Entre Smartphones e Desrespeito: O Desafio de Ensinar Hoje ("Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio. Que a morte de tudo que acredito não me tape os ouvidos e a boca." Oswaldo Montenegro)
Por Claudeci Ferreira de Andrade
Ao cruzar a porta da sala de aula, lista de chamada em mãos, já sentia o peso daquele pressentimento familiar - seria mais uma aula desafiadora. O burburinho das conversas e o brilho azulado dos celulares dominavam o ambiente. No epicentro da agitação estava Marie, uma aluna para quem o smartphone parecia uma extensão natural do corpo.
Como professor, aprendi a ser um equilibrista emocional, mas naquele dia Marie testava os limites da minha serenidade. Enquanto eu dissertava sobre ética e filosofia, ela compartilhava conteúdos no celular, trocando risadinhas cúmplices com os colegas. Um rápido olhar para as expressões ao redor revelou que não se tratava de simples memes inofensivos.
"Marie, entregue o celular, por favor", pedi com voz firme mas controlada. Ela ergueu os olhos, desafiadora. Em outros tempos, talvez uma simples advertência bastasse. Hoje, porém, minha solicitação foi recebida com desdém: "Isso dá nada não, fessor!"
"Dá nada" - duas palavras que ecoavam como um diagnóstico cruel de nossa época. Recordei as narrativas dos professores mais antigos sobre um tempo em que a palavra do mestre tinha valor e o menor desrespeito encontrava consequências. Não era mero saudosismo, mas a constatação de que algo fundamental se perdeu no processo educacional.
O episódio persistiu em minha mente, mesmo após o término das aulas. A aparente simplicidade do "dá nada" mascarava uma questão muito mais profunda - o reflexo de uma instituição onde as punições se tornaram exceção e a autoridade, mera formalidade. Nos corredores, multiplicavam-se os casos: professores silenciados após ofensas, funcionários injustamente acusados, colegas receosos de agir.
Caroline - um nome impossível de esquecer. Li sua história anos atrás: uma professora agredida por tentar manter a ordem em sala. As manchetes informavam sua recuperação física, mas quem poderia mensurar as cicatrizes invisíveis que tais experiências deixam?
A escola transformou-se em um palco onde valores morais foram relegados a papéis secundários. Conteúdos inadequados circulam livremente, incidentes graves são abafados para evitar escândalos, e uma pretensa modernidade parece justificar qualquer comportamento. O que temos não é paz, mas o silêncio perturbador de um sistema à deriva.
Naquela noite, refletindo sobre Marie e seu "dá nada", questionei-me: estaríamos à beira de um colapso educacional? Ou talvez já o tivéssemos ultrapassado, caminhando cegamente rumo a um cenário onde a educação se dissolve como areia entre os dedos?
5. Como o professor pode lidar com os desafios da educação contemporânea e manter a esperança em um futuro melhor?
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