Naquela manhã, quando vi a silhueta da coordenadora na porta da sala, senti um calafrio percorrer minha espinha. Já sabia o que aquilo significava. Ela não viera apenas para uma visita cordial ou para trocar algumas palavras amáveis. Ela queria ver, avaliar, medir. Sempre que isso acontecia, em meu período probatório, quando eu estava recém concursado, a sensação era a de estar sob um microscópio, com cada palavra e gesto analisados minuciosamente.
Ela entrou sem alarde, ocupou um canto discreto ao fundo da sala e cruzou os braços, como um espectador num teatro silencioso. Os alunos perceberam. Não era apenas a minha aula que estava sob escrutínio, mas também o comportamento deles. Sorrisos contidos, olhares desconfiados, o burburinho da sala de aula, que normalmente dançavam entre o permitido e o insolente, tornaram-se um sussurro tímido. A coordenadora era um farol de vigilância, um olho bem visível que pesava sobre cada ação. Suspeitava que, quando eles descobrissem que o alvo era apenas o professor, a presença da coordenadora se tornaria outro motivo para os alunos hostilizarem o docente, pois, é sabido que os inimigos se unem quando o adversário é comum. Você sabia que, em muitas vezes, os alunos ficam na porta da sala com o professor dentro da sala para a coordenadora "brigar" com ele, essa é a intensão. A coordenadora várias vezes foi na minha sala, vendo os meninos fora, botava a cabeça na porta e me perguntava: — Professor, o que este meninos fazem fora da sala? E os "estudantes" entravam rindo. E quase sempre acrescentavam: — O professor não está passando nada, não!
Fiz o que sempre faço. Expliquei, perguntei, provoquei reflexões. O ritmo da aula seguiu seu curso, ainda que eu sentisse o peso daquela observação. A presença da coordenadora me lembrava que ensinar não era só um ofício, mas também um espetáculo, e que, como todo espetáculo, estava sujeito a críticas.
Após a aula, veio a devolutiva: — "Gostei da sua abordagem, mas notei que alguns alunos não estavam tão engajados... Notei também e sei que sua matéria de ensino, a sociologia, não é uma ciência exata, portanto não há um roteiro que se segue com precisão cirúrgica. É um jogo de tentativa e erro, um equilíbrio delicado entre o que planejamos e o que acontece de fato".
A coordenadora se foi, e eu fiquei ali, sozinho na sala vazia, pensando na estranha relação entre quem ensina e quem avalia. A ideia de que alguém observa para entender e melhorar é bonita na teoria, mas, na prática, muitas vezes se transforma em uma sensação incômoda, quase invasiva.
E então, concluí: mais importante do que assistir a uma aula é compreender a complexidade de ser professor. Porque há algo que nenhum observador pode captar de fato: o peso diário da responsabilidade, os desgastes visíveis e invisíveis, o cansaço que se disfarça em entusiasmo. Só quem está dentro do palco da sala de aula entende a real arte de ensinar.
No fim das contas, a coordenadora pode assistir à aula. Mas, será que ela realmente vê? Aí, o povo responde: — "Olha, esse papo todo é muito bonito, mas, na real, ninguém aqui fica preocupado com a formação da coordenadora pedagógica, não. O que a galera quer saber é se ela vai ajudar a melhorar a escola ou só ficar de 'blá-blá-blá'. E quem é que se importa com essa história de especialização? A pedagoga pode não saber de matemática ou física, mas se ela for boa de papo e souber lidar com a galera, já tá valendo. E outra, se ela é coordenadora, é porque tá no comando, né? O povo tá cansado de esperar que alguém que 'entende de educação' venha resolver as paradas, porque o que rola mesmo é que, às vezes, quem manda lá não sabe nada de sala de aula. Então, se a pedagoga souber organizar a escola e dar uma ajuda pros professores, já tá ótimo, mesmo sem saber os detalhes de todas as matérias".
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