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sexta-feira, 18 de abril de 2025

O Quadro-negro e o Palanque ("Não me mostre o caminho já trilhado, mas abra-me a veredas." Autor: Cora Coralina)

 

O Quadro-negro e o Palanque ("Não me mostre o caminho já trilhado, mas abra-me a veredas." Autor: Cora Coralina)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Nunca esqueci o dia em que entrei em sala de aula pela primeira vez como professor. Havia uma lousa limpa, cadeiras enfileiradas e um cheiro forte de giz novo — desses que riscam com facilidade e soltam um pó fino que se entranha nos dedos. Eu havia preparado uma aula sobre cidadania, uma daquelas que a gente imagina que vai mudar o mundo. Mas bastou abrir a boca para perceber que o mundo já tinha mudado... e eu não tinha sido consultado.

Os alunos, ainda adolescentes, pareciam recitar um roteiro ensaiado, como se já soubessem as respostas antes mesmo das perguntas. Falavam de opressores, estruturas de dominação e hegemonia cultural com uma fluidez que me espantou. Pensei: quando foi que ensinaram isso a eles? E, mais importante, por que não sabiam sequer localizar os estados brasileiros no mapa que estava ao lado?

Ali, naquele instante, percebi que a escola já não formava leitores, mas soldados. A gramática virou “instrumento de dominação”, o cálculo, “expressão do capitalismo”, e até a literatura foi reduzida a um campo de batalha entre classes. O livro didático se tornara manifesto. E o professor? Um mediador de lutas, não mais um guia para o conhecimento.

Senti-me deslocado. E não era pela idade. Era pelo espanto de ver a educação transformar-se em campo ideológico. Ao invés de iluminar o caminho, apagava-se a luz para que ninguém enxergasse a porta de saída. Formava-se, ali, uma geração que aprendera a suspeitar antes de entender, a acusar antes de escutar. A escola, outrora templo de dúvidas, virou fábrica de certezas prontas — e todas com a mesma cor.

Houve um tempo em que se aprendia a pensar para escolher. Hoje, ensina-se a escolher sem pensar. Os discursos são decorados, as convicções não passam por reflexão. E quando se ousa discordar, a resposta vem em coro: “você é opressor”. Nunca vi tamanha obediência travestida de rebeldia.

Não se trata de negar a história, tampouco de ignorar desigualdades. Mas quando a educação perde o senso de universalidade, quando passa a servir a projetos políticos e não a projetos de vida, é o aluno quem mais sofre. Não porque esteja sendo oprimido, mas porque foi convencido de que pensar por conta própria é um perigo. E se é verdade que um povo ignorante é mais fácil de manipular, então o objetivo parece ter sido atingido com maestria.

Hoje, ao olhar meus próprios alunos — muitos incapazes de escrever uma carta com coerência, mas prontos para marchar por slogans — sinto que a escola falhou. E falhou não por falta de recursos ou tecnologia, mas por excesso de intenções.

Educar não é pintar o mundo com uma única cor. É dar ao aluno a paleta completa, para que ele próprio misture, teste e descubra a sua. Ensinar é um ato de confiança — confiança de que o outro pode pensar diferente de você e, mesmo assim, não ser seu inimigo.

Ao final de cada aula, apago o quadro e olho para as cadeiras vazias. Às vezes penso que a escola virou um palanque — e, entre discursos e palavras de ordem, o silêncio do pensamento crítico se perdeu. Mas eu sigo ali, esperando que um aluno qualquer levante a mão e diga: “professor, posso discordar?”. Nesse dia, talvez eu volte a acreditar que ainda há esperança. Os marcos antigos são apontados como referência para resgatar valores tradicionais na educação, família e escola.


Como seu professor de sociologia, preparei 5 questões discursivas simples que exploram os pontos cruciais do meu relato sobre a experiência em sala de aula:


1. O autor descreve uma mudança na forma como os alunos se expressam em sala de aula, utilizando termos como "opressores" e "hegemonia cultural". Como essa linguagem surpreendeu o professor em seu primeiro dia, e qual a principal preocupação que essa observação levanta sobre a formação dos estudantes?

2. Segundo o autor, a escola parece ter se transformado em algo diferente de um espaço de aprendizado tradicional. Que metáfora ele utiliza para descrever essa nova função da escola, e quais as implicações dessa transformação para o papel do professor e o desenvolvimento dos alunos?

3. O autor argumenta que, em vez de aprenderem a pensar para escolher, os alunos são ensinados a "escolher sem pensar". Explique o que ele quer dizer com essa afirmação e quais as consequências desse modelo de ensino para a autonomia e o pensamento crítico dos jovens.

4. Em sua análise, o autor diferencia entre reconhecer a história e as desigualdades e o que ele considera um excesso de "intenções" na educação. Qual é a crítica principal por trás dessa distinção, e como ele acredita que essa situação afeta a experiência dos alunos?

5. Na conclusão do texto, o autor expressa uma esperança em relação ao futuro da educação. Qual é essa esperança, e que tipo de interação em sala de aula representaria um sinal positivo para ele? Como essa expectativa se relaciona com a visão de educação que ele defende ao longo do texto?

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