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MINHAS PÉROLAS

terça-feira, 30 de junho de 2009

CONFISSÃO DE UM ANJO (A consequência do pecado de um anjo da guarda)





Crônica

CONFISSÃO DE UM ANJO: A Reunião Hostil (A consequência do pecado de um anjo da guarda)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Acompanhei o professor-tutor Ci ao departamento pedagógico da subsecretaria. Ele havia sido convocado para entregar um levantamento sobre alunos, salas e capacidade, essencial para o reordenamento da rede escolar.

Ci procurou a senhora Li, coordenadora do grupo de técnicos auxiliares ("dupla pedagógica, tutores") dessa regional, esperando ser recebido com as "boas-vindas como um servo bom e fiel". Contudo, a coordenadora estava visivelmente mal-humorada. Ci, apreensivo por ter recebido uma ordem truncada e não um documento formal (ofício), sentou-se à mesa em que Li o atendia e tentou quebrar o gelo:

— "Bom dia! Aqui estão as informações."

— "Onde estão os Gestores das escolas de sua responsabilidade?" – perguntou Li, confrontando-o diretamente.

Ele respondeu exatamente o que ela não esperava ouvir, já que nenhum gestor estava presente:

— "Foram convocados e até assinaram meu relatório de visitas, aqui está (eram três folhas abordando o objetivo das visitas do tutor). Se não compareceram, é porque julgaram não ser tão importante assim!"

Vi Ci colocar à mesa o relatório de três folhas, devidamente assinado, visto que a coordenadora sequer estendeu a mão para pegá-lo. Após um minuto de silêncio embaraçoso, Li concordou:

— "Então, vamos fazer o que dá para fazer já que eles não vieram."

Percebi que Li estava estressada, parecendo indisposta. Ela organizou seus formulários e deu início ao que se assemelhava a um interrogatório policial, buscando criar "armadilhas para pegar o culpado".

— "Quais as medidas das salas? Por onde começa a numeração das salas? Quantas salas são? Que escola é essa? Quais turmas funcionam na sala nº. 1 nos três turnos? Blá blá blá...?"

Entre um telefonema e outro, ela retornava à mesa para mais uma rodada de perguntas. Embora eu sentisse a obrigação de intervir para auxiliar Ci, ele conseguiu reagir ao que parecia ser o golpe final:

— "Você não me pediu quais turmas funcionam em tais e tais salas, nos três turnos, mas posso telefonar para as escolas e providenciar essas informações que deseja, agora."

Foi nesse momento que Li desferiu o ataque, com palavras agressivas e desorganizadas:

— "Eu estou cheia desses tutores e, se depender de mim, não vou escolher você para o próximo ano (2004)."

Eu desconhecia o que motivava sua mente, pois o anjo que a assistia era outro, mas via aquela "competição" como desleal. Nesse instante, justifiquei-me e retirei apressadamente as folhas de relatório da mesa.

Durante o recesso de final de ano, vi Ci, por várias vezes, recorrendo ao Pai, pedindo ajuda para decidir entre continuar na função de tutor ou retornar à regência em sala de aula. Eu, no entanto, estava impedido de auxiliá-lo: cometi um pecado, e por isso o Pai não me promoveu. "Agora sou o anjo dela."

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Como seu professor de Sociologia, vejo neste texto um excelente material para analisarmos as dinâmicas de poder e as relações interpessoais no ambiente burocrático. O trecho descreve um micro-ambiente de trabalho na área da educação, onde a hierarquia, a comunicação e o estresse moldam as interações. As seguintes questões discursivas simples ajudarão a conectar a narrativa com os conceitos sociológicos que estudamos:

1. Hierarquia e Expectativas

O professor Ci esperava ser recebido com as "boas-vindas como um servo bom e fiel" pela coordenadora Li. Explique, a partir da Sociologia, o que essa frase revela sobre a hierarquia e as expectativas de subordinação que permeiam as relações profissionais em ambientes burocráticos como o departamento pedagógico.

2. Comunicação Burocrática

O texto menciona que Ci ficou apreensivo porque recebeu a ordem para a tarefa de forma "truncada" e "não um documento formal (ofício)". Qual é a importância dos procedimentos formais (como o ofício) em uma burocracia, segundo Max Weber, e como a ausência desse formalismo afetou a relação de trabalho entre Ci e Li?

3. Conflito de Papéis

O questionamento de Li sobre a ausência dos gestores ("Onde estão os Gestores das escolas de sua responsabilidade?") e a resposta de Ci ("Se não compareceram, é porque julgaram não ser tão importante assim!") evidenciam um conflito. Analise esse trecho sob a ótica da "autoridade" e da "responsabilidade" na gestão escolar. Por que a ausência dos gestores se torna um ponto de tensão entre o tutor e a coordenadora?

4. Micro-Poderes e Assédio

O comportamento da coordenadora Li é descrito como um "interrogatório policial", com "armadilhas para pegar o culpado", e culmina em uma ameaça explícita ("não vou escolher você para o próximo ano"). Como a Sociologia do Trabalho ou das Relações de Poder pode interpretar a atitude de Li? Identifique um conceito sociológico (como poder disciplinar, dominação, ou assédio moral, por exemplo) que ajude a explicar essa dinâmica.

5. Cultura da Cobrança e Estresse

A narrativa indica que Li estava "visivelmente mal-humorada" e "estressada", enquanto Ci estava "apreensivo". Relacione o estresse e a pressão no ambiente de trabalho burocrático, conforme retratado no texto, com a cultura de cobrança de resultados ou com a rigidez institucional. De que maneira essa pressão interfere na fluidez e na qualidade das interações humanas?

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