"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

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MINHAS PÉROLAS

domingo, 22 de dezembro de 2024

O Analfabetismo que Não Me Cala ("A verdadeira sabedoria está em reconhecer a própria ignorância." — Sócrates)

 

  • O Analfabetismo que Não Me Cala ("A verdadeira sabedoria está em reconhecer a própria ignorância." — Sócrates)

    Por Claudeci Ferreira de Andrade

    Hoje, folheando as redes sociais, deparei-me com uma discussão que me fez refletir profundamente sobre nossa realidade brasileira. Entre comentários inflamados e opiniões diversas, encontrei uma voz que me tocou de maneira especial.

    Era uma senhora que, com simplicidade desconcertante, admitia suas limitações educacionais, mas demonstrava uma sabedoria que muitos doutores invejariam. "Posso não ter diploma", escreveu ela, "mas sei reconhecer o certo do errado". Suas palavras, embora simples, carregavam o peso da experiência vivida.

    Fiquei ali, contemplando aquela manifestação de lucidez em meio ao caos digital. Como professor de filosofia e sociologia, já presenciei inúmeras discussões sobre educação e política, mas raramente vi tanta clareza em tão poucas palavras. A ironia da situação não me escapou: enquanto alguns brandem seus títulos acadêmicos como escudos, outros, com menos instrução formal, conseguem enxergar com nitidez as questões que realmente importam.

    O Brasil é um país de contrastes gritantes. Em nossas escolas públicas, crianças ainda lutam pelo básico, enquanto nas altas esferas do poder, decisões que afetam milhões são tomadas com a casualidade de quem escolhe o sabor do café da manhã. É como se vivêssemos em dois países diferentes, sobrepostos no mesmo território.

    Lembrei-me de uma antiga história sobre um militar que foi "convidado" a se retirar de sua instituição. A narrativa popular, sempre criativa, logo estabeleceu um paralelo com a expulsão do paraíso. Ri sozinho dessa comparação, mas logo o riso deu lugar à reflexão: quantas vezes nossa história não se repetiu como farsa?

    A verdadeira educação vai além da capacidade de ler e escrever. Ela se manifesta na habilidade de pensar criticamente, de questionar com propriedade, de se posicionar com dignidade. Aquela senhora das redes sociais, com sua "limitada" educação formal, havia entendido isso melhor que muitos.

    Ao final daquele dia, guardei comigo uma lição valiosa: não é o título que nos faz sábios, mas nossa capacidade de compreender o mundo ao redor e de nos posicionarmos diante dele com honestidade e coragem. O verdadeiro analfabetismo não está na falta de diplomas, mas na ausência de humanidade e sensatez.

    E você, caro leitor, já parou para pensar sobre qual tipo de educação realmente importa?


    1. Como a senhora mencionada no texto demonstra sabedoria apesar de suas limitações educacionais?


    2. Qual é a ironia destacada pelo autor em relação aos títulos acadêmicos e a sabedoria prática?


    3. De que maneira o texto aborda os contrastes sociais e educacionais no Brasil?


    4. O que o autor sugere sobre a verdadeira natureza da educação e sua importância?


    5. Como a reflexão sobre a história do militar expulso se relaciona com a repetição de eventos na história brasileira?

    sábado, 21 de dezembro de 2024

    Os Ipês Roxos da Vergonha: Uma Crônica do Sertão ("O silêncio dos justos não pode ser a vitória dos covardes." — Cora Coralina)

     

  • Os Ipês Roxos da Vergonha: Uma Crônica do Sertão ("O silêncio dos justos não pode ser a vitória dos covardes." — Cora Coralina)

    Por Claudeci Ferreira de Andrade

    Agosto no sertão baiano. Sob o sol implacável, os ipês roxos tingiam o céu de Riacho de Santana com uma beleza contrastante. A aridez da paisagem parecia guardar um segredo que, como uma nuvem densa, prenunciava a ruptura de uma calmaria enganosa. A vida seguia seu curso lento, pontuada por conversas sussurradas à sombra das mangueiras. Mas o que antes era apatia, transformava-se em apreensão: um horror se desenrolava sob o silêncio cúmplice da cidade.

    Tudo começou com um telefonema. Maria, professora da escola estadual, relatava com a voz embargada os rumores que atravessavam os corredores. Havia algo terrível acontecendo. Ao chegar, o calor seco e o vento carregavam não apenas folhas, mas também sussurros que cresciam em intensidade. As acusações contra o vice-diretor, um homem que antes simbolizava autoridade e respeito, transformaram a escola em palco de um pesadelo. Bebidas alcoólicas oferecidas a adolescentes, manipulação psicológica e abuso de poder revelavam um modus operandi cruel. As vítimas, meninas entre 14 e 17 anos, tiveram a coragem de romper o silêncio.

    A prisão do homem, em uma quarta-feira ensolarada, marcou um ponto de inflexão. Enquanto ele atravessava a praça algemado, o rosto que outrora inspirava respeito carregava agora o peso da vergonha. Contudo, a sua prisão não apagava os traumas das vítimas, cujas vidas seriam marcadas para sempre por aquela experiência. Os depoimentos revelavam um padrão de abuso que ultrapassava as fronteiras da pequena cidade. Casos similares, como o do diretor de uma escola em Camaçari, condenaram a sociedade a confrontar uma verdade sombria: a fragilidade de crianças e adolescentes dentro do próprio ambiente escolar.

    A dor coletiva transformou-se em um ponto de partida para mudanças. Hoje, as escolas da região exibem cartazes sobre canais de denúncia e discutem protocolos de segurança. As vozes, antes abafadas pelo medo, erguem-se em defesa dos mais vulneráveis. Em Riacho de Santana, os ipês continuam a florescer, mas seu silêncio parece carregado de uma nova mensagem. Aprendi que, como as flores que surgem no auge da seca, a coragem e a solidariedade podem florescer nos momentos mais áridos.

    A história de Riacho de Santana é um retrato das feridas sociais que precisamos curar. Mais do que punir os culpados, é necessário educar e prevenir, construindo uma sociedade onde a confiança e o respeito sejam os alicerces das relações humanas. Que o silêncio dos ipês, portanto, seja não o da cumplicidade, mas o da reflexão, impulsionando-nos a ser verdadeiros guardiões da infância e da juventude. Porque proteger é um ato de amor e coragem, e cabe a cada um de nós assegurar que os santuários de aprendizado jamais sejam maculados por aqueles que deveriam ser exemplos. [ https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2024/12/19/vice-diretor-de-escola-e-preso-suspeito-de-estuprar-alunas-no-interior-da-bahia.ghtml ]


    Como professor de sociologia do Ensino Médio, proponho as seguintes cinco questões discursivas sobre o texto apresentado:


    1. O texto inicia descrevendo a paisagem de Riacho de Santana e a atmosfera que pairava sobre a cidade antes da revelação dos crimes. De que forma essa descrição inicial contribui para a compreensão do impacto dos eventos na comunidade?


    2. O texto destaca a figura do vice-diretor, um homem que antes inspirava respeito, como o autor dos abusos. Qual a importância desse contraste para a reflexão sobre as relações de poder e confiança no ambiente escolar?


    3. O texto menciona a coragem das vítimas em romper o silêncio e denunciar os crimes. Como esse ato é apresentado na narrativa e qual o seu significado social, considerando a dificuldade em denunciar casos de abuso?


    4. Além do caso em Riacho de Santana, o texto cita um caso similar em Camaçari. Qual a importância de apresentar esse outro caso e como ele amplia a discussão sobre a problemática abordada?


    5. O texto conclui com uma reflexão sobre a necessidade de mudanças e ações para proteger crianças e adolescentes. Quais as principais medidas apontadas pelo texto e como elas se relacionam com a ideia de transformar o "silêncio dos ipês" em um símbolo de reflexão e ação?

    O Aroma Amargo do Chocolate: Uma Receita Fatal ("A confiança é como porcelana fina: uma vez quebrada, mesmo que colada, nunca mais será a mesma." — Machado de Assis)

     

  • O Aroma Amargo do Chocolate: Uma Receita Fatal ("A confiança é como porcelana fina: uma vez quebrada, mesmo que colada, nunca mais será a mesma." — Machado de Assis)

    Por Claudeci Ferreira de Andrade

    No inverno gaúcho, com o Vale do Sinos coberto pela bruma fria, Estância Velha parecia ser mais uma cidade onde o tempo caminhava devagar, entre os sons dos carros antigos e as conversas nas praças. Mas aquele julho trouxe consigo algo que transformaria a paz da cidade: um boato que parecia uma piada de mau gosto, mas que logo se revelou uma triste realidade. Nos corredores de uma escola municipal, começava a se espalhar a história de “bolinhos de chocolate com recheio especial”. A princípio, ninguém acreditou. Mas, como a fumaça sempre antecipa o fogo, os detalhes começaram a surgir.

    A professora, jovem, 34 anos, figura conhecida na comunidade, era o centro de tudo. Ela, cuja missão era ensinar e formar, estava agora sendo acusada de vender brownies recheados com maconha. A ideia de uma educadora, que deveria ser o modelo de responsabilidade, envolvida com tráfico de drogas, parecia impossível de acreditar. E no entanto, era o que estava acontecendo.

    O tempo passou e, à medida que a investigação avançava, a tensão tomou conta de Estância Velha. As conversas nas praças e cafés sempre rondavam o mesmo assunto. Em outubro, a confirmação: a professora foi indiciada por tráfico de drogas. A realidade bateu com um peso que se espalhou por toda a cidade. A comunidade, perplexa, não sabia como reagir. Uma mulher que deveria ser exemplo de virtude estava, na verdade, corrompendo o próprio papel de educadora.

    A história ganhou contornos ainda mais dramáticos em dezembro, quando a prefeitura anunciou sua demissão. O prefeito, Diego Willian Francisco, usou as redes sociais para dar a notícia de forma inusitada: em um vídeo, aparecia comendo um pedaço de bolo, ao som de Bob Marley, dizendo que “este não era batizado, apenas um bolo de chocolate com cobertura”. O tom irônico do gesto gerou controvérsias, mas, para mim, soou como uma tentativa desajeitada de fechar um capítulo triste com um toque de humor que, na verdade, só aprofundava o desconforto da situação.

    Hoje, ao refletir sobre tudo isso, mais de um ano depois dos primeiros rumores, é impossível não perceber o impacto profundo dessa história. Ela não é apenas sobre um crime cometido por uma professora, mas sobre a fragilidade das relações humanas e o risco que corre a confiança depositada nas instituições que deveriam proteger os mais vulneráveis. A escola, o porto seguro de tantas famílias, foi manchada por um ato que contradiz tudo o que ela deveria representar.

    Este caso nos ensina algo doloroso: não importa o quão doces sejam as palavras de um educador, o que realmente importa é a integridade de seus atos. E a lição vai além disso. Ela nos alerta para a necessidade de vigilância constante sobre os jovens, de um diálogo sempre aberto e de uma atenção genuína para que histórias como esta não se repitam. O aroma amargo do chocolate “batizado” nos lembra que devemos proteger nossas crianças e adolescentes, garantindo que eles tenham um futuro construído sobre confiança e respeito. Que possamos aprender com os erros do passado, para não cometer os mesmos enganos no futuro. [ https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/sul/rs/professora-suspeita-de-vender-brownies-com-maconha-em-escola-e-demitida-no-rs/ ]


    Como professor de sociologia do Ensino Médio, proponho as seguintes cinco questões discursivas sobre o texto apresentado:


    1. O texto descreve como um boato sobre "bolinhos de chocolate com recheio especial" evoluiu para a confirmação de um crime. De que forma essa progressão impactou a comunidade de Estância Velha, segundo o texto?


    2. A narrativa destaca o contraste entre o papel esperado de um educador e a ação da professora envolvida no caso. Como esse contraste é apresentado no texto e qual o seu significado sociológico?


    3. O texto menciona a reação do prefeito à demissão da professora, utilizando um tom irônico em suas redes sociais. Como essa atitude é interpretada pelo narrador e quais as possíveis implicações sociais dessa postura?


    4. O narrador afirma que o caso não se trata apenas de um crime, mas também da "fragilidade das relações humanas" e do risco à confiança nas instituições. Explique essa afirmação, relacionando-a com o contexto apresentado no texto.


    5. O texto conclui com uma reflexão sobre a necessidade de vigilância, diálogo e atenção aos jovens. De que forma essa conclusão se conecta com os eventos narrados e qual a mensagem principal que o texto busca transmitir?

    sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

    O Sinal Silencioso no Bolso: Reflexões sobre a Era Digital na Escola (“Educar não é cortar asas, mas sim orientar o voo” — de Aisha Linda)

     

  • O Sinal Silencioso no Bolso: Reflexões sobre a Era Digital na Escola (“Educar não é cortar asas, mas sim orientar o voo” — de Aisha Linda)

    Por Claudeci Ferreira de Andrade

    O tempo em que o recreio era um festival de gritos, corridas e bolinhas de papel amassado ficou para trás. Hoje, os corredores das escolas estão imersos em um silêncio denso, pontuado apenas pelos suaves cliques das telas de celular. O aparelho, antes um objeto de luxo, tornou-se uma extensão do corpo, onipresente em todos os momentos, inclusive nas salas de aula. Esse novo cenário levou à aprovação de uma lei que proíbe o uso de celulares nas escolas brasileiras a partir de 2025. Uma medida recebida com um misto de alívio e ceticismo, gerando intensos debates sobre sua real eficácia.

    Na prática, a proibição vai além de um simples decreto. Ela surge como uma tentativa de resgatar o foco perdido e de devolver aos alunos a capacidade de concentração e interação face a face, além de reduzir os danos psicológicos provocados pelo uso excessivo de telas. No entanto, sua implementação tem se mostrado desafiadora. Em algumas escolas, como a Escola Estadual Professor Antônio Emílio Souza Penna, o processo segue um caminho de tentativa e erro, sem um plano claro para a adaptação. A vice-diretora, Manuela, expressou sua preocupação ao afirmar que “cada instituição tem uma realidade distinta”, e a questão não se resolve apenas com a proibição.

    A resistência dos alunos é palpável. Mesmo com a medida em vigor, muitos escondem seus celulares debaixo da carteira ou mantêm os aparelhos discretos durante a aula, dificultando o controle. Gabriel, um aluno de 16 anos, argumenta que o celular é uma ferramenta essencial para a socialização. No entanto, o que muitos não percebem é que o celular, muitas vezes, impede a socialização genuína, criando barreiras invisíveis entre os estudantes e o momento presente.

    Em escolas particulares, como o Colégio Porto Seguro, onde a proibição de celulares já existia antes da lei, a experiência tem sido mais positiva. A diretora Meire Nocito relata que a instituição criou espaços para interação social, como o “detox digital” nas sextas-feiras, onde os alunos deixam os celulares de lado para participar de atividades recreativas. Esse gesto, que partiu dos próprios estudantes, reflete uma busca por resgatar o contato humano e reconectar-se com o que realmente importa: o diálogo, o esporte e a arte.

    A conversa que li da Camila Bruzzi, do movimento “Desconecta”, destaca outro ponto crucial: a falsa sensação de controle dos pais, que insistem na necessidade de os filhos portarem celulares “para emergências”. Camila argumenta que, em caso de crise, a comunicação pode ser feita diretamente com a escola, sem a necessidade de um aparelho pessoal. Ela sugere que a disciplina digital precisa vir de casa, com os pais alinhando-se às escolas para promover uma educação responsável sobre o uso das telas.

    A nova lei, embora importante, não é a solução definitiva. A verdadeira mudança deve vir da conscientização sobre o uso equilibrado da tecnologia e da implementação de práticas pedagógicas que incentivem o foco e o desenvolvimento mental dos alunos. O uso excessivo de celulares afeta a capacidade de reflexão e acelera a busca por prazer imediato, prejudicando as habilidades cognitivas e a saúde mental dos jovens.

    O caminho para uma transformação real exige um esforço coletivo, que envolva escolas, famílias e alunos. A proibição dos celulares nas escolas não é uma questão de controle rígido, mas sim de ensinar aos estudantes a importância de se desconectar para se reconectar com o conhecimento e com a vivência plena do presente. Os celulares, longe de serem vilões, são apenas mais uma ferramenta. A questão está em como os usamos, e não em proibi-los completamente. O silêncio que preenche os corredores das escolas pode, enfim, ser preenchido pelas vozes da juventude, vibrantes e presentes, quando o contato humano for, novamente, o verdadeiro protagonista.


    Como professor de sociologia do Ensino Médio, proponho as seguintes cinco questões discursivas sobre o texto apresentado:


    1. O texto descreve uma mudança no ambiente escolar, caracterizada pela substituição das interações presenciais pelo uso de celulares. Quais as principais características dessa mudança e como ela impacta o cotidiano escolar, segundo o texto?


    2. A partir da leitura, explique a relação entre a proibição do uso de celulares nas escolas e a busca por resgatar o foco e a interação face a face entre os alunos. Quais os desafios apontados para a implementação dessa proibição?


    3. O texto apresenta diferentes perspectivas sobre o uso de celulares no ambiente escolar: a dos alunos, a dos professores, a da direção das escolas e a dos pais. Descreva brevemente cada uma dessas perspectivas, destacando os principais argumentos de cada grupo.


    4. O texto menciona o “detox digital” como uma estratégia adotada por algumas escolas. Explique o que é essa estratégia e como ela se relaciona com a proposta de um uso mais equilibrado da tecnologia no ambiente escolar.


    5. Segundo o texto, a proibição do uso de celulares nas escolas é suficiente para resolver os problemas relacionados ao uso excessivo da tecnologia pelos jovens? Justifique sua resposta com argumentos presentes no texto.

    quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

    A Educação, Entre as Ruínas ("A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo." – Nelson Mandela)

     Crônica


    A Educação, Entre as Ruínas ("A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo." – Nelson Mandela)

    Por Claudeci Ferreira de Andrade

    Na vastidão de um país continental como o Brasil, a educação, que um dia foi um farol de esperança e ascensão social, encontra-se agora em leito de enfermidade. Em 2025, completarei 31 anos dedicados ao magistério, desde o ensino fundamental até o ensino médio. Não são apenas anos acumulados, mas vivências, cicatrizes e, acima de tudo, a persistente crença de que a educação tem o poder de transformar o destino de uma nação. Contudo, a realidade que se apresenta, ano após ano, insiste em contradizer essa convicção.

    A educação brasileira, longe das promessas dos discursos oficiais e das estatísticas manipuladas, revela-se uma farsa, com exceções raras, mas honrosas, em algumas escolas espalhadas pelo país. Conhecer as entranhas de uma escola pública, mergulhar em seu cotidiano, é deparar-se com uma realidade aterradora. A qualidade, antes questionável, agora declina a passos largos em direção a um abismo que parecia intransponível. O que um dia imaginei como motor de transformação social, vejo hoje ser moldado e deformado pela própria sociedade, com seus males sendo arrastados para dentro das escolas.

    Como professor, sou testemunha da invasão de “metodologias inovadoras” propostas por aqueles que jamais pisaram em uma sala de aula da educação básica. A “pedagogia da panelinha”, exaltada por teóricos distantes da realidade, revela um dos maiores desafios: a ausência de uma política pública de Estado para a educação, substituída por políticas de governo que são reféns da indisciplina generalizada, da violência, do tráfico e do abandono. A falta de professores, antes impensável em certas regiões, tornou-se uma triste constante. O que vemos, então, é um faz de contas, onde pouco se ensina e, consequentemente, quase nada se aprende. O discurso governamental, no entanto, insiste na falácia de que “a educação vai bem”, numa tentativa vã de tapar o sol com a peneira.

    Escrevo esta crônica não com a ilusão de que minhas palavras chegarão aos ouvidos do presidente e dos governadores eleitos, mas como um grito de indignação e um apelo à mudança. É um desabafo, sim, mas também um ato de resistência. A educação não pode ser tratada como um mero implemento de governo, manipulada por números e estatísticas. Precisamos alcançar resultados que se traduzam na vida das pessoas, por meio de conquistas humanas e vivências coletivas significativas. Devemos combater a indisciplina com ações efetivas, valorizar a carreira docente, tornar o ambiente escolar um espaço propício ao aprendizado e, acima de tudo, resgatar a crença na escola como um meio de crescimento humano e social.

    Enquanto isso, a descrença popular ecoa: “Mais uma crônica que ninguém lê… Eles lá no poder não querem saber de salário de professor, estão ocupados demais com seus privilégios.” Há uma amargura compreensível nessa voz, o eco do abandono sentido por tantos professores que, exaustos, acabam por “largar de mão”. A realidade é dura: falta professor, falta respeito, falta tudo. E o futuro, sob a ótica de muitos, prenuncia tempos ainda mais sombrios.

    Por isso, conclamo os senhores governantes a um gesto concreto: escolham uma escola em um bairro periférico, onde pulsa a realidade da imensa maioria das escolas brasileiras, e ministrem aulas durante um mês. E, se não for pedir demais, que seus salários, durante esse período, sejam equiparados aos de um professor. Quem sabe, assim, vocês comecem a entender, na prática, o que é a educação brasileira e, consequentemente, busquem soluções eficazes. Não se trata de cinismo, mas de um último ato de fé na transformação. Porque eu, como professor, me recuso a desistir da educação, mesmo que a sociedade, em muitos momentos, pareça ter desistido de nós. Que possamos, juntos, encarar os desafios de frente, sem subterfúgios ou maquiagens, buscando um futuro onde a educação seja, de fato, um instrumento de libertação e progresso.


    Aqui estão 5 questões discursivas, no formato de pergunta simples, elaboradas como um professor de sociologia do Ensino Médio faria, abordando os temas principais do texto:


    1. O texto descreve a educação brasileira como uma "farsa". Quais argumentos o autor utiliza para sustentar essa afirmação?


    2. De acordo com o autor, qual a relação entre as "metodologias inovadoras" e a realidade das escolas de educação básica no Brasil?


    3. O autor menciona a ausência de uma "política pública de Estado" para a educação. Qual a diferença entre uma política de Estado e uma política de governo, e por que essa distinção é importante para a melhoria da educação?


    4. O texto aborda a descrença popular em relação à capacidade do sistema educacional de promover mudanças. Como essa descrença se manifesta e qual a relação dela com a situação dos professores?


    5. O autor propõe um gesto concreto aos governantes. Qual é essa proposta e qual o objetivo por trás dela?