"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

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MINHAS PÉROLAS

terça-feira, 15 de julho de 2025

O Enigma Alemão e o Valor da Educação ("Uma sociedade que não valoriza seus professores não pode esperar que eles valorizem seu futuro." — John F. Kennedy)

 


O Enigma Alemão e o Valor da Educação ("Uma sociedade que não valoriza seus professores não pode esperar que eles valorizem seu futuro." — John F. Kennedy)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Era uma manhã comum, dessas em que o café parece mais forte que as esperanças de quem ensina. Abri o jornal e lá estava ela: a notícia que me fisgou como um anzol filosófico cravado na carne da minha curiosidade docente. A Alemanha, país modelo em tantos sentidos, paga cerca de 50 mil euros por ano aos seus professores da rede pública — algo em torno de 25 mil reais por mês. Um salário que, aos olhos brasileiros, beira o inacreditável. E, no entanto, as salas seguem vazias.

Sim, vazias. Não por falta de recursos, mas por ausência de vocações. A Alemanha, apesar do salário atrativo, não consegue preencher suas vagas docentes. Recorre, então, a uma alternativa curiosa: convocar profissionais de outras áreas, bem-sucedidos em suas carreiras, para dar aulas. Uma ideia ousada que me fez pensar: para quê o ensino médio tradicional? Para quê o ENEM, se a escola deveria, acima de tudo, preparar os jovens para a vida e o mercado de trabalho?

A questão se agrava no ensino superior. Os cursos de licenciatura, responsáveis por formar professores, não conseguem atrair novos estudantes. A procura é menor do que a necessidade. E isso — mesmo com bons salários — revela algo mais profundo do que uma simples crise numérica: revela a desvalorização simbólica da docência, que nem todo dinheiro do mundo consegue esconder.

Ao longo deste último ano, colecionei outros exemplos, mas esse me parece emblemático. Ele desmascara uma ilusão perigosa: a de que investir financeiramente é suficiente para salvar a educação. Não é. É preciso também investir em justiça pedagógica, em dignidade profissional, em critérios honestos. Aprovar um aluno sem mérito não é inclusão, é negligência. Às vezes, a reprovação ensina mais que uma aprovação inflada para enfeitar relatórios e estatísticas.

Na Finlândia, vi professores entrarem em sala com a mesma solenidade de quem pisa num templo: lá, o educador é escolhido entre os melhores, e ser aprovado para lecionar é uma honra rara. Já no Brasil, presenciei colegas exaustos, carregando pilhas de provas como quem arrasta o próprio desânimo, enquanto alunos desmotivados olham para o futuro com a mesma apatia com que encaram a lousa. Gestores, muitas vezes mais preocupados com indicadores do que com integridade pedagógica, pressionam por aprovações em massa, transformando o ensino em um teatro de aparências. Esses cenários concretos escancaram o abismo entre a vocação e a burocracia, entre o prestígio e o descaso. E é nesse contraste que se revela a urgência de resgatar o sentido perdido da profissão docente.

Como professor, vejo que não se trata apenas de salário, mas de sentido. O sentido de ensinar, de formar, de resistir — mesmo quando tudo aponta para o desânimo. A educação precisa, antes de tudo, ser verdadeira. E, talvez, o maior vazio não esteja nas salas alemãs, mas na coragem coletiva de reconhecer que formar um cidadão exige mais que cifras: exige método, ética e propósito. E falo do propósito vocacional, não de mercenarismo.


https://jornalgrandebahia.com.br/2009/11/falta-de-professores-e-preocupante-na-alemanha/ (Acessado em 15/07/2025)



Como professor de sociologia, desenvolvi estas 5 questões discursivas para explorar as ideias centrais do texto:


QUESTÃO 1 - Trabalho e Sociedade

O texto menciona que a Alemanha paga cerca de 50 mil euros anuais aos professores, mas ainda assim enfrenta escassez de profissionais na educação. Explique por que um salário alto nem sempre é suficiente para atrair pessoas para uma profissão e cite outros fatores que influenciam a escolha profissional na sociedade contemporânea.


QUESTÃO 2 - Valorização Social e Prestígio

O autor fala sobre a "desvalorização simbólica da docência". Analise como o prestígio social de uma profissão pode influenciar mais na escolha de carreira do que apenas os aspectos financeiros. Dê exemplos de profissões que possuem alto prestígio social em nossa sociedade.


QUESTÃO 3 - Educação e Função Social

Quando o texto questiona "para quê o ensino médio tradicional?", está problematizando a função da escola na sociedade. Discuta qual deve ser o papel principal da educação: preparar para o mercado de trabalho ou formar cidadãos críticos? Justifique sua resposta.


QUESTÃO 4 - Políticas Educacionais e Consequências

O autor critica a aprovação de alunos "sem mérito" como forma de "enfeitar relatórios e estatísticas". Analise como certas políticas educacionais podem ter consequências sociais negativas quando priorizam números em vez da qualidade do ensino.


QUESTÃO 5 - Vocação versus Mercado

O texto termina diferenciando "propósito vocacional" de "mercenarismo" na educação. Explique essa distinção e discuta por que é importante que algumas profissões, como a docência, mantenham um caráter vocacional na sociedade moderna.

segunda-feira, 7 de julho de 2025

A Romaria Incompleta ("A fé não é um refúgio da realidade, mas uma força para enfrentá-la." — Martin Luther King Jr.)

 



A Romaria Incompleta ("A fé não é um refúgio da realidade, mas uma força para enfrentá-la." — Martin Luther King Jr.)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Não era apenas mais uma caminhada. Era a romaria do Divino Pai Eterno — uma promessa que me impulsionava a cruzar vinte quilômetros a pé até a cidade de Trindade. No fundo, queria misturar fé e sorte, fazer minha parte no sacrifício e, quem sabe, receber de volta uma bênção nos jogos da vida. Levei comigo a esperança nas pernas e uma companheira de condução que, embora tivesse o mapa da cidade na cabeça, parecia carregar outros planos nos olhos.

A saída foi ainda sob a bênção da lua, brilhava no céu quase cheia, mas ainda sorridente como só ela consegue ser, isto é, quando há silêncio interior suficiente para percebê-la. A Via dos Romeiros já fervilhava de gente — famílias inteiras, devotos solitários, vendedores aos montes — e, a cada passo, parecia que uma nova multidão se somava atrás. Havia algo de bonito naquele caos: pessoas indo em busca de algo maior, mesmo que mal soubessem nomeá-lo.

O trajeto começou em Senador Canedo. Peguei o ônibus até Goiânia e, mesmo com o direito conquistado pela idade recém-chegada, enfrentei resistência para conseguir a passagem gratuita. A velhice, percebi, não basta por si só; é preciso saber reivindicá-la. Já na caminhada, veio a primeira graça da noite: em um ponto de apoio, fui recebido com leite quente com canela, café forte e pão macio (Centro de Apoio ao Romeiro). Minha companheira preferiu chá de erva-doce, talvez tentando acalmar a ansiedade que, mais tarde, se transformaria em pressa.

Mal cheguei à igreja, a primeira missa já estava terminando, e as portas abarrotadas de gente. Quis esperar pela próxima, às 5h30 minutos, repousar os pés e o espírito, mas, a parte frustrante veio na matriz. fui surpreendido pela decisão unilateral da minha parceira de jornada: "Se você quiser seguir a procissão, fique. Eu vou embora. Não aguento mais." Disse isso com a firmeza de quem não estava aberta à negociação, e com a frieza de quem não compreendeu que o sentido da fé também pode estar em permanecer.

No pátio, ao redor do santuário, notei os trajes dos outros romeiros, aspectos que eu já havia observado no trajeto: tênis caros, camisetas fluorescentes, roupas de academia. Estavam preparados para a caminhada, mas não para o templo. Pareciam mais maratonistas do que devotos — um contraste que me deixou inquieto. Afinal, que imagem é essa da fé que vestimos hoje?

Pelo caminho, as barracas disputavam atenção com as preces. Havia de tudo: pamonha, cerveja, terço, sandália, livros. Era o capitalismo disfarçado de romaria — ou talvez o contrário. Fé e comércio já aprenderam a caminhar de mãos dadas, como velhos conhecidos que fingem ainda se estranhar.

Voltei com mais bolhas nos pés do que bênçãos na alma. Mas nem tudo foi em vão. A caminhada me ensinou, mais uma vez, que a fé também se manifesta na frustração — quando não conseguimos o que queremos, mas seguimos em frente mesmo assim. Aprendi que, entre a promessa e o milagre, há sempre o risco do desencontro. E que nem todos os que andam ao nosso lado estão indo na mesma direção.

Talvez minha romaria incompleta, por não ter assistido a nenhuma missa, diga mais sobre mim do que se eu tivesse assistido a todas as missas daquela noite e retornado em êxtase. Carregar uma promessa no peito e não conseguir cumpri-la por inteiro é como ser humano demais: limitado, falho, dependente dos outros e das surpresas do caminho. A fé, afinal, não está no destino alcançado, mas no gesto insistente de caminhar mesmo sabendo que nem sempre se chega aonde se espera. Minha travessia, interrompida pela urgência alheia, revelou o quanto somos romeiros da própria vida — sujeitos a desvios, abandonos e frustrações que nem sempre escolhemos. Mas há beleza também nos trajetos interrompidos, pois mesmo as romarias inacabadas nos transformam. E talvez o verdadeiro altar esteja no ponto exato onde decidimos não desistir de seguir.

A romaria foi dura, mas não inútil. Porque caminhar é, antes de tudo, um ato de fé: a crença de que, ao fim da estrada, algo — ou alguém — nos aguarda. Mesmo que seja apenas o espelho da nossa própria persistência.

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Essa crônica nos leva a uma romaria, mas também a uma profunda reflexão sobre a sociedade e o comportamento humano. Vamos usar o texto como base para discutir alguns conceitos importantes da Sociologia. Leiam com atenção e respondam às questões a seguir!


1 - O texto descreve a "Via dos Romeiros" como "fervilhando de gente" e um "caos" com pessoas "em busca de algo maior". Pensando nos conceitos de aglomerado social e multidão, explique como esses fenômenos se manifestam em eventos como a romaria, e quais são os diferentes motivos que podem levar as pessoas a participar de grandes concentrações.


2 - O narrador menciona que "a velhice, percebi, não basta por si só; é preciso saber reivindicá-la" para conseguir a passagem gratuita. Discuta como o trecho ilustra a ideia de direitos sociais e a necessidade de luta por reconhecimento e acesso a esses direitos, mesmo para grupos que possuem amparo legal.


3 - No caminho, o autor observa o contraste entre os trajes "esportivos" dos romeiros e o que seria "adequado para o templo". Analise como essa observação pode nos levar a refletir sobre a secularização da sociedade e as diferentes formas como as pessoas expressam sua religiosidade e seu pertencimento a grupos sociais.


4 - A crônica aponta que "o capitalismo disfarçado de romaria" se manifestava nas barracas com "preços exorbitantes", concluindo que "Fé e comércio já aprenderam a caminhar de mãos dadas". Explique como esse trecho demonstra a mercantilização de aspectos religiosos e culturais na sociedade contemporânea e quais são as implicações sociais dessa relação.


5 - O autor experimenta a frustração da romaria incompleta e conclui que "a fé, afinal, não está no destino alcançado, mas no gesto insistente de caminhar". Relacione essa reflexão com o conceito de resiliência social e a capacidade dos indivíduos e das comunidades de lidar com adversidades, frustrações e desvios de rota em suas jornadas, mantendo a busca por significado.

quinta-feira, 3 de julho de 2025

A Lição de Um Golpe ("Não confio em ninguém que se sente perfeito, pois a perfeição é o inimigo do progresso e a ilusão da verdade." — Carl Jung)

 



A Lição de Um Golpe ("Não confio em ninguém que se sente perfeito, pois a perfeição é o inimigo do progresso e a ilusão da verdade." — Carl Jung)

Foi numa tarde como tantas outras, dessas em que a sala dos professores parece uma trincheira silenciosa entre uma aula e outra. O cansaço se espalhava pelo ar junto com o cheiro de café requentado. A rotina nos unia — não pela paz, mas pelo costume da luta.

Ela entrou radiante. Usava uma daquelas bolsas que mais parecem artigo de vitrine de shopping nobre. Bonita mesmo. — “Nossa, que bolsa!”, - soltou alguém, admirada. Ela sorriu com gosto e agradeceu. Dias depois, apareceu com uma sandália prateada, daquelas que fazem barulho de status no corredor. — “É a mais cara da loja”, - comentou, sem modéstia. Uma colega, encantada, confessou: — “Meu sonho é comprar uma dessa. Mas não tenho coragem…”.

Aos poucos, os detalhes brilhantes foram se somando: um anel delicado, um brinco caro, uma bolsa nova. Cada aparição dela era uma vitrine ambulante, e cada elogio, um passo a mais na encenação de uma vida que, à primeira vista, parecia bem-sucedida. Mas no fundo, havia algo dissonante — uma beleza que não batia com o contracheque.

Foi só depois de algumas semanas que o brilho se transformou em susto. — “Gente, vocês não vão acreditar!”, - disse uma colega. — “Olha o que apareceu no meu cartão de crédito: a mesma sandália daquela professora!”. Outra completou: — “Sabe o que veio no meu? O brinco!”. E uma terceira: “No meu apareceu uma bolsa!”. Nenhuma delas tinha feito aquelas compras. A dúvida virou alarme. — “Como assim? Vamos ver nas câmeras?” E vimos.

As imagens revelaram o que ninguém queria acreditar: ela, sorrateira, vasculhando bolsas alheias, fotografando cartões de crédito como quem fotografa flores num jardim invadido. Tudo era feito com agilidade cirúrgica — um clique aqui, um clique ali, e o golpe estava armado. As vítimas, nossas colegas de café, que já contavam as moedas no fim do mês, eram as financiadoras involuntárias de uma vida de ostentação. Roupas caras. Botox. Viagens. A vaidade de quem se enfeitava com o suor alheio.

Descobre-se que aquela não era sua primeira performance. Já tinha 14 ocorrências anteriores. Como a escola contrata uma professora sem examinar seus antecedentes, ou qualquer um ser. Quando estagiária na Controladoria-Geral da União e depois no Ministério da Justiça, fazia o mesmo: usava dados dos colegas para comprar, exibir, brilhar. Em uma rede social, posava com roupas compradas com cartões clonados — verdadeiras selfies do estelionato.

O primeiro alerta surgiu no dia 22, quando uma orientadora educacional percebeu algo estranho e bloqueou o cartão. Depois dela, mais duas servidoras, que dividiam uma sala reservada, notaram as mesmas movimentações suspeitas. Numa quarta-feira, gravaram um flagrante, mas a imagem ficou escura. Só no fim de semana, depois de muito investigar por conta própria, ficou confirmado: era ela.

A gravação definitiva veio depois: ela pega o cartão da vice-diretora e, minutos depois, inicia as compras. A estratégia era simples e eficaz — um clique, uma senha, e o prejuízo estava feito.

Mesmo após ser presa, foi liberada mediante fiança. E durante a própria gravação da reportagem, mais colegas descobriram que também haviam sido vítimas. O prejuízo ultrapassava os dez mil reais. Ela tentava justificar, alegando problemas psicológicos. — “Ah, eu sou cleptomaníaca…”, - disse, como quem tenta dar nome bonito à ganância.

Era professora substituta. Circulava entre escolas, acumulava rostos, confiança e brechas. Entrava sorrindo, saía com dados. Em meio ao barulho da sala dos professores, entre o grito de um aluno e o toque do sinal, bastava uma bolsa aberta e uma distração. E o golpe acontecia.

Não precisava nem de saldo. Com o limite do Nubank, cartão virava dinheiro. “Use seu dinheiro de forma inteligente para quando precisar”, dizia a propaganda. No caso dela, usava o dos outros — com inteligência, frieza e uma pontinha de crueldade.

Agora, tudo depende das vítimas. Se houver denúncia formal, o processo anda. Se não, tudo se arquiva, como se nunca tivesse existido. Um crime pode render de um a cinco anos de prisão. Ela cometeu vários. Mas só responderá se alguém tiver coragem de representar.

Disse lamentando uma das vítimas: — "O que mais me dói, no entanto, não é o prejuízo. É a quebra da confiança. Somos uma categoria acostumada a partilhar o pouco que temos — lanche, materiais, esperança. Nunca pensei que seria preciso esconder também o cartão. A lição que fica é amarga: até entre os nossos, às vezes, se esconde o inimigo. E o mais triste é que, de tantas disciplinas que já ensinamos, esquecemos de incluir a mais urgente: 'ética cotidiana' — aquela que deveria vir antes de qualquer conteúdo".

Talvez ela não quisesse apenas consumir — queria ser vista, admirada, desejada. Havia, por trás do brilho dos acessórios e do tom afetado da voz, uma fome de pertencimento, típica de quem vive à margem dos bastidores do prestígio. Não se trata de justificar, mas de entender: sua compulsão tinha método, cálculo e vaidade, mas também solidão e um desejo doentio de reconhecimento. O problema é que, ao vestir o que não podia pagar, ela despiu a confiança de todos ao redor. O resultado não foi só o rombo financeiro — foram vínculos rompidos, colegas desconfiados, uma escola inteira em alerta. E agora, diante do inquérito aberto, ela aguarda o processo — que só andará se formos capazes de enfrentar não apenas o estelionato, mas também o silêncio.

E, talvez, agora, depois desse golpe, venha a maior prova de todas: a de que é possível seguir sendo professor… mesmo depois de aprender, na dor, que nem todos merecem o nosso caderno aberto.


https://www.youtube.com/watch?v=WELO9DXDXy4&ab_channel=CidadeAlertaRecord (Acessado em 03/07/2025)



Essa crônica é um soco no estômago, né? Ela nos mostra como o cotidiano e as relações sociais podem ser mais complexos e desafiadores do que imaginamos. Vamos usar o texto como ponto de partida para refletir sobre alguns conceitos da Sociologia. Leiam com atenção e respondam às questões a seguir!


1 - A professora do texto usava objetos caros para ser "vista, admirada, desejada", mesmo cometendo crimes para isso. Explique como a sociedade de consumo e a busca por status social podem influenciar as atitudes e a identidade dos indivíduos, a ponto de levá-los a comportamentos antiéticos.


2 - A crônica descreve como a professora aproveitava a confiança dos colegas e a "correria da sala dos professores" para fotografar os cartões. Discuta como a quebra de confiança afeta as relações sociais e o capital social dentro de um grupo ou comunidade, como a equipe de uma escola.


3 - O texto menciona que a professora já tinha um histórico de 14 ocorrências e aplicava golpes em outros locais de trabalho. Considerando o conceito de desvio social, como podemos analisar a persistência desse tipo de comportamento e o impacto de suas ações na moral coletiva de diferentes ambientes profissionais?


4 - Uma das vítimas lamenta que "nunca pensou que seria preciso esconder também o cartão" e que a "ética cotidiana" deveria vir antes de qualquer conteúdo. Explique o que é ética cotidiana e por que ela é fundamental para a manutenção da coesão social em um ambiente de trabalho ou em qualquer grupo.


5 - A crônica finaliza com a reflexão de que, mesmo depois do ocorrido, é possível "seguir sendo professor". Pensando no papel da educação e das instituições sociais, discuta como esses espaços podem aprender e se fortalecer a partir de crises de confiança, buscando reconstruir os vínculos e reforçar a integridade.

quarta-feira, 2 de julho de 2025

A Vertigem do Inesperado ("O preço da grandeza é a responsabilidade." — Winston Churchill)

 


A Vertigem do Inesperado ("O preço da grandeza é a responsabilidade." — Winston Churchill)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Naquele primeiro de julho, o dia amanheceu com a rotina de sempre. O cheiro do café invadia a cozinha, os noticiários matinais zumbiam na TV, e eu, como de costume, preparava-me para mais uma jornada de e-mails, pautas e o incessante rolar da tela do computador. Mal sabia que, entre as manchetes apressadas e os fatos corriqueiros, um fragmento de notícia me agarraria pela alma — um daqueles enredos que nos fazem duvidar da própria realidade.

Tratava-se de um caso vindo de Michigan, nos Estados Unidos, envolvendo uma professora: Jocelyn Sanroman. À primeira vista, parecia apenas mais um item na extensa esteira de acontecimentos do mundo. Mas o título, seco e direto, carregava um peso que reverberou em mim: “Professora é acusada de manter relação sexual com aluno.” A cada palavra, a vertigem de um abismo se abria.

O que se seguiu foi uma sucessão de revelações que expunham não apenas a falha de um indivíduo, mas a rachadura em uma estrutura que se pretendia sólida. Jocelyn lecionava na Oakside Prep Academy, uma escola particular que, vejam só, vangloriava-se de seu programa Moral Focus, voltado à promoção de valores éticos e virtudes. Respeito, compaixão, integridade — palavras que, naquele contexto, soavam como ecos distantes de um ideal perdido.

Lembro-me do instante em que, com um clique do mouse, vi as informações se desdobrando no silêncio do meu escritório. O suposto abuso teria ocorrido em 2023. A denúncia partiu de uma colega de trabalho, a quem a própria Jocelyn teria confidenciado o envolvimento com o adolescente de apenas 16 anos. Teria sido uma confissão, um grito de socorro ou um desabafo incauto? A promotora do Condado de Oakland, Karen McDonald, foi enfática: “Ela é acusada de usar sua posição de autoridade para explorar um menor. Isso representa uma quebra de confiança gravíssima.”

A notícia me fez refletir sobre a teia complexa das relações humanas, sobretudo aquelas construídas sobre os alicerces da confiança e da responsabilidade. Como alguém, pilar da educação, incumbida de orientar e proteger, pode se desviar de forma tão drástica? E o que dizer da instituição que, enquanto propaga valores elevados, abriga tamanha contradição? Não era apenas um caso isolado, mas um sintoma de algo mais profundo — um lembrete cruel da fragilidade da moral diante das sombras da natureza humana.

Na manhã daquela segunda-feira, a imagem de Jocelyn Sanroman já circulava. Um rosto agora marcado pela acusação. Ela ainda não havia sido detida, mas a investigação prosseguia, tecendo os fios de um enredo que, ao avançar, poderia revelar novas verdades — ou intensificar as incertezas.

Ainda que o impacto inicial da notícia tenha sido avassalador, é inevitável tentar compreender o que leva alguém a atravessar uma fronteira tão definitiva entre o permitido e o condenável. Talvez Jocelyn, em algum momento, tenha confundido carência com intimidade, autoridade com afeto, ou simplesmente perdido o senso de consequência num cotidiano que, aos poucos, dissolveu os limites éticos. Não se trata de justificar, mas de reconhecer que por trás do ato há um emaranhado humano que desafia julgamentos fáceis. Ao recordar aquele primeiro de julho e, em seguida, remontar os fatos de 2023, percebo que essa alternância de tempos reflete justamente o abalo da razão diante do inesperado — quando passado e presente se embaralham, tentando, em vão, oferecer explicações ao que não deveria ter acontecido.

Este caso, que me alcançou por uma tela, ficou gravado na memória não apenas como uma notícia impactante, mas como um conto moral dos nossos tempos. Ele nos obriga a olhar para as fissuras sob a superfície polida das instituições e a questionar a profundidade dos valores que proclamamos. Que esta história, ainda em desdobramento, sirva como um alerta: a vigilância deve ser contínua, e a integridade, um farol inabalável — para que a confiança não se desfaça em pó e as fundações da educação permaneçam firmes e seguras para aqueles que mais precisam de proteção.


https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2025/07/7188801-professora-e-acusada-de-manter-relacao-sexual-com-aluno.html (Acessado em 02/07/2025)



Este texto nos faz refletir sobre temas importantes da nossa sociedade. A partir da crônica "A Vertigem do Inesperado", vamos discutir alguns conceitos sociológicos. Leiam com atenção e respondam às questões a seguir:


1 - A crônica descreve a Oakside Prep Academy como uma escola que promovia "valores éticos e virtudes". Discuta como o caso da professora Jocelyn Sanroman pode ser visto como uma contradição entre os valores declarados por uma instituição e as práticas que ocorrem em seu interior.


2 - O texto menciona a posição de autoridade da professora e a "quebra de confiança gravíssima". Explique como as relações de poder e autoridade podem ser exercidas de forma abusiva em ambientes sociais, como o escolar, e quais as possíveis consequências para os indivíduos envolvidos.


3 - A denúncia do caso partiu de uma colega de trabalho da professora. Pensando nos conceitos de controle social e ética profissional, discuta a importância da atitude dessa colega para a manutenção da integridade e segurança no ambiente escolar.


4 - O narrador reflete sobre a "fragilidade da moral diante das sombras da natureza humana". Com base na sua compreensão sociológica, como podemos analisar a ideia de que o comportamento individual (como o da professora) pode ser influenciado por um "emaranhado humano que desafia julgamentos fáceis" ou pela dissolução de limites éticos no cotidiano?


5 - A crônica finaliza com uma mensagem sobre a necessidade de "vigilância contínua" e "integridade" para que "as fundações da educação permaneçam firmes e seguras". Relacione essa reflexão com a importância das instituições sociais (como a escola) na formação de indivíduos e na reprodução de valores em uma sociedade.

terça-feira, 1 de julho de 2025

O Professor de Verdade ("Viver não é 'visitável'." — Clarice Lispector)

 



O Professor de Verdade ("Viver não é 'visitável'." — Clarice Lispector)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Outro dia, ao rolar a tela do celular, deparei-me com a gravação de uma aula online. No centro da imagem, uma jovem professora, de beleza e didática impecáveis, discorria sobre um tema complexo. Os comentários dos alunos eram só elogios; os pais, certamente, estavam satisfeitos. E eu, do lado de cá, com meus cabelos brancos e a poeira de muitas estradas nos ombros, não pude deixar de pensar: quem, de fato, é o professor de verdade?

Não que eu tenha algo contra a juventude ou a beleza, mas me inquieta a crescente obsessão pela embalagem em detrimento do conteúdo. Tenho a impressão de que os concursos para o magistério, em breve, adotarão os mesmos critérios de um desfile de Miss Brasil, onde o que agrada aos olhos parece valer mais do que o que enriquece a alma. E não sejamos ingênuos: essa lógica se espalha para além da sala de aula, chegando aos cargos de gestão, nos quais a experiência é, não raro, preterida pela aparência.

Toda essa superficialidade me fez recordar o que dizia um velho médico: "O melhor professor da vida é a experiência; ela cobra caro, mas explica bem." A experiência, segundo ele, "é um troféu composto por todas as armas que nos feriram." Não troco essa sabedoria por nenhuma teoria. A didática é uma estratégia, uma artimanha para prender a atenção; o conteúdo, porém, nasce do que foi vivido. Afinal, simulação não é realidade. O mapa não é o território.

Por isso — e que me perdoem os recém-formados —, para mim, o professor de verdade é aquele que chega à sala de aula depois dos 40 anos. É quem já colecionou fracassos, teve o coração partido ou precisou recomeçar do zero em outra profissão. É quem traz na voz não apenas a teoria dos livros, mas o peso e a leveza da vida. O ideal, arrisco dizer, seria que todo professor exercesse também outro ofício, sujando as mãos com a realidade do mundo para poder, enfim, limpar a poeira dos conceitos teóricos. Hoje, parece fácil demais ser professor: bastam um diploma e um rosto harmonioso.

Minha conterrânea, a imensa Cora Coralina, resumiu tudo com a doçura de um doce de figo: "Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina." A questão é que só se aprende na prática, no chão da vida, e isso demanda tempo. O que um jovem, por mais brilhante que seja, pode ensinar sobre resiliência a um aluno que enfrenta dificuldades que ele mesmo jamais imaginou?

Neste tempo de telas e aulas digitais, a pergunta se torna ainda mais urgente. Quem é o professor de verdade? Talvez sejam aqueles que já navegavam pelo mundo da informática antes que virasse moda, os que não precisaram de tutoriais para entender que a tecnologia era um caminho sem volta. Os mais velhos, que muitos julgam ultrapassados, deveriam ser ouvidos. Que serventia tem uma vida inteira de aprendizados, de tropeços e vitórias, se tudo será silenciado sob sete palmos de terra?

Porém, talvez, a resposta para tanta frustração não seja negar os tempos modernos, mas acolher a possibilidade de conciliação. O professor de verdade pode, sim, ser jovem — desde que traga sede de aprender com os mais velhos e humildade para ouvir o que a vida ensina fora das apostilas. E os mais experientes, por sua vez, ainda têm muito a entregar, se lhes dermos espaço. A educação não precisa ser uma competição de gerações, mas uma travessia onde quem já caminhou ilumina o trajeto dos que estão chegando. Se o texto soa denso, é porque o tema ainda pesa. Mas entre a crítica e a esperança, fico com a ponte: há caminhos possíveis se estivermos dispostos a construir juntos — um parágrafo de cada vez, uma vida inteira por detrás de cada lição.

Deus, em sua infinita sabedoria, não pode ser tão injusto. Aprender tanto, acumular tantas histórias e decifrar tantos segredos da alma humana apenas para que tudo se perca no pó é, para mim, um pecado imperdoável. Talvez a maior tragédia da educação não seja a falta de recursos ou as metodologias defasadas, mas o tesouro de sabedoria que enterramos todos os dias, a cada ancião que parte sem ter tido a chance de ser, finalmente, o professor de verdade que a vida o tornou.

Depois da nossa leitura atenta da crônica "O Professor de Verdade", vamos aprofundar a discussão com um olhar sociológico. O texto é um prato cheio para pensarmos sobre como nossa sociedade enxerga a educação, o conhecimento e a experiência. Preparem o caderno e respondam às questões a seguir, sempre justificando suas respostas com as ideias apresentadas no texto.

1 - O autor critica o que ele chama de "obsessão pela embalagem em detrimento do conteúdo". Explique com suas palavras o que essa oposição entre "embalagem" e "conteúdo" significa no universo da educação e dos professores, segundo a visão apresentada na crônica.

2 - No texto, encontramos a seguinte afirmação: "simulação não é realidade. O mapa não é o território." Como essa frase se conecta com a defesa que o autor faz da experiência de vida como sendo fundamental para a formação de um "professor de verdade"?

3 - Ao descrever o "professor de verdade", o autor menciona aquele que "já colecionou fracassos, teve o coração partido ou precisou recomeçar do zero". Do ponto de vista social, por que essas experiências "negativas" são consideradas tão valiosas pelo autor para o ato de ensinar?


4 - A crônica termina com uma reflexão sobre "o tesouro de sabedoria que enterramos todos os dias". A quem o autor está se referindo com essa metáfora? Qual é a principal crítica que ele faz à nossa sociedade sobre a maneira como lidamos com o conhecimento dos mais velhos?


5 - O autor sugere que a aparência e a juventude estão se tornando critérios importantes na escolha de professores, comparando o processo a um "desfile de Miss Brasil". Que tipo de valor social está sendo criticado aqui? E como essa valorização pode impactar a qualidade da educação a longo prazo?