"Se você tem uma missão Deus escreve na vocação"— Luiz Gasparetto

" A hipocrisia é a arma dos mercenários." — Alessandro de Oliveira Feitosa

Pesquisar neste blog ou na Web

MINHAS PÉROLAS

terça-feira, 4 de março de 2025

Cipós e Memórias ("Pais permissivos produzem filhos tiranos." - Provérbio popular)

 

Cipós e Memórias ("Pais permissivos produzem filhos tiranos." - Provérbio popular)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

Na vastidão do mundo, poucas coisas me entristecem tanto quanto presenciar pais amordaçados, impotentes diante de sua própria prole. Vejo-os hesitantes, temerosos de impor limites, como se a correção fosse um pecado capital, um ato de barbárie imperdoável. E, nesse abismo de frouxidão, nesse mar de condescendência, percebo a escola naufragar, o futuro se esvair pelos dedos.

Recordo-me, como se fosse ontem, das lapadas memoráveis de Dona Maria José. Não, não evoco a violência gratuita, mas a pedagogia ancestral daquela mulher de fibra, cujo método, embora rústico, era carregado de amor e propósito. Uma surra, sim, quando a ocasião clamava por rigor. E quem ousaria dizer que tais corretivos me causaram mazelas? Pelo contrário, forjaram em mim um caráter resiliente, uma bússola moral inabalável.

Jamais me esqueço daquele episódio pueril, quando meu tio José Gonçalo deu parte ao soldado Florêncio porque o filho de Dona Maria José estava atirando com garrucha, feita de pé de bicicleta, em sua privada de Duratex. Eu era o desobediente. A emoção do estampido, o buraco do chumbo no alvo e a fumaça da pólvora me cegaram, a ponto de não respeitar a propriedade alheia. Chegando em casa, o cipó de goiabeira cantou em minhas costas, não como vingança, mas como lição indelével. "Vergonha nunca matou", dizia ela, "mas a falta dela pode te levar à perdição." Ela me informou que o Soldado Florêncio tinha visitado a nossa casa por minha causa.

E assim, entre dores e ensinamentos, fui moldado. Aprendi a refrear os impulsos, a respeitar o próximo, a discernir o lícito do proibido. Lições que a rua, em sua crueza implacável, jamais ensinaria com tamanha precisão. Hoje, observo pais reféns dos próprios filhos, justificando a leniência com discursos modernosos, ignorando que a ausência de limites pavimenta o caminho para a delinquência, para o caos social.

A correção firme, temperada pela justiça e pelo afeto, sempre foi e sempre será o alicerce da formação humana. O que se esvai não é apenas a autoridade parental, mas a compreensão de que o limite, longe de ser um grilhão, é o leme que orienta a embarcação da vida. No tempo de outrora, um olhar reprovador bastava, pois o respeito era moeda corrente. Hoje, o excesso de zelo descamba para a omissão, para o abandono disfarçado de proteção. Se a família abdica de educar, a rua assume o bastão, com métodos brutais e sequelas profundas. Urge, portanto, uma reflexão coletiva: estamos, de fato, protegendo nossas crianças, ou apenas lhes legando um futuro de incertezas e ilusões?

E o povo, na sabedoria ancestral das ruas, conclama: "Antigamente, meu amigo, era cipó de marmeleiro e pronto! Menino aprendia na carne o que era respeito. Hoje, qualquer coisinha é 'trauma', 'bullying', 'agressão'. Mas me diga, a bandidagem lá na frente vai ter paciência de dar sermão? A rua educa sem manual, e a conta chega, amarga e salgada. O mundo virou de pernas pro ar mesmo!"

E eu, testemunha ocular dessa metamorfose social, pergunto-me: até quando insistiremos nesse equívoco? Até quando trocaremos a bússola da disciplina pela deriva da permissividade? A rua, lócus da barbárie travestida de liberdade, aguarda faminta, pronta a engolir os filhos que a escola e a família, em conluio silencioso, se recusam a educar. Urge resgatarmos a coragem de corrigir, de orientar, de amar com firmeza, pois o futuro de nossos jovens, e da sociedade que almejamos construir, depende dessa urgente e inadiável retomada de responsabilidade.


Preparei 5 questões discursivas e simples para você refletir sobre a temática da disciplina e da educação sob a perspectiva da sociologia:


1. A crônica descreve uma mudança nas práticas parentais, contrastando a "frouxidão" e "condescendência" atuais com a "pedagogia ancestral" baseada na correção firme. Sob a perspectiva da sociologia da educação, como podemos analisar essa transformação nas abordagens disciplinares ao longo do tempo? Quais fatores sociais, culturais e históricos podem ter contribuído para essa mudança nas práticas de criação de filhos?

2. O autor da crônica valoriza a disciplina como "alicerce da formação humana" e critica a ausência de limites como um caminho para a "delinquência" e o "caos social". De que maneira a sociologia do desvio e da criminalidade pode nos ajudar a analisar a relação entre disciplina, socialização e comportamento desviante? A ausência de disciplina familiar e escolar pode ser considerada um fator determinante para o aumento da criminalidade e da desordem social?

3. O texto evoca a figura de "Dona Maria José" e o uso do "cipó de goiabeira" como métodos de correção, associando-os à formação de um "caráter resiliente" e uma "bússola moral inabalável". Sob a ótica da sociologia da família e da infância, como podemos analisar o papel da disciplina física na educação? Quais os possíveis impactos da violência física na formação da personalidade e no desenvolvimento social das crianças, considerando diferentes perspectivas teóricas e evidências empíricas?

4. A crônica apresenta um contraste entre a educação familiar e a "educação da rua", sugerindo que, na ausência da primeira, a segunda se impõe de forma "brutal" e com "sequelas profundas". De que maneira a sociologia urbana pode nos ajudar a compreender a "rua" como um espaço de socialização e educação? Quais os diferentes papéis e influências da família, da escola e da rua na formação dos jovens em diferentes contextos sociais e urbanos?

5. Em suma, o texto conclama a "resgatarmos a coragem de corrigir, de orientar, de amar com firmeza", argumentando que o futuro da sociedade depende dessa "retomada de responsabilidade". Em sua opinião, quais seriam os desafios e as possibilidades de se promover uma "retomada da responsabilidade" na educação contemporânea, conciliando a necessidade de disciplina e limites com os princípios de respeito, diálogo e autonomia na formação das novas gerações? Como a sociologia pode contribuir para repensarmos as práticas educativas e construirmos sociedades mais justas e equilibradas?

Nenhum comentário: