"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

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MINHAS PÉROLAS

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

O Dia em que o Medo Venceu ("Onde a educação falha, a violência floresce." - Provérbio Africano)

 

O Dia em que o Medo Venceu ("Onde a educação falha, a violência floresce." - Provérbio Africano)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O vídeo, curto e trêmulo, invadiu os grupos de mensagens como um raio em dia de tempestade. A voz embargada, o olhar perdido, a notícia devastadora: Maria dos Prazeres Pereira, diretora da Escola Estadual Professor Francisco Barbosa, em São José de Mipibu, Rio Grande do Norte, entregava os pontos. Pedia exoneração. Vencida.

Não era uma derrota no campo de batalha, com honra e glória. Era uma rendição silenciosa, imposta pela covardia, pela sombra rasteira da ameaça. "Em virtude das ameaças, eu estou passando aqui hoje para me despedir de vocês do cargo de diretora. Eu estou deixando o meu cargo hoje", as palavras, gravadas em vídeo amador, ecoavam a fragilidade de uma fortaleza que ruiu sob o peso da violência.

Pesquisei sobre a Escola Francisco Barbosa, e descobri sua fama de gigante na rede estadual, um colosso com mais de mil almas estudantis. Imagino Maria dos Prazeres à frente daquela nau, timoneira experiente em mares revoltos, tentando manter a rota em meio a ondas de indisciplina e ventos de descaso. Mas, desta vez, a tempestade veio de dentro, urdida nas entranhas da própria escola, naqueles corredores que deveriam ser palco de aprendizado e respeito, se transformaram em trincheiras de medo e intimidação.

O Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do RN (Sinte-RN), em nota oficial, clamava por investigação, por justiça, por punição aos algozes anônimos que, escondidos nas sombras da virtualidade, destilaram o veneno da ameaça. "A escola deve ser um ambiente de respeito, aprendizado e crescimento, e qualquer forma de intimidação contra profissionais da educação deve ser firmemente combatida", dizia o comunicado, ecoando o óbvio ululante, a verdade elementar que teima em ser ignorada.

Mas as palavras do sindicato, por mais justas e necessárias, não alcançavam a dor lancinante que emanava do vídeo de Maria dos Prazeres. Naquelas imagens amadoras, mais do que a despedida de uma diretora, víamos a confissão de uma professora acuada, amedrontada, ferida na alma. — "Vocês venceram sim, vocês venceram", - repetia, em prantos, a voz embargada, direcionando a acusação dolorida aos alunos, aos pais omissos, à violência que se alastra como erva daninha nos jardins da educação.

Ela falava em "recadinhos", em "celular", em "exercícios", pistas esparsas de um crime silencioso, de uma tortura psicológica que culminou na sua renúncia. Maria dos Prazeres confessava o medo, o pavor da "violência", da "postura" daqueles que deveriam ser seus alunos, seus protegidos, e se transformaram em algozes cruéis e implacáveis. — "Tô com medo mesmo, medo da violência, medo da postura de vocês. Eu tô com muito medo", - a frase, repetida com a insistência de um mantra desesperado, expunha a fragilidade de uma educadora diante da barbárie.

E no eco daquelas palavras, pairava a sombra da nossa própria impotência, a constatação amarga de que, por vezes, a escola, refúgio de saber e esperança, pode se tornar palco de crueldade e desesperança. Maria dos Prazeres, ao se render, ao pedir exoneração, não apenas entregou um cargo, mas escancarou uma ferida profunda na alma da educação brasileira, um grito de alerta que ecoa nos corredores da escola Francisco Barbosa e em cada sala de aula do país: até quando a violência vencerá o saber? Até quando o medo calará a voz dos educadores?


https://www.instagram.com/reel/DGeExbZS_bk/?igsh=c2h6bzRpeGhpOXlw (Acessado em 26/02/2025)


Preparei 5 questões discursivas e simples para você refletir sobre a problemática da violência no ambiente escolar e seus impactos na comunidade educativa, sob a perspectiva da sociologia:


1. A crônica descreve um cenário de violência e ameaças que levam à renúncia da diretora. "Sob a ótica da sociologia, quais fatores sociais mais amplos podem contribuir para a ocorrência de violência nas escolas, como a descrita no texto?"

2. O texto menciona a fragilidade da diretora diante das ameaças e a falta de um ambiente de "respeito, aprendizado e crescimento" na escola. "Como a sociologia pode analisar as relações de poder e a dinâmica social dentro das instituições escolares, e de que forma essas relações podem influenciar a ocorrência de casos como o da diretora Maria dos Prazeres?"

3. A crônica questiona "até quando a violência vencerá o saber? Até quando o medo calará a voz dos educadores?". "De acordo com a perspectiva sociológica sobre a educação como instituição social, quais as consequências da violência e do medo no ambiente escolar para o processo de ensino-aprendizagem e para a função social da escola?"

4. O texto destaca a nota do sindicato que "cobra uma investigação rigorosa para punir os responsáveis". "Considerando a sociologia das profissões e do trabalho docente, qual a importância do apoio de entidades de classe e de políticas públicas para proteger os profissionais da educação em situações de violência e ameaça?"

5. Em suma, a crônica expõe uma "ferida profunda na alma da educação brasileira". "Na sua visão sociológica, quais seriam os caminhos possíveis para construir escolas mais seguras, acolhedoras e promotoras de um ambiente de respeito e aprendizado, onde a violência não silencie a voz dos educadores?"

domingo, 23 de fevereiro de 2025

Democracia Escolar para Além dos Grêmios Estudantis ("Não basta democratizar o acesso à escola, é preciso democratizar a escola por dentro." - Moacir Gadotti (Educador e filósofo))

 

Democracia Escolar para Além dos Grêmios Estudantis ("Não basta democratizar o acesso à escola, é preciso democratizar a escola por dentro." - Moacir Gadotti (Educador e filósofo))

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Refutando a ideia de que a centralidade dos grêmios estudantis seria sinônimo de democracia escolar, é crucial expandir a análise para além da mera formalidade representativa. Embora a participação estudantil seja, inegavelmente, um pilar fundamental na construção de um ambiente educacional democrático, reduzi-la apenas à existência de grêmios estudantis simplifica a complexidade da gestão escolar e ignora outras vias de engajamento igualmente válidas. Portanto, a premissa de que a baixa adesão a grêmios estudantis reflete, necessariamente, uma carência democrática nas escolas públicas brasileiras merece ser questionada.

Em vez de focar exclusivamente na quantidade de grêmios, uma perspectiva contemporânea valoriza a qualidade e a diversidade das formas de participação estudantil. Nesse sentido, o pesquisador Stephen Ball, em sua obra "Sociologia da Educação" (2012), argumenta que "a democracia escolar se manifesta em múltiplos espaços e práticas, que vão além das estruturas formais de representação". Assim, conselhos de classe participativos, projetos pedagógicos colaborativos, fóruns de discussão abertos e plataformas digitais de feedback podem se configurar como instrumentos tão ou mais eficazes para garantir a voz ativa dos estudantes.

Ademais, a efetividade dos grêmios estudantis não está isenta de desafios. Estudos recentes apontam para o risco de que essas instâncias se tornem palco de disputas políticas polarizadas ou reféns de agendas pouco representativas da totalidade do corpo discente. Nessa linha, o relatório "Juventudes Brasileiras e Participação Social" (2021), do Conselho Nacional de Juventude, evidencia que "a participação estudantil autêntica demanda um engajamento contínuo e diversificado, que nem sempre se restringe ou se esgota na atuação em grêmios".

Outrossim, a gestão democrática escolar perpassa por outros atores e instâncias, e não apenas pelos grêmios estudantis. A participação ativa de professores, pais, funcionários e da comunidade local em conselhos escolares atuantes e transparentes, conforme preconiza a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), é igualmente crucial para a construção de uma escola democrática e dialógica. Desse modo, priorizar apenas a existência de grêmios pode desviar o foco de outras dimensões essenciais para a democratização da gestão escolar.

Em suma, embora os grêmios estudantis possuam inegável valor simbólico e histórico, mensurar a democracia escolar apenas por sua presença quantitativa mostra-se reducionista e pouco acurado. Uma abordagem mais abrangente e eficaz reside em fomentar a pluralidade de espaços e mecanismos de participação estudantil, em diálogo constante com os demais atores da comunidade escolar, visando a construção de uma gestão verdadeiramente democrática e representativa, que vá para além da mera existência de grêmios.


https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2025-02/no-brasil-14-das-escolas-publicas-tem-gremio-estudantil (Acessado em 23/02/2025)


Preparei 5 questões discursivas e simples para você refletir sobre a temática da democracia escolar e a importância da participação estudantil:

1. O ensaio questiona se a presença de grêmios estudantis é o único indicador de democracia na escola. Na sua opinião, por que o texto argumenta que focar apenas nos grêmios estudantis é uma visão "reducionista" da democracia escolar?

2. O texto defende que a democracia escolar se manifesta em "múltiplos espaços e práticas, que vão além das estruturas formais de representação". Quais exemplos de "espaços e práticas" você considera que podem promover a democracia escolar, além dos grêmios estudantis?

3. O ensaio aponta que a efetividade dos grêmios estudantis pode ser limitada por "disputas políticas polarizadas" ou por representarem "agendas pouco representativas". Em sua experiência ou conhecimento, você consegue identificar desafios ou limitações que podem dificultar a atuação dos grêmios estudantis na promoção da democracia escolar?

4. O texto destaca a importância da participação de "professores, pais, funcionários e da comunidade local" para a gestão democrática da escola. Como você imagina que a participação desses diferentes atores pode contribuir para uma escola mais democrática e dialógica?

5. Em suma, o ensaio propõe uma visão mais ampla de democracia escolar, que vai "para além da mera existência de grêmios". Qual é, em suas palavras, a principal mensagem que o texto busca transmitir sobre como construir uma escola verdadeiramente democrática e representativa?

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Estamos Protegendo a Quem, Proibido o Uso do Celular na Escola? ("A mudança que você quer ver no mundo, seja a mudança." - Mahatma Gandhi)

 

Estamos Protegendo a Quem, Proibido o Uso do Celular na Escola? ("A mudança que você quer ver no mundo, seja a mudança." - Mahatma Gandhi)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

É algo que me incomoda profundamente: a ideia de que, em pleno século XXI, estamos discutindo o direito de um aluno se defender contra abusos dentro de uma sala de aula. Imagine isso: um adulto, com poder sobre dezenas de jovens, dizendo que tudo o que acontece entre essas quatro paredes deve ser escondido, como se a educação fosse um segredo a ser guardado a todo custo. Como se a dignidade e os direitos dos estudantes fossem menos importantes do que a imagem da escola ou a autoridade de um professor. Isso, para mim, é um absurdo inaceitável.

Estamos no início de mais um ano letivo, com novos desafios e promessas. Para muitos pais e responsáveis, este é o momento de garantir que seus filhos, no processo de educação, se sintam protegidos e respeitados. Porém, a realidade, por vezes, nos surpreende com a crueldade de certas ações. Recentemente, vi notícias sobre escolas que, com base em uma lei sancionada, têm confiscado os celulares dos alunos, alegando que a medida visa proteger a saúde mental e o foco nas aulas. O que há de mais contraditório nesse ato? Ao tentar garantir um ambiente “sem distrações”, estão, na verdade, infringindo um direito básico dos jovens: a liberdade de se protegerem contra situações de abuso ou injustiça.

E não, isso não é uma hipótese distante. Casos de professores que desrespeitam a dignidade dos alunos, fazem piadas de mau gosto ou até os assediam não são raros. Quem de nós nunca ouviu uma história, uma denúncia, ou uma suspeita sobre o comportamento de alguém em posição de autoridade? A sala de aula não pode ser um espaço onde o abuso seja silenciado, onde o aluno se sinta impotente, sem voz. A verdade é que a violência, em suas mais variadas formas, tem se infiltrado na educação e, muitas vezes, ela não é visível aos olhos desatentos.

Quem já ouviu falar do caso da professora de Blumenau? E quem já soube dos escândalos envolvendo diretores e professores em outras escolas? A realidade é que essas histórias não são exceções, mas sim sintomas de um sistema que tenta se proteger através do sigilo, da opacidade, da negação da responsabilidade. O que acontece quando o aluno se vê diante de um comportamento abusivo, mas não pode se defender, não pode fazer nada porque seu celular foi confiscado e ele não tem meios de provar o que está acontecendo?

A Lei 15.100, que alguns insistem em manipular, não diz que os celulares devem ser proibidos. Ao contrário, ela afirma que, em casos de ameaça, o uso do celular é legítimo. E mais, a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente são claros ao garantir que, em situações de violação de direitos, a criança ou adolescente tem o direito de registrar a violência e denunciar. Como pais e educadores, precisamos compreender que o celular pode ser a única ferramenta de defesa desses jovens em momentos de emergência.

E o que fazer diante disso tudo? Não podemos ignorar que a lei não é uma prisão, mas uma proteção. Ao invés de encararmos a educação como um campo de disciplina cega, devemos enxergá-la como um lugar de desenvolvimento e respeito mútuo. Eu falo como educador, mas também como alguém que já viu e ouviu muitas coisas no corredor da escola, que conhece a dor de ver um aluno sendo humilhado ou desrespeitado.

Não podemos mais permitir que a nossa busca por um ambiente de aprendizado seguro seja confundida com uma desculpa para silenciar as vítimas. Não podemos permitir que a nossa cegueira institucional continue a encobrir os abusos que acontecem dentro de nossas escolas. A verdadeira proteção não é aquela que tenta esconder a realidade, mas sim a que assegura que os direitos de cada um sejam respeitados e defendidos.

Sei que essa reflexão não é fácil, mas ela é necessária. Porque, no fim das contas, as escolas não podem ser lugares de segredo ou de medo. Elas precisam ser espaços de liberdade, de confiança, onde a verdade possa ser dita sem receio de retaliações. A vida é dura, mas se não a enfrentarmos com coragem, quem o fará? Que cada um de nós, pais, educadores e alunos, sejamos vigilantes e combativos, para garantir que o futuro de nossas crianças e adolescentes seja um futuro de justiça, e não de silenciamento.

O que nos cabe agora é agir.


Questões Discursivas Detalhadas sobre o Texto:


1. A Problemática do Abuso e a Cultura do Sigilo

O texto aborda a problemática do abuso em salas de aula, destacando a cultura do sigilo que protege os agressores e silencia as vítimas. Discuta como essa cultura se manifesta no contexto escolar, explorando os seguintes pontos:

A relação de poder entre professor e aluno: Como a hierarquia e a autoridade do professor podem ser utilizadas para cometer abusos?

O papel do sigilo: De que forma a alegação de "proteger a imagem da escola" ou a "autoridade do professor" contribui para a perpetuação dos abusos?

A dificuldade de denunciar: Quais são os obstáculos que os alunos enfrentam ao tentar denunciar casos de abuso?

A importância da conscientização: Como a escola, os pais e a sociedade podem trabalhar juntos para desconstruir a cultura do sigilo e garantir que as vítimas se sintam seguras para denunciar?

2. A Proibição do Celular como Instrumento de Controle

O texto critica a proibição do uso de celulares em sala de aula, argumentando que a medida, sob o pretexto de "proteger a saúde mental e o foco nas aulas", acaba por impedir que os alunos se defendam de situações de abuso. Discuta essa questão, explorando os seguintes aspectos:

A contradição da medida: Como a proibição do celular, que se propõe a proteger os alunos, pode, na verdade, colocá-los em risco?

O celular como ferramenta de defesa: De que forma o celular pode ser utilizado para registrar e denunciar casos de abuso?

A importância da liberdade de expressão: Como a proibição do celular fere o direito à liberdade de expressão dos alunos?

Alternativas para um ambiente escolar saudável: Que medidas podem ser tomadas para garantir um ambiente de aprendizado seguro e livre de distrações, sem que os alunos sejam privados de seu direito à defesa?

3. A Manipulação da Lei 15.100 e a Defesa dos Direitos dos Alunos

O texto menciona a Lei 15.100, que dispõe sobre o uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula, e como ela tem sido utilizada para justificar a proibição do celular. Discuta a interpretação da lei apresentada no texto, explorando os seguintes pontos:

O que diz a Lei 15.100: Qual o teor da lei e como ela se aplica ao uso de celulares em sala de aula?

A manipulação da lei: De que forma a lei tem sido interpretada para restringir o direito dos alunos à defesa?

A Constituição e o ECA: Como a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente garantem o direito dos alunos de registrar e denunciar casos de abuso?

A importância da informação: Como pais e alunos podem se informar sobre seus direitos e lutar contra a manipulação da lei?

4. O Papel da Escola na Formação de Cidadãos Conscientes

O texto critica a postura de algumas escolas que, em vez de promoverem um ambiente de respeito e liberdade, parecem mais preocupadas em proteger sua imagem e a autoridade de seus professores. Discuta o papel da escola na formação de cidadãos conscientes, explorando os seguintes aspectos:

A escola como espaço de diálogo: Como a escola pode promover um ambiente de diálogo aberto e construtivo, onde alunos, pais e professores possam expressar suas opiniões e defender seus direitos?

A importância da ética e da cidadania: De que forma a escola pode ensinar valores como ética, cidadania e respeito aos direitos humanos?

O combate à cultura do silêncio: Como a escola pode combater a cultura do silêncio e incentivar os alunos a denunciarem casos de abuso e injustiça?

A construção de uma escola democrática: Que medidas podem ser tomadas para transformar a escola em um espaço mais democrático, onde todos os membros da comunidade escolar tenham voz e participação?

5. A Coragem de Denunciar e a Luta por uma Escola Justa

O texto termina com um chamado à ação, incentivando pais, educadores e alunos a serem "vigilantes e combativos" na luta por uma escola justa e segura. Discuta a importância da coragem para denunciar casos de abuso e injustiça, explorando os seguintes pontos:

O medo da retaliação: Como o medo de represálias pode impedir que as vítimas denunciem seus agressores?

A importância do apoio: Como o apoio de pais, amigos e da comunidade escolar pode encorajar as vítimas a denunciarem?

O papel da denúncia: De que forma a denúncia pode contribuir para a punição dos agressores e para a prevenção de novos casos de abuso?

A construção de uma cultura de respeito: Como a coragem de denunciar pode ajudar a construir uma cultura de respeito e tolerância nas escolas?

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Uma Crônica Sobre o Medo na Escola ("A violência é a confissão da incompetência." - Simone de Beauvoir)

 

Uma Crônica Sobre o Medo na Escola ("A violência é a confissão da incompetência." - Simone de Beauvoir)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O sol da manhã brilhava sobre o Bairro São Jorge, em Uberlândia, e o burburinho das crianças a caminho da escola enchia as ruas com uma energia inocente. Na porta da Escola Municipal Sebastiana Silveira Pinto, o motorista de uma van escolar esperava pacientemente seus pequenos passageiros. Seu rosto era gentil, mas carregava o cansaço de quem já viu de tudo. Ainda assim, nada o prepararia para o que estava prestes a acontecer.

O silêncio foi abruptamente rompido por um estrondo. Um homem, com a fúria estampada nos olhos, disparou contra o veículo. O motorista, atônito, mal teve tempo de reagir antes de ver o agressor fugir, deixando atrás de si um rastro de medo e perplexidade. A notícia se espalhou rapidamente, e o bairro, antes pacato, foi tomado pelo pânico. Mães corriam para a escola, aflitas, buscando qualquer informação sobre seus filhos. Mas, por um milagre ou acaso do destino, ninguém saiu ferido.

A polícia foi acionada imediatamente graças ao botão de pânico do aplicativo "Escola Protegida", e os agentes chegaram com rapidez. As primeiras investigações indicavam que o crime poderia ter sido motivado por um desentendimento banal ocorrido dias antes. No entanto, os reais motivos ainda permaneciam nebulosos.

Como professor e testemunha de tantas formas de violência em escola, lembro-me das agressões que já presenciei em outros contextos, como nos jogos do interclasse, onde ânimos exaltados se transformam em conflitos físicos. Fico perplexo ao perceber como a violência se insinua, sorrateira, em nosso cotidiano, atingindo até mesmo espaços destinados ao aprendizado e ao crescimento. A fragilidade da vida se impõe como uma verdade inquestionável, e o medo passa a fazer parte da rotina escolar.

Segundo a notícia que li, apesar do horror retratado, daquele dia, algo se sobressaiu: a resposta rápida da escola e da comunidade. Pais, alunos e professores se uniram, buscando apoio uns nos outros, compartilhando o susto, mas também fortalecendo a esperança de dias melhores. Esse episódio não pode ser apenas mais uma tragédia esquecida. Ele deve servir como um alerta para a necessidade de repensarmos a segurança em nossas escolas e a construção de um ambiente de respeito e tolerância.

A violência não pode ser normalizada. Ela não pode ditar as regras em um espaço que deveria ser um santuário de aprendizado. A escola precisa continuar sendo um lugar de acolhimento, onde crianças se sintam protegidas e cuidadas. Mas essa segurança não será conquistada apenas com câmeras ou aplicativos; é necessário um compromisso coletivo para transformar a realidade que nos cerca.

O medo ainda paira sobre nós, mas ele não pode nos paralisar. Enquanto houver esperança e a coragem de enfrentar esses desafios, ainda há espaço para a construção de um futuro mais humano e justo.

https://g1.globo.com/mg/triangulo-mineiro/noticia/2025/02/20/homem-armado-atira-em-van-e-ameaca-motorista-na-porta-de-escola-em-uberlandia.ghtml?fbclid=IwY2xjawIkYv9leHRuA2FlbQIxMQABHeeyu_nxCRsTUJNpI5FIV3n4D8QVHUcEhoSoy4dKJDek9MvK7tO2gnhWog_aem_chipejN0bW3tuwdIqGiOTQ (acessado em 20/02/2025)

Questões Discursivas sobre o Texto:

1. O texto descreve um incidente de violência em uma escola. Discuta as possíveis causas da violência nas escolas, indo além do caso específico apresentado no texto. Que fatores sociais, psicológicos ou culturais podem contribuir para esse tipo de ocorrência?

Habilidade: Compreensão e análise do fenômeno da violência escolar, suas causas multifacetadas e seus impactos na comunidade.

Resposta Esperada: Discussão aprofundada sobre as causas da violência escolar, incluindo fatores como desigualdade social, cultura de violência, problemas de saúde mental, bullying, etc. O aluno deve ser capaz de analisar o caso apresentado no texto como um exemplo de um problema mais amplo.

2. O autor do texto expressa preocupação com a "normalização da violência". O que significa essa expressão? De que forma a banalização da violência pode afetar a sociedade e a comunidade escolar?

Habilidade: Compreensão do conceito de normalização da violência e análise de seus impactos na sociedade e na escola.

Resposta Esperada: Explicação do conceito de normalização da violência como a aceitação e banalização de atos violentos, levando à perda da sensibilidade e à diminuição da capacidade de reação. O aluno deve ser capaz de analisar como essa normalização pode gerar um ciclo de violência e como afeta a comunidade escolar.

3. O texto destaca a importância da união da comunidade escolar para lidar com a violência. Qual o papel da escola, dos pais, dos alunos e da sociedade em geral na prevenção e no combate à violência nas escolas?

Habilidade: Compreensão da importância da participação de todos os atores sociais na prevenção e no combate à violência escolar.

Resposta Esperada: Discussão sobre o papel de cada um dos atores sociais na prevenção e no combate à violência nas escolas, incluindo a importância da comunicação, do diálogo, da educação para a paz, do acompanhamento psicológico e do fortalecimento dos vínculos entre escola, família e comunidade.

4. O autor do texto menciona o uso do aplicativo "Escola Protegida". Qual a importância da tecnologia e de outras medidas de segurança para garantir a segurança nas escolas? Essas medidas são suficientes para resolver o problema da violência nas escolas?

Habilidade: Reflexão sobre o papel da tecnologia e das medidas de segurança na prevenção da violência escolar, bem como seus limites.

Resposta Esperada: Discussão sobre a importância da tecnologia e das medidas de segurança para garantir a segurança nas escolas, mas também sobre seus limites. O aluno deve ser capaz de analisar criticamente o papel dessas medidas, reconhecendo que a violência é um problema complexo que exige soluções multifacetadas, que vão além da segurança física.

5. O autor do texto termina com uma mensagem de esperança, enfatizando a importância da coragem para enfrentar os desafios da violência. Que tipo de ações e iniciativas podem ser tomadas para construir um futuro mais humano e justo, onde a violência não encontre espaço nas escolas?

Habilidade: Capacidade de propor soluções e iniciativas para a construção de um futuro mais seguro e pacífico nas escolas.

Resposta Esperada: Apresentação de propostas concretas para a construção de um futuro mais humano e justo nas escolas, incluindo iniciativas como projetos de educação para a paz, programas de prevenção da violência, ações de combate ao bullying, fortalecimento do diálogo entre escola e comunidade, investimento em saúde mental, etc. O aluno deve ser capaz de defender suas propostas com argumentos sólidos e coerentes.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

O Sistema que nos Engole: Receba um bom dia ("Não há despertar de consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma." — Carl Jung)

 

O Sistema que nos Engole: Receba um bom dia ("Não há despertar de consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma." — Carl Jung)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Lembro-me do exato momento em que percebi que havia sido engolido pelo sistema. Não foi um despertar dramático, apenas uma constatação silenciosa numa manhã aparentemente comum. Eu cruzava o corredor em direção à sala dos professores quando notei que passava por colegas, funcionários da secretaria, pessoal da limpeza e da cozinha como se fossem apenas elementos do cenário. Nem "bom dia" eu dizia mais.

Em que momento deixei de ser aquele professor entusiasta e sorridente? Quando foi que esse pequeno gesto de cordialidade desapareceu do meu repertório diário?

Era cada vez mais difícil sair da cama pela manhã. Sentia-me pesado, como se carregasse um fardo invisível. E quando finalmente chegava à escola, apenas cumpria protocolos, passando pelos movimentos necessários, sem realmente estar presente. A verdade incontestável era que eu não estava sozinho nesse processo.

Os corredores da escola haviam se transformado em um desfile de rostos fechados e olhares distantes. O "bom dia" raramente encontrava resposta – quando muito, recebia um murmúrio desanimado ou um silêncio cortante. Alguns professores, absortos em sua própria pressa, pareciam nem notar a saudação. Outros, imersos em suas angústias pessoais, mostravam-se incapazes de retribuí-la.

O sistema que nos engole é um monstro sem rosto. Uma força silenciosa, uma névoa que envolve principalmente os recém-chegados, transformando-os gradualmente. O jovem professor inicia sua jornada repleto de ideias inovadoras, motivado, acreditando genuinamente que pode fazer a diferença. Contudo, dia após dia, observa a indiferença ao seu redor, os olhares cansados, os suspiros de exaustão. É um processo lento e imperceptível: o brilho nos olhos se apaga, a voz entusiasmada torna-se monótona, e o simples "bom dia" é a primeira vítima dessa desumanização coletiva.

A rotina nos consumia. Cada um carregava suas frustrações profissionais, a sensação de estar preso a um ciclo repetitivo e desgastante, a falta crônica de reconhecimento. A escola, que deveria representar um espaço de crescimento e aprendizado contínuo, havia se convertido em um campo minado de mal-entendidos e desânimo generalizado.

O choque veio quando um aluno me cumprimentou no corredor e só percebi o silêncio que devolvi quando já era tarde demais. Aquele momento foi revelador. Quando foi que parei de responder? Quando permiti que me deixasse levar pelo mesmo desânimo que um dia critiquei veementemente nos outros?

Naquela manhã, tomei uma decisão: lutar contra esse sistema invisível que nos suga a energia e a paixão, que nos transforma em meras engrenagens de uma máquina sem propósito ou significado. Voltei deliberadamente a dizer: "Receba um bom dia" em alto e bom som, mesmo quando não obtinha resposta. Forcei-me a sorrir, ainda que os rostos ao redor insistissem em permanecer fechados.

Foi apenas um pequeno gesto, mas percebi que, ao menos para mim, fazia uma diferença significativa. Talvez fosse um recomeço. Talvez fosse a simples lembrança de que, por trás dos cansaços acumulados e frustrações diárias, ainda somos humanos tentando sobreviver ao peso implacável dos dias.

E é exatamente isso que quero transmitir: não deixem que o sistema os engula por completo. Não permitam que a paixão e a energia que um dia os trouxe a esta profissão se perca nos meandros da burocracia e das políticas institucionais. Sejam professores que se importam verdadeiramente, que se preocupam com cada aluno, que renovam diariamente o amor pela educação.

Porque, ao final de cada jornada, o que realmente importa não é o sistema, não são os protocolos intermináveis ou as reuniões pedagógicas. É a paixão genuína, a energia renovada e a dedicação constante que nos definem como educadores.

E se nada mais funcionar, que ao menos continuemos dizendo: "Receba um bom dia" – esse pequeno ato de resistência humana contra a maré de indiferença que ameaça nos submergir. E correr o risco de cumprimentar uma mulher e ser acusado de assédio sexual.


Questões Discursivas


1. O texto menciona um "sistema que nos engole" como "um monstro sem rosto". Analise como as instituições sociais podem promover processos de desumanização e alienação entre seus membros, relacionando com o conceito sociológico de anomia social.

2. O autor descreve uma transformação gradual que afeta os professores novatos, do entusiasmo inicial à apatia. Discuta como os processos de socialização profissional podem contribuir para a reprodução de comportamentos e atitudes no ambiente escolar.

3. "A escola, que deveria representar um espaço de crescimento e aprendizado contínuo, havia se convertido em um campo minado de mal-entendidos e desânimo generalizado." A partir desta afirmação, reflita sobre a contradição entre o papel ideal das instituições educacionais e sua realidade prática na sociedade contemporânea.

4. No texto, o simples ato de dizer "Receba bom dia" é apresentado como uma forma de resistência. Discuta como pequenos gestos cotidianos podem representar formas de resistência microssocial contra processos de alienação nas instituições.

5. O autor menciona a "falta crônica de reconhecimento" como um dos elementos que contribuem para o desgaste profissional. Analise como as relações de trabalho na sociedade atual podem afetar a construção da identidade profissional dos educadores.