"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

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MINHAS PÉROLAS

sexta-feira, 9 de maio de 2025

Na Sala Onde Caem Professores ("... A banalidade do mal." — Hannah Arendt)

 



Na Sala Onde Caem Professores ("... A banalidade do mal." — Hannah Arendt)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Nos primeiros dias de maio de 2025, os portais de notícia de Minas Gerais estamparam manchetes que, embora chocantes, já não surpreendiam. Professores agredidos dentro da sala de aula. Outra vez. Em cidades vizinhas, com poucas horas de diferença, cenas semelhantes, dores idênticas.

A primeira ocorrência veio de Belo Horizonte, na região da Pampulha. Uma professora de Geografia, de 55 anos, foi empurrada por um aluno de 15 durante uma discussão sobre o uso do celular em sala. O gesto de repreensão, que outrora fazia parte da rotina pedagógica, agora é visto como provocação. O garoto a empurrou com força diante de todos. Gritou para os colegas: “Grava ela! Grava ela fazendo graça!” A educadora caiu ao chão. Riram. Filmaram. Viralizaram. No boletim de ocorrência, consta que o aluno tem diagnóstico de TDAH e transtorno opositor desafiador — mas, até então, a escola não havia sido oficialmente informada.

Dois dias depois, outra manchete: “Aluno ameaça matar professora dentro da escola, em Sabará.” Desta vez, a vítima foi uma supervisora pedagógica de 61 anos. Estava em sua sala, organizando papéis, quando foi surpreendida por um estudante de 16 anos, visivelmente alterado. Ele entrou sem bater, jogou sobre a mesa uma cartela de medicamentos e acusou: “A senhora falou com meu pai que eu uso droga.” Não esperou resposta. Avançou. Empurrou. Encurralou-a entre uma estante e a mesa e, apontando uma caneta para seu rosto, declarou: “Eu vim aqui pra te matar, e hoje eu vou te matar mesmo.”

A história quase teve um desfecho trágico. Um aluno, ao passar pelo corredor, ouviu os gritos e correu pedindo ajuda. Um professor que tentou intervir saiu com o braço ferido. A polícia foi chamada. O boletim foi registrado. Mas o que mais uma ocorrência pode significar num país onde ser professor se tornou sinônimo de vulnerabilidade?

Nas redes sociais, os comentários se dividiam entre o espanto e a resignação. “Mais um caso?”, perguntava um internauta. “Até quando?”, indagava outro. Mas, entre o choque e a indiferença, a pergunta mais dura permanecia: por que isso continua acontecendo?

Os relatos revelam mais do que episódios isolados de violência escolar. São sintomas de um colapso. A autoridade do professor vem sendo corroída há anos — não apenas pela indisciplina, mas por um sistema que, ao mesmo tempo em que exige paciência infinita dos educadores, falha em lhes garantir o mínimo de segurança. Espera-se que sejam psicólogos, conselheiros, guardiões e heróis — mas não se oferece nem proteção, nem respeito.

No caso da professora da Pampulha, o laudo médico registrou contusões e escoriações. No de Sabará, o trauma foi mais profundo que o físico. O medo ocupou o lugar da vocação. E, mesmo assim, ambas continuam. Continuam por compromisso, por teimosia — ou talvez por uma fé dolorosa de que ensinar ainda pode valer a pena.

As manchetes passarão. Os vídeos talvez continuem circulando até que outra polêmica ocupe os holofotes. Mas, nas salas onde caem professores, o chão permanecerá frio, duro e hostil. E quem ousar ensinar ali, aprenderá, antes de tudo, a sobreviver.




Minha crônica "Na Sala Onde Caem Professores" é um relato impactante que nos convida a uma reflexão profunda sobre a escola e a sociedade contemporânea. Como seu professor de Sociologia, vejo aqui muitos pontos cruciais para nossa análise. Com base nas minhas ideias, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto descreve atos de violência de alunos contra professores em escolas. Como a Sociologia analisa os fatores sociais e institucionais que podem contribuir para a ocorrência de violência dentro do ambiente escolar?

2. A crônica sugere que a "autoridade do professor vem sendo corroída" e que os incidentes são "sintomas de um colapso". De que forma a Sociologia estuda a dinâmica da autoridade em instituições sociais como a escola e o que a fragilização dessa autoridade pode indicar sobre mudanças na sociedade?

3. O texto aponta que se espera que professores sejam "psicólogos, conselheiros, guardiões e heróis", mas não se oferece a eles "proteção, nem respeito". Como a Sociologia compreende as expectativas sociais sobre o papel do professor na sociedade atual e os desafios enfrentados pela profissão diante dessas expectativas e da realidade do ambiente de trabalho?

4. A crônica sugere que a violência na escola é um reflexo de problemas mais amplos da sociedade. Como a Sociologia analisa de que maneira as tensões, desigualdades e violências existentes na sociedade em geral podem se manifestar e impactar diretamente o cotidiano das instituições de ensino?

5. O texto menciona como as agressões foram filmadas e circularam nas redes sociais, gerando comentários diversos. Como a Sociologia da Mídia estuda o papel dos meios de comunicação e das redes sociais na representação e no debate público sobre a violência na escola e a imagem dos professores?

quinta-feira, 8 de maio de 2025

A Exaustão de Amar Demais ("Empatia sem limites é receita para exaustão." — Atribuído a profissionais de saúde mental)

 



Crônica


A Exaustão de Amar Demais ("Empatia sem limites é receita para exaustão." — Atribuído a profissionais de saúde mental)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Sinto o peso da profissão todos os dias. Não o dos livros na mochila, nem o da rotina que insiste em nos moer, mas o peso invisível e denso das vidas que cruzam a minha. Há trinta anos, testemunho o turbilhão que é a adolescência: as dificuldades que se escondem por trás dos sorrisos e das rebeldias, as histórias sussurradas que carregam o mundo nas costas. A cada olhar atento, a cada confidência, a cada dificuldade percebida em sala de aula, uma parte de mim se envolve, se preocupa, se doa. Acredito que ser professor é, em grande parte, estar ali — inteiro, disponível — para esse universo complexo. É essa conexão que, paradoxalmente, me nutre de sentido e, ao mesmo tempo, me esgota a alma.

Foi numa terça-feira qualquer, dessas em que o café esfria antes mesmo de darmos o primeiro gole, que me deparei com um estudo. Estava na sala dos professores, entre papéis amassados e olhares perdidos pelo cansaço. A pesquisa, sobre o mal-estar docente, trazia um alerta que me atingiu como um soco no estômago — daqueles que tiram o ar e fazem questionar tudo o que pensávamos saber sobre a nossa profissão. A conclusão, seca e direta como um diagnóstico, afirmava que os professores mais resilientes, aqueles que chegavam ao fim da carreira inteiros, menos afetados por adoecimentos psiquiátricos graves, eram justamente os que sabiam se afastar emocionalmente.

O estudo dizia que esses profissionais mantinham uma empatia limitada, uma compaixão dosada. Entendiam seu papel até certo ponto e, depois dali, conseguiam, metaforicamente, "virar as costas e ir embora", deixando o problema onde estava — sem levá-lo para casa, sem permitir que corroesse a alma. A pesquisa gritava uma verdade inconveniente, daquelas que não aparecem nas manchetes motivacionais: a sobrevivência na docência, muitas vezes, exige uma distância afetiva.

Como digerir uma verdade tão dura? Como conciliar essa conclusão com a imagem idealizada que a sociedade — e nós mesmos — construímos do professor: o ser onipresente, onicompreensivo, capaz de abraçar todas as dores e solucionar todos os dilemas? O estudo me colocava diante de um paradoxo cruel: seria a própria empatia, a compaixão que consideramos virtudes essenciais, o caminho para a doença na nossa profissão? Seria a capacidade de estabelecer limites rígidos, de não se afogar no mar de problemas que nos cerca, a verdadeira chave para a sobrevivência — mesmo que isso pareça ir contra a nossa natureza ou contra a expectativa de entrega total que nos é imposta?

Lembro do início da minha carreira, trinta anos atrás. Eu me jogava com tudo: sem filtros, sem limites. Chorava junto com os alunos, levava os problemas deles para casa, perdia o sono imaginando soluções para dificuldades muito além do meu alcance. Sentia-me na obrigação de ser santo, de carregar cada dor de aluno, cada conflito familiar, cada ausência afetiva, como se a minha mochila pedagógica também fosse emocional. O preço dessa entrega total era alto: eu me sentia esgotado, à beira do abismo.

Hoje, não mais. Aprendi, a duras penas, que, se eu não me colocar limites, ninguém o fará por mim. Aprendi que o professor que permanece são é aquele que constrói uma cerca em torno de si. Não para excluir — jamais para abandonar os alunos —, mas para não ser arrastado pela tempestade que, do lado de fora da sala de aula, não dá trégua. É a capacidade de abrir o guarda-chuva e seguir, mesmo com os pés molhados; é a consciência de que meu papel é ensinar, guiar, apoiar "dentro do meu escopo de trabalho". Problemas que transcendem isso — a fome em casa, a violência, as complexas questões psicológicas — são reais, urgentes, mas não podem se tornar inteiramente "meus" fardos, sob pena de adoecer e não conseguir mais ser útil — nem para mim, nem para eles.

Conseguir "virar as costas", nesse sentido, não é frieza; é um ato de autopreservação. É reconhecer que não sou um salvador universal, mas um profissional com um papel específico e, sim, com limites. O estudo dizia que, por mais difícil e contraintuitivo que pareça, esse é o profissional que paga um preço menor pela intensa carga emocional da docência. Quando o emocional se esgota, quando a cerca é derrubada, o corpo cobra em juros altos: crises de pânico, depressão, afastamentos sucessivos, olhares vazios que já não conseguem mais ler nem o próprio nome na lousa. Ensinar não deve custar a alma.

Esse estudo é um alerta gigante, um grito silencioso sobre o custo humano da nossa profissão. Ele nos obriga a encarar uma verdade incômoda: o modelo de professor que se entrega por completo, sem filtros, sem limites, está em risco constante de adoecimento grave. Não sei se a resposta é simplesmente "limitar a empatia" — isso parece contrariar a essência do cuidar, que também é parte do educar, e que se emociona genuinamente quando Mateus consegue sua primeira entrevista de emprego ou quando Luiza finalmente compreende um teorema. Mas sei que precisamos, com urgência, discutir as condições de trabalho, o apoio psicológico disponível nas escolas, a formação que nos ajude a construir limites saudáveis sem perder a conexão humana.

Ao final desta crônica, sinto a amargura de uma verdade difícil, mas necessária. O estudo não condena a empatia — revela o quão perigoso é exercê-la sem estrutura de apoio adequada e sem os limites necessários à sobrevivência emocional na arena escolar. O alerta é para a instituição, para a sociedade, para nós mesmos: a profissão docente está adoecendo, e talvez a forma como a idealizamos — exigindo entrega total e ilimitada — seja parte do problema. Precisamos de resiliência, sim, mas de uma resiliência que seja fruto de um sistema que apoia, que oferece recursos, e não de um isolamento emocional que, embora protetor, soa solitário. Que esse estudo, por mais duro que seja, nos leve a construir uma docência onde compaixão e saúde caminhem juntas, e não em rotas de colisão. Que sejamos luz, sim — faróis que guiam no caminho do saber —, mas não velas que queimam até desaparecer, deixando apenas o rastro de cera e um silêncio de exaustão.



Minha crônica "A Exaustão de Amar Demais" é um relato muito poderoso sobre os desafios emocionais da docência e nos oferece um excelente ponto de partida para discussões sociológicas sobre trabalho, saúde mental e instituições. Com base nas minhas reflexões, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto descreve o "peso invisível e denso das vidas" dos alunos como parte da profissão docente. Como a Sociologia analisa o conceito de "trabalho emocional" em profissões que lidam diretamente com pessoas e suas dificuldades, e qual o impacto desse tipo de trabalho na saúde e no bem-estar dos profissionais, como os professores?

2. A crônica contrapõe a imagem idealizada do professor como um "santo" totalmente dedicado à conclusão de um estudo que aponta a necessidade de "limites" e "distância afetiva" para a sobrevivência na carreira. Como a Sociologia estuda a tensão entre as expectativas sociais sobre um profissional e a realidade prática do seu trabalho, especialmente em ocupações de cuidado?

3. O narrador fala sobre o adoecimento e o "esgotamento" (burnout) como consequências do excesso de entrega emocional sem limites. De que forma a Sociologia entende o burnout não apenas como um problema individual, mas como um fenômeno social e institucional relacionado às condições de trabalho, à organização das tarefas e à cultura da profissão?

4. O texto sugere que a capacidade de "virar as costas" metaforicamente para problemas que transcendem o escopo do professor é um ato de "autopreservação". Como a Sociologia analisa as estratégias que os indivíduos desenvolvem para gerenciar as demandas de seu trabalho e proteger sua saúde mental em ambientes profissionais desafiadores?

5. A crônica conclui apontando a necessidade urgente de "condições de trabalho", "apoio psicológico" e "formação para limites saudáveis" como soluções para o mal-estar docente. Como a Sociologia compreende o papel das instituições e das políticas de apoio na promoção da saúde e da sustentabilidade da carreira de profissionais em áreas de alta carga emocional?

segunda-feira, 5 de maio de 2025

A Verdadeira Construção da Autoestima ("Mar calmo nunca fez bom marinheiro." — Provérbio popular)

 







A Verdadeira Construção da Autoestima ("Mar calmo nunca fez bom marinheiro." — Provérbio popular)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Naquela manhã comum, vi um garoto se olhar no espelho do banheiro da escola. Nenhuma vaidade saltava dali. Era como se, ao ajeitar a gola da camiseta, tentasse encontrar um pouco de ordem na bagunça que sentia por dentro. O gesto foi breve, mas permaneceu comigo o dia todo. Talvez porque, naquele simples movimento, estivesse condensada uma das maiores inquietações da adolescência: quem sou eu nesse mundo que me olha tanto, mas me vê tão pouco?

Para muitos, a escola se tornou um palco improvisado para a construção de identidades ainda em esboço. Os alunos chegam com figurinos emprestados, roteiros mal escritos e uma plateia mais distraída do que compreensiva. E nós, professores, seguimos ensaiando cenas de acolhimento, acreditando – ou fingindo crer – que bastam dinâmicas afetivas para salvar o que foi negligenciado fora dali.

Durante uma reunião pedagógica, a coordenadora anunciou, com entusiasmo, um novo projeto de fortalecimento da autoestima estudantil, repleto de rodas de conversa, murais de gratidão e meditações guiadas. Observei os rostos ao meu redor, tão esperançosos, e percebi o quanto nos agarramos a iniciativas simbólicas para enfrentar o que, no fundo, sabemos ser estrutural. Disse, meio contrariado, que a escola não pode ser o centro gravitacional da vida emocional dos alunos. Fui alvo de olhares reprovadores. Mas mantive o que disse.

A verdade é que, por mais que tentemos, a escola não consegue proteger os estudantes dos ventos que sopram de fora. E são ventos fortes. Famílias desajustadas, redes sociais implacáveis, padrões inalcançáveis de beleza, comparações cruéis, silêncios doídos. A autoestima, ao contrário do que dizem alguns cartazes coloridos nos corredores, não nasce de elogios fáceis. Ela floresce do enfrentamento – da conquista suada, da frustração elaborada, do orgulho que surge quando alguém percebe que superou a si mesmo.

Lembro de Julius, um aluno que escrevia contos maduros, muito além de sua idade. Vivendo entre dois lares em conflito, ele zombava de nossas tentativas de fazê-lo “falar sobre seus sentimentos”. Um dia, me disse com amargura: “Não preciso de outro adulto me dizendo que tudo vai melhorar. Preciso de alguém que reconheça que algumas coisas não melhoram – e, mesmo assim, a gente segue.”

A escola pode ser um ponto de apoio, um farol em meio à neblina, mas não um abrigo eterno. Se insistimos em ser o colo que embala todas as dores, em vez de o impulso que lança, acabamos por infantilizar os jovens e empobrecer a própria educação. Educar não é anestesiar, é preparar para o corte da vida.

Outro dia, observei dois alunos tímidos explicando seu projeto de ciências num evento do Ensino Médio. Começaram hesitantes, tropeçando nas palavras, mas, ao final, responderam perguntas com a segurança de quem enfrentou o medo e venceu. Ali estava a verdadeira construção da autoestima: não no tapinha nas costas, mas no suor das mãos que seguravam o microfone.

Émily, aluna do terceiro ano, trabalha nos fins de semana para comprar seus próprios livros. Ela não precisou de sessões de “valorização pessoal”. A força que carrega no olhar veio das escolhas difíceis que já precisou fazer.

Há uma cena que jamais esqueço. Uma professora, emocionada, dizia que certa aluna só encontrava amor dentro da escola. Fiquei calado. Não por indiferença, mas por saber que o afeto escolar, por mais sincero que fosse, não tem força para remendar vazios que nasceram em casa. A escola pode iluminar, sim, mas não substitui a luz que deveria vir do lar.

Hoje, vejo adolescentes se espremendo entre filtros digitais e expectativas desumanas. E lembro daquele menino no espelho. Talvez ele só quisesse saber se ainda era ele mesmo ali refletido. Por isso, minha missão como educador não é lapidar espelhos – é abrir janelas. Mostrar que há um mundo lá fora esperando por quem tem coragem de sair do esconderijo e viver de verdade.

Não, a autoestima não se molda entre quatro paredes. Ela começa quando alguém entende que não precisa ser perfeito para ser inteiro. E é isso que desejo ensinar: que a vida não será fácil, mas pode ser bela. Que não estaremos aqui para salvá-los, mas para caminhar ao lado. E que, mais importante do que oferecer abrigo, é ensinar a construir abrigo próprio.

Porque, no fim, não importa se o autorretrato está bonito. Importa que seja verdadeiro.



Minha crônica é um retrato muito sensível e sociologicamente perspicaz da experiência adolescente e do papel da escola nesse período. Ela nos faz questionar discursos simplistas e olhar para as complexas forças sociais que moldam a identidade e a autoestima dos jovens. Com base nas minhas reflexões, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto começa com a imagem de um adolescente se olhando no espelho, buscando "ordem na bagunça que sentia por dentro" e questionando "quem sou eu nesse mundo?". Como a Sociologia entende o processo de construção da identidade durante a adolescência, considerando a influência das interações sociais, da autoimagem e das expectativas do grupo?

2. A crônica descreve a escola como um "palco improvisado" para a construção de identidades e discute o papel dos professores e projetos. Como a Sociologia da Educação analisa a escola como um espaço de socialização fundamental para os adolescentes, capaz de influenciar sua autoimagem e relações sociais, mas também sujeito a limitações?

3. O narrador menciona os "ventos fortes que sopram de fora", como "redes sociais implacáveis, padrões inalcançáveis de beleza" e "famílias desajustadas". De que forma as pressões sociais externas ao ambiente escolar, transmitidas pela mídia, família e pares, impactam a autoestima e o bem-estar emocional dos adolescentes na sociedade contemporânea?

4. O texto sugere que a verdadeira autoestima nasce do "enfrentamento" de desafios e não de "elogios fáceis". Como a Sociologia compreende a resiliência — a capacidade de lidar e superar adversidades — e qual o papel do apoio social (vindo de diferentes fontes, incluindo a escola) no desenvolvimento dessa capacidade nos jovens?

5. A crônica critica a ideia de que "bastam dinâmicas afetivas" na escola para resolver problemas complexos. Como a Sociologia analisa as abordagens que tendem a individualizar ou simplificar soluções para desafios sociais complexos que, muitas vezes, têm raízes em questões estruturais e sistêmicas?

domingo, 4 de maio de 2025

A Fé Refletida no Espelho: Crônica Sobre Profetas Mirins ("Nós não vemos as coisas como elas são, vemos as coisas como nós somos." — Anaïs Nin)


 

A Fé Refletida no Espelho: Crônica Sobre Profetas Mirins ("Nós não vemos as coisas como elas são, vemos as coisas como nós somos." — Anaïs Nin)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Sentei-me diante da tela, distraído, numa manhã qualquer, quando um vídeo começou a rodar sozinho. Era uma criança — talvez nove, dez anos — em cima da calçada, na rua, gritando palavras com a força de quem já sofreu demais, embora a vida ainda nem tivesse tido tempo de machucá-la direito. Ao redor, adultos choravam, tremiam, erguiam as mãos ao alto como se tivessem reencontrado algo que há muito haviam perdido. Aquilo me fisgou. Não pelas palavras — frases recheadas de esperança, vitória, bênçãos que logo viriam —, mas por quem as dizia: uma menina de vestido rodado e voz aguda, segurando o microfone como se empunhasse uma espada contra o mundo.

No dia seguinte, procurei outros vídeos. Apareceu um menino, Miguel, de olhos acesos e voz surpreendentemente grave. Já tinha visto a Vitória Souza, com seu sorriso cativante e suas mensagens de superação. Não demorei a perceber: esses pequenos pregadores surgem como lampejos num mundo exausto. Falam com uma convicção assustadora sobre escolhas, promessas e castigos, ou com analogias simples sobre prosperidade e bênçãos que logo virão. Em um tempo em que os adultos se sentem cada vez mais perdidos, talvez seja reconfortante ouvir a fé na boca de quem ainda não se contaminou com as dúvidas da vida adulta. Eles falam de milagres como quem conta histórias da escola. Carregam no tom de voz uma certeza que nem os profetas antigos ousariam ter.

Mas, o que mais me inquieta — e talvez seja o cerne desse fenômeno — não é o conteúdo em si, e sim o contexto: a plateia adulta. Uma plateia, muitas vezes quebrada por dentro, que olha para essas crianças como se fossem oráculos. A emoção que se acende em tantos adultos — lágrimas nos olhos, arrepios na espinha — talvez revele mais sobre nós do que sobre eles. Estaríamos buscando, na pureza da infância, uma validação para nossas próprias crenças? Queremos, na voz de uma criança, a confirmação de que estamos no caminho certo, de que "vai dar certo"?

A performance vira culto, o culto vira espetáculo, e o espetáculo, alívio. Vitória Souza, com suas analogias e linguagem acessível, transforma o ato religioso em um show motivacional, moldado ao ritmo frenético das redes sociais, onde o conteúdo é consumido de forma rápida e emocional. Miguel, com sua erudição precoce, atrai pela novidade — talvez pelo desejo de encontrar "novas vozes", o que denuncia certa insatisfação com as lideranças tradicionais. A adesão a essas pregações, com milhões de visualizações e comentários, parece sintoma claro de uma sociedade em busca de sentido e pertencimento em tempos de incerteza. É como se a figura do profeta mirim preenchesse vazios existenciais, oferecendo uma narrativa de esperança e direção.

Mas, será mesmo fé o que estamos assistindo? Ou seria apenas um espelho voltado para nossa própria carência? Esses profetas mirins, quer queiramos ou não, são espelhos. Refletem nossa busca por sentido e pertencimento, nossa necessidade de esperança em um mundo complexo e, por vezes, assustador. A forma como consumimos seus discursos, como nos emocionamos com suas palavras, diz muito sobre nossa imaturidade emocional e nossa indisposição — ou não — para lidar com a complexidade da fé e da vida. Eles não revelam a pureza da Fé, mas escancaram, com crueldade, a imaturidade de uma sociedade que, muitas vezes, prefere a segurança da obediência ao desconforto da Liberdade — que busca respostas fáceis e confortantes em vez de questionar e enfrentar o que realmente importa.

Essas crianças não são culpadas. Estão apenas repetindo o que viram, o que ouviram, o que se espera delas. São sementes lançadas sobre um solo rachado de dúvidas, num sistema em colapso. O que me preocupa, o que realmente me inquieta, são os adultos ao redor. Esses, sim, deveriam estar guiando (nas escolas, nas ruas e nos campos) — e não sendo guiados pela voz, por vezes ensaiada, da infância.

Hoje, ao ver mais um desses vídeos circulando com milhões de visualizações — desta vez, João Vitor Ota —, eu não consegui clicar. Apenas respirei fundo. Porque entendi que o que me comoveu naqueles primeiros vídeos, e o que me perturba nesses fenômenos, não é a fé da criança — é a desesperança dos adultos. É essa busca desenfreada por algo que preencha um vazio, que nos diga que "vai dar certo", sem exigir de nós o esforço necessário para construir esse "certo" na realidade dura e complexa da vida adulta.

Não há respostas fáceis. Mas, é essencial que nós, adultos — consumidores e promotores desse conteúdo —, nos façamos essas perguntas: o que estamos realmente buscando? O que essas crianças, com suas vozes poderosas, dizem sobre nós, sobre nossa carência, nossa ânsia por validação, nosso fascínio pelo espetáculo? Será que, ao ouvirmos profecias com voz de criança, estamos tentando redimir nossas próprias perdas ou apenas buscamos, no eco da inocência, uma desculpa para não enfrentarmos as perguntas que a vida adulta já nos obrigou a fazer?

Porque, no fim das contas, o que vemos em seus olhos e ouvimos em suas palavras não é apenas fé. É, inegavelmente, o reflexo de nós mesmos — de nossas fraquezas e anseios projetados em pequenos púlpitos improvisados ou não.


https://www.youtube.com/watch?v=sTwyuMQKE5s&ab_channel=Mulheres (Acessado em 04/05/2025)


Como seu professor de Sociologia, minha crônica "A Fé Refletida no Espelho" é um material fascinante para pensarmos as dinâmicas sociais, religiosas e culturais da nossa época. Ela nos convida a olhar para além do que se vê e a questionar o porquê de certos fenômenos ganharem destaque. Com base nas suas ideias, formulei 5 questões discursivas simples:


1. O texto descreve adultos que se emocionam e buscam "sentido e pertencimento" e "esperança" em "profetas mirins". Como a Sociologia entende a busca por respostas religiosas ou espirituais em tempos de incerteza social e o papel das figuras carismáticas (mesmo que crianças) nesse processo?

2. A crônica aponta que as pregações se tornam "espetáculo motivacional" adaptado para redes sociais. De que forma a Sociologia da Religião e a Sociologia da Mídia analisam como as formas de expressar e consumir a fé se transformam na sociedade contemporânea, influenciadas pelas lógicas da mídia e do consumo?

3. O narrador sugere que o fenômeno reflete a "imaturidade emocional" de uma sociedade que busca "respostas fáceis e confortantes". Como a Sociologia pode investigar e discutir as características de uma sociedade que parece priorizar o alívio emocional imediato e a busca por certezas rápidas em detrimento da complexidade da vida e da fé?

4. A crônica vê as crianças como "espelhos" que refletem as necessidades e carências adultas. Como a Sociologia entende a relação entre as experiências e buscas individuais dos adultos e os fenômenos sociais e culturais que ganham popularidade (como o dos profetas mirins)?

5. O texto menciona a busca por "novas vozes" religiosas, o que pode indicar insatisfação com as lideranças tradicionais. Como a Sociologia analisa as mudanças nas práticas e instituições religiosas e as razões sociais que levam as pessoas a procurarem novas formas de vivenciar ou expressar sua fé?

sábado, 3 de maio de 2025

Sementes do Amanhã ("Onde a palavra falha, a violência começa." — Atribuído a Sigmund Freud)


 

Sementes do Amanhã ("Onde a palavra falha, a violência começa." — Atribuído a Sigmund Freud)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Não foi no portão da escola, tampouco num corredor de sala de aula, que me deparei com a cena. Foi na tela fria do celular, numa manhã de quinta-feira, enquanto o café esfriava na xícara. A manchete cravou-se nos olhos como um estilhaço: "Mãe de aluna agride diretora em escola de Salvador; profissional levou murro e teve cabelos arrancados." Cliquei. Vi. E o que vi não saiu mais de mim.

A imagem mostrava uma mulher entregando um bebê a alguém fora do enquadramento, como quem sabe exatamente o que está prestes a fazer. Precisava das mãos livres. Em seguida, partiu para cima da diretora com socos e empurrões. A educadora, Ticiane Oliveira Sampaio, caiu ao chão. As agressões continuaram: tapas, puxões, cabelos arrancados. Uma cena crua, silenciosa, captada pelas câmeras de segurança de um Centro Municipal de Educação Infantil ironicamente chamado “Semente do Amanhã”.

Naquele instante, caiu mais do que uma diretora. Caiu um símbolo — o da escola como espaço seguro. Vi ruir, ali, a frágil muralha que ainda protege o professor da violência que ronda as ruas. O vídeo doeu em quem, como eu, já pisou em sala de aula com o coração cheio de ideal e a cabeça cheia de boletins.

Soube depois, pelas reportagens, que a agressão teve origem em uma suspeita: a filha da agressora aparecera com um machucado no rosto. A diretora, seguindo os protocolos, registrou o ocorrido. A mãe, revoltada, acusou: "Você induziu minha filha a dizer que eu bati nela." Ela não quis se identificar, mas deu sua versão: alegou arrependimento e disse ter perdido o controle ao se sentir pressionada. Mas o controle, nesses tempos, parece ter deixado de ser prática para se tornar luxo — sobretudo quando a violência se naturaliza e a palavra falha como mediação.

Não faltaram versões: de um lado, a diretora com duas décadas de carreira na educação pública, elogiada por sua dedicação; do outro, uma mãe com o rosto tenso e o olhar perdido, dizendo que não teve intenção, que se deixou levar. E entre as narrativas, uma criança — silenciosa, talvez assustada — cuja dor deu origem ao confronto, mas cujas marcas psicológicas talvez ainda estejam por vir.

A escola onde tudo aconteceu localiza-se no bairro do IAPI, em Salvador — um território marcado por lutas diárias, onde a instituição pública de ensino é, muitas vezes, a única ponte entre o presente precário e um futuro possível. Mas que futuro se constrói quando o próprio espaço educativo é invadido pela lógica da violência? Que semente germina nesse solo? Que aprendizado se extrai quando, em vez do diálogo, a agressão se impõe como linguagem?

A Secretaria de Educação emitiu nota de apoio à servidora. Os jornais informaram que o caso foi registrado na delegacia e que uma investigação por lesão corporal foi instaurada. Tudo conforme o protocolo. Tudo redigido em tom burocrático, com verbos como "rechaça" e "lamenta", enquanto a realidade escancara: não é de agora que os profissionais da educação têm sido expostos, vulneráveis, desamparados.

Na fila do supermercado, ouvi duas mulheres comentarem o caso. Uma insinuava que há diretores que “abusam do poder”; a outra chamava a mãe de “louca”. Simplificações que nos impedem de enxergar a complexidade. Porque não se trata apenas de certo ou errado, vilão ou vítima. Trata-se de um sistema em colapso, onde o cansaço emocional, a pressão social, a desigualdade e a falta de escuta produzem combustões que não deveriam explodir no chão de uma escola.

Antes de dormir, revisitei a manchete. O vídeo já havia se espalhado. Nos comentários, um tribunal virtual julgava com fúria, sem tempo para nuances. Penso na criança com o machucado no rosto. Que tipo de lição ela aprendeu? Que adultos gritam, se agridem, e depois se arrependem? Ou que o conflito não precisa ser resolvido com gritos e socos?

Desliguei o celular e olhei pela janela. Em algum lugar de Salvador, uma diretora tenta dormir com o corpo dolorido e a alma ainda mais. Uma mãe revê os próprios atos com o peso do remorso. E uma criança, talvez, desenha uma escola onde o medo não entra, onde as palavras são maiores que os punhos, onde o amanhã é realmente semente de algo melhor.

E eu, mero espectador, me pergunto: que escola temos deixado para germinar? E o que, de fato, estamos colhendo?


https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2025/05/01/mae-de-aluna-agride-diretora-em-escola-de-salvador.ghtml (Acessado em 03/05/2025)


Como seu professor de Sociologia, minha crônica é um ponto de partida muito forte para analisarmos questões sociais complexas que se manifestam no cotidiano escolar. A violência narrada na notícia nos permite discutir temas como segurança, o papel da escola na sociedade e as tensões sociais. Com base nas suas ideias, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto descreve a violência ocorrendo na escola, um espaço que idealmente seria seguro. Como a Sociologia explica por que atos de violência que existem na sociedade podem acabar invadindo ou se manifestando dentro de instituições como a escola?

2. A crônica fala da escola como um "símbolo" e "espaço seguro" que é violado pela agressão. Qual a importância sociológica da escola como uma instituição social com um papel e um significado específicos na comunidade, e como incidentes de violência podem afetar essa imagem e a confiança das pessoas nela?

3. O narrador sugere que a violência aconteceu onde "a palavra falha como mediação". De que forma a Sociologia estuda os processos de comunicação e resolução de conflitos em diferentes grupos sociais e quais as consequências sociais quando o diálogo não funciona e a violência se torna a forma de expressão?

4. A crônica menciona o bairro onde a escola se localiza como um lugar de "lutas diárias" e fala em "pressão social" e "desigualdade". Como os problemas sociais e econômicos presentes em uma comunidade podem estar relacionados a tensões e conflitos que se manifestam no dia a dia, incluindo no ambiente escolar?

5. O texto é baseado na notícia e na forma como o evento foi divulgado e comentado publicamente. Como a Sociologia da Mídia entende a maneira como as notícias sobre violência são construídas e consumidas pela sociedade, e como essa circulação de informações pode influenciar a percepção pública sobre a segurança nas escolas e o trabalho dos educadores?