"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

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MINHAS PÉROLAS

⁠O NOVO ENSINO MÉDIO PÓS-PANDÊMICO ("O novo sempre despertou perplexidade e resistência." — Sigmund Freud)
           No Velho Normal; Velho Ensino Médio, os alunos em aula presencial, aparentemente amigáveis e confiáveis, trazem baralho para o colégio. Isso é uma armadilha e uma emboscada moral para o professor. Brincam, e o professor fazendo vista grossa, já cansado de tanto dizer não e sabendo dos vagos resultados se os entregar para coordenação, então permite; mas eles o denunciam por deixá-los jogar truco na aula dele, desde que não gritem. Parece um acordo. Todavia é estranho condenar o professor que espera por eles concluírem as atividades propostas ali, enquanto uns poucos jogam as cartas. Estes nem fingem interesse na aula. Contudo, se o professor não os entregar para a coordenação, os demais entregarão o professor. Agora, Novo Normal; Novo Ensino Médio! Mil horas por ano em cada série em duzentos dias letivos. Vão entrar às sete horas e saírem ao meio-dia, cansados de tantas aulas grandes, pouco rendimento, percebem que a quantidade sobrepõe a qualidade, então forçarão por mais recreação. Desacostumados do antigo regime, com aulas síncronas de 40 minutos, resistirão veementemente a mais trabalhos e mais dedicação. Será que no Novo Ensino Médio, o aluno deixará de ser cliente? Por isso profetizo, o sistema vai ter que se adequar ao novo aluno: Pós-pandemia! Senão, não valeu o aprendizado no regime avançado de novas tecnologias. O Novo não se estabelece se não for facilitado. CiFA

Claudeci Ferreira de Andrade

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Estamos Protegendo a Quem, Proibido o Uso do Celular na Escola? ("A mudança que você quer ver no mundo, seja a mudança." - Mahatma Gandhi)

 

Estamos Protegendo a Quem, Proibido o Uso do Celular na Escola? ("A mudança que você quer ver no mundo, seja a mudança." - Mahatma Gandhi)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

É algo que me incomoda profundamente: a ideia de que, em pleno século XXI, estamos discutindo o direito de um aluno se defender contra abusos dentro de uma sala de aula. Imagine isso: um adulto, com poder sobre dezenas de jovens, dizendo que tudo o que acontece entre essas quatro paredes deve ser escondido, como se a educação fosse um segredo a ser guardado a todo custo. Como se a dignidade e os direitos dos estudantes fossem menos importantes do que a imagem da escola ou a autoridade de um professor. Isso, para mim, é um absurdo inaceitável.

Estamos no início de mais um ano letivo, com novos desafios e promessas. Para muitos pais e responsáveis, este é o momento de garantir que seus filhos, no processo de educação, se sintam protegidos e respeitados. Porém, a realidade, por vezes, nos surpreende com a crueldade de certas ações. Recentemente, vi notícias sobre escolas que, com base em uma lei sancionada, têm confiscado os celulares dos alunos, alegando que a medida visa proteger a saúde mental e o foco nas aulas. O que há de mais contraditório nesse ato? Ao tentar garantir um ambiente “sem distrações”, estão, na verdade, infringindo um direito básico dos jovens: a liberdade de se protegerem contra situações de abuso ou injustiça.

E não, isso não é uma hipótese distante. Casos de professores que desrespeitam a dignidade dos alunos, fazem piadas de mau gosto ou até os assediam não são raros. Quem de nós nunca ouviu uma história, uma denúncia, ou uma suspeita sobre o comportamento de alguém em posição de autoridade? A sala de aula não pode ser um espaço onde o abuso seja silenciado, onde o aluno se sinta impotente, sem voz. A verdade é que a violência, em suas mais variadas formas, tem se infiltrado na educação e, muitas vezes, ela não é visível aos olhos desatentos.

Quem já ouviu falar do caso da professora de Blumenau? E quem já soube dos escândalos envolvendo diretores e professores em outras escolas? A realidade é que essas histórias não são exceções, mas sim sintomas de um sistema que tenta se proteger através do sigilo, da opacidade, da negação da responsabilidade. O que acontece quando o aluno se vê diante de um comportamento abusivo, mas não pode se defender, não pode fazer nada porque seu celular foi confiscado e ele não tem meios de provar o que está acontecendo?

A Lei 15.100, que alguns insistem em manipular, não diz que os celulares devem ser proibidos. Ao contrário, ela afirma que, em casos de ameaça, o uso do celular é legítimo. E mais, a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente são claros ao garantir que, em situações de violação de direitos, a criança ou adolescente tem o direito de registrar a violência e denunciar. Como pais e educadores, precisamos compreender que o celular pode ser a única ferramenta de defesa desses jovens em momentos de emergência.

E o que fazer diante disso tudo? Não podemos ignorar que a lei não é uma prisão, mas uma proteção. Ao invés de encararmos a educação como um campo de disciplina cega, devemos enxergá-la como um lugar de desenvolvimento e respeito mútuo. Eu falo como educador, mas também como alguém que já viu e ouviu muitas coisas no corredor da escola, que conhece a dor de ver um aluno sendo humilhado ou desrespeitado.

Não podemos mais permitir que a nossa busca por um ambiente de aprendizado seguro seja confundida com uma desculpa para silenciar as vítimas. Não podemos permitir que a nossa cegueira institucional continue a encobrir os abusos que acontecem dentro de nossas escolas. A verdadeira proteção não é aquela que tenta esconder a realidade, mas sim a que assegura que os direitos de cada um sejam respeitados e defendidos.

Sei que essa reflexão não é fácil, mas ela é necessária. Porque, no fim das contas, as escolas não podem ser lugares de segredo ou de medo. Elas precisam ser espaços de liberdade, de confiança, onde a verdade possa ser dita sem receio de retaliações. A vida é dura, mas se não a enfrentarmos com coragem, quem o fará? Que cada um de nós, pais, educadores e alunos, sejamos vigilantes e combativos, para garantir que o futuro de nossas crianças e adolescentes seja um futuro de justiça, e não de silenciamento.

O que nos cabe agora é agir.


Questões Discursivas Detalhadas sobre o Texto:


1. A Problemática do Abuso e a Cultura do Sigilo

O texto aborda a problemática do abuso em salas de aula, destacando a cultura do sigilo que protege os agressores e silencia as vítimas. Discuta como essa cultura se manifesta no contexto escolar, explorando os seguintes pontos:

A relação de poder entre professor e aluno: Como a hierarquia e a autoridade do professor podem ser utilizadas para cometer abusos?

O papel do sigilo: De que forma a alegação de "proteger a imagem da escola" ou a "autoridade do professor" contribui para a perpetuação dos abusos?

A dificuldade de denunciar: Quais são os obstáculos que os alunos enfrentam ao tentar denunciar casos de abuso?

A importância da conscientização: Como a escola, os pais e a sociedade podem trabalhar juntos para desconstruir a cultura do sigilo e garantir que as vítimas se sintam seguras para denunciar?

2. A Proibição do Celular como Instrumento de Controle

O texto critica a proibição do uso de celulares em sala de aula, argumentando que a medida, sob o pretexto de "proteger a saúde mental e o foco nas aulas", acaba por impedir que os alunos se defendam de situações de abuso. Discuta essa questão, explorando os seguintes aspectos:

A contradição da medida: Como a proibição do celular, que se propõe a proteger os alunos, pode, na verdade, colocá-los em risco?

O celular como ferramenta de defesa: De que forma o celular pode ser utilizado para registrar e denunciar casos de abuso?

A importância da liberdade de expressão: Como a proibição do celular fere o direito à liberdade de expressão dos alunos?

Alternativas para um ambiente escolar saudável: Que medidas podem ser tomadas para garantir um ambiente de aprendizado seguro e livre de distrações, sem que os alunos sejam privados de seu direito à defesa?

3. A Manipulação da Lei 15.100 e a Defesa dos Direitos dos Alunos

O texto menciona a Lei 15.100, que dispõe sobre o uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula, e como ela tem sido utilizada para justificar a proibição do celular. Discuta a interpretação da lei apresentada no texto, explorando os seguintes pontos:

O que diz a Lei 15.100: Qual o teor da lei e como ela se aplica ao uso de celulares em sala de aula?

A manipulação da lei: De que forma a lei tem sido interpretada para restringir o direito dos alunos à defesa?

A Constituição e o ECA: Como a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente garantem o direito dos alunos de registrar e denunciar casos de abuso?

A importância da informação: Como pais e alunos podem se informar sobre seus direitos e lutar contra a manipulação da lei?

4. O Papel da Escola na Formação de Cidadãos Conscientes

O texto critica a postura de algumas escolas que, em vez de promoverem um ambiente de respeito e liberdade, parecem mais preocupadas em proteger sua imagem e a autoridade de seus professores. Discuta o papel da escola na formação de cidadãos conscientes, explorando os seguintes aspectos:

A escola como espaço de diálogo: Como a escola pode promover um ambiente de diálogo aberto e construtivo, onde alunos, pais e professores possam expressar suas opiniões e defender seus direitos?

A importância da ética e da cidadania: De que forma a escola pode ensinar valores como ética, cidadania e respeito aos direitos humanos?

O combate à cultura do silêncio: Como a escola pode combater a cultura do silêncio e incentivar os alunos a denunciarem casos de abuso e injustiça?

A construção de uma escola democrática: Que medidas podem ser tomadas para transformar a escola em um espaço mais democrático, onde todos os membros da comunidade escolar tenham voz e participação?

5. A Coragem de Denunciar e a Luta por uma Escola Justa

O texto termina com um chamado à ação, incentivando pais, educadores e alunos a serem "vigilantes e combativos" na luta por uma escola justa e segura. Discuta a importância da coragem para denunciar casos de abuso e injustiça, explorando os seguintes pontos:

O medo da retaliação: Como o medo de represálias pode impedir que as vítimas denunciem seus agressores?

A importância do apoio: Como o apoio de pais, amigos e da comunidade escolar pode encorajar as vítimas a denunciarem?

O papel da denúncia: De que forma a denúncia pode contribuir para a punição dos agressores e para a prevenção de novos casos de abuso?

A construção de uma cultura de respeito: Como a coragem de denunciar pode ajudar a construir uma cultura de respeito e tolerância nas escolas?

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Uma Crônica Sobre o Medo na Escola ("A violência é a confissão da incompetência." - Simone de Beauvoir)

 

Uma Crônica Sobre o Medo na Escola ("A violência é a confissão da incompetência." - Simone de Beauvoir)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O sol da manhã brilhava sobre o Bairro São Jorge, em Uberlândia, e o burburinho das crianças a caminho da escola enchia as ruas com uma energia inocente. Na porta da Escola Municipal Sebastiana Silveira Pinto, o motorista de uma van escolar esperava pacientemente seus pequenos passageiros. Seu rosto era gentil, mas carregava o cansaço de quem já viu de tudo. Ainda assim, nada o prepararia para o que estava prestes a acontecer.

O silêncio foi abruptamente rompido por um estrondo. Um homem, com a fúria estampada nos olhos, disparou contra o veículo. O motorista, atônito, mal teve tempo de reagir antes de ver o agressor fugir, deixando atrás de si um rastro de medo e perplexidade. A notícia se espalhou rapidamente, e o bairro, antes pacato, foi tomado pelo pânico. Mães corriam para a escola, aflitas, buscando qualquer informação sobre seus filhos. Mas, por um milagre ou acaso do destino, ninguém saiu ferido.

A polícia foi acionada imediatamente graças ao botão de pânico do aplicativo "Escola Protegida", e os agentes chegaram com rapidez. As primeiras investigações indicavam que o crime poderia ter sido motivado por um desentendimento banal ocorrido dias antes. No entanto, os reais motivos ainda permaneciam nebulosos.

Como professor e testemunha de tantas formas de violência em escola, lembro-me das agressões que já presenciei em outros contextos, como nos jogos do interclasse, onde ânimos exaltados se transformam em conflitos físicos. Fico perplexo ao perceber como a violência se insinua, sorrateira, em nosso cotidiano, atingindo até mesmo espaços destinados ao aprendizado e ao crescimento. A fragilidade da vida se impõe como uma verdade inquestionável, e o medo passa a fazer parte da rotina escolar.

Segundo a notícia que li, apesar do horror retratado, daquele dia, algo se sobressaiu: a resposta rápida da escola e da comunidade. Pais, alunos e professores se uniram, buscando apoio uns nos outros, compartilhando o susto, mas também fortalecendo a esperança de dias melhores. Esse episódio não pode ser apenas mais uma tragédia esquecida. Ele deve servir como um alerta para a necessidade de repensarmos a segurança em nossas escolas e a construção de um ambiente de respeito e tolerância.

A violência não pode ser normalizada. Ela não pode ditar as regras em um espaço que deveria ser um santuário de aprendizado. A escola precisa continuar sendo um lugar de acolhimento, onde crianças se sintam protegidas e cuidadas. Mas essa segurança não será conquistada apenas com câmeras ou aplicativos; é necessário um compromisso coletivo para transformar a realidade que nos cerca.

O medo ainda paira sobre nós, mas ele não pode nos paralisar. Enquanto houver esperança e a coragem de enfrentar esses desafios, ainda há espaço para a construção de um futuro mais humano e justo.

https://g1.globo.com/mg/triangulo-mineiro/noticia/2025/02/20/homem-armado-atira-em-van-e-ameaca-motorista-na-porta-de-escola-em-uberlandia.ghtml?fbclid=IwY2xjawIkYv9leHRuA2FlbQIxMQABHeeyu_nxCRsTUJNpI5FIV3n4D8QVHUcEhoSoy4dKJDek9MvK7tO2gnhWog_aem_chipejN0bW3tuwdIqGiOTQ (acessado em 20/02/2025)

Questões Discursivas sobre o Texto:

1. O texto descreve um incidente de violência em uma escola. Discuta as possíveis causas da violência nas escolas, indo além do caso específico apresentado no texto. Que fatores sociais, psicológicos ou culturais podem contribuir para esse tipo de ocorrência?

Habilidade: Compreensão e análise do fenômeno da violência escolar, suas causas multifacetadas e seus impactos na comunidade.

Resposta Esperada: Discussão aprofundada sobre as causas da violência escolar, incluindo fatores como desigualdade social, cultura de violência, problemas de saúde mental, bullying, etc. O aluno deve ser capaz de analisar o caso apresentado no texto como um exemplo de um problema mais amplo.

2. O autor do texto expressa preocupação com a "normalização da violência". O que significa essa expressão? De que forma a banalização da violência pode afetar a sociedade e a comunidade escolar?

Habilidade: Compreensão do conceito de normalização da violência e análise de seus impactos na sociedade e na escola.

Resposta Esperada: Explicação do conceito de normalização da violência como a aceitação e banalização de atos violentos, levando à perda da sensibilidade e à diminuição da capacidade de reação. O aluno deve ser capaz de analisar como essa normalização pode gerar um ciclo de violência e como afeta a comunidade escolar.

3. O texto destaca a importância da união da comunidade escolar para lidar com a violência. Qual o papel da escola, dos pais, dos alunos e da sociedade em geral na prevenção e no combate à violência nas escolas?

Habilidade: Compreensão da importância da participação de todos os atores sociais na prevenção e no combate à violência escolar.

Resposta Esperada: Discussão sobre o papel de cada um dos atores sociais na prevenção e no combate à violência nas escolas, incluindo a importância da comunicação, do diálogo, da educação para a paz, do acompanhamento psicológico e do fortalecimento dos vínculos entre escola, família e comunidade.

4. O autor do texto menciona o uso do aplicativo "Escola Protegida". Qual a importância da tecnologia e de outras medidas de segurança para garantir a segurança nas escolas? Essas medidas são suficientes para resolver o problema da violência nas escolas?

Habilidade: Reflexão sobre o papel da tecnologia e das medidas de segurança na prevenção da violência escolar, bem como seus limites.

Resposta Esperada: Discussão sobre a importância da tecnologia e das medidas de segurança para garantir a segurança nas escolas, mas também sobre seus limites. O aluno deve ser capaz de analisar criticamente o papel dessas medidas, reconhecendo que a violência é um problema complexo que exige soluções multifacetadas, que vão além da segurança física.

5. O autor do texto termina com uma mensagem de esperança, enfatizando a importância da coragem para enfrentar os desafios da violência. Que tipo de ações e iniciativas podem ser tomadas para construir um futuro mais humano e justo, onde a violência não encontre espaço nas escolas?

Habilidade: Capacidade de propor soluções e iniciativas para a construção de um futuro mais seguro e pacífico nas escolas.

Resposta Esperada: Apresentação de propostas concretas para a construção de um futuro mais humano e justo nas escolas, incluindo iniciativas como projetos de educação para a paz, programas de prevenção da violência, ações de combate ao bullying, fortalecimento do diálogo entre escola e comunidade, investimento em saúde mental, etc. O aluno deve ser capaz de defender suas propostas com argumentos sólidos e coerentes.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

O Sistema que nos Engole: Receba um bom dia ("Não há despertar de consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma." — Carl Jung)

 

O Sistema que nos Engole: Receba um bom dia ("Não há despertar de consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma." — Carl Jung)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Lembro-me do exato momento em que percebi que havia sido engolido pelo sistema. Não foi um despertar dramático, apenas uma constatação silenciosa numa manhã aparentemente comum. Eu cruzava o corredor em direção à sala dos professores quando notei que passava por colegas, funcionários da secretaria, pessoal da limpeza e da cozinha como se fossem apenas elementos do cenário. Nem "bom dia" eu dizia mais.

Em que momento deixei de ser aquele professor entusiasta e sorridente? Quando foi que esse pequeno gesto de cordialidade desapareceu do meu repertório diário?

Era cada vez mais difícil sair da cama pela manhã. Sentia-me pesado, como se carregasse um fardo invisível. E quando finalmente chegava à escola, apenas cumpria protocolos, passando pelos movimentos necessários, sem realmente estar presente. A verdade incontestável era que eu não estava sozinho nesse processo.

Os corredores da escola haviam se transformado em um desfile de rostos fechados e olhares distantes. O "bom dia" raramente encontrava resposta – quando muito, recebia um murmúrio desanimado ou um silêncio cortante. Alguns professores, absortos em sua própria pressa, pareciam nem notar a saudação. Outros, imersos em suas angústias pessoais, mostravam-se incapazes de retribuí-la.

O sistema que nos engole é um monstro sem rosto. Uma força silenciosa, uma névoa que envolve principalmente os recém-chegados, transformando-os gradualmente. O jovem professor inicia sua jornada repleto de ideias inovadoras, motivado, acreditando genuinamente que pode fazer a diferença. Contudo, dia após dia, observa a indiferença ao seu redor, os olhares cansados, os suspiros de exaustão. É um processo lento e imperceptível: o brilho nos olhos se apaga, a voz entusiasmada torna-se monótona, e o simples "bom dia" é a primeira vítima dessa desumanização coletiva.

A rotina nos consumia. Cada um carregava suas frustrações profissionais, a sensação de estar preso a um ciclo repetitivo e desgastante, a falta crônica de reconhecimento. A escola, que deveria representar um espaço de crescimento e aprendizado contínuo, havia se convertido em um campo minado de mal-entendidos e desânimo generalizado.

O choque veio quando um aluno me cumprimentou no corredor e só percebi o silêncio que devolvi quando já era tarde demais. Aquele momento foi revelador. Quando foi que parei de responder? Quando permiti que me deixasse levar pelo mesmo desânimo que um dia critiquei veementemente nos outros?

Naquela manhã, tomei uma decisão: lutar contra esse sistema invisível que nos suga a energia e a paixão, que nos transforma em meras engrenagens de uma máquina sem propósito ou significado. Voltei deliberadamente a dizer: "Receba um bom dia" em alto e bom som, mesmo quando não obtinha resposta. Forcei-me a sorrir, ainda que os rostos ao redor insistissem em permanecer fechados.

Foi apenas um pequeno gesto, mas percebi que, ao menos para mim, fazia uma diferença significativa. Talvez fosse um recomeço. Talvez fosse a simples lembrança de que, por trás dos cansaços acumulados e frustrações diárias, ainda somos humanos tentando sobreviver ao peso implacável dos dias.

E é exatamente isso que quero transmitir: não deixem que o sistema os engula por completo. Não permitam que a paixão e a energia que um dia os trouxe a esta profissão se perca nos meandros da burocracia e das políticas institucionais. Sejam professores que se importam verdadeiramente, que se preocupam com cada aluno, que renovam diariamente o amor pela educação.

Porque, ao final de cada jornada, o que realmente importa não é o sistema, não são os protocolos intermináveis ou as reuniões pedagógicas. É a paixão genuína, a energia renovada e a dedicação constante que nos definem como educadores.

E se nada mais funcionar, que ao menos continuemos dizendo: "Receba um bom dia" – esse pequeno ato de resistência humana contra a maré de indiferença que ameaça nos submergir. E correr o risco de cumprimentar uma mulher e ser acusado de assédio sexual.


Questões Discursivas


1. O texto menciona um "sistema que nos engole" como "um monstro sem rosto". Analise como as instituições sociais podem promover processos de desumanização e alienação entre seus membros, relacionando com o conceito sociológico de anomia social.

2. O autor descreve uma transformação gradual que afeta os professores novatos, do entusiasmo inicial à apatia. Discuta como os processos de socialização profissional podem contribuir para a reprodução de comportamentos e atitudes no ambiente escolar.

3. "A escola, que deveria representar um espaço de crescimento e aprendizado contínuo, havia se convertido em um campo minado de mal-entendidos e desânimo generalizado." A partir desta afirmação, reflita sobre a contradição entre o papel ideal das instituições educacionais e sua realidade prática na sociedade contemporânea.

4. No texto, o simples ato de dizer "Receba bom dia" é apresentado como uma forma de resistência. Discuta como pequenos gestos cotidianos podem representar formas de resistência microssocial contra processos de alienação nas instituições.

5. O autor menciona a "falta crônica de reconhecimento" como um dos elementos que contribuem para o desgaste profissional. Analise como as relações de trabalho na sociedade atual podem afetar a construção da identidade profissional dos educadores.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

Aposentando: Uma Crônica Sobre a Paixão de Ensinar ("Ensinar é a arte de despertar a curiosidade nos jovens e, em seguida, satisfazê-la." - Anatole France)

 Crônica  


Aposentando: Uma Crônica Sobre a Paixão de Ensinar ("Ensinar é a arte de despertar a curiosidade nos jovens e, em seguida, satisfazê-la." - Anatole France)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O giz estava na mão, a lousa imaculada, e o burburinho ansioso dos alunos ecoava pela sala. Naquele momento, a emoção transbordava em mim. Não era o peso da autoridade recém-adquirida, nem o ritual solene do início da aula. Era a inquietude, a *осознание* de que, a partir daquele instante, eu passaria a ser parte da história de cada um daqueles jovens.

Lembro-me da minha timidez inicial, do nervosismo ao apresentar a lição que havia preparado com tanto cuidado. Porém, ao fitar os olhos curiosos e atentos que me observavam, percebi que ensinar ia muito além de transmitir conhecimento. Era sobre construir pontes, despertar paixões, plantar sementes que germinariam em terrenos diversos.

Os anos passaram rapidamente, como areia entre os dedos. O quadro negro deu lugar às telas digitais, os alunos se multiplicaram, mas a essência do meu ofício permaneceu inalterada: a troca, o aprendizado mútuo, a alegria de ver o conhecimento florescer em mentes jovens.

Aprendi que as melhores aulas não são aquelas em que os alunos apenas ouvem, mas sim aquelas em que questionam, desafiam e ousam discordar. Foi com um aluno assim, um jovem de perguntas incisivas e argumentos perspicazes, que vivi uma das maiores lições da minha carreira.

No começo, confesso, suas interrupções me incomodavam. No entanto, com o tempo, percebi que sua curiosidade era um presente, um convite ao debate, ao aprofundamento. Anos depois, já formado, ele me disse: "O senhor me ensinou a pensar, e isso vale mais do que qualquer resposta".

Essa frase ecoa em mim como um mantra. Ensinar me transformou, me deu propósito e me fez sentir parte de algo maior. A ideia da aposentadoria, confesso, me assusta. É como se, ao deixar a sala de aula, eu perdesse um pedaço de mim.

Mas a vida, com sua sabedoria, me mostrou que um professor nunca deixa de ser professor. Nossa marca permanece nos corações e mentes de cada aluno que cruzou nosso caminho. As lições que transmitimos, os valores que plantamos, continuam a ecoar em suas vidas, influenciando suas escolhas e moldando seus futuros.

Hoje, vejo a educação de longe, mas com o mesmo carinho e entusiasmo de sempre. Guardarei comigo as lembranças de cada turma, de cada rosto, de cada história. E a certeza de que, enquanto houver alguém disposto a aprender, haverá sempre um professor pronto para ensinar. Eis-me aqui.

Porque ensinar não é apenas uma profissão; é uma vocação, um chamado que ecoa em nossa alma e nos impulsiona a compartilhar o conhecimento que "valoriza" em nós. É a missão de transformar vidas, de construir um futuro mais justo e promissor para todos.

E essa missão, meus amigos, jamais se aposenta.


Aqui estão 5 questões discursivas baseadas no texto acima, com foco nas ideias principais.


1. A Emoção do Primeiro Dia

O autor descreve a emoção do seu primeiro dia como professor. Como essa experiência se relaciona com a sua própria trajetória como aluno? Que sentimentos te marcaram nesse início e como você acha que eles influenciam sua visão sobre a educação?

2. Ensinar Além do Conhecimento

O texto destaca que ensinar vai além de transmitir informações. O que significa construir pontes, despertar paixões e plantar sementes? Como você enxerga o papel do professor nesse processo de desenvolvimento dos alunos?

3. O Valor do Questionamento

O autor aprendeu que as melhores aulas são aquelas em que os alunos questionam e desafiam. Por que a curiosidade e o debate são importantes para o aprendizado? Como os professores podem incentivar essa postura crítica nos alunos?

4. A Marca de um Professor

O texto afirma que a marca de um professor permanece nos corações e mentes de seus alunos. Que tipo de impacto você espera que seus professores tenham em sua vida? Como você acha que os professores podem influenciar positivamente a trajetória de seus alunos?

5. Ensinar como Vocação

O autor descreve o ensino como uma vocação, um chamado que o impulsiona a compartilhar conhecimento. Qual é a sua vocação? O que te motiva a seguir a carreira que você escolheu? Como você acha que sua vocação pode contribuir para a sociedade?

domingo, 16 de fevereiro de 2025

Flores no portão da escola ("A crueldade de um ato reside principalmente na intenção que o inspira." - Samuel Johnson)

 

  • Flores no portão da escola ("A crueldade de um ato reside principalmente na intenção que o inspira." - Samuel Johnson)

    Por Claudeci Ferreira de Andrade

    Na porta da escola, havia flores. Muitas flores. Fitas brancas tremulavam ao vento, bilhetes escritos com letras trêmulas eram deixados por desconhecidos, carregando um misto de pressa e incredulidade. Um crime brutal havia acontecido ali, e a cidade de Daejeon, na Coreia do Sul, tentava compreender o impensável: como uma professora — alguém encarregada de ensinar e proteger — pôde matar uma aluna de oito anos a facadas dentro da sala de aula?

    Tudo aconteceu na manhã de 10 de fevereiro de 2025. A menina, escolhida ao acaso, foi atraída para a sala de vídeo. Era para ser mais um dia comum, uma sucessão de lições, intervalos e risadas infantis. Mas não foi. A professora, que deveria guiá-los, tornou-se algo inominável.

    O socorro chegou rápido, mas a pequena já não resistia aos ferimentos. Cortes no rosto e no pescoço. Marcas que, para os que presenciaram a cena, jamais cicatrizariam. A própria agressora foi encontrada ferida, com sinais de que tentara acabar com a própria vida. Não conseguiu. Restou-lhe confessar. Disse que a escolha da vítima foi aleatória. Não havia motivo, não havia vingança, não havia desavença. Apenas um plano: levar consigo uma vida inocente antes de dar fim à própria existência.

    A notícia espalhou-se como um incêndio. A indignação cresceu junto com o medo. Como um sistema inteiro falhou em enxergar o perigo antes que se tornasse tragédia? O Departamento de Educação revelou que a professora havia solicitado afastamento no ano anterior. Estava em depressão. Voltou ao trabalho recentemente, mesmo apresentando comportamento violento. Chegou a agredir um colega, mas, em vez de ser afastada de forma definitiva, permaneceu em funções administrativas sob supervisão. Até que supervisionar não foi suficiente.

    Naquele dia, a escola não abriu suas portas para o conhecimento. Abriu-as para a dor, para o luto, para a fragilidade da vida. As flores, como um manto de piedade, cobriram a entrada — um grito silencioso de repúdio à violência. Os rostos cabisbaixos nas ruas, as entrevistas hesitantes das autoridades e os comunicados formais da presidência interina apenas reforçavam o vazio que aquela morte deixava.

    Colegas de trabalho relataram que a professora, nos últimos dias, manifestava comportamentos estranhos, sinais de um sofrimento silencioso. Afastada das salas de aula, mas ainda presente na escola, sua presença era um prenúncio de desgraça. O que leva alguém a destruir o que deveria proteger? O que significa um sistema que não consegue evitar seus próprios colapsos? Há perguntas que jamais encontrarão resposta. Mas há cicatrizes que permanecem muito além dos corpos que as carregam.

    E eu, por aqui, sou testemunha ocular de uma situação levada ao extremo. Se um professor pede licença, o sistema dificulta. Se solicita a aposentadoria já conquistada por direito, leva um ano para a análise do processo e deferimento. A burocracia do sistema mata seus professores, assim como Jerusalém matava seus profetas. Pergunto-me: onde erramos? Onde se perdeu a humanidade? Quando a sala de aula se transformou em palco de horror?

    No portão da escola, entre as flores e as fitas brancas, um bilhete chamava atenção. Uma criança havia escrito com letras tremidas: "Por quê?".

    E talvez essa seja a única pergunta que realmente importe.

    Que a dor dessa menina nos sirva de alerta. Que as flores no portão não sejam apenas um símbolo de luto, mas um clamor por mais amor, mais cuidado, mais empatia. Que a escola volte a ser um lugar de refúgio, onde o saber floresce e a vida é celebrada.


    https://g1.globo.com/mundo/noticia/2025/02/11/professora-mata-aluna-de-7-anos-a-facadas-na-coreia-do-sul.ghtml (Acessado em 16/02/2025)


    Questões discursivas sobre o texto:


    1. Análise da Tragédia:

    O texto descreve um cenário de profunda tristeza e perplexidade, marcado por um crime brutal ocorrido em uma escola.

    Com base no texto, analise os sentimentos que permeiam a narrativa, destacando como o autor os transmite ao leitor.

    Discuta a importância da comoção expressa no texto como forma de repúdio à violência e de solidariedade às vítimas.

    2. O Sistema em Xeque:

    A notícia da tragédia levanta questionamentos sobre a segurança nas escolas e a capacidade do sistema educacional de proteger seus alunos e professores.

    Reflita sobre a seguinte passagem do texto: "Como um sistema inteiro falhou em enxergar o perigo antes que se tornasse tragédia?"

    Discuta as possíveis falhas do sistema que podem ter contribuído para o ocorrido, como a falta de apoio a professores com problemas de saúde mental e a insuficiência de medidas de segurança.

    3. A Busca por Respostas:

    O texto evidencia a busca por respostas para perguntas complexas sobre a natureza humana e a violência.

    A pergunta central, expressa no bilhete encontrado no portão da escola – "Por quê?" – ecoa a perplexidade diante da brutalidade do crime.

    Comente a importância de mantermos viva a busca por respostas, mesmo que elas não sejam fáceis de encontrar, como forma de aprendizado e prevenção.

    4. O Papel da Escola:

    A escola é apresentada no texto como um lugar que deveria ser de refúgio e aprendizado, mas que se transformou em palco de horror.

    Discorra sobre a importância da escola como espaço de proteção e desenvolvimento para crianças e adolescentes.

    Apresente propostas para que a escola possa cumprir seu papel de promover a cultura de paz e o bem-estar de todos os seus membros.

    5. Empatia e Solidariedade:

    O texto termina com um apelo à empatia, ao cuidado e ao amor como antídotos à violência.

    Reflita sobre a importância da empatia e da solidariedade para a construção de uma sociedade mais justa e pacífica.

    Discuta como podemos cultivar esses valores em nossas comunidades e em nossos relacionamentos, especialmente no ambiente escolar.