Ah, o "aluno de sucesso"! Permitam-me apresentar-lhes uma criatura peculiar que floresceu nos jardins da nossa moderna educação, um espécime cultivado em um solo onde direitos germinam sem a contrapartida dos deveres, e onde a busca por atenção suplanta a sede pelo saber. Essa figura foi moldada por uma tríade de instituições – família, igreja e escola – que, embora tenham lhe ensinado sobre os direitos do cidadão, convenientemente se esqueceram de mencionar a premissa fundamental: a dignidade dos direitos reside no cumprimento dos deveres. Da mesma forma, incentivaram a busca incessante por holofotes, a necessidade de jamais passar despercebido, mas omitiram a futilidade da "palhaçada" como ferramenta de ascensão, reservando o sucesso nesse campo apenas para raridades como o Tiririca.
Lembro-me da primeira vez que o observei em ação. Uma algazarra no pátio, um murmúrio crescente que ecoava promessas de confusão. Lá estava ele, no centro do redemoinho, a voz estridente a clamar por "Porrada! Porrada! Porrada!!!". Um eco do mundo moderno, onde a violência, muitas vezes, parece ser o espetáculo mais atraente. Hoje, confesso, até invejo a praticidade dos sprays de pimenta e dos colírios que prometem aliviar os olhos lacrimejantes após o tumulto. Ele, claro, fará questão de elaborar um relatório detalhado sobre o "alvoroço", mesmo que sua participação tenha sido mais ativa do que a de um mero espectador, como o mundo moderno tão bem o ensina.
A arte da transgressão parece ser outra de suas especialidades. Leis e normas são meros obstáculos a serem contornados em sua busca incessante por satisfazer seus caprichos. Mente com desenvoltura, furta com displicência, profere impropérios com naturalidade, edita conversas digitais com maestria, ameaça com sorrisos e, se a situação exigir, até ensaia uma tentativa de suborno. E o mais fascinante é a metamorfose que se opera em seguida: veste a máscara da vítima com uma perfeição teatral, desfilando com a consciência aparentemente mais limpa do que a neve, enquanto aqueles que foram por ele manipulados ainda se recompõem dos golpes.
A igualdade com o corpo docente é uma bandeira que ele brande com fervor. "Se o professor pode, eu também posso!", proclama pelos corredores, ignorando solenemente que a referência não deveria ser as falhas humanas dos mestres, mas sim seus acertos, sua dedicação, seu conhecimento. Curiosamente, é nas imperfeições dos educadores que ele encontra terreno fértil para suas reclamações: o uniforme ausente, o atraso ocasional, o lanche diferenciado. Os erros são imitados com mais afinco do que os acertos. Alguns até adotam uma persona cuidadosamente construída: o olhar penetrante (vazio, na maioria das vezes), os cabelos desalinhados (estratégicos), a mochila como extensão do corpo, o celular à mostra, uma pilha de livros (raramente abertos) nas mãos, calças com bolsos repletos de... mistérios. E, ironicamente, sua popularidade entre os colegas muitas vezes ofusca a dos próprios professores.
A escrita, essa ferramenta fundamental da aprendizagem, nem sempre é seu forte. Incapaz de produzir uma redação escolar adequada, ele, no entanto, não se acanha em humilhar os professores. Ah, se alguém ousar apontar uma falha na grafia de um mestre! O escândalo é imediato, o grito debochado ecoa pela escola: "Que professor de português é esse?!". Menosprezar o educador parece ser um degrau importante em sua escalada rumo ao sucesso, uma forma de se destacar perante os seus pares em sua busca por reconhecimento.
E se o sucesso tardar a chegar pelos meios "convencionais", não há problema. Ele é bem instruído a buscar auxílio nas instâncias superiores, a clamar por prejuízos imaginários, a manipular os pais (aqueles que raramente comparecem para ver o boletim, mas que prontamente atendem ao chamado para "desacatar" professores e coordenadores). O importante é "sair por cima", mesmo que para isso seja necessário recorrer a artimanhas e encenações. Depois, com a poeira abaixada, ele se encarregará de restaurar as relações com os ofendidos, distribuindo sorrisos e "gracinhas" convenientes.
A impaciência e a impulsividade são marcas registradas. Qualquer contratempo, por menor que seja, é motivo para explosões de raiva, para a demonstração de que a violência é sempre uma opção a ser considerada. Intimidar os outros parece ser uma estratégia eficaz para diminuir seus próprios desafios. Esqueceram, porém, de lhe dizer que é justamente ao enfrentar os obstáculos que se constrói a grandeza. O primeiro passo nessa busca peculiar pelo sucesso, curiosamente, envolve rodar o livro no dedo, um livro fechado em alta velocidade, exibido como um troféu de domínio. As alunas, com suas unhas impecáveis que mal lhes permitem segurar uma caneta, agregam-se a esses "dominadores", rindo de qualquer bobagem como sinal de apoio, usufruindo do status que essa proximidade lhes confere.
E o professor, pobre mortal que almeja sobreviver nesse ambiente hostil, muitas vezes se vê compelido a ceder aos caprichos desse "aluno de sucesso", elegendo-o representante de classe, buscando uma trégua com o "herói" para evitar maiores dissabores, mesmo que isso implique assinar advertências semanais, fruto das incessantes denúncias desse "líder" estudantil que questiona seu trabalho. Resta-me, confesso, a ironia como derradeira arma secreta, um escudo sutil contra essa caricatura de estudante que, paradoxalmente, a nossa sociedade parece ter moldado.
Como um bom professor de sociologia, preparei 5 questões discursivas e simples, baseando-me nas ideias principais do texto apresentado:
1. O autor descreve o "aluno de sucesso" como um produto de instituições como família, igreja e escola, que enfatizaram direitos em detrimento de deveres. De que maneira a sociologia analisa o papel dessas instituições na socialização dos indivíduos e como a ênfase em certos valores em detrimento de outros pode moldar comportamentos sociais específicos?
2. O texto satiriza o comportamento do "aluno de sucesso" em relação às regras e à autoridade, como a transgressão de normas e a busca por igualdade com os professores através da imitação de suas falhas. Sob uma perspectiva sociológica, como se manifestam as relações de poder dentro do ambiente escolar e de que forma os alunos podem desafiar ou negociar essas relações?
3. O autor critica a valorização da atenção e da popularidade em detrimento do aprendizado genuíno, exemplificado pela busca por reconhecimento através de comportamentos disruptivos e pela humilhação dos professores. Como a sociologia analisa a influência da cultura e dos valores sociais na definição de "sucesso" no ambiente escolar e como isso pode impactar a motivação e o engajamento dos estudantes?
4. O texto menciona a manipulação dos pais e o recurso a instâncias superiores para resolver problemas, indicando uma possível fragilidade na autonomia e na capacidade de resolução de conflitos por parte do "aluno de sucesso". De que maneira a sociologia aborda o papel da família no desenvolvimento da autonomia e da responsabilidade nos jovens, e quais as possíveis consequências de uma superproteção ou de uma falta de limites?
5. O autor descreve a reação dos professores diante do "aluno de sucesso", que muitas vezes se sentem compelidos a ceder aos seus caprichos. Como a sociologia analisa o papel dos professores como agentes de socialização e de manutenção da ordem no ambiente escolar, e quais os desafios que eles enfrentam ao lidar com comportamentos que desafiam as normas estabelecidas?