Coleção 76 ("Uma coletânea de pensamentos é uma farmácia moral onde se encontram remédios para todos os males." — Voltaire)
Por Claudeci Andrade
1 A prostituição, como qualquer trabalho, é a troca legítima de tempo, corpo e habilidade por sustento; condená-la revela mais a hipocrisia social e religiosa do que uma verdadeira defesa da moral, pois onde há demanda, a marginalização apenas perpetua a exploração e nega direitos que a legalização poderia garantir.
2 A reputação, outrora símbolo de virtude, tornou-se um artifício de sobrevivência: quem não tem riqueza precisa comprar aceitação com gentileza, pois, em um mundo que valoriza aparência e utilidade, o caráter serve menos à moral que à conveniência dos que julgam.
3 A rebeldia juvenil, disfarçada de indiferença, revela uma resistência à instrução que se manifesta no corpo e no olhar; enquanto os jovens desprezam o saber por considerá-lo antiquado, o professor persiste, não por glória, mas por dever, e nessa teimosa fidelidade ao ofício encontra a prova de que ainda merece existir.
4 A enfermidade e a pobreza desnudam a fragilidade dos vínculos humanos, revelando que a maioria das relações se sustenta no interesse; quando o bolso esvazia, a lealdade desaparece, e resta ao desiludido fingir autossuficiência para disfarçar o abandono que a miséria expõe.
5 A falsa erudição se revela na incapacidade de sustentar ideias sob crítica; nas arenas virtuais, onde a ignorância se disfarça de autoridade, quem questiona é punido, provando que a sabedoria não está em impor opiniões, mas em submeter o próprio pensamento ao exame que liberta do autoengano.
6 Toda exposição de ideias atrai inimigos, e medir-se por eles é reconhecer o valor do próprio pensamento; contudo, quando a incompreensão e a dor se acumulam, a ausência torna-se refúgio e castigo; um silêncio que separa os que aprendem dos que apenas observam, pois as pérolas do espírito não se lançam aos que não sabem vê-las brilhar.
7 Contra o narcisismo disfarçado de autoajuda, o pensamento proclama a humildade como forma de lucidez: reconhecer-se pequeno, esperar o pior e agir em silêncio é o antídoto contra a ilusão de grandeza que faz do homem um tolo satisfeito com sua própria mentira.
8 A rebeldia juvenil nasce do ressentimento por uma infância perdida e transforma-se em vingança disfarçada de liberdade; quem aprendeu a brincar com o pouco e em paz não precisa usar os outros como brinquedos, pois a verdadeira maturidade vem de quem nunca precisou ferir para se sentir vivo.
9 A celebração da consciência negra, esvaziada de propósito, torna-se símbolo de uma escravidão moderna; a da ociosidade e da desculpa, pois, sob o disfarce das causas coletivas, Vê-se apenas a fuga individual da responsabilidade e o culto à própria impotência.
10 O mal espalha-se com a naturalidade de uma doença, enquanto o bem exige esforço e consciência; quem convive com o vício aprende seus gestos, pois o pecado é sedutor e fiel à própria natureza, ao passo que a virtude, rara e silenciosa, é o único escudo que dispensa o medo da morte.
11 A escola, que deveria ser refúgio de saber, tornou-se território de hostilidade, onde a experiência incomoda e o mérito envelhece; ali, o professor veterano descobre que décadas de serviço valem menos que a conveniência dos medíocres, e que o reconhecimento só é dado a quem nada ameaça.
12 A Bíblia, tida como Palavra de Deus, revela-se espelho do leitor: quanto mais o homem tenta “clareá-la”, mais a transforma em suas próprias palavras; assim, o sagrado não se perde no texto, mas na ignorância de quem o interpreta sem sabedoria.
13 A doença revela o que somos: nela, o corpo fraqueja para que o espírito se prove; e, na solidão, descobre-se que amar sem possuir é a forma mais pura de caridade. Pois o bem não está no reconhecimento alheio, mas na intenção silenciosa; e é por isso que o céu se enche dos que agiram por respeito, não dos que esperaram gratidão.
14 A mediocridade das massas teme a luz da inteligência e, por isso, apaga quem brilha; na escola e na vida, os melhores são punidos por não se dobrarem ao comum, tornando-se minoria oprimida num mundo que confunde igualdade com nivelamento por baixo.
15 O cinema, exaltado como arte popular, tornou-se espelho da degradação moral: alimenta a ilusão dos acorrentados da caverna, que tomam sombras por cultura, enquanto a verdadeira elevação; intelectual, ética e espiritual, se perde num mundo que confunde prazer com valor e espetáculo com sabedoria.
16 A fé, corrompida pelo comércio e pela arrogância dos que dizem servir a Deus, perde seu sentido quando o homem percebe que existir basta, e que nem ele precisa de Deus, nem Deus dele — pois a verdadeira descrença nasce não da dúvida, mas da decepção com os que fingem crer.
17 O afeto humano raramente é puro: o sucesso e o dinheiro reconciliam o que o amor não sustenta, pois, no fim, todos gostam de quem oferece ganhos; e poucos amam sem receber nada em troca.
18 A autoridade da coordenadora revela-se ilusória: domina a teoria, mas foge da prática, ditando métodos que ela mesma é incapaz de aplicar; prova de que, na escola, o poder muitas vezes se sustenta mais na burocracia que no saber.
19 O egoísmo disfarçado de hábito revela-se nas reuniões onde cada um ocupa mais espaço do que precisa; ali, até as bolsas têm assento, enquanto o respeito coletivo permanece de pé; sinal de que a convivência profissional cedeu lugar à vaidade e à falta de consideração.
20 A escola vangloria-se dos que triunfam sem ela, celebrando como mérito próprio o sucesso que a desmente; e, no ritmo dessa ironia, chegará o dia em que bastará ser poeta para receber um diploma; prova de que o ensino se tornará homenagem ao acaso, não à educação.


Nenhum comentário:
Postar um comentário