O Seis que Virou Zero ("O silêncio dos bons é mais perigoso que a brutalidade dos maus." — Martin Luther King Jr.)
Tudo começou no início deste semestre. Em um vídeo que prometia ser uma calorosa saudação de boas-vindas aos educadores, presenciamos algo muito diferente: uma hostilidade velada contra uma professora chamada Débora — uma voz corajosa que ousou denunciar a aprovação automática. Débora, professora da Rede Estadual de Educação há 15 anos, criticou abertamente a pressão exercida pela Secretaria de Educação para que nenhum aluno tivesse média inferior a seis. Naquele momento, em meio às falas oficiais, senti um nó na garganta.
Eu a compreendia perfeitamente. Débora, com sua sinceridade, tocou na ferida aberta da nossa categoria: o assédio silencioso, mas constante, que enfrentamos para garantir artificialmente que todos os estudantes atinjam a nota mínima. Como ela mesma ousou dizer, em um comentário que ressoa como grito de guerra entre nós: "o seis é o novo zero da Secretaria de Educação." Em sua fala, ela questionou o absurdo de um sistema que baseia sua eficácia em resultados maquiados, rankings inflados e uma fantasia pedagógica que ignora a realidade das salas de aula.
A verdade é que essa pressão nos rouba o que temos de mais precioso: a autonomia. Hoje, já não podemos decidir nossos métodos avaliativos, nem como conduzir a recuperação de um aluno durante o bimestre. Essa cultura de aprovação automática desvaloriza nosso trabalho, ignora o processo real de aprendizagem e impõe um sistema perverso e conivente com a mediocridade. E eu, assim como Débora, posso provar. No semestre passado, conheço casos de professores que lançaram notas vermelhas e, ao voltarem de férias, encontraram essas notas misteriosamente alteradas — agora convertidas em aprovações — pelo próprio secretário da escola.
E não foi só Débora. Também ouvi relatos da professora Marta, que viu sua planilha ser “ajustada” sem qualquer consulta, e de Rodrigo, obrigado a refazer o conselho de classe sob orientação da direção, tudo para “melhorar os números”. A verdade é que há um palco montado onde se encenam notas e se silenciam verdades. As cortinas se abrem com discursos inspiradores, mas, nos bastidores, manipula-se a narrativa com o cinismo de quem despreza o aprendizado real. Cada boletim retocado é um ato nesse teatro de ilusão. E os professores, quando ousam sair do script, são tratados como ameaça.
Basta abrir o Sistema de Gestão Educacional (SIGE) para ver. Em muitas escolas, todas as notas estão convenientemente acima de seis. Mas a realidade é implacável. Quando nos deparamos com os resultados das avaliações externas, como o IDEB, os índices seguem baixos ou muito baixos. Como é possível, então, que as médias internas estejam todas acima da média exigida? A resposta é clara: estamos diante de um esquema.
O objetivo, percebi, não é pedagógico, mas político. O governo busca inflar artificialmente as notas dos estudantes para subir nos rankings do IDEB. O que deveria ser uma ferramenta séria de avaliação foi transformado em instrumento de propaganda institucional.
Diante disso, minha voz se junta à de Débora. Se você, professor, também se sente pressionado a inflar as notas de seus alunos, se percebe que a aprovação automática já virou regra silenciosa em nosso estado, saiba que não está só. O silêncio é a nossa maior derrota. Precisamos, juntos, dar voz a essa denúncia para corrigir essa distorção. Precisamos revelar a verdadeira face da educação pública em Goiás, para que a dignidade da nossa profissão e a integridade do aprendizado de nossos alunos não continuem sendo, mais uma vez, as vítimas.
https://www.instagram.com/reel/DM2kZFAuSuF/?igsh=YzAyMDM1MGJkZA== (Acessado em 02/08/2025)
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O texto que acabamos de ler é mais do que uma simples denúncia. Ele é um material valioso para a Sociologia, pois nos revela as tensões, os jogos de poder e as contradições que existem na instituição escolar. Ao falarmos da "aprovação automática", não estamos tratando apenas de notas, mas de como o sistema de ensino se organiza para atingir certos objetivos — sejam eles pedagógicos ou, como o texto sugere, políticos. A crônica de Claudeci Ferreira de Andrade nos convida a pensar criticamente sobre o nosso próprio sistema educacional. A partir da lente da Sociologia, podemos analisar a escola como um espaço de relações sociais complexas e, por vezes, conflituosas. Vamos às perguntas para a nossa reflexão!
1 - O texto descreve um cenário de "pressão" e "assédio" da Secretaria de Educação sobre os professores. Com base na Sociologia das Relações de Poder, discuta como essa prática afeta a autonomia profissional dos docentes e quais as consequências dessa perda de liberdade para o processo de ensino e aprendizagem.
2 - A crônica diferencia a realidade das notas internas (altas) com a das avaliações externas (baixas, como o IDEB). Discuta, a partir da Sociologia da Educação, por que essa manipulação de resultados pode ser entendida como um problema social e quais os riscos de basear a eficácia de um sistema de ensino em "resultados maquiados".
3 - O autor afirma que o objetivo da aprovação automática é político, visando melhorar o ranking do IDEB para "propaganda institucional". Analise sociologicamente essa prática, explicando como a educação, que deveria ser um meio para o desenvolvimento humano, pode ser transformada em um instrumento para fins políticos e de marketing.
4 - A prática de alterar notas dos professores no Sistema de Gestão Educacional (SIGE) por funcionários da escola é revelada no texto. Explique, a partir da Sociologia do Trabalho, como essa prática pode desvalorizar a profissão de professor e criar um clima de desconfiança e desmotivação na categoria.
4 - O texto finaliza com um apelo aos professores para que "dêem voz a essa denúncia" e rompam o silêncio. Como a solidariedade profissional e a mobilização coletiva, conceitos importantes na Sociologia, podem ser ferramentas para que os professores defendam sua dignidade e promovam mudanças reais no sistema educacional?
https://www.instagram.com/reel/DM2kZFAuSuF/?igsh=YzAyMDM1MGJkZA== (Acessado em 02/08/2025)



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