"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

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MINHAS PÉROLAS

terça-feira, 23 de setembro de 2025

O Silêncio Forçado do Docente ("A maior covardia de uma sociedade é deixar que a voz do oprimido seja abafada." — Martin Luther King Jr.)

 



O Silêncio Forçado do Docente ("A maior covardia de uma sociedade é deixar que a voz do oprimido seja abafada." — Martin Luther King Jr.)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O professor não pode falar a verdade sobre o comportamento de uma criança, pois corre o risco de ser mal interpretado, julgado ou até processado em um parecer descritivo. Imagine um docente diante da tarefa de descrever um aluno inquieto: sabe que a criança não é “desobediente”, mas que precisa de atenção e apoio emocional. Ao tentar registrar isso no papel, porém, se perde em rodeios, trocando a clareza pela sutileza, como quem escreve com medo de acender um pavio invisível. A verdade se encolhe entre adjetivos amenos, porque uma palavra mal colocada pode se transformar em munição contra quem apenas quis ajudar.

Ao escrever, precisa escolher “palavras aceitáveis”, pois, se disser a verdade de forma direta, os pais podem não gostar — e, então, crucificá-lo. Muitas vezes, o professor enxerga que a criança necessita de apoio emocional, mas não pode declarar isso com todas as letras, já que qualquer observação pode soar como acusação. Ele ouve gritos, críticas e exigências, mas, se levanta a voz, é tachado de despreparado. Cobra-se que ensine valores, mas não há respaldo quando os pais não colaboram ou, pior, desautorizam seu trabalho.

Entre regras, protocolos e burocracias, o professor precisa lidar com dezenas de alunos que carregam realidades distintas. E, no fim, ainda escuta que “trabalha pouco” e “tem férias demais” — palavras de quem nunca entrou em uma sala de aula lotada e desconhece o peso de sustentar o dia a dia da educação.

É nesse ponto que a contradição se revela com mais crueldade: cobra-se do professor que seja psicólogo, conselheiro e herói, mas nega-se a ele o direito de dizer o óbvio. Como nomear o bullying sem ser acusado de exagero? Como alertar sobre a negligência sem ser tachado de ofensivo? O silêncio imposto, que deveria proteger, apenas adoece e isola. Talvez seja hora de inverter o jogo: oferecer aos pais e à sociedade oficinas de escuta, espaços de diálogo real, onde a palavra do professor não seja sentença, mas ponte. Enquanto isso não acontece, a verdade permanece refém — dita às escondidas, engasgada nos corredores.

Essas são as verdades silenciosas da vida docente, aquelas que quase ninguém sabe — ou prefere não saber. Porque, no fundo, o professor não pode falar a verdade.


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O texto que lemos nos provoca a pensar sobre as complexidades da vida docente para além do que vemos em sala de aula. Ele nos mostra um professor que se sente silenciado e desautorizado, enfrentando desafios que vão além do conteúdo a ser ensinado. Para a nossa aula, preparei 5 questões que nos ajudarão a analisar esse cenário de um ponto de vista sociológico.


1. A Burocracia e a Perda de Autonomia: O autor sugere que o professor, ao escrever um parecer descritivo, se perde em "rodeios" para não correr o risco de ser processado. De que forma as regras e burocracias de uma instituição (a escola, neste caso) podem limitar a autonomia do profissional e influenciar a forma como ele age e se comunica?

2. A Contradição do Papel Social: O texto afirma que se espera que o professor seja "psicólogo, conselheiro e herói". Como a sociologia explica essa acumulação de papéis? Por que essa multiplicidade de funções, somada à falta de respaldo, pode gerar um conflito de papéis e levar à frustração profissional?

3. O Silêncio como Estratégia de Sobrevivência: O autor descreve o silêncio como uma estratégia de defesa do professor. Analise como esse silenciamento imposto não apenas protege o profissional de conflitos, mas também pode isolá-lo e impedir que os problemas reais dos alunos e da escola sejam resolvidos de forma aberta e eficaz.

4. A Desvalorização do Trabalho: O texto cita a percepção popular de que o professor "trabalha pouco" e "tem férias demais". Discuta como essa visão estereotipada reflete uma desvalorização da profissão na nossa sociedade. Quais as consequências desse tipo de julgamento para o trabalho diário e a motivação dos educadores?

5. A Relação Família-Escola: A crônica aponta para um cenário em que os pais "desautorizam" o trabalho do professor. De que maneira essa falta de colaboração entre a família e a escola impacta o desenvolvimento do aluno e o processo de ensino-aprendizagem?

domingo, 14 de setembro de 2025

A falsa promessa da inclusão ("A inclusão só é verdadeira quando o lugar do outro, com a sua diferença, não é apenas tolerado, mas desejado." — Marcelo Gleiser)



 

A falsa promessa da inclusão ("A inclusão só é verdadeira quando o lugar do outro, com a sua diferença, não é apenas tolerado, mas desejado." — Marcelo Gleiser)

Por Claudeci Ferreia de Andrade

           Sempre que me manifesto contra a chamada educação inclusiva, percebo os olhares de reprovação se voltarem para mim. A frase soa estranha e até cruel, como se eu fosse contra o acolhimento e a solidariedade, mas não é isso. O que me incomoda não é a ideia de inclusão, e sim o modo como essa política foi imposta sem ouvir quem vivia a realidade do dia a dia.




           Lembro-me de um vídeo em que um pai de Porto Alegre relata a experiência de sua filha em uma escola especial. Ele atravessava a cidade todos os dias para levá-la a esse refúgio, no bairro Intercap. Lá, a filha, que tem a síndrome de Williams, era respeitada e compreendida, pois a escola era um local próprio para crianças com diversas condições. O pai encontrava ali um ambiente de acolhimento e troca de experiências. Nesse espaço, a diferença não era um peso; era o ponto de partida para o desenvolvimento.



           O depoimento desse pai mostrou que a escola especial era exatamente o que as famílias desesperadas precisavam: professores qualificados, uma comunidade de pais que se entendiam, e crianças que, por fim, encontravam um lugar de pertencimento.



           A mudança começou com a “educação inclusiva”, uma política do governo do PT que parecia irresistível. O objetivo era extinguir as escolas especiais e colocar todas as crianças juntas, como se a simples convivência pudesse dissolver o preconceito. A justificativa era que, convivendo lado a lado, os alunos aprenderiam a enxergar a diferença como algo positivo.



           No entanto, a prática se mostrou bem diferente. Eu e meus colegas, sem a formação adequada, recebemos alunos com necessidades especiais sem nenhum preparo. A insegurança dos pais faz com que muitos proíbam seus filhos de se aproximarem desses colegas, como se fossem contagiosos. E as próprias crianças, na sua inocência cruel, reagem com piadas, bullying e exclusão.



           A filha daquele pai, que antes era acolhida, passou a se sentir invisível. Já enfrentava a dificuldade de uma condição genética e, agora, também lidava com a rejeição de quem deveria ser seu colega. A escola, que deveria proteger, acabou por reforçar a exclusão.



           A promessa de acompanhamento pedagógico exclusivo, tão repetida nos discursos oficiais, na maioria das vezes, não existe. O que se vê são professores exaustos, tentando equilibrar uma sala inteira sem conseguir atender plenamente a todos, nem os que avançam mais rápido, nem os que precisam de mais apoio.



           O resultado é que todos aprendem menos. O ritmo das aulas se arrasta, o conteúdo é diluído e forma-se uma geração que termina o ensino médio sem saber interpretar um texto ou resolver um cálculo básico. No papel, a inclusão virou uma exclusão disfarçada.



           O depoimento do pai mostrou a dor silenciosa de perceber que a promessa de igualdade, no fundo, se tornou um atalho para o abandono. Ele queria apenas ter o direito de escolher entre uma escola especial ou uma escola regular. Mas ninguém o ouviu.



           Eu, que vejo essa realidade de perto nas minhas turmas, digo sem receio: a educação inclusiva, como foi implementada, não melhorou nada. Na verdade, piorou. Quando se finge incluir, faz-se algo ainda mais cruel do que excluir: “deixa-se alguém acreditar que pertence, apenas para descobrir que, no fundo, nunca lhe deram lugar de verdade.”

https://www.facebook.com/share/v/1619HA3DMV/ (Acessado em 14/09/2025)


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O texto que vocês leram é um depoimento forte e complexo sobre a educação inclusiva no Brasil. Ele nos convida a ir além do senso comum e a analisar criticamente as políticas públicas e suas consequências na vida real. Como futuros sociólogos, é fundamental que vocês consigam identificar os conflitos, os papéis sociais e as estruturas presentes nesse debate. A partir da leitura, pensem sobre as seguintes questões:


1 - O autor do texto se sente julgado por sua posição. De acordo com a Sociologia, como podemos analisar a "reprovação" que ele percebe nos olhares das pessoas? Qual o papel da moral social nesse tipo de situação?

2 - O texto aborda a diferença entre o que é "inventado no papel" e o que é imposto "na prática". Discuta como essa desconexão entre a teoria da política pública e a realidade pode gerar conflitos sociais, utilizando o exemplo da educação inclusiva.

3 - O depoimento do pai mostra a busca por um "espaço de pertencimento" para sua filha. Explique, com base na sociologia, o que significa a "diferença não ser peso" e a importância de um ambiente que promova o pertencimento para a identidade e o desenvolvimento social de um indivíduo.

4 - A política de "educação inclusiva" é apresentada como uma forma de dissolver o preconceito. Analise criticamente essa premissa, considerando o que o texto relata sobre a falta de preparo dos professores e a reação de pais e alunos. Como a Sociologia do Conflito pode nos ajudar a entender essa situação?

5 - O autor afirma que a inclusão, "no papel", se tornou uma "exclusão disfarçada" na prática. Discorra sobre como a implementação de uma política, mesmo com boas intenções, pode inadvertidamente reforçar processos de exclusão social.