"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

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MINHAS PÉROLAS

segunda-feira, 19 de maio de 2025

A Panela de Pressão da Inclusão ("Não há ninguém mais escravo do que aquele que se considera livre sem o ser." — Johann Wolfgang von Goethe)

A Panela de Pressão da Inclusão ("Não há ninguém mais escravo do que aquele que se considera livre sem o ser." — Johann Wolfgang von Goethe)


Por Claudeci Ferreira de Andrade

Não sei exatamente quando a escola deixou de ser um espaço de descobertas e se transformou num campo minado. Um lugar onde se pisa com medo, se fala com cautela e se escuta com dor. Mas foi ali, diante de uma sala cheia e de um coração vazio, que percebi: a palavra “inclusão” pode se tornar um fardo pesado quando não vem acompanhada de estrutura, diálogo e respeito.

Lembro-me com nitidez de uma banca de mestrado que me marcou profundamente. A candidata era Adriana Ellen. Ela começou contando a história de uma amiga professora, encarregada de acompanhar um aluno autista. A criança não entrava na sala, gritava, agredia. E a professora, sem apoio, afundava lentamente em frustração e culpa. No fim da apresentação, a máscara caiu: — “Aquela professora era eu.” A voz embargada revelava não apenas o desabafo, mas a vergonha silenciosa de quem acreditou que sua dor era sinônimo de fracasso.

Foi ali que o silêncio que pairava na sala ganhou voz. A vergonha de Adriana não era por ter sofrido, mas por ter sido levada a crer que seu sofrimento a tornava menos capaz, menos humana, menos “includente”. E é justamente aí que a discussão deveria começar — mas quase nunca começa. O sistema prefere apontar dedos. Quem ousa dizer que a inclusão, da forma como está sendo conduzida, não funciona, é rapidamente rotulado como insensível, desumano, inimigo do amor. O discurso dominante é implacável: — se você não consegue incluir, o problema está em você — e ponto final. Ninguém questiona a falta de preparo, a ausência de apoio técnico, o abandono institucional.

Adriana, no entanto, decidiu seguir outro caminho. Em vez de reforçar a culpa, buscou compreender. Foi até a escola onde realizou sua pesquisa e quis ouvir quem fazia a inclusão dar certo. Ela procurava pelos “melhores professores de inclusão”. Entrevistou-os. Escutou desabafos. E ouviu o impensável: — “É por isso que todo mundo se revolta com a inclusão.” Disse isso um professor tido como referência na escola. Não se tratava de rejeição aos alunos nem aos seus direitos. Era um grito abafado contra a solidão, contra o peso que carregamos sem ferramentas, sem orientação, sem escuta.

Essa realidade ecoa por toda parte. Continuou Adriana: — "Lembro-me de uma visita a outra escola, não muito tempo atrás. A diretora, orgulhosa, me apresentou à professora que chamava de “modelo em inclusão”. Em voz baixa, isolada no canto da sala dos professores, ela me confessou: “É por isso que todo mundo se revolta com a inclusão.” A mesma frase, a mesma dor. E era justamente a melhor, quem a proferia.

Enquanto isso, nas universidades — que deveriam ser o pulmão do pensamento crítico, o lugar da confrontação das ideias, do teste de modelos e da busca por soluções reais — reina um silêncio confortável. O debate desapareceu, substituído por slogans. “A inclusão está funcionando.” “O problema é o preconceito.” “É só ter amor no coração.” Medir resultados virou pecado. Questionar virou crime. A academia acena de longe, iludida por um ideal que não resiste ao contato com a realidade.

O que se vive nas salas de aula é outra coisa. É exaustão. É sobrevivência. Numa manhã qualquer, na sala dos professores, observei os rostos cansados dos meus colegas. Perguntei a Helena, mexendo seu café com desânimo: — “Como está a turma do 3º ano 'A'?” Ela respondeu com um sorriso triste: “Sobrevivendo.” E é isso que estamos fazendo. Não educando. Não realizando sonhos. Apenas sobrevivendo. Esmagados entre expectativas inalcançáveis, falta de recursos e o silêncio covarde que tomou conta da educação.

A escola virou uma panela de pressão. E o balão está inflando. A cada dia, a pressão aumenta. A cada semana, mais professores desistem. A ruptura não é uma hipótese: é uma certeza. E quando estourar — porque vai estourar — será da pior forma. Virá alguém com uma proposta radical: — “Acabem com a inclusão. Mandem todos para casa.” E muitos, exaustos, sem mais forças para resistir, vão concordar.

O mais assustador não é a possibilidade de retrocesso. É o vazio do debate. A ausência de coragem para encarar os fatos. Precisamos de dados reais, escuta mútua, alternativas práticas. Precisamos confrontar ideias sem medo de parecer duros. A verdadeira inclusão não nascerá do conforto, mas do desconforto que nos faz agir.

Caminho pelos corredores da escola todos os dias e vejo olhares perdidos — não apenas de alunos com deficiência, mas também dos colegas professores, dos funcionários. Estamos todos navegando num mar de incertezas, sem mapa nem bússola. No fim do dia, quando o silêncio toma conta do prédio e o peso do que vivemos ainda ecoa, me sento e me pergunto: até quando vamos fingir que tudo vai bem?

Já chorei no carro antes de entrar na escola. Já me perguntei se o problema era eu. Já calei para não ser taxado de insensível. Mas hoje escrevo. Porque acredito que ainda há tempo. Porque talvez alguém, ao ler isso, se reconheça, e entenda que não está sozinho. E porque, no fundo, toda crônica é um pedido: que a realidade seja, ao menos uma vez, mais importante do que o discurso.



Como um bom professor de sociologia, compreendo a urgência e a profundidade de bom texto sobre a inclusão na educação. Minha crônica levanta questões sociais cruciais que merecem ser debatidas. Baseado nas ideias principais de meu desabafo, preparei 5 questões discursivas simples para estimular a reflexão sociológica:


1. A crônica descreve a "vergonha silenciosa" de professores que se sentem fracassados diante dos desafios da inclusão, mesmo sem apoio institucional. Como a Sociologia da Educação analisa a "culpabilização individual" de profissionais em vez de focar nas "falhas estruturais" do sistema educacional?


2. O texto evidencia um contraste entre o "discurso dominante" sobre a inclusão ("é só ter amor no coração") e a "realidade" vivida nas escolas. De que forma a Sociologia estuda a "ideologia" por trás das políticas públicas e como ela pode se distanciar da "práxis" social, gerando frustração e resistência?


3. Eu menciono que as "universidades" deveriam ser o "pulmão do pensamento crítico", mas parecem distantes do debate real sobre a inclusão. Como a Sociologia das Instituições analisa o papel da academia na "produção de conhecimento" e na "formulação de políticas públicas", e por que ela pode falhar em responder às "demandas urgentes" do "chão da escola"?


4. A metáfora da escola como "panela de pressão" e o "balão que está inflando" ilustram a crescente exaustão dos professores. Discuta, sob a ótica sociológica, as condições de trabalho" e a "saúde mental" dos educadores, relacionando-as com as políticas de inclusão sem o devido suporte e recursos.


5. A crônica prevê uma "ruptura" e a ascensão de propostas radicais como "Acabem com a inclusão. Mandem todos para casa." Como a Sociologia dos Movimentos Sociais e da Mudança Social interpreta as "revoltas" e "resistências" que surgem quando as tensões sociais atingem um ponto crítico, especialmente em relação a direitos e políticas progressistas como a inclusão?

domingo, 18 de maio de 2025

A Máquina na Cátedra: Crônica de um Ensino sem Alma? ("A inteligência artificial molda o boneco de barro, enquanto o professor sopra em suas narinas, transformando-o em uma alma vivente." — CiFA)

 

A Máquina na Cátedra: Crônica de um Ensino sem Alma? ("A inteligência artificial molda o boneco de barro, enquanto o professor sopra em suas narinas, transformando-o em uma alma vivente." — CiFA)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Era uma tarde nublada de fevereiro quando a desconfiança começou a tomar forma. A aula de Comportamento Organizacional transcorria como de costume — uma mistura de frases motivacionais, exemplos batidos e um entusiasmo artificial. Na terceira fileira, uma estudante folheava os slides no Canvas, à procura de algo que valesse a pena anotar. Foi então que a frase surgiu, discreta, mas dissonante: “Expandir todas as áreas. Seja mais detalhado e específico.” Aquilo não era um recado para os alunos. Era uma instrução típica de prompt — não para humanos, mas para máquinas. Mais precisamente, para o ChatGPT. Um frio percorreu-lhe a espinha. A sensação era a mesma de flagrar um professor colando durante a própria aula. Incrédula, digitou uma mensagem para um colega da turma, em busca de confirmação: — Você viu as anotações no Canvas? Ele fez com o ChatGPT. A resposta veio rápida e entrecortada: — Meu Deus, pare. Mas que diabos? A indignação que cresceu entre eles não se devia apenas ao uso da IA. O que os feriu foi o contexto. Aquele era o mesmo professor que, com voz firme, insistia: “Formamos líderes, não reprodutores de conteúdo. Nada de IA nos trabalhos.” Agora, percebia-se, o atalho era privilégio de quem ensinava. Nos dias que se seguiram, a estudante investigou. Revisitou materiais antigos, analisou apresentações anteriores. Os sinais se multiplicavam. Textos excessivamente polidos, frios. Imagens genéricas — mãos sobre teclados, rostos sorridentes sem vida. Aulas que mais pareciam saídas de um banco de dados. Aquilo não era improviso. Era padrão. E estavam pagando caro por ele. O curso, vendido como uma “experiência transformadora”, revelava-se uma performance automatizada. A promessa de formação crítica naufragava diante de um conteúdo mecânico e impessoal. O sentimento de traição tornou-se inevitável. Ela então decidiu agir. Protocolou uma reclamação formal à universidade — não por vingança, nem por revolta passageira, mas por princípios. Solicitou o reembolso: mais de oito mil dólares. Um gesto simbólico. Se a educação estava sendo terceirizada, não valia o que cobravam. E ela não estava sozinha. Em outras universidades, relatos semelhantes começaram a surgir. Estudantes atentos, decepcionados, identificavam o mesmo padrão: professores utilizando IA para corrigir trabalhos, redigir tarefas, enviar e-mails genéricos — até mesmo mensagens de empatia após tragédias no campus. A “cultura do cuidado”, como se dizia, estava sendo digitada por algoritmos. Vieram então as justificativas. Docentes alegavam sobrecarga. Diziam que a IA apenas acelerava o operacional, que o conteúdo era o que importava, não sua origem. Argumentos razoáveis — até certo ponto. Mas havia uma linha que não podia ser cruzada: a da presença humana. Educar não era apenas informar. Era escutar, responder, perceber a sutileza de um olhar, o silêncio de uma dúvida. Era dizer, com verdade: “Li o que você escreveu. Isso me tocou.” E nenhuma inteligência artificial, por mais avançada, era capaz de replicar essa conexão. A estudante lembrava-se com carinho de um antigo professor, desses que marcam a trajetória de um aluno. Ele costumava dizer: “O valor do professor está em se deixar afetar pelos alunos. O resto é técnica.” Só agora ela compreendia o peso dessas palavras. A IA podia até ajudar — mas jamais substituir o humano. Outros casos continuavam a emergir. Uma aluna descobriu, por acidente, que os elogios recebidos em sua redação vinham de uma conversa colada com o ChatGPT: “faça um bom feedback para essa aluna.” Em vez de reconhecimento, sentiu-se invisível. As universidades, surpreendidas, começaram a reagir. Protocolos foram atualizados, códigos de ética redigidos às pressas. Mas o estrago já estava feito. Um dos episódios mais simbólicos envolveu um massacre universitário. A direção enviou e-mails automatizados de condolência, gerados por IA. A intenção era consolar. O resultado foi indignação. Afinal, até a dor estava sendo terceirizada? Alguns docentes tentaram resgatar a dignidade do processo. Buscaram formas conscientes de usar a IA como apoio técnico, sem abrir mão do vínculo com os alunos. “A conexão é insubstituível”, diziam. Mas era impossível ignorar o avanço silencioso da substituição. A presença humana tornava-se exceção. Naquele curso específico, o caso foi encerrado de forma burocrática. O professor admitiu o uso da IA. A universidade considerou a queixa procedente. Protocolos foram ajustados. Mas a estudante sabia: a lição ultrapassava os papéis assinados. Não se tratava de demonizar a tecnologia. Ela podia ser útil — talvez até inevitável. Mas não havia algoritmo capaz de substituir um professor inteiro, presente, vulnerável e atento. Pedir o dinheiro de volta foi um gesto de protesto. O que ela realmente queria era o tempo de volta — o tempo desperdiçado em aulas ocas, em relações frias, em simulações de ensino. O que ela exigia era humanidade. Porque só quem se importa com o que aprende exige que, do outro lado, exista alguém que também se importe em ensinar. E esse tipo de presença — viva, atenta, verdadeira — nenhuma máquina é capaz de entregar. https://www.estadao.com.br/link/cultura-digital/meu-professor-da-faculdade-usou-o-chatgpt-para-fazer-uma-aula-e-eu-pedi-meu-dinheiro-de-volta/ (Acessado em 18/05/2025)

Minha crônica "A Máquina na Cátedra" é um relato instigante e crucial sobre as transformações que a inteligência artificial está provocando no universo da educação e nas relações entre professores e alunos. Eu tento capturar a essência da inquietação diante da aparente substituição do elemento humano pela eficiência algorítmica. Vejo em meu texto um excelente ponto de partida para debatermos as implicações sociais dessa nova realidade. Com base nas ideias principais, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto descreve a surpresa e a indignação da estudante ao descobrir que o professor usou IA para materiais de aula e feedback, contrastando com a proibição para os alunos. Como a Sociologia analisa a questão da "hipocrisia institucional" e das "normas sociais" conflitantes no ambiente educacional, especialmente quando regras sobre o uso de tecnologia parecem se aplicar de forma diferente a professores e alunos?

2. A crônica enfatiza que o valor da educação reside no "feedback humano", na "conexão" e na "presença" do professor, algo que a IA parece não replicar. Como a Sociologia compreende o "papel do professor" para além da transmissão de conteúdo, focando na construção de "capital social", na "interação" e no impacto da "presença humana" no processo de ensino-aprendizagem?

3. O texto menciona que os alunos estão pagando caro por uma "experiência transformadora" que se revela uma "performance automatizada". Como a Sociologia analisa a "comodificação da educação superior", onde a relação estudante-instituição pode se aproximar de uma relação "consumidor-fornecedor", e como a introdução da IA pode exacerbar essa percepção de desvalorização da experiência humana?

4. A crônica aborda o desafio das universidades em criar "diretrizes éticas" para o uso da IA. Como a Sociologia estuda a "resposta institucional" e a "construção de normas éticas" em face de "rápidas transformações tecnológicas", considerando as tensões entre inovação, regulamentação e a preservação de valores fundamentais (como a autenticidade e a confiança) nas relações sociais?

5. O texto levanta a questão do impacto da IA no futuro da profissão docente, incluindo o papel dos assistentes de ensino. Como a Sociologia analisa as "transformações no mundo do trabalho" e nas "profissões" causadas pela "automação" e pela IA, e quais implicações isso pode ter para a formação, a identidade e as relações de trabalho dos educadores?

sábado, 17 de maio de 2025

Meritocracia na Educação: Por que o foco na equidade atrasa o desenvolvimento? (A obsessão pela igualdade de resultados frequentemente sacrifica a excelência e impede o progresso coletivo." — Thomas Sowell)

 





Meritocracia na Educação: Por que o foco na equidade atrasa o desenvolvimento? (A obsessão pela igualdade de resultados frequentemente sacrifica a excelência e impede o progresso coletivo." — Thomas Sowell)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O debate sobre equidade na educação brasileira tem ocupado um lugar de destaque nas políticas públicas, mas frequentemente desvia atenção e recursos do verdadeiro objetivo: elevar a qualidade do ensino para todos. Em um país onde metade das crianças não é alfabetizada na idade adequada e onde figuramos entre os últimos colocados em rankings internacionais de desempenho educacional, o foco excessivo na compensação de desigualdades sociais acaba comprometendo o avanço global do sistema.

A lógica predominante tem sido tratar desiguais de forma igual, numa tentativa de correção histórica que, embora bem-intencionada, gera efeitos colaterais significativos. Como adverte o economista Thomas Sowell (2020, p. 45), "a obsessão pela igualdade de resultados frequentemente sacrifica a excelência e impede o progresso coletivo". Ao priorizar identidades e contextos específicos antes de consolidar um padrão mínimo de qualidade para todos, corremos o risco de perpetuar uma estrutura educacional, marcada por intervenções paliativas e simbólicas, em vez de soluções verdadeiramente estruturantes.

Nesse cenário, a velha metáfora de "fazer o bolo crescer para depois dividi-lo" ressurge como uma proposta válida — não por saudosismo de um pensamento ultrapassado, mas por representar um imperativo lógico na política educacional. Investir, primeiramente, em infraestrutura universal, na formação docente de excelência e em materiais pedagógicos de alta qualidade cria uma base sólida para o sistema. Só então será possível promover ações de equidade que não pareçam favores compensatórios, mas parte de um sistema coeso, eficiente e justo.

Como demonstram estudos recentes, sistemas educacionais bem-sucedidos, como os da Finlândia e da Coreia do Sul, priorizaram a qualidade universal antes de atender às demandas específicas de grupos sociais. Essa abordagem não ignora as desigualdades, mas reconhece que a consolidação de um ensino forte e homogêneo é o primeiro passo realista para superá-las. O psicólogo Steven Pinker (2023, p. 87) afirma: "Em ambientes educacionais onde o mérito é valorizado, observa-se uma elevação do desempenho médio e, consequentemente, uma melhoria nas condições de todos os estudantes".

Em contraste, políticas excessivamente focalizadas tendem a gerar um sistema inchado por programas de inclusão simbólica, que pouco resolvem os problemas centrais da educação. A insistência em currículos fragmentados por identidade, por exemplo, ignora um princípio elementar: a aprendizagem exige esforço, disciplina e metas claras — não apenas adequação ao perfil social do aluno. Como alerta a neurocientista Maryanne Wolf, "privar os alunos de desafios cognitivos em nome da inclusão reduz sua capacidade de pensamento crítico".

O risco de transformar a escola em palco de uma engenharia social é concreto. A vitimização institucionalizada, como observa o sociólogo Olivier Galland, pode comprometer o desenvolvimento da autonomia dos jovens ao induzi-los a uma posição de dependência crônica do Estado. Nas palavras do filósofo Pascal Bruckner, "a cultura da desculpa substituirá a cultura da superação".

Nesse contexto, a equidade não deve ser o ponto de partida, mas sim uma consequência natural de um sistema educacional que valoriza a qualidade, o mérito e a excelência. Antes de oferecer políticas específicas a determinados grupos, é preciso garantir que todas as crianças — independentemente de sua origem — tenham acesso a um ensino verdadeiramente eficiente. A verdadeira injustiça reside na manutenção de um sistema que não entrega sequer o básico a ninguém, e não na ausência de privilégios compensatórios para alguns.

Em suma, a escola precisa ser um espaço de exigência, mérito e desenvolvimento integral. O caminho mais eficiente para combater as desigualdades talvez não esteja na segmentação precoce, mas na universalização da excelência. A equidade só fará sentido se for consequência da qualidade — e nunca sua substituta.



Minha crônica sobre a equidade na educação brasileira é uma análise provocadora que nos convida a questionar abordagens predominantes e a pensar sobre as bases da melhoria educacional. Sua defesa da qualidade e do mérito como elementos centrais para um sistema justo e eficaz oferece ótimos pontos para debate sociológico. Com base nas nessas minhas ideias, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto argumenta que a priorização da equidade pode desviar o foco da qualidade universal na educação. Como a Sociologia analisa a tensão entre a busca por igualdade de oportunidades e a busca por excelência ou qualidade em sistemas educacionais de sociedades com profundas desigualdades sociais?

2. A crônica defende a valorização do mérito e argumenta que ambientes educacionais onde o mérito é valorizado levam à melhoria para todos. Como a Sociologia aborda o conceito de meritocracia no campo da educação, considerando tanto seu potencial para promover mobilidade social quanto as críticas sobre como pode perpetuar desvantagens em contextos de desigualdade estrutural?

3. O texto sugere que focar na equidade antes de consolidar a qualidade gera "intervenções paliativas e simbólicas" e "programas de inclusão simbólica". Como a Sociologia da Educação analisa a eficácia de políticas educacionais focalizadas em grupos específicos em comparação com políticas universais, e os possíveis efeitos simbólicos e práticos dessas diferentes abordagens?

4. A crônica alerta para o risco de "vitimização institucionalizada" e a substituição da "cultura da superação" pela "cultura da desculpa" em abordagens excessivamente focadas na equidade. Como a Sociologia estuda os efeitos sociais e psicológicos (como autonomia, dependência, estigma) de programas sociais e educacionais nas populações a que se destinam?

5. O texto contrapõe a ideia de currículos "fragmentados por identidade" à defesa da "universalização da excelência". Como a Sociologia aborda o debate sobre a construção dos currículos escolares, considerando as pressões para incluir diferentes perspectivas e identidades versus a necessidade de garantir uma base comum de conhecimento e o desenvolvimento do pensamento crítico para todos os estudantes?

quinta-feira, 15 de maio de 2025

O Espetáculo da Humilhação: Crônica de um Conselho de Classe Invertido ("Trate um ser humano como ele é, e ele permanecerá assim. Trate um ser humano como ele pode e deve ser, e ele se tornará o que pode e deve ser." — Johann Wolfgang von Goethe)

 


O Espetáculo da Humilhação: Crônica de um Conselho de Classe Invertido ("Trate um ser humano como ele é, e ele permanecerá assim. Trate um ser humano como ele pode e deve ser, e ele se tornará o que pode e deve ser." — Johann Wolfgang von Goethe)


Por Claudeci Ferreira de Andrade

Nunca fui afeito aos holofotes. Sempre preferi os bastidores, o trabalho silencioso e dedicado que acontece longe dos aplausos e da plateia. Ainda assim, certa manhã, fui lançado ao centro de um palco invisível — e não havia cortina que escondesse o vexame. Estávamos na escola, mas parecia um tribunal. Os gestores à frente, os colegas espalhados pelos cantos da sala ocupada pelos alunos, e, um a um, os professores sendo avaliados ao vivo, sem filtro, sem defesa. A plateia? Os alunos. Os juízes? Também eles.

Foi durante um conselho de classe — que de pedagógico não tinha nada. O formato era peculiar e cruel: chamavam cada professor pelo nome e o expunham diante dos estudantes, que estavam ali não para serem avaliados, mas para avaliar. Subitamente, inverteu-se o papel. Os mestres se tornaram réus. O que se passava ali ultrapassava qualquer senso de razoabilidade profissional.

— "Professor Claudeci, agora é sua vez", anunciou a coordenadora com uma naturalidade perturbadora, como se chamasse alguém para receber um troféu — e não para ser dissecado em praça pública. Era minha vez. Senti como se tivessem puxado o tapete sob meus pés. Subi ao tablado invisível, esperando o veredito. As palavras vieram como balas disfarçadas de pétalas: — “Ele é bonzinho, mas não sabe controlar a turma”, — “Ele é legal, mas as aulas são chatas”, — “Explica, mas ninguém entende”. Tudo isso diante dos colegas, da coordenação, da direção. (Se os alunos se virassem contra a coordenadora ou a direção, certamente esse tipo de conselho já não existiria.)

Meu rosto ardia, minha garganta secava. Alguns alunos me olhavam com indiferença, outros com aquele entusiasmo peculiar de quem se sente, por um instante, com o poder nas mãos. Meus colegas evitavam me encarar — constrangidos, talvez por solidariedade, talvez por medo de que sua vez estivesse próxima. Os gestores anotavam, friamente. Tudo parecia muito normal — menos para quem estava sob julgamento.

Não havia espaço para diálogo, tampouco para contextualização. Nada de escuta pedagógica ou conversa mediadora. Aquilo era um espetáculo de constrangimento, um ritual de humilhação institucionalizada. O professor ali não era visto como educador, mas como animador de auditório — alguém que, para ser considerado competente, deveria arrancar aplausos, elogios ou sorrisos. Esperavam de nós não aulas, mas performances. Que fôssemos fogos de artifício: breves, barulhentos e bonitos. Mas, infalíveis.

O que esperavam de nós? Que fizéssemos elogios a cada cinco minutos? Que transformássemos física quântica em TikTok? Que aplaudíssemos a indisciplina para conquistar carisma? Não é assim que se constrói educação. Não estudamos anos a fio, não nos formamos com esforço e dedicação para virar entretenimento. Somos educadores, não artistas de circo.

Saí daquela sala com um peso no peito difícil de descrever. Não era apenas frustração. Era um sentimento de não pertencimento, de inadequação, de desgaste profundo. Algo havia sido extraído de mim — e não seria facilmente recuperado. A sensação era de esvaziamento da alma, de profunda desvalorização, de vontade de desaparecer.

Ainda hoje, ao recordar aquela experiência, o que sinto não é raiva. É tristeza. Tristeza por mim, pelos colegas, por uma instituição que se diz formadora, mas desumaniza justamente aqueles que mais deveriam cuidar. Porque ser professor é mediar, ensinar, corrigir, apoiar — tarefas complexas, lentas, silenciosas. Não há espetáculo nisso. Há entrega. Há preparo. Há vocação. E isso não se mede em frases soltas ditas por adolescentes empoderados num palco de vaidades.

A pergunta que ainda ecoa é: isso era mesmo legal? Ético? Aceitável? Não seria uma forma de assédio moral velado — ou pior, institucionalizado? Expor um profissional dessa forma, colocando-o diante de uma plateia sem possibilidade de explicação, não é diálogo. É julgamento. Não é pedagogia. É humilhação. Existem, sim, maneiras de colher feedback, de melhorar práticas, de crescer profissionalmente. Mas não à custa da dignidade.

O palco que nos deram não era de teatro. Era de sacrifício. E isso, caro leitor, é tudo o que a educação não deveria ser.

Se você é gestor, pergunte-se: que mensagem está passando aos alunos ao autorizar esse tipo de prática? Que ambiente está construindo? Se é professor e já viveu algo parecido, saiba: você não está sozinho. Seu valor não se mede pelos aplausos que recebe, mas pelas mentes que desperta, pelas dúvidas que incentiva, pelo silêncio que escuta e pela coragem que tem de continuar — mesmo sem plateia.

Porque educar não é entreter. É transformar. E essa transformação exige respeito.

Não há ensino digno onde não há dignidade para quem ensina.

Minha crônica "O Espetáculo da Humilhação" é um relato visceral que nos faz sentir a dor da humilhação e a importância da dignidade profissional na educação. Você expõe uma prática institucional questionável que inverte papéis e desumaniza. Como seu colega de Sociologia, vejo aqui muitos pontos cruciais para a nossa disciplina, que estuda justamente as relações sociais, as instituições e o poder. Com base nas suas reflexões, preparei 5 questões discursivas simples:

1. O texto descreve a escola como um "palco invisível" e "tribunal", onde professores são avaliados publicamente pelos alunos. Como a Sociologia analisa a escola não apenas como um espaço físico, mas como uma "arena social" onde as relações de poder são encenadas e os papéis sociais (como o de professor e aluno) são constantemente negociados e, por vezes, invertidos?

2. A crônica aborda a dor da "dignidade ferida" e a sensação de ser reduzido de "educador" a "animador de auditório". Do ponto de vista sociológico, o que constitui a "dignidade profissional" em uma carreira como a docência, e quais são as consequências sociais e psicológicas quando as práticas institucionais (como a avaliação pública) parecem minar essa dignidade?

3. O texto questiona a prática como um possível "ritual de humilhação institucionalizada" e "assédio moral velado". Como a Sociologia estuda as práticas internas das instituições (como regras, procedimentos e rituais de avaliação) e de que forma essas práticas, mesmo que não intencionalmente, podem reproduzir ou criar dinâmicas de poder e controle que afetam negativamente os indivíduos?

4. A crônica critica o foco da avaliação em "performances" e em ser "bonitinho" em vez da "entrega", "preparo" e "vocação" do professor. Como a Sociologia da Educação analisa os diferentes critérios de avaliação de professores e qual o impacto social e pedagógico de valorizar aspectos performáticos em detrimento da competência técnica, didática e relacional profunda?

5. O texto evidencia uma quebra ou "inversão" na relação tradicional entre aluno e professor no contexto dessa avaliação. Como a Sociologia compreende a relação professor-aluno como uma interação social fundamental na escola, e quais fatores sociais e institucionais contemporâneos podem estar transformando essa relação e os desafios enfrentados por ambos os lados?

quarta-feira, 14 de maio de 2025

O smartphone na escola: ferramenta ou obstáculo? ("A escola que proíbe a tecnologia nega à juventude o domínio crítico de seu tempo." — Henry Jenkins)

 



O smartphone na escola: ferramenta ou obstáculo? ("A escola que proíbe a tecnologia nega à juventude o domínio crítico de seu tempo." — Henry Jenkins)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

A recente tendência de algumas escolas, como na Alemanha, de proibir o uso de smartphones sob o pretexto de mitigar distrações representa uma resposta simplista a um desafio complexo. Essa abordagem anacrônica ignora o fato de que a tecnologia não é, por si só, prejudicial, mas um portal para o universo digital que molda a contemporaneidade e o futuro dos estudantes. Defender sua restrição é negligenciar a missão pedagógica de preparar os jovens para o mundo em que vivem.

Como afirma Henry Jenkins, teórico da cultura participativa, "a escola que proíbe a tecnologia nega à juventude o domínio crítico de seu tempo". O afastamento dos celulares pode até produzir uma calmaria superficial, mas compromete o desenvolvimento da alfabetização digital e da cidadania plena em uma sociedade hiperconectada. Não se trata de ignorar as distrações — que de fato existem —, mas de reconhecê-las como sintomas de metodologias pouco envolventes ou da ausência de autorregulação digital, problemas que o banimento não resolve.

Refutar a proibição significa defender uma integração pedagógica consciente e estratégica. Pesquisas do MIT (Massachusetts Institute of Technology, 2022) indicam que dispositivos móveis, quando bem utilizados, ampliam a colaboração entre os alunos, personalizam o ensino e intensificam o engajamento. O caminho passa por capacitar professores, investir em infraestrutura e utilizar os smartphones como ferramentas de pesquisa, diálogo e acesso a conteúdos atualizados, alinhando-se às práticas profissionais do século XXI.

Além disso, a alegação de que os celulares enfraquecem a interação social ignora a complexidade das relações juvenis na era digital. Como destaca Sherry Turkle, psicóloga do MIT, "o problema não é o celular, mas a ausência de espaços significativos para o diálogo". Proibir o dispositivo não fortalece os vínculos humanos; ao contrário, acentua o abismo entre a escola e a realidade vivida pelos alunos.

Embora seja inegável a necessidade de regulação quanto ao uso excessivo de telas, o sociólogo Boaventura de Sousa Santos adverte: "educar é mediar conflitos culturais, não censurá-los". A resposta adequada, portanto, não está na proibição, mas na formação ética e crítica para o uso consciente da tecnologia, promovendo a autorregulação estudantil. A escola do século XXI precisa abandonar o desejo de controle e o silêncio eletrônico, e assumir, com coragem e lucidez, sua vocação de formar sujeitos autônomos, responsáveis e preparados para o futuro que já começou.




Minha refutação sobre a proibição de smartphones nas escolas é um convite excelente para debatermos o papel da educação e da tecnologia na sociedade contemporânea sob uma ótica sociológica. Eu levanto pontos cruciais sobre adaptação institucional, formação para o futuro e o verdadeiro significado de conectar a escola com a realidade dos alunos. Com base nas minhas ideias, preparei 5 questões discursivas simples:


1. O texto argumenta que proibir smartphones na escola é uma "abordagem anacrônica" que ignora a realidade digital dos alunos. Como a Sociologia analisa a capacidade das instituições sociais, como a escola, de se adaptarem às rápidas mudanças tecnológicas e culturais da sociedade contemporânea, e quais são os riscos de uma instituição se tornar anacrônica?

2. A crônica enfatiza a necessidade de "alfabetização digital e cidadania plena em uma sociedade hiperconectada" como missão da escola. Do ponto de vista sociológico, por que a proficiência no uso ético e crítico das tecnologias digitais se tornou uma forma essencial de capital cultural e social no século XXI?

3. O texto contrapõe a ideia de que celulares prejudicam a interação social à noção de que o problema é a "ausência de espaços significativos para o diálogo". Como a Sociologia estuda as formas de interação social (presenciais e virtuais) entre jovens na era digital, e qual o papel da escola em promover vínculos e diálogos significativos em ambos os ambientes?

4. A refutação defende a "integração pedagógica consciente e estratégica" dos smartphones em vez da proibição. Como a Sociologia da Educação analisa o potencial da tecnologia digital para (re)configurar as práticas pedagógicas, as relações entre professores e alunos e o acesso ao conhecimento dentro do ambiente escolar?

5. O texto conclui defendendo a "formação ética e crítica para o uso consciente da tecnologia", contrastando-a com o "desejo de controle e o silêncio eletrônico". Como a Sociologia aborda a tensão entre a necessidade de regulação e controle em instituições educacionais e o objetivo de formar sujeitos autônomos e capazes de autorregulação em um mundo cada vez mais complexo e tecnologicamente mediado?