"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

Pesquisar neste blog ou na Web

MINHAS PÉROLAS

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Uma Realidade Educacional Distorcida ("O declínio da educação anuncia a decadência de uma nação." - Platão)


Uma Realidade Educacional Distorcida ("O declínio da educação anuncia a decadência de uma nação." - Platão)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Na manhã seguinte à entrega dos boletins, a escola foi tomada por uma tensão que se espalhou rapidamente, como fogo em palha seca. O pai da menina, furioso, exigia explicações: como sua filha poderia ter tirado apenas dois em uma prova? “Isso é o que ela mereceu!”, disse a mãe, com o tom de quem tenta justificar o injustificável. No dia seguinte, uma reunião na escola. A diretora, com uma autoridade que parecia vir de algum lugar indefinido, ordenou: “Proibido dar menos que sete. Se a criança tirar dois ou três, a culpa é de vocês, professores. Isso engana os pais, porque eles não aceitam que seus filhos não estão aprendendo.” Eu, ali, era apenas um espectador dessa ordem. O que se passou em minha mente foi um turbilhão: como justificar uma farsa dessa magnitude?

Aquela situação, onde o aprendizado real havia sido substituído pela mera aparência de aprendizado, não era novidade para mim. No entanto, o que vi no dia seguinte me abalou ainda mais. Em outra escola, um menino de oito anos, sem hesitar, foi até a cozinha, abriu a bolsa da moça da limpeza e tirou cinco reais. Quando ela o flagrou, uma gritaria tomou conta do ambiente. “Ladrão! Sem vergonha!” O grito dela ecoou pelos corredores, e a diretora, como que surgindo do nada, desceu as escadas. “O que houve?”, perguntou, com sua autoridade de quem resolve tudo com uma palavra. “Ele pegou meus cinco reais do ônibus!” O menino, parado, não dizia uma palavra. “Toma dez”, ordenou a diretora. “Cala a boca, vai trabalhar, guria, e volta para a aula.” E, assim, tudo parecia resolvido, como se fosse um simples erro, como se a moral do menino não importasse. Mas a verdade era outra. Ali, em meio à bagunça e ao desdém, um ladrão de oito anos estava sendo ignorado por um sistema que se recusava a reconhecer suas falhas.

Essa é a realidade distorcida que vivemos. Em vez de educar, as escolas parecem mais preocupadas em agradar os pais, em proteger suas imagens, mesmo que isso signifique omitir a verdade. Em muitas dessas instituições, não se pode mais advertir o aluno, nem impor limites. O professor, em vez de ser o guia, é silenciado, uma figura decorativa, impotente diante de um sistema que prefere fazer de conta que tudo está bem. E o que isso gera? Um ciclo de desrespeito que se perpetua, uma geração sem disciplina, sem caráter. A indisciplina se torna regra, e a falta de aprendizado se disfarça de sucesso.

Lembro de um pai que, em uma reunião de escola, arremessou as chaves de sua casa sobre a mesa da diretora e disse: “Eu pago o salário de vocês! Não se esqueçam disso!” Como se o dinheiro fosse a única medida de valor em um ambiente que deveria ser de educação e respeito. O que ele não percebe é que a falta de disciplina e limites custa mais do que qualquer salário. A falta de respeito por parte de pais, alunos e até da própria instituição leva a um futuro incerto, onde o ensino não prepara mais para o mundo real.

A escola, com sua falsa sensação de autoridade, já não é mais um espaço genuíno de aprendizado. Transformou-se em um campo de batalha, onde os professores, acuados, são impedidos de ensinar, de impor limites, de educar. Hoje, no lugar de um professor respeitado, temos uma figura desmoralizada, que não pode mais disciplinar nem exigir nada de seus alunos. E, ao invés de formar cidadãos conscientes, o sistema educacional vai moldando uma geração sem caráter e sem responsabilidade.

Como educador, sinto o peso dessa transformação. Fico me perguntando: até quando vamos permitir que isso aconteça? Até quando vamos aceitar que nossa profissão seja tratada com tanto desdém? Chega o momento em que precisamos nos levantar e dizer que a educação não é uma mercadoria, que a autoridade não é negociável, que a disciplina e o respeito são valores que devem ser preservados. O professor deve ser respeitado, não apenas pelo salário, mas pela importância do seu papel. E o sistema precisa reconhecer isso, ou o que teremos é uma geração perdida, sem limites, sem rumo.

Eu, como professor, me recuso a ser parte dessa farsa. A verdadeira educação não se faz com tapinhas nas costas ou promessas vazias. Ela exige coragem, exige respeito. E, mais importante, exige a verdade.


Preparei 5 questões discursivas e simples para você refletir sobre a crise no sistema educacional contemporâneo, sob a perspectiva da sociologia da educação e do trabalho:


1. A crônica descreve escolas onde a "aparência de aprendizado" e a preocupação em "agradar os pais" se sobrepõem ao ensino real e à disciplina. "Sob a ótica da sociologia da educação, como podemos analisar essa inversão de valores no contexto escolar contemporâneo? Que fatores sociais e culturais podem estar contribuindo para essa priorização da 'aparência' em detrimento da 'essência' da educação?"

2. O texto relata a desvalorização da figura do professor, que se torna "silenciado" e "impotente", perdendo sua autoridade e capacidade de disciplinar. "Como a sociologia do trabalho docente pode nos ajudar a entender esse processo de desprofissionalização e desvalorização dos professores? Quais as consequências dessa desvalorização para a qualidade da educação e para a motivação dos educadores?"

3. A crônica aborda a questão da indisciplina e da falta de limites nas escolas, mencionando alunos que "fazem o que querem" e pais que "não aceitam que seus filhos não aprendem". "De que maneira a sociologia pode analisar a relação entre escola, família e sociedade na produção e reprodução da indisciplina e da violência no ambiente escolar? Quais as implicações sociais e culturais da falta de limites na formação das novas gerações?"

4. O texto critica um sistema educacional que "prefere fingir que tudo está bem" e "omite a verdade" para evitar conflitos e manter as aparências. "Como a sociologia pode nos ajudar a compreender os mecanismos de manutenção de 'fachadas' e de 'ilusões' em instituições sociais como a escola? Quais os custos sociais e educacionais dessa cultura da dissimulação e da falta de transparência?"

5. Em suma, a crônica questiona "até quando vamos permitir que isso aconteça?" e conclama os professores a "se levantarem" e "dizerem que a educação não é mercadoria". "Na sua perspectiva sociológica, quais seriam os caminhos possíveis para reverter esse cenário de crise na educação? Que papel podem desempenhar os professores, as famílias, as escolas, o Estado e a sociedade em geral na construção de um sistema educacional mais justo, eficiente e valorizador dos profissionais da educação?

Nenhum comentário: