Como as ações e o exemplo de indivíduos dedicados podem influenciar positivamente seus grupos sociais ou comunidades, gerando impacto e esperança?

domingo, 27 de abril de 2025

O Boné e a Fúria: Uma Escola sob Ameaça ("A violência é o último recurso da incompetência." — Isaac Asimov)

 

O Boné e a Fúria: Uma Escola sob Ameaça ("A violência é o último recurso da incompetência." — Isaac Asimov)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

A manchete me saltou aos olhos como um projétil: "Jovens tentando invadir a escola para matar a coordenadora e são detidos em Vila Velha". Li e reli, sentindo a descrença pesar no peito. Em Vila Velha, no Espírito Santo. O local parecia próximo, real demais, enquanto a notícia soava absurda a ponto de ser difícil de acreditar. Matar uma coordenadora de escola? A mente buscava um motivo, qualquer explicação que pudesse, minimamente, justificar tamanha fúria. E então, a reportagem trouxe a resposta — mais chocante do que a própria violência: tudo começou por causa de um boné.

Aparentemente, a centelha que acendeu o pavio foi esse objeto banal. Um adolescente, dentro da sala de aula, recusou-se a seguir a norma básica de retirá-lo. A coordenadora, no exercício de sua função, advertiu-o. Diante da persistência na desobediência, a situação escalou para a sala da coordenação. O boné permaneceu na cabeça; o desafio, no ar. A escola, seguindo o protocolo, acionou a família do estudante para uma conversa — uma tentativa rotineira de resolver o conflito em seu nascedouro. Mal sabiam eles a tempestade que se formava.

A reação, no entanto, foi brutalmente desproporcional. Após o término das aulas, o adolescente, tomado por uma raiva incontrolável e acompanhado de alguns amigos, retornou à escola. Não para dialogar, não para compreender a regra, mas para atacar. Tentaram forçar o portão, em um acesso de fúria que danificou a estrutura da instituição. Gritos e ameaças ecoaram, todos direcionados à coordenadora. A Guarda Civil foi acionada e chegou a tempo de evitar uma tragédia, mas o grupo, percebendo a aproximação dos agentes, fugiu antes de ser capturado. O ar da noite em Vila Velha agora carregava o eco sinistro daquela tentativa frustrada.

O que veio a seguir beirou o inacreditável. Mesmo após a intervenção da guarda e a reunião com os pais, o grupo não desistiu. No dia seguinte, com a mesma determinação aterradora, voltaram à escola. Desta vez, armados com uma faca, como detalhou a notícia. Eram quatro: uma jovem de 19 anos, dois adolescentes de 16 e 15, e uma adolescente de 14. Uma perigosa mistura de idades unidas por um plano violento, motivado por uma advertência sobre um boné. A Guarda Municipal agiu novamente, conseguindo detê-los antes que invadissem a escola e colocassem a vida da coordenadora em risco real. O alívio da prisão veio misturado à perplexidade.

Foram levados à delegacia especializada: a mais velha, autuada por organização criminosa; os adolescentes, responsabilizados por ato infracional análogo. As aulas, estranhamente, seguiram seu curso normal naquele dia, apesar da gravidade dos fatos que se desenrolaram à sombra dos portões.

É essa desconexão que me assombra. Um ato de violência planejada contra uma educadora, desencadeado por uma regra simples do ambiente escolar, não ecoou como deveria por todo o país. Parece que estamos perigosamente próximos de normalizar a violência que invade os muros da escola, de aceitar que a fúria de poucos possa ameaçar a segurança de tantos, de desvalorizar a integridade de quem dedica a vida a ensinar. Todo aquele ódio, toda aquela determinação em ferir... por um boné. A desproporção é gritante e dolorosa.

Não podemos, de forma alguma, fechar os olhos para isso. A escola é um espaço sagrado de aprendizado e convivência; aqueles que nela trabalham merecem respeito e segurança. A violência — não importa sua origem nem a aparente "pequenez" do estopim — jamais pode ser a resposta. Que este episódio em Vila Velha sirva de alerta, um lembrete cruel de que a banalização do descumprimento de regras e a escalada da agressividade podem conduzir a tragédias. É urgente olhar para nossas escolas, para nossos jovens e para a maneira como lidamos com os conflitos. É hora de valorizar, proteger e garantir que a paz seja a única norma inegociável dentro e fora de nossas salas de aula. Nossas coordenadoras, professores e estudantes merecem viver e aprender sem medo.



https://www.agazeta.com.br/es/policia/grupo-e-detido-por-planejar-matar-coordenadora-de-escola-em-vila-velha-0425 (Acessado em 27/04/2025)



Elaborei 5 questões discursivas e simples, baseadas nos pontos centrais da minha crônica "O Boné e a Fúria: Uma Escola sob Ameaça". O objetivo é provocar uma reflexão sociológica sobre os eventos e as questões sociais levantadas pelo texto.


1. O texto inicia com o choque de uma regra simples (o boné) levando a uma tentativa de violência extrema. Sob a ótica da Sociologia, como podemos entender a relação entre normas sociais (como as regras escolares) e a escalada de conflitos que podem resultar em atos de violência desproporcional?

2. A crônica descreve a escola como um "espaço sagrado de aprendizado e convivência". Como a Sociologia analisa a importância da escola como instituição social para a formação dos indivíduos e da própria sociedade, e de que forma a violência pode comprometer esse papel?

3. O grupo envolvido no incidente era composto por adolescentes e uma jovem adulta. Que fatores sociais e de interação grupal (como a influência de pares ou a dinâmica do grupo) a Sociologia considera relevantes para analisar comportamentos de risco e violência entre jovens?

4. O narrador expressa preocupação com o fato de a notícia não ter ecoado nacionalmente, sugerindo uma possível "normalização da violência" na escola. Explique, sociologicamente, como certos tipos de violência ou problemas sociais podem acabar sendo banalizados ou recebendo pouca atenção pública.

5. A crônica menciona a tentativa da escola de resolver o conflito inicial chamando a família. Quais são alguns dos desafios sociais complexos que as escolas e as famílias enfrentam hoje na mediação de conflitos e na garantia de um ambiente seguro para educadores e alunos?