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MINHAS PÉROLAS

A minha maior inquietação aqui é por que os crentes fanáticos precisam defender seu Deus, sem se importar em machucar o próximo de fé contrária! Quem é o Deus de quem? Seria o adorador maior sobre o adorado?
Claudeci Ferreira de Andrade

sábado, 12 de abril de 2025

A Escola Silenciada ("Primeiro estranha-se, depois entranha-se." Autor: Fernando Pessoa)

 

A Escola Silenciada ("Primeiro estranha-se, depois entranha-se." Autor: Fernando Pessoa)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Foi numa manhã comum de quarta-feira que percebi: a escola estava perdendo a voz. Não a voz literal — aquela que ecoa pelos corredores e quadros brancos —, mas a outra: a que forma, contesta, ensina e ousa dizer não. Essa voz, que um dia foi bússola, agora me soava como um sussurro abafado por aplausos protocolares e carimbos de satisfação.


A primeira pista surgiu numa reunião de pais. Um encontro para alinhamento de expectativas, diziam. Mas logo se revelou um tribunal informal. A cada fala do professor, um julgamento. A cada proposta pedagógica, uma objeção. “Acho que seria melhor mudar o conteúdo de História para algo menos... polarizador”, sugeriu um pai, com o sorriso de quem já trazia o veredito. A professora retribuiu o sorriso — não por concordância, mas por cansaço.


Foi então que percebi: o papel do docente vinha sendo reescrito — e não por ele. De formador de pensamento, passara a prestador de serviço. Bastava um feedback negativo no grupo de WhatsApp para que a direção o chamasse “só para conversar”. E a tal conversa, invariavelmente, era um eufemismo para: “veja se agrada mais os pais, está bem?”. A escola tornou-se um palco em que os professores atuam sem roteiro, tentando satisfazer uma plateia exigente e volúvel, que aplaude apenas o que lhe convém.


Lembro de uma colega recém-chegada que ousou propor um trabalho sobre desigualdade social. Em três dias, já enfrentava uma enxurrada de queixas. “Meu filho chegou triste em casa, professor não é terapeuta”, disseram. Em uma semana, o tema foi retirado da grade. Ela continuou, claro. Mas um pouco mais calada, um pouco mais retraída. Assim como todos nós.


O mais irônico é que, por trás de tantos discursos sobre autonomia, respeito e desenvolvimento integral, instalou-se uma pedagogia da conveniência. Educar, agora, é agradar. Questionar tornou-se arriscado. Reprovar, então, virou pecado. O aluno aprende cedo que basta uma reclamação estratégica para que o mundo se curve ao seu favor. E aprende rápido.


Outro dia, uma aluna me interrompeu no meio da explicação para dizer que não prestava atenção em minha aula, porque não concordava com nada que eu dizia. Quando tentei argumentar, ele avisou que sua mãe já estava “falando com a coordenação”. Saí da sala com um gosto amargo na boca — não era frustração, era impotência. Não se tratava mais de ensinar, mas de sobreviver ao dia sem desagradar demais.


Aos poucos, compreendi: a escola que escuta demais, sem critério, vai se esquecendo de ensinar. Cada vez que silencia uma orientação em nome do agrado, renuncia um pouco de si mesma. E a cada concessão sem debate, abre espaço para um vazio onde deveria haver reflexão.


Hoje, quando olho para os quadros repletos de fórmulas e palavras bonitas, me pergunto quantas delas ainda dizem algo verdadeiro. Porque educar não é entreter. Não é agradar. Não é evitar o choro, nem apagar as diferenças. Educar é, muitas vezes, frustrar com propósito. Fazer do incômodo um degrau. E isso exige coragem.


Mas a coragem anda sumida. Talvez esteja soterrada sob pilhas de avaliações externas, protocolos de conduta e relatórios de desempenho. Talvez tenha sido silenciada pelo medo de retaliações. Ou, quem sabe, ainda esteja ali, viva — esperando o tempo em que a escola volte a ser escola. Não uma loja de agrados, nem um balcão de queixas.


De tudo isso, fica uma certeza: a verdadeira educação não busca palmas fáceis. Ela busca transformação. E transformar, meu caro, nunca foi tarefa para os que temem desagradar.


Olá! Como seu professor de sociologia, preparei 5 questões discursivas simples com base nas ideias principais do texto:


1. O autor descreve a perda da "voz" da escola, distinguindo-a da voz literal. Explique o que o autor entende por essa "voz" pedagógica e quais elementos do texto indicam que essa voz está sendo silenciada no ambiente escolar contemporâneo.

2. O texto apresenta a reunião de pais como um "tribunal informal". Analise essa metáfora, identificando os papéis sociais que pais e professores parecem assumir nessa dinâmica, e discuta como essa situação pode afetar a autonomia e a prática pedagógica dos educadores.

3. O autor argumenta que o papel do docente está sendo redefinido, passando de "formador de pensamento" a "prestador de serviço". Quais exemplos concretos do texto ilustram essa transformação? Discuta as implicações dessa mudança para a qualidade da educação e para a relação entre professores, alunos e pais.

4. A experiência da professora que propôs o trabalho sobre desigualdade social revela tensões entre a liberdade pedagógica e as expectativas dos pais. Sob uma perspectiva sociológica, como você analisa esse episódio? Quais são os possíveis impactos da supressão de temas relevantes para a formação crítica dos alunos?

5. O autor conclui que a "verdadeira educação não busca palmas fáceis" e que "transformar nunca foi tarefa para os que temem desagradar". Explique essa afirmação à luz dos exemplos apresentados no texto. Qual a importância da "coragem" mencionada pelo autor no contexto da prática educativa e da resistência às pressões externas?

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