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domingo, 4 de abril de 2010

ENTRE PÁSSAROS E GAIOLAS ("/Ninguém é o dono do que a vida dá/" — Dani Black)






Crônica

ENTRE PÁSSAROS E GAIOLAS ("/Ninguém é o dono do que a vida dá/" — Dani Black)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

              
            O mundo é feito de conceitos enraizados, como se as ideias fossem árvores antigas, com raízes profundas que se entrelaçam no solo da tradição. Entre essas concepções, uma que persiste é a da posse, em especial quando se trata da mulher. Mas permitam-me, caros leitores, desfiar-lhes a trama de uma realidade vivida, uma crônica que, como um rio sinuoso, flui entre o enredo da tradição e a busca pela liberdade feminina.
            Era uma vez a crença de que a mulher deveria ser posse do homem, uma ideia que, ao longo do tempo, revelou-se limitadora e sufocante. Essa narrativa, embora pintada com tintas de utilidade, escondia armadilhas que transformavam vidas em trágicas histórias de submissão. A mulher, mais do que útil, deveria ser dona de si mesma, uma ideia que surge como uma brisa suave em meio às palavras rígidas.
             A tradição, qual jardim com flores de normas inflexíveis, alimentou o mito da exclusividade, transformando mulheres em propriedades, objetos, ou até mesmo em animais de estimação. Uma trama que, ao ser tecida com fios de controle, resulta em sofrimento, violência e dominação. O homem, às vezes, cego pela mania de consertar suas "coisas", transforma o amor em algo amargo, como absinto, e a fidelidade em uma espada de dois gumes, cortando a liberdade.
            A infidelidade, concebida como pecado, ecoa em páginas de livros mais vendidos, mas e a esposa do Cristo, quem a conheceu? A fidelidade, imposta, contrasta com a benevolência voluntária, uma dualidade que paira sobre relacionamentos. Questiono-me se é possível manter uma mulher de tudo e, ainda assim, falhar na compreensão de seus propósitos, alimentando a fragilidade que conduz à infidelidade conjugal.
             A busca por respostas perpassa as páginas da história e até mesmo as escrituras, mas é nas expressões do amor que encontramos a verdadeira libertação. Mulheres, capazes de se livrar de pesos como ansiedade e culpa, embarcam num caminho de metamorfose, transformando a traição em sintoma dessa jornada de autodescobrimento.
             O casamento, esse consórcio que muitos veem como o maior lesador do ser humano, revela-se como uma metamorfose constante. Até "que a morte os separe", um lema que antecipa a morte do próprio eu, prenunciando que a garantia para a jornada conjugal não é eterna.
             Ao final, percebo que a fidelidade autêntica está reservada a Deus e a Si mesmo. Não defendo a prostituição, mas sim a conveniência, a felicidade que reside na liberdade. Recordo as palavras de William Shakespeare: "O diabo pode citar as Escrituras quando isso lhe convém". Ser conveniente é, afinal, uma questão de felicidade.
             E assim, entre pássaros que voam livres e gaiolas que tentam aprisioná-los, concluo esta crônica. Onde há amor que promove liberdade, há felicidade. Raul Seixas não estava equivocado ao cantar sobre "A Maçã", e em todos os lugares, unhas são feitas, celebrando a liberdade feminina [Lembrei-me da Fabíola].
            Que possamos, entre as asas do tempo, voar em busca de um amor que não aprisiona, mas que liberta.

ENCAMINHAMENTO DE PERCEPÇÃO



1- Descreva uma mulher "fabiolada", e o que há de irônico no neologismo com relação ao texto todo?

2- O que está insinuando as imagens sugeridas pelo texto, juntamente com o sentido do olho da crônica?

3- Que tipo de fidelidade promove a mulher? Relacione com o antepenúltimo parágrafo do texto.

4- A mulher fala: Este é meu marido/ o homem diz: Esta é minha mulher! Que sutilidade da sociedade machista há nas expressões acima para levar a mulher à submissão?

5- Por que nenhum homem é digno de ser dono de uma mulher? Como isso contrasta com a ideologia dos documentos que legalizam a dependência da mulher: plano de saúde, franquia de clube etc.?

6- Qual tipo de questionamento deve ser feito acerca das mulheres com o fim de  honrá-las?

 7- "tudo vale como expressão de um amor altruísta" versus "quem ama não mata". O que há de comum na semântica das duas frases?

8-  Por que, historicamente, a libertação da mulher é uma luta acanhada?

9- No pensamento de Rudyard a palavra "dominar" marca a tendência do exagero feminista. Comente.

10- O que as mulheres podem fazer por si mesmas para atingir o ideal da frase: "Atrás de um grande homem só o passado, porque hoje a mulher anda lado a lado"?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 30/01/2010
Código do texto: T2059939

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