"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

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domingo, 26 de abril de 2009

NAS TETAS DA VAQUINHA (É vergonhoso querer aparecer com o chapéu dos outros!)







                             

Crônica

NAS TETAS DA VAQUINHA (É muito fácil fazer graça com o chapeu dos outros.)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Aqui, estou eu, um observador silencioso no coração de uma escola, onde a vida pulsa em ritmo acelerado. A escola, um microcosmo da sociedade, é um lugar onde as pessoas se reúnem para aprender, ensinar e, frequentemente, para participar de um fenômeno curioso: a vaquinha.

A vaquinha é uma prática comum aqui. Para tudo, faz-se uma vaquinha: para celebrar aniversários, para comprar café, até mesmo para comprar papel sulfite. É uma maneira fácil de fazer caridade com o chapéu alheio. Mas, oh, como é difícil encarar o olhar de desapontamento do organizador quando, por algum motivo, você não contribui.

Lembro-me da última vez em que fui solicitado a participar de uma vaquinha. Era para a despedida da coordenadora substituta. Cinco reais era o pedido. Na semana seguinte, outra vaquinha, desta vez, para a recepção da coordenadora titular que voltava de licença. Usei a desculpa de sempre: "Não tenho dinheiro agora". No dia do evento, decidi não comer nada, estava constrangido, com a consciência pesada. Fiquei ainda mais desapontado quando vi, no final, as organizadoras enchendo suas sacolas com bolo para levar para casa. Benefício em dobro, pensei, por isso nunca faltará quem promova uma vaquinha!

Depois de muito esforço mental e reflexão, concluí que ninguém pode me forçar a demonstrar gratidão. A vaquinha me ensinou que ser grato é para quem pode, não para quem quer. E a espontaneidade? Quem merece gratidão não a exige e continua sendo amável, mesmo com os ingratos, porque a bondade não depende de condição.

Li que os funcionários da Escola Estadual Reverendo Jacques Orlando Caminha D'Ávila, no Jardim São Luís, na zona sul de São Paulo, estão fazendo vaquinha para garantir dinheiro extra aos servidores da escola que estão sem o bônus da Educação. As vaquinhas de lá parecem diferentes, mas... são uma espécie de "dízimo". Alguns preferem chamá-la de "boizinho", "bodezinho" ou algum outro apelido, mas o princípio é o mesmo: beneficiar os organizadores, forçar os colaboradores bajularem os superiores.

O que ainda não entendi é se, quando contribuo para a vaquinha, estou pagando por uma diversão forçada ou se estou pagando para trabalhar em nome da boa convivência! Que a tal vaquinha vá para o brejo e nos deixe em paz.

Sempre aparece um espertalhão para fazer graça com o chapéu dos outros! Vaquinha é isso, dividir a dor da consequência dos que transgrediram com quem não tem nada a ver. E se não contribuir, é tachado dos mais horríveis termos de bullying. Lembrando que Deus perdoa, mas não elimina a consequência. Que cada um pague o preço de seu pecado ou pague pela sua projeção! Eu odeio vaquinha, não quero ser trampolim para ninguém. Quando quero ajudar alguém necessitado, dou o que posso sem precisar de intermediário.

Os alunos sempre sabem por que foram dispensados mais cedo das aulas. Já pensaram se o mundo aprendesse o que a escola exemplifica! A escola, afinal, é um reflexo da sociedade ou a sociedade é um reflexo da escola? E, como tal, deve ser um lugar de aprendizado, não apenas acadêmico, mas também moral e ético. Que possamos aprender com nossos erros e buscar sempre a melhoria, não apenas para nós mesmos, mas para toda a comunidade escolar.

ALINHAMENTO CONSTRUTIVO

1. Vaquinha: Caridade ou Extorsão?

O texto apresenta a vaquinha como uma prática comum na escola, desde a celebração de aniversários até a compra de materiais escolares. Como a sociologia pode nos auxiliar a compreender os diferentes significados da vaquinha, considerando as relações de poder, a pressão social e a cultura da doação?

2. Gratidão Obrigatória ou Autêntica?

O autor questiona a ideia de gratidão obrigatória presente nas vaquinhas, afirmando que ser grato é uma escolha individual. Como a sociologia pode nos ajudar a analisar a relação entre gratidão, reciprocidade e obrigações sociais, considerando as diferentes normas e valores presentes na sociedade?

3. Vaquinha e a Desigualdade Social:

O autor menciona o caso da Escola Estadual Reverendo Jacques Orlando Caminha D'Ávila, onde funcionários fazem vaquinha para ajudar colegas que não receberam o bônus da Educação. Como a sociologia pode nos auxiliar a compreender a relação entre vaquinha, desigualdade social e a busca por soluções coletivas para problemas individuais?

4. Vaquinha e o Bullying:

O autor critica a pressão social para contribuir nas vaquinhas, com o risco de ser alvo de bullying. Como a sociologia pode nos ajudar a analisar o impacto da vaquinha na dinâmica social da escola, considerando as relações de poder, a exclusão e o cyberbullying?

5. A Escola como Reflexo da Sociedade:

O autor afirma que a escola é um reflexo da sociedade, com seus problemas e desafios. Como a sociologia pode nos auxiliar a pensar o papel da escola na formação de cidadãos conscientes, críticos e preparados para os desafios do mundo contemporâneo?

Bônus:

A Evolução da Cultura da Doação ao Longo da História:

Realize uma análise sociológica da evolução da cultura da doação ao longo da história. Como as mudanças sociais, as lutas por direitos, as diferentes correntes de pensamento e as descobertas científicas influenciaram as formas de doação e caridade em diferentes épocas e culturas? Quais os desafios e as oportunidades que a prática da doação enfrenta na sociedade contemporânea?

sábado, 18 de abril de 2009

DEMOCRACIA ILÍCITA ("Educar não é encher um balde, mas acender um fogo." — William Butler Yeats)



Crônica

Os corredores da escola possuem um silêncio peculiar, quase ensurdecedor. É um silêncio que fala, que narra histórias que nenhum conselho de classe consegue traduzir. Naquele dia, mais uma vez, o ritual se repetia. Aliviado por não estar entre os convocados, observei à distância a liturgia dessa dança onde palavras cortam mais fundo que lâminas.

Já participei de conselhos de classe o suficiente para reconhecer seu caráter antropofágico. Entre representações discentes e os olhares falsamente impassíveis dos coordenadores, o que se vê é um espetáculo no qual os professores são banqueteados. Cada crítica parece alimentar um apetite insaciável, não pela construção, mas pela destruição. Uma professora ao meu lado, em uma dessas ocasiões, desabafou com um misto de sarcasmo e frustração:

— Os representantes de turma são sempre os piores alunos. E, claro, eleitos por seus próprios pares!

Essa definição, embora carregada de ironia, ecoa verdades que preferimos não dizer. No conselho, os papéis estão bem definidos: alunos no banco dos juízes, coordenadores como escribas, e professores no banco dos réus, à mercê de veredictos emocionais e implacáveis. Não importa o quão bem você desempenhe seu papel, o tribunal já tem sua sentença.

Foi após um desses momentos que uma aluna, representante de turma, me abordou no dia seguinte. Sua expressão era tão séria quanto provocativa:

— Professor, o senhor vai estar presente no próximo conselho?

Havia mais do que curiosidade em sua pergunta. Era um desafio, um convite velado para mais um duelo metafórico, onde palavras seriam as armas.

Os conselhos deveriam ser espaços de troca, não de confronto. No entanto, transformaram-se em arenas de vingança, lugares onde se fala mal de tudo e de todos: professores, colegas, instalações. Sempre me pergunto por que ainda se insiste na presença de alunos nesse processo, quando suas vozes já ecoam em tantas outras instâncias, desde denúncias informais até relatórios formais.

Longe dali, refleti sobre como nossa educação se assemelha a um campo de batalha, quando deveria ser um jardim. Jardins exigem paciência, cuidado e, acima de tudo, compreensão. Cada planta cresce à sua maneira, nem sempre como esperamos, mas todas merecem atenção. O problema maior, contudo, não está no aluno que critica nem no professor que justifica, mas na ausência de respeito mútuo.

Na educação, assim como no futebol, todos se sentem especialistas. Todos têm opiniões e querem dizer como deveria ser feito, como se ensinar fosse um ato simples e mecânico, ao alcance de qualquer um. Mas, diferente do futebol, onde o jogo acontece atrás de bastidores bem orquestrados, na educação tudo é exposto. Não há ensaios, apenas o improviso do dia a dia.

Dar voz é importante, mas usá-la sabiamente é ainda mais. Conceder espaço a quem apenas ecoa críticas vazias não fortalece a democracia educacional; fragiliza o ambiente que deveria ser de construção. Se os conselhos fossem verdadeiros encontros de diálogo, talvez não saíssemos deles com a sensação de termos sido esfaqueados — metafórica ou literalmente.

Assim seguimos: eu, professor; eles, alunos; todos, aprendizes. E, no silêncio eloquente dos corredores, guardo a esperança de que um dia essa dança dissonante possa se tornar harmonia. Afinal, a educação não é sobre vitórias individuais, mas sobre o encontro humano, onde imperfeições e desejos se cruzam para criar algo maior.

5 Questões Discursivas sobre o Texto

O texto descreve os conselhos de classe como um "espetáculo antropofágico". O que o autor quer dizer com essa comparação e como essa dinâmica impacta o ambiente escolar?

Qual a função dos representantes de turma nos conselhos de classe, segundo o texto? Essa função é positiva ou negativa para o processo educativo?

O autor critica a falta de respeito mútuo entre professores e alunos nos conselhos. Como essa falta de respeito influencia a relação entre ambos e a qualidade do ensino?

O texto sugere que a educação é frequentemente comparada a um jogo. Quais as implicações dessa comparação para a forma como entendemos o processo de ensino-aprendizagem?

Qual a importância do diálogo e da escuta ativa nos conselhos de classe para a construção de um ambiente escolar mais saudável e produtivo?


sábado, 11 de abril de 2009

CASO DE METONÍMIA ( Você não precisa ser "Zoilo")








Crônica

CASO DE METONÍMIA ( Você não precisa ser "Zoilo")

Claudeci Ferreira de Andrade


           Eu gostaria muito de saber qual a intenção daquele bicicleteiro, um “zoilo” como diria Raquel de Queiroz, ou melhor, um metediço, não é de ver que ele se atreveu a corrigir minha expressão supermetonímica, assim na cara! Tentou me impressionar com sua limitada competência linguística como bom aluno que ele pensava que era, ou apenas, quis espantar-me, o freguês que não simpatizou, com a expressão máxima de sua incompetência profissional, faltando-lhe a polidez minimamente necessária para um empresário de sucesso!?

          Vejam: passando próximo à praça criativa com o pneu traseiro da bicicleta murcho, resolvi entrar em sua oficina:

          — Remenda o meu pneu – dirigi-me a ele assim meio imperativo, pois tinha dinheiro suficiente para pagar o que pedisse.

          — Aqui não remendamos pneu, mas sim, câmara de ar – respondeu-me com ar de "professor" arrogante, mas estava com a roupa suja e as mãos meladas de graxa como um mecânico trabalhador.

          Agora só lamento por não ter explicado para ele que não estava errada minha frase, e nos 10 minutos em que eu assistia ao crítico inconsequente examinar a câmara em um balde d’água, construí, em silêncio, bons argumentos; revendo mentalmente os textos lidos recentemente: “Metonímia, ou a vingança do enganado” (Raquel de Queiroz), “As razões da metonímia em Vidas Secas” (Roberto Sarmento Lima). Constatando nenhum furo, apenas trocou a válvula, recebeu o dinheiro e virou-se. Por um instante, pensei que tivesse se arrependido da inconveniência, por fazer tão barato o serviço: um real.

          A metonímia consiste na substituição de um termo por outro, por existir entre eles uma relação de proximidade, de interdependência, de inclusão. Em minha frase: Remenda meu pneu, há uma sobreposição de metonímia, o dono é usado em lugar do objeto (o pneu é uma parte da bicicleta e não do condutor) e mais ainda, o continente é empregado em lugar do conteúdo (remenda-se a câmara e não o pneu). Portanto, a metonímia é bastante frequente na linguagem do cotidiano, é um recurso expressivo da língua, perfeitamente normal e artístico.

          Com este desagravo, espero preencher aquele vazio que deixei, ou melhor, quero com o mesmo pagar-lhe minha dívida linguística, como deve ser um professor que se preza. Pois só agora tive tempo de escrever aqueles argumentos que não pude dizer na hora, por gentileza. Até porque eu lera em algum lugar, não me lembro mais onde, que se o animal tiver sua perna presa em uma armadilha esmagadora, o domesticar está fora de questão, no mínimo até que o animal seja liberto e conduzido a algum grau de conforto.

          Preciso desse descargo de consciência  E vocês, não? Esta crônica vai lhes ser útil de alguma forma, é meu desejo.
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 18/06/2009
Código do texto: T1654980

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