"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

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terça-feira, 30 de junho de 2009

INCOERÊNCIAS LICENCIADAS (Educação é polidez?)



Claudeci Ferreira de Andrade

          Um dia, fui à Câmara dos Vereadores para participar de uma capacitação do PES (Planejamento Estratégico da Secretaria), como cheguei um pouco depois do início, tive dificuldade para arranjar um assento, pois cada professor, ali, ocupava duas cadeiras, uma para se assentar e outra para colocar seus pertences. Ao entrar, quando empurrei a porta de vidro, soou um barulho que fez notória minha chegada, dei alguns passos para frente à procura de uma cadeira disponível, mas nenhuma estava.  Porém, não me restava outra opção, senão escolher uma das pessoas ali e o fiz; passaram-se uns dois a três minutos até que ela arrumasse, no colo, toda a sua papelada e outros objetos de uso pessoal, constrangeu-me muito pedir licença, eles estavam indiferentes. Contudo, eu já tinha compreendido a sua má vontade, ela entraria em prejuízo com relação aos demais! Sendo assim, eu também estava, somente procurei tirar a diferença, dirigindo a palavra àquela “virtual” cursista, digo virtual, porque estava cochilando, minha tão conhecida de outros encontros. É claro que apenas murmurei a seus ouvidos; a reunião estava a todo vapor:

          — Não me leve a mal, professora Ana, mas como estar o desempenho do palestrante?

          Na verdade, eu não queria saber do desempenho de ninguém. O que eu queria mesmo era quebrar o “gelo”. Ela demorou um pouco até retornar ao mundo real, então repeti a pergunta, foi quando o dirigente virou-se para a tela de projeção, criando oportunidade para o nosso diálogo, que me respondeu:

          — Estou gostando!

          — Você não acha uma incoerência paralisar todos os gestores e o pessoal da Secretaria para tratarem de um assunto pertinente só a uns poucos diretores de departamento? Falei sem muita propriedade, pois acabara de chegar e ainda não tinha pegado o “fio da meada”.

          Naquele momento, interessava-me apenas o momento, e ela teria que me aceitar em “sua cadeira guarda-volumes”, portanto, para isso, estava tentando lhe provar que eu seria uma boa companhia, que me ceder a cadeira foi um bom investimento. E me pareceu ter conseguido, porque ela preferiu desabafar-se comigo a assistir a reunião.

          — E o que não é incoerente na educação? – Perguntou-me sem muita meticulosidade e continuou enumerando outras contradições: — Os professores cobram da Secretaria cursos de aperfeiçoamento, e depois colocam mil dificuldades para participar. Veja quantas pessoas estão aqui!

          Na deixa, pensei e retruquei imediatamente: — Se todos os professores estivessem aqui como cumpririam o calendário letivos? Quando fariam a reposição das aulas?

          — Você tem razão, – disse ela – lembrando que um sábado letivo não serve para repor um dia letivo, sobra pouco espaço no calendário escolar! Que isso também é uma grande incoerência, não se discute.

          Conversa vai, conversa vem, e eu já preocupado com o desconforto que estávamos causando aos vizinhos de simpósio, com nosso zum-zum-zum, chamei sua atenção para o assunto da palestra:
          — Parece-me que este tal "PES" é igual ao "PDE"!?

          — É incoerente do mesmo jeito. — Disse ela com ares de descrença.— Elabora-se um plano de ações financiáveis no início do ano, com dados do ano passado, para se executar com o dinheiro já insuficiente que vai chegar no final do ano vigente.

          — Mas, com isso estamos acostumados, – asseverei – elaboramos nossas aulas em janeiro para os alunos que nem conhecemos!

          Eu tentei confortá-la; o que consegui foi apenas lhe apertar no amaranhado do infortúnio da libertinagem educacional. Fui, também, um exemplo de incoerência. Como pude ir a uma palestra e ficar tão ausente! Talvez a Ana seja apenas o prefixo de Analfabeto ou Anacrônico; eu, nesse caso, seria o morfema lexical de Claudicar, porém se damos mancadas, ou não sabemos das coisas, ou, ainda, estamos fora de moda, ninguém mais se incomoda com essas coisas! Educação é "polidez"?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 31/07/2009
Código do texto: T1728900

Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original (Autoria de Claudeci Ferreira de Andrade,http://claudeko-claudeko.blogspot.com). Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas



SE NÃO SEI, EIS A QUESTÃO (A meus (ex)-alunos)


SE NÃO SEI, EIS A QUESTÃO (A meus (ex)-alunos)

por Claudeci Ferreira de Andrade

           Agora sei que sou um “péssimo” professor, pois eles me convenceram a isto, aqueles do terceiro ano do Ensino Médio, dizendo: — "Você é péssimo porque é muito certinho, formal, nunca falta e fala difícil, é velho e feio, não nos traga mais jornais, queremos aquilo que cai nos vestibulares."
           A verdade é que ensino a variedade padrão da língua portuguesa, com metodologias diversificadas. O que outros mais prendados diriam se eu fosse avacalhado e descompromissado como requerem os moldados pelas novelas: Rebelde, Malhação e Caminho das índias; incluindo nesse lixão outros programas humorísticos que caricaturizam as salas de aula?! Compreendo por que alguns colegas disseram que eu não sei dar aula e tenho pouco a contribuir para unidade escolar. É que estou do outro lado. Mas, consigo entender perfeitamente o que significa ter salário por fazer o que é correto. Pelo menos ainda tenho consciência!
           O aprendizado e a formalidade (disciplina), como experiência, são inseparáveis. Podemos separá-los pedagogicamente, mas na vida real da sala de aula, não se pode assimilar o conteúdo ensinado sem respeito e reflexão. Os grandes educadores, que também foram grandes alunos, mantiveram o devido equilíbrio entre o aprendizado e a disciplina.
           Se eu não tiver quem me ouça, as páginas da história apregoarão que o aprendizado só acontecerá mediante grande esforço. E isso é sintetizado no cotidiano. Só não sei aonde a escola pública quer chegar, dando tudo, gratuitamente, alimentando os alunos que nem valorizam. Nesse sentido, O bom aluno fica raro demais nos sistemas paternalistas. Como é difícil "criança criada por avó"!
           Meu conforto é que o mundo ensina, disciplina e corrige. É o mercado de trabalho, que  não dar nada a ninguém que nos habilita a obedecer. É o trabalho que paga nossa penalidade. É a vida que comunica seu poder para alcançarmos a vitória sobre nossos erros. Oxalá que meus ex-alunos, se fracassados, não me acusem de culpado porque não fui maioria, lembrando que a maioria nem sempre está certa.
            É porque me amo, acima de tudo, que aprendi a obedecer, bem cedo, na vida. Louvado seja o mundo por fazer o que a educação não consegue.
             Não existe péssimo professor para o bom aluno. Antes de ser aluno seja humilde, pois antes de ser professor fui aluno humilde.
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 30/07/2009
Código do texto: T1727016


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NA CONTRA PERNA DA EDUCAÇÃO (“Só ensina quem aprende”)

Na contra perna da educação
Claudeci Ferreira de Andrade

         Era um congresso de professores, mas eles chamaram-no de movimento popular, por se tratar de um evento de educadores populares: 5º MOVA – BRASIL, este era o slogan utilizado, tudo a ver com o impulso da paixão que se elevava na alma daqueles Alfabetizadores. Como membro do Núcleo da Educação de Jovens e Adultos para a Cidade de Senador Canedo, propus-me a participar da comoção juntamente com mais dois representantes do NEJA: os Josés. Senti-me indigno daquele local de tão aconchegante que era: CTE-CNTE (centro de treinamento educacional), mas depois que foram chegando os representantes de outros segmentos, convenci-me de que estava em qualquer lugar. Após nosso credenciamento, só deu tempo de guardarmos as malas naquele apartamento de cinco camas e logo descemos para o jantar daquele primeiro dia. Como eu estava ansioso para conhecer pessoas novas, Aquela seria a melhor ocasião. À mesa das iguarias, formou-se uma longa fila. Tamanha era nossa vontade de exibir nossos patrocinadores que parecíamos mais um arco-íris em flocos desordenados. Na minha frente, estava um alfabetizador, vestindo uma camiseta do movimento dos sem-terra, como a fila estava muito lenta, e eu, muito cansado, juro que, por um momento, desejei ardentemente me escorar na muleta dele, pois lhe faltava uma perna; percebi, também, quando cambaleava nos pequenos movimentos rumo ao self service que lhe faltava algo mais: estava bêbado! Pensei comigo mesmo – se é apenas um alfabetizador de adultos, esse hábito não faz tanto mal! Mas, mudei a forma de pensar em menos de vinte minutos, já com os pratos cheios nas mãos, rumo às mesas, quando, de súbito, ele escorregou na ardósia polida e caiu sobre mim. A ironia da vida convenceria qualquer um que naquele momento, eu estaria mais faminto que todos ali, porque sua comida esparramou-se toda em minha barriga numa atração fatal. Alguém cuidou de pegar rapidamente meu prato, nem vi quem foi, agora com as mãos desocupadas, atraquei-me com aquele sujeito com o intuito de não deixá-lo derrubar a refeição de todo mundo, se apoiando no balcão dos servidores; agora, eu também estava bêbado, deslizamos desequilibradamente, por alguns instantes, no óleo da comida derramada no piso, até que uma equipe, de meia dúzia de pessoas, contornou a situação, colocando-nos em equilibrio.
Que professora generosa! Aquela que tirou o prato de minha mão, evitando quebrá-lo, e aguardava-me à mesa; agradeci e formulei um elogio como é do meu feitio, não daquela forma, mas ali, eu não estava com espírito para essas coisas, mesmo assim disse:
— como você é ágil! Preciso ver se a carteira ainda se encontra em meu bolso!
— Você está me chamando de ladra ou de prostituta? – perguntou-me num impulso agressivo.
— Nem uma coisa, nem outra, estou apenas enaltecendo sua eficiência e agilidade como a de um ladrão.
Eu não estava em condições de continuar me justificando naquela celeuma e me retirei, mas ainda não havia “comido” o suficiente. À noite, dormi mal, assistindo ao reflexo daquela criatura de "boa" interpretação, sendo mais claro, meu colega de quarto, que também era paraense, levou-a para dormir com ele em sua cama.
Alguém já havia me dito que “só ensina quem aprende”; que “a educação não muda o mundo, a educação muda as pessoas e as pessoas mudam o mundo”; que “ninguém educa ninguém, se educa sozinho, nós nos educamos juntos”; que “o homem não nasce fazendo nem sabendo, O homem nasce brincando”. Também me disseram que “todo professor tem problemas psicológicos”. Eu não queria acreditar, mas depois de tantas capacitações vividas, não sei se preciso de um tratamento especializado, ou de mais um congresso de professores!

Aprende-se com motivação (Não existe coincidência, existe sim providência.)

Aprende-se com motivação (Não existe coincidência, existe sim providência.)
Claudeci Ferreira de Andrade

         Tinha um cigarro entre os dedos, atitude esta repugnante para mim; não para ela, pois agia tão naturalmente que não se dava conta que estava sendo alvo de meu julgamento hostil. Então veio em minha direção, sentou-se gentilmente ao meu lado, pareceu-me muito tímida pela maneira acanhada que me cumprimentou, continuei observando discretamente seu comportamento, sua cabeça virava-se de um lado para outro, de baixo para cima com frenesi. Foi por isto que deduzi: pelo seu olhar descomprometido com qualquer alvo fixo, procurando algo que não estava ali; então somei coragem para dirigir-lhe a palavra, mexi-me na mureta onde estávamos assentados, em um ponto de ônibus. Para tanto, retomei o espaço o qual ela criara entre mim e si para não me incomodar com a fumaça; fiz uma aproximação sutil e lhe perguntei:

         — Como aprendeu a fumar?

         Agora controlada por outro espírito, com o olhar voltado para baixo em contrição, como quem precisava se confessar; respondeu com palavras que pareciam não querer sair de seus lábios, pois vinham de um passado muito mordaz:

  — Foi participando de rodas de amigos, nas quais brincávamos de quem segurava mais a cinza na ponta do cigarro, quem a deixasse cair primeiro pagaria uma prenda. Eu era sempre quem perdia, não sabia fumar, a certa altura me engasgava com a fumaça e tossia muito, então tinha que pagar a prenda, era um pacto sério entre nós! Quem não satisfizesse o contrato seria cortado do grupo. Por essa razão, o perdedor ficava sujeito a um sorteado do grupo para fazer o que ele quisesse. Se uma menina perdia, sorteava-se entre os homens; se um menino perdia, sorteava-se entre as mulheres; a verdade é que quase sempre terminava em “transa”. Elas estavam acostumadas “naquilo”, eu não, tinha só treze anos naquela época, e perdi minha virgindade à vista de todos. Olha, mas eu não culpo meus amigos, apesar de ter herdado o vício e hoje sentir dores nos pulmões, ainda fui infeliz em meu casamento por meus desajustes psicológicos, enganava meu esposo muitas vezes quando fugia para as rodas licenciosas. Eu era mesmo uma viciada. Ele, porém, não era daquilo, era um homem comedido. Agora só me resta lamentar duas dores vizinhas em meu peito: dói os pulmões e o coração. Ultimamente estou frequentando uma “célula”, lendo a Bíblia e orando muito. Já abandonei tudo de errado! Para eu viver melhor só me resta abandonar o cigarro. Você não merece respirar fumaça, e a “fumaça” de minha boca!
         Terminava de falar quando chegou sua irmã menor, era uma criança de aspecto bem diferente, duvidei que, de fato, fosse da mesma família, tinha tez e olhos claros, mas me apresentou e disse que era ela a razão de sua inquietação naquele momento, pois estavam sozinhas e precisavam chegar em casa em paz. Então desejei-lhe essa paz que tanto almejava; no momento da despedida, acrescentei-lhe uma promessa:

  — Sua história será contada a muitas pessoas por algumas gerações para falar do bem que você me fez, mostrando-me o poder da transformação, quando eu já contava que o meu seria um caso perdido.

Apenas me agradeceu com uma entonação de dúvida, ela não entendeu que eu falava de minha consciência pesada, porque contemplava nela o cachorro que fugia do vômito, e eu, o cachorro que voltava ao vômito. Presenteei-lhe um livro, na tentativa de merecer suas orações. Neste momento, confirmo, mais uma vez, a veracidade do pensamento que não existe coincidência, existe sim providência.

Professor, cadê seu texto? (Os verdadeiros cegos são aqueles que veem, mas preferem ser mal conduzidos.)


CRÔNICA


Professor, cadê seu texto? (Os verdadeiros cegos são aqueles que veem mas preferem ser mal conduzidos.)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

          Alguém já disse: “Faça o que digo e não faça o que faço.” A palavra influência não aparece nessa frase, mas está implícita. Apesar de carregada com um sentido negativo, porém ninguém pode negar o poder da influência. O que é mais influente do que a ação de quem produz num lugar onde só se manda fazer? O exemplo é muito benéfico quando positivo. É silencioso, mas sua influência é poderosíssima. A única ocasião em que o exemplo produz algum ruído é quando está inspirando para uma realização maligna.
          Já foi levado a bocejar porque outra pessoa o estava fazendo? Isto constitui uma simples ilustração do poder da influência. Ela é sentida em todos os aspectos da vida. Até os animais são influenciados uns pelos outros. O Talmude (livro sagrado dos Judeus, no qual estão copilados as tradições, as doutrinas e os costumes do povo hebreu) declara sucintamente: “Uma ovelha segue a outra”. Diz um antigo provérbio chinês: “Não os gritos, mas o voo do pato selvagem leva os demais a voar e a acompanhá-lo”. Um interessante adágio espanhol expressa-o desta maneira: “Vive com os lobos, e aprenderás a uivar”.
          O verdadeiro professor reconhece o poder da influência (intelectual, comportamental etc.) em sua prática pedagógica. Ele escreve antes de querer que seus alunos produzam bons textos. Certas pessoas que conheço muito bem exercem grande influência sobre mim em virtude de sua prática de ler e escrever. Quanto mais o professor escreve bem, mais poderosa será sua influência nesse sentido. Como cobrar para ensinar o que não sabe fazer?
          Qualquer que seja a sua disciplina (matéria) de trabalho, considere um privilégio e uma honra deixar brilhar o seu talento, para que os seus alunos vejam os seus bons textos. O resultado será o engrandecimento e a eficácia de sua docência.
          Quem escreve escraviza no bom sentido, é um dominador pela condução do leitor. Aliás, o leitor só tem um caminho a seguir: deixar se conduzir, ou pelo sim, ou pelo não; ou aceitar, ou não aceitar; ou concordar, ou não concordar. E quem escolher ser conduzido pelo não, ou seja, discordando da ideia do autor lido, é pior que escravo, é miserável. Aqui cabe bem uma frase da professora Lourdinha: — "Os verdadeiros cegos são aqueles que não veem a ordem e, por isso, preferem ser mal conduzidos."

Encaminhamento de Percepção
1 Quão influente é o exemplo?
2 O que acha do pensamento: Só se aprende escrever escrevendo!
Como cobrar para ensinar o que não sabe fazer?
4 Têm os outros professores de outras disciplinas obrigação se saber escrever bem para exigir dos seus alunos melhor desempenho? 
5 Por que os rebeldes à leitura são considerados os verdadeiros cegos?


Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 27/07/2009
Código do texto: T1721555

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segunda-feira, 29 de junho de 2009

QUEM É O PROFESSOR MAIS FELIZ?











QUEM É O PROFESSOR MAIS FELIZ?

segunda-feira, 29 de junho de 2009
 Claudeci Ferreira de Andrade

            Os diferentes cursos de graduação, na maioria das vezes, são escolhidos não por grau de vocação a uma profissão, mas por amor ao dinheiro e ao emprego, visando apenas maior segurança material.
            Almejemos  sim, da segurança desse pretenso emprego; não renunciemos a possibilidade de um salário que nos será proporcionado justamente. Porém, nessa extremidade estão os professores de "sangue azul" que renunciam ao sacerdócio e à vocação, e procuram evadir-se aos bons princípios éticos, focalizando apenas a possibilidade de melhorar financeiramente. Mesmo assim, conscientemente, alguns entram na obra como mercenários por "merreca"; outros, às vezes, já a muito tempo no trabalho, continuam desprezando até mesmo seu público alvo que surpreendentemente "paga o pato", não passa de coisa. E ainda procuram provar seu triunfo fora do que os profissionais de boa índole mais prezam: os valores internos. Ainda, às vezes, perdem de vista o pagamento justo pelo que fazem e querem muito mais, atirando-se nos movimentos grevistas e atraindo a infâmia sobre todos nós. Esta dedicação interesseira ao magistério cativa admiração de muitos até, e deixa pouca esperança para o resto da categoria.
           Para sermos felizes, precisamos ser superiores não somente ao dinheiro e seus males, mas também a seus valores. Não há dúvida de que muitos devotam ao magistério e satisfazem suas necessidades materiais, isto é, ganham o dinheiro que precisam! Mas, não há como alcançar a felicidade, exercendo uma profissão totalmente desprovido de amor à causa. O salário é consequência.
           São mais felizes os que estão livres da dominação do egoísmo. O professor deve ser senhor de todas as coisas. Quem quer que vá pela vida, supondo que a felicidade e a satisfação virão mediante a prosperidade material, abrindo mão das coisas da alma, ficará desapontado. Sacrifício é sempre um serviço de amor: amor ao próximo e à profissão.
           Neguemo-nos a nós mesmos e nos demos aos outros em serviço útil. Nosso verdadeiro relacionamento com o professorado não é simplesmente sobrepormo-nos a ele, nem, principalmente, dele obter riquezas materiais, mas amá-lo como Cristo amou o mundo e morreu para salvá-lo. Amemos o professorado, porque na atividade do vocacionado há vida real. Deixe o professor a sua vocação e não haverá para a sociedade valores morais, nem vida, nem futuro. A vocação restaura no homem o supremo valor profissional e seus atributos reconciliam no homem o trabalho e o prazer. Em qualquer profissão podemos acumular grandes riquezas, podemos melhorar as condições humanas; tudo isso seria possível, também, com uma atuação desvocacionada, mas os homens ainda estariam perdidos, se o amor não fizesse a diferença. Só é feliz o professor que ama o que faz, independente do que ganha para fazê-lo.

 Encaminhamento de percepção

 1- Deveria um professor, devotado ao Professor dos professores (Jesus Cristo), participar de movimentos grevistas por melhoria salarial em detrimento aos transtornos educacionais e a despeito do que possa manchar sua imagem missionária?
 2- Que relação contemplamos com respeito à formação acadêmica e o desempenho de um professorado próspero?
 3- Quais são as características de um professor vocacionado?
 4- Que efeitos chegarão a um professor insatisfeito com seu trabalho – a ele e a seu público?
 5- O que significa amar o que fazemos?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 26/07/2009
Código do texto: T1719745

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LIÇÃO ECOLÓGICA (Alguém fez isso!)











LIÇÃO ECOLÓGICA (Alguém fez isso!)

por Claudeci Ferreira de Andrade

          Da vila Galvão para o terminal do Novo Mundo não é muito longe, mas para mim, foi uma eternidade. Já eram 6 horas da tarde quando estava de volta. Tive que dividir, no ônibus, um banco de dois assentos com uma jovem de mais ou menos 16 anos que me fez refletir em coisas profundas da alma: o que é nossa vida?! Fui motivado a chegar a respostas deprimentes ao contemplar sua aparência que era digna de compaixão: tinha os cabelos tingidos de louro, amarfanhados, na verdade era uma espécie de matiz esfumaçado de preto com louro; seu cheiro era uma mistura de urina com álcool; suas roupas, que mal cobriam as vergonhas, não tinham cor definida, eram pura sujeira. Olhei para os seus pés, estavam descalços, sujos e com unhas crescidas.
          Encolhi-me em meu canto, quando percebi que ela se movimentou para me dirigir a palavra; que hálito insuportável! Seus lábios estavam inchados e inflamados. Falou-me do aparelho celular que acabara de roubar de um homem bêbado, queria se desfazer do tal objeto rapidamente por medo de ser apanhada pela polícia, então insistia para eu comprar o telefone por dez reais; apenas abanei a cabeça algumas vezes em sinal de reprovação e me virei para a janela, desejando que tivesse mais espaço naquela direção. Mas as circunstâncias forçaram-me a me reportar mentalmente para outro cenário.
          Lá fora, visto que passávamos na GO-403, às margens do rio meia-ponte, no meio dele, contemplei uma garça paralisada a espreita de algo que pudesse alimentar-se, já que ela não podia roubar celular para vender. Pensei, tendenciosamente, olhando apenas para mim mesmo, que a situação da garça solitária se assemelhava mais com a minha do que com a daquela jovem. Porém, logo depois, concluí que, por ter de suportar o mau cheiro daquelas águas poluídas e o roçar morno da correnteza opaca na pernas, por horas a fio, de plantão e não ter pescado nada, se é que tinha algum peixe ali para ser pescado, a garça assemelhava-se mais com ela naquele momento! Ora se parecia comigo, ora com ela!
           Só contemplando um pouco mais a alteração artificial da paisagem, visível a olho nu, e a contaminação do meio, palpável, pude ver, cá no ônibus, a minha semelhança com a maltrapilha! Que situação a nossa! Por que a garça não tinha suas penas branquíssimas como deveriam ser!? Seria uma camuflagem! Uma nova espécie!? Ou essa contaminação lhe incomodava? Certamente! Corajoso e atrevidamente me virei para minha parceira de viagem e perguntei se suas roupas sujas lhe incomodavam. Não! Justificou-se, dizendo que a culpa era de alguém, assim como o rio a sujou, e alguém sujou o rio. Estremeci pela a evidência de que a jovem também contemplava a garça encardida e tinha as mesmas impressões que eu. Naquele momento, desfizeram-se todas as nossas diferenças, ela também pensava, não apenas vegetava, ou melhor, isso fez a diferença, apreendi. Somos vítimas igualmente. Alguém fez isso e não foi a chuva! Ou seja, Deus!

Encaminhamento de percepção

 1- Reflita também sobre a pergunta: O que é nossa vida?
 2-Que tipos de vícios relata a crônica e qual é o grau de influência nas situações mencionadas?
 3-Qual seria sua reação se encontrasse alguém como essa jovem?
 4-Em que circunstâncias a garça suja e solitária pode ser tanto o narrador personagem, quanto a jovem maltrapilha?
 5- Por que o narrador chegou a pensar que a jovem não teria sensibilidade suficiente para relacionar as situações?
 6- A quem se refere o texto na frase: “Alguém fez isto”
?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 25/07/2009
Código do texto: T1718151

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LENTES DE ALUNO (Os jovens precisam mais de modelos sociais e não de grevistas)





















LENTES DE ALUNO (Os jovens precisam mais de modelos sociais e não de grevistas)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Escrevo esta crônica, especialmente, supondo que sempre há um ou outro aluno contemplando longa e constantemente a vida de seus mestres e procurando imitá-la; com certeza, sei que conseguirão. Mas, uma coisa gostaria de saber: É a nossa vida assim digna de imitação? Tudo que nossos alunos precisam é de exemplos de amor e justiça para segui-los!
Suponhamos que alguém lhe dê uma paleta, pincéis e tinta, e mande você imitar um mestre da pintura. Quantas horas necessitaria para estudar suas pinturas? Isto na verdade não é impossível. O mesmo aconteceria se tivesse de imitar um famoso cantor, e muitos o fazem. Quantos dias, meses e anos de prática seriam necessários para chegar a imitá-los? Na verdade, com muito esforço, um dia tudo será possível. Porém imitar os bons é muito necessário e urgente, visto que o dia já declina. Falo, sobretudo, da arte de moldar o caráter como parte da responsabilidade social, um talento que Deus deu a todos. Aliás, uma habilidade que Deus não negou a nenhum de nós, bastando apenas desenvolvê-la dentro dos moldes da contemplação: é molduragem do caráter 
Como podem imitar a seus professores e líderes por olhando-os longamente, examinando-lhes cada movimento e cada palavra que eles proferirem sem copiar deles também o caráter? Isto acontece espontaneamente; é uma imitação natural. Aconselho que continuemos com a disciplina pessoal do eu, em concentração constante, com pouco ou o mínimo possível do tempo de lazer (afrouxamento dos princípios morais) para maior dedicação à formação pessoal para a vida: disciplina. Já é o que a nova escola pretende: “educar para vida”. Que redundância,  se isso a própria vida já o faz. Volto a afirmar, os alunos precisam, na verdade, é de professores formadores de bons cidadãos, motivados de dentro para fora; isso implica verdadeira reforma em sua natureza interior, transformação essa inspiradora nas nossas demonstrações: modelos sociais e não de grevistas. Por isso, nós, mestres, chefes e líderes precisamos nos regenerar primeiro e viver uma vida socialmente “ideal”, porque somos lentes para nossos seguidores. Então, a você que segue meu conselho: ache-se em si mesmo antes de imitar-me; saiba quem você é, e aonde quer chegar; não seja apenas uma conformidade externa, mas uma resposta espiritual.
Os bons exemplos não se relacionam com os outros tão fluentemente como os fazem os maus exemplos, que são atrevidos. A imitação do mau deixa-nos afastados de nós mesmos, entorpecidos. Nesse caso, quando procuramos reagir e viver como os bons vivem, o fazemos sob nossa própria força é assim que funciona, precisamos da fé e obras. Lembremos que os bons precisam comunicar aos maus, cada dia, nova vida. Precisamos ser o amor personalizado. Nada menos que isto satisfará a demanda vigente.  Assim é a experiência do mestre que também é aprendiz. A harmonia social depende da proliferação dos bons.

Encaminhamento de percepção

1-Onde a escola peca quando se propõe a educar para vida?
2-O que vale mais na arte de ensinar: o palanque do professor ou o seu exemplo de vida dentro e fora da sala de aula?
3-Quando decidimos resolver os problemas a nosso modo, com nossas próprias forças, sem contar com a ajuda de Deus, o que acontece?
4-A vida de nossos professores modernos é digna de imitação?
5-Em que condição nossos mestres, chefes e líderes devem ser imitados?

O NOVO BRASIL DAS REVOLTAS ("O gigante acordou" mais pobre, brigando por vinte centavos!)
























O NOVO BRASIL DAS REVOLTAS ("O gigante acordou" mais pobre, brigando por vinte centavos!)

Quinta-feira, 26 de junho de 2013
Por Claudeci Ferreira de Andrade
          Desejaram-me um feliz Brasil velho. O velho Brasil  de outrora com sua carga de boas recordações que perdurará para a eternidade, e continuará sendo sempre o melhor. Que todo pensamento, todo sentimento, agora sejam das boas lembranças do que passou. Tenho uma feliz lembrança após a outra; só assim amenizo as algozes interrogações do presente momento: Que novo Brasil das revoltas é esse!? O PASSADO NÃO RECONHECE O SEU LUGAR. Então, tenho que concordar com Simeyson Silveira quando disse: "Não consigo entende quem procura obter pela força o que pode ser conseguido pela persuasão, nem quem prefere a violência, quando a concórdia é igualmente eficaz. Onde reina a violência, a razão se aniquila." (Brasil. O povo vai às ruas em busca de quê? DM-OP 26/06/2013).
          A evidência da necessidade que tenho, do cuidado e do amor de Deus em dose dupla, a cada instante vindouro, é expressa na desestruturação causada pela já prevista destruição do patrimônio físico e moral dos brasileiros. O meu olhar calejado demora-se sobre um vácuo, ou melhor, num vazio e num horizonte novo e incerto, onde tudo me faz desejar a situação anterior. Como diz o outro: "eu era feliz e não sabia". Ouço sobre maldição, sobre a pobreza que tem sido provida tão abundantemente para dificultar nossa sobrevivência neste mundo de bonança e me pergunto: em que consiste a minha parte na grande trama da politicagem reinante? É que, ainda, contudo, me desejaram um feliz ontem! Eu também como peregrino, como estrangeiro em busca da estabilidade, trago-lhes a alegria do velho Brasil, e digo-lhes que busquem razões para praticar bons princípios inabaláveis e depois podem me esquecer se puder. Considerando as provisões feitas por nós, e falando sobre os benditos momentos passados, não se esqueçam também dos novos aborrecimentos e aflições desta vida vindoura. Nesse particular  parecemos respirar a mesma atmosfera destes últimos dias: o melhor, porque ainda nos resta este! Assim ficamos aliviados e confortamo-nos uns aos outros; mais do que isso, regozijamo-nos em Deus.
          Não poderíamos conhecer o que nos acontecerá no futuro, a não ser pelas experiências do passado, pois é somente por elas que sabemos o que está preparado como uma colheita infalível. Como as flores, na sábia disposição de Deus, estão constantemente extraindo as propriedades do solo rico de restos mortais, assim é conosco. Extraímos das vivências passadas toda a paz, conforto e esperança que desenvolverão em nós os frutos da alegria e da fé. Ao trazer essas cicatrizes à nossa vida presente, sempre as comunicamos à vida dos outros, por isso, também, desejo-lhes um feliz passado. Devo me aquietar esperando do novo, desconhecido, uma melhor saída das tribulações? Que preciosas lições de otimismo, ética e cidadania vocês têm para me ensinar do meio dos tumultos e gritarias das ruas? Outra coisa que temos em comum: confiamos serenamente em Deus e O louvamos por nos ter dado tais revelações de sua vontade e propósitos, através da Bíblia Sagrada: "Os homens escarnecedores abrasam a cidade, mas os sábios desviam a ira. Um tolo expande toda a sua ira, mas o sábio a encobre e reprime." (Pv. 29:8,11).  Para que prossigamos nesta vida com segurança, apesar do caos: Pós-revoltas; é preciso obediência e disciplina. Disse Platão: "Quem comete uma injustiça é sempre mais infeliz que o injustiçado."

Encaminhamento de percepção

 1-Devemos nos aquietar esperando do Novo Brasil uma melhor saída das tribulações presentes, com a metodologia das revoltas?
 2-Que preciosas lições de otimismo, 
ética e cidadania  você tem para ensinar do meio de uma passeata dessas?
 3- Depois de assistir aos noticiários sobre o acordar do gigante, se você fosse saudado  com um “feliz Brasil velho” ainda sentiria dificuldade para dizer que era feliz e não sabia?
 4- O que o texto revela sobre as implicações da transição dos tempos, considerando a passagem de uma “era velha” para uma “era nova”?
 5- Justifique o título com a situação dos que receberam pedradas, tiros com bala de borracha, comércio depredado, a moral vilipendiada, a isolação, o afastamento e o desemprego.
7- O que aconteceu digno de repetição do impeachment de Collor até o passe livre no transporte público?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 23/07/2009
Código do texto: T1714555

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HIERARQUIA ÀS AVESSAS



 

 

 

 

 

 

 

 

HIERARQUIA ÀS AVESSAS

Por Claudeci Ferreira de Andrade


           Ouvi de minha coordenadora pedagógica, que ali, naquele colégio, havia professor que fazia um rascunho de suas provas com respostas, porque não as sabia e precisaria “colar” para corrigir as respostas dos seus alunos. Fiquei indignado. Seria essa uma forma pedagógica de orientar um professor!? Eu sempre fiz gabarito para facilitar a correção das provas de meus alunos, que são muitas. Minha preocupação foi tamanha, que me levou a entrevistar alguns colegas. Contei o incidente à professora de sociologia e perguntei se ela entendeu a observação da professora-coordenadora. Ela pensou e disse:
           — Eu a comparo com uma assistente social de uma grande cidade, que descobre um homem velho e andrajoso, vivendo na mais completa miséria, num escoadouro abandonado. Essa assistente resolve, então, fazer algo por esse ancião; ela lhe proporciona um banho e novas vestimentas, coloca-o num confortável lar para a velhice. Alguns dias depois, o velho desaparece. Volta para o seu abrigo anterior, alegando ter acostumado a viver naquele lugar. Assim é um professor de muitos anos de classe.
           Seria verdade que ela falou de mim! Sou um professor de um bom nível (Pós-graduado), cheio das titularidades, apesar de mergulhado numa rotina: é assim que sempre funcionou.
           Desta vez, fui ter com o professor de história. Contei o incidente, a comparação da socióloga e perguntei o que ele pensava disso:
           — Por isso penso que, na escola, ainda, estamos há alguns séculos, durante o feudalismo no Japão, quando era costume um homem carregar seus idosos pais ao alto de uma montanha e deixá-los ali, para morrerem de fome e frio. De acordo com esse costume, quando uma pessoa completava setenta anos de idade e não era mais produtiva, a sociedade não tinha mais nenhuma obrigação para com ela. O sistema vai lhe vomitar, é só uma questão de tempo.
           É, se bem que a coordenadora devia ter um pouco de paciência comigo. Vai ver, talvez, nem seja eu! Ela sempre fala a mesma coisa para muita gente. Até porque eu sou um professor tradicional e um tradicional gosta do outro!
           No dia seguinte, falei com o professor de ciências e contei o incidente, a comparação da socióloga, o comentário do historiador e perguntei o que ele pensava disso:
           — No meu tempo de aluno no colegial, conheci um mágico. Um de seus truques consistia em esvaziar reiteradas vezes um jarro de água sem acrescentar-lhe a menor quantidade desse líquido. Não sei exatamente como ele fazia isso com um jarro de vidro transparente; mas, se estou bem lembrado, toda vez que ele esvaziava o jarro, a quantidade de água despejada era menor do que na vez anterior. Esvaziar-se do próprio eu assemelha-se em alguns aspectos com o que o mágico fazia: você é o jarro do mágico; um velho profissional que se mostra cheio, mas oferece um conteúdo cada vez menor.
           Eu não sou egoísta, apenas não deprecio a mim mesmo e não estou centralizado no meu próprio eu. Será que minha própria pessoa não deve, portanto, receber a mínima consideração?
           Outra vez, falei com alguém; contei o incidente, a comparação da socióloga, o comentário do historiador, a ilustração do professor de ciências e perguntei o que ele pensava disso:
           —Acho que para um escultor deve ser um problema dificílimo pegar um pedaço de mármore recusado, há anos, por um outro escultor mais talentoso, com uma figura parcialmente acabada e transformá-lo naquela que ele tem em mente, uma perfeita estátua. Você veio de outras mãos que desistiram, depois de tanto tempo precisa-se de um milagre para fazê-lo um espetáculo.
           Não, não me acho intratável, além do mais, quero melhorar. Bastava ela dizer que era eu o tal professor e eu não faria mais gabarito.
           Naquela noite, falei com o Cristo e contei o incidente, a comparação da socióloga, o comentário do historiador, a ilustração do professor de ciências, a fala do alguém e perguntei o que Ele pensava disso:
           —Eu, com esse incidente, ampliei sua capacidade de amar, porque, tanto para ensinar quanto para aprender, precisa-se de amar. Ninguém jamais deu tão grande lição de amor como Eu: ao deixar sem condenação a mulher adúltera; ao fazer do ladrão um amigo crucificado ao Meu lado; ao perdoar alegremente a Pedro que Me negara; ao orar pelos que Me crucificaram. A minha norma de amor prefere um pecador que ama a um “santo” que não ama. O amor vem de outra demonstração de amor. Sua capacidade de amar a outrem está na medida em que deixe que Eu o ame, ou melhor, está na raiz de nosso relacionamento. Aprouve-Me redimi-lo a fim de torná-lo uma pessoa amorável. O Meu amor perdoa todos os seus pecados: triunfa sobre todo o egoísmo do coração, sobre sua impaciência, hostilidade, ressentimento, inveja, ciúmes. Eu sou o professor de todos os tempos. Também sou tradicional.
           Depois desse encontro, nunca mais falei sobre o incidente. Lembrei dele quando assisti ao retorno da coordenadora à regência em sala de aula. Posteriormente, soube que ela solicitou uma vaga para a coordenação novamente, pois não conseguia mais lecionar (Os coordenadores pedagógicos são assim, põem-nos na sala de aula, e eles contratam um substituto atrás do doutro) — A indisciplina estava demais.

 Encaminhamento de percepção

 1- Segundo a coordenadora pedagógica, o rascunho para colar é prática de quem não tem capacidade. Você concorda?
 2- Um professor com experiência de muitos anos em sala de aula(tradicional) está inadequado para “dar aulas” nos dias de hoje?
 3- A que se atribue a atual indisciplina em sala de aula e a falta de vontade do aluno para o aprendizado?
 4- Por que as ações de um coordenadora pedagógica transformam tanto sua unidade escolar, tornando-a obsoleta quando no futuro esta retorna à regência em sala?
5- Pedagogo lecionando para o Ensino Médio é leigo, e o Licenciado em outra área, exercendo função de coordenador pedagógico é o quê?
6- Se a escola existe para hierarquizar as pessoas na sociedade ascendentemente, por que um graduado em pedagogia coordena um doutor em linguística que está em sala de aula lecionando?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 22/07/2009
Código do texto: T1713722

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PAPU(DA) CABEÇA (Lições de ética!?)



PAPU(DA) CABEÇA (Lições de ética!?)

segunda-feira, 29 de junho de 2009
Claudeci Ferreira de Andrade


          Às vezes, sem querer, ouvimos comentários constrangedores. Eles vêm, quase sempre, de quem aplicou alguma desforra em alguém. Para esse ostentador, independente de quantas pessoas estejam ouvindo, é um culto ao seu ego. Em uma dessas circunstâncias, na biblioteca de uma das escolas em que trabalho, ouvi o seguinte diálogo entre duas pedagogas, coordenadoras de duas escolas vizinhas:

          — Menina, você não sabe o que me aconteceu ontem no matutino! Uma turma lá fez bagunça demais, e a diretora, como castigo, me convocou para dar a sexta aula nessa turma. Eu disse não; imagina compartilhar o castigo com eles! Então, ela chamou um professor que passava por ali, exatamente aquele comissionado que não pode perder o emprego. Coitado, os alunos saíram da sala, e ele ficou falando sozinho! Agora pense se isso acontecesse comigo, eu hein!? Mas, eu sou de sorte mesmo, sabe que o próximo sábado é letivo, né?! Como sexta-feira é feriado, Paixão de Cristo, quando a maioria dos professores viajará, então a “Parada Pedagógica” já ficou agendada para o primeeeeeeeiro de abril!

          — Ah, não! Melhor foi a minha de ontem no noturno! Como você sabe, já estava instalada uma pequena desavença entre a diretora e todos os demais professores, uma espécie de resistência à substituição do bom diretor que nós tínhamos. Mas, para completar, sabe aquele tal professor técnico de apoio para disciplina de Língua Portuguesa, lá da Secretaria de Educação? Você conhece a peça! Pois é, dessa vez, ele trouxe uma advertência à gestora, dizendo que depois de três meses de aulas, ainda, tinha uma professora ali que não a conhecia. Como a diretora fazia-se de inocente, negando-se a acreditar; o clima estava ficando morno, prontifiquei-me de imediato a chamar a tal professora para esquentar mais ainda, afinal sou a coordenadora. Não é nem por que não goste dela, mas é que eu não gosto mesmo é dele, porém, antes então, adiantei algumas coisinhas para Rosetear a professora em questão. Quando chegamos, ela já entrou na diretoria possuída pelo Demônio, disse tudo como se desferisse uma rajada de metralhadora. A diretora coitada, amoral, só concordava com os negativos e positivos, não ficou um naquele local sem que não fosse atingido pelos espinhos Letíficos de quem não temia consequência alguma. Você não imagina como ficou o representante da Secretaria de Educação. Senti pena; ele nem sequer levantou a cabeça, estava arrasado, mesmo que quisesse retrucar alguma coisa, não houve jeito, a protagonista não queria ouvir mais nada. Saiu de supetão, assim como entrou, largando todos nós na sala em uma atmosfera de pós-guerra, só destruição. Achei muito bom! Maravilhoso! Esse tipo de pessoa, que se acha melhor que a gente, só porque trabalha na Secretaria e, por isso, quer nos enfiar tudo de “goela a baixo”, merece o pior! Olha, ela fez o que eu sempre quis, porém nunca tive coragem, ou melhor, oportunidade. Agora estou, como se diz, "de alma lavada".

          Lamentei por estar ali, aquele era o local errado e o momento errado. Mas onde seria certo? As coordenadoras queriam-me como público ou, talvez, como uvas no lagar, esmagando-me indiretamente, mas a escola é um lugar público e político, portanto democrático. E em nome dessa democracia, digo que por sermos apenas colegas é que não guardei seus segredos.

Encaminhamento de percepção

 1-Na primeira locução, que atitude foi mais ética: da diretora que determinou o castigo para os alunos com a sexta aula, ou da professora coordenadora que se recusou ir para a sala de aula, ou do professor que não impôs autoridade sobre a turma, cumprindo a ordem da direção? Justifique.
 2-Todo bom profissional defende sua categoria, mesmo considerando algumas falhas. Nesse sentido, o que está incoerente no texto?
 3-Se você estivesse no lugar do narrador personagem, que atitude tomaria como bom profissional? Por quê?
 4-Que lições de ética podemos aprender com esses personagens? Comente.
 5- Existe uma distinção no texto entre profissionais “apenas colegas” e profissionais "amigos". Até que ponto devemos ser leais a este ou aquele que trabalha conosco?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 08/07/2009
Código do texto: T1688191

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O SISTEMA DA MARIA (Se a Maria não vai com as outras, o sistema não anda)










O SISTEMA DA MARIA (Se a Maria não vai com as outras, o sistema não anda)

por Claudeci Ferreira de Andrade
  
Conhecemos a palavra grega Paidagwgos da qual veio, em transliteração aceitável, a nossa palavra Pedagogo. Essa no original é formada por duas outras palavras pais (Criança) e agwgos (Conducente). No sentido etimológico dessa palavra, o antigo pedagogo era um escravo incumbido de conduzir as crianças à escola.

  Não faz muito tempo assim, surgiu o novo papel do pedagogo: aquela pessoa da equipe escolar que responde pela operacionalização da proposta pedagógica da escola, pelo acompanhamento e orientação do trabalho desenvolvido pelos professores, pela qualidade do processo de ensino e pelo sucesso da aprendizagem dos alunos. Mas, a Maria prefere não ir com as outras. Ela é efetiva e com Licenciatura em Pedagogia; prefere orientar os seus professores de Matemática, Línguas e Ciências Biológicas por velhas metodologias. Ela tem experiência de muitos anos no magistério e prefere não se atualizar. Maria é reconhecida na comunidade escolar como uma profissional comprometida com o sucesso da escola, mas prefere emperrar os projetos, substituindo-os pela improvisação. Ela tem liderança expressa na capacidade de interagir com os vários segmentos da escola, mas prefere se valer disso para articular fofocas, mediante um processo marcado pela desconfiança. Ela revela capacidade de motivar os outros profissionais da escola, de modo a formar neles o gosto pelo estudo, pela troca de experiência e pela discussão coletiva, mas prefere lhes entregar os velhos livros didáticos e dizer: — se vire. Maria é autoconfiante, mas prefere demonstrar vaidade, presunção e arrogância. Ela tem domínio do conhecimento pedagógico e dos processos de investigação que possibilitam o aperfeiçoamento da aprendizagem, mas prefere não se envolver com cursos de capacitação e novas tecnologias. A última que ela aprontou, contou-me a própria professora da Educação de Jovens e Adultos, para a disciplina de ciências. — Proibiu-nos de passar qualquer filme para nossos alunos, pois “ela já não aguentava mais enrolação”; então usou seu respaldo profissional e tomou essa decisão. Só porque eu havia passado “O auto da Compadecida”, e um aluno pediu para sair, pois precisava chegar em casa mais cedo, ela interpretou isso como motivador de evasão, e eu: professora do ócio. O que você acha?

  Bem, o que eu acho é muito particular, mas penso que este é um caso de crise de identidade profissional, de fácil resolução. O tempo encarregar-se-á disso, assim como um adolescente torna-se adulto automaticamente. Porque a Maria também é do Sistema.

Encaminhamento de percepção

 1-Ao perfilar a coordenadora pedagógica Maria que atributos consideraria ideais?
 2-Em que circunstâncias, usar o vídeo em sala de aula pode prejudicar a aprendizagem?
 3-Que motivos teria um coordenador pedagógico para agir dessa forma?
 4-Cursos de capacitação e aperfeiçoamento em novas tecnologias possibilitam a qualidade do ensino? Por que Maria não se submetia a isso?
 5-A busca de identidade por um adolescente o leva a muitas aventuras, com essa analogia o narrador pretende uma escola aventureira? Em que sentido?
 6-A Maria é do sistema, ou é o sistema da Maria, ou a Maria é o próprio sistema?
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 07/07/2009
Código do texto: T1686437


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