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segunda-feira, 29 de junho de 2009

UMA ROSA QUASE ALGUÉM (Crianças reclamando de maus-tratos)




















Crônica

UMA ROSA QUASE ALGUÉM (Crianças reclamando de maus-tratos)

Claudeci Ferreira de Andrade


           Eu sou uma Rosa, daquelas feita com carinho. Não me considero artificial e apesar de nascida de uma gravidez planejada, levaram-me para ornamentar uma mesa que, bem à vista, no melhor local do salão, faria jus a apreciação de um conviva refinado. Afinal, era o aniversário do subsecretário de Educação. Uma celebridade! Então pensei que, naquele bem trabalhado arranjo, por horas, daria minha contribuição para somar às motivações de quem já está acostumado com fortes emoções.
Chegavam-se de dois em dois, quando não de três ou quatro; sentavam-se aqui e acolá nas mesas próximas, tão próximas que dava para ouvir elogios sem medida aos arranjos das outras rosas; no entanto, nenhum para mim. Não compreendia. Será que não tinha saído do jeito encomendado? Talvez, se eu fosse de outra cor! Mas, não era, fazer o quê! Oba, uma professora estava vindo em minha direção! Estava sem companhia. Era uma senhora loura, tinha os olhos claros, estava bem trajada; que perfume! Como gostaria que ela me acariciasse, só assim o cheiro de suas mãos passaria para minhas pétalas de tecido comum, então me aproximaria mais de uma posição social da qual é digna uma rosa de verdade. Por que estava sozinha? Comportamento estranho para uma festa de professores! Mas deixei que viesse; iria presenteá-la com minha maciez, e não havia melhor presente numa noite como aquela do que uma rosa para uma rosa. Com certeza queria minha companhia! — Se se sentar nesta mesa, vou fazê-la feliz com minha graciosidade — dizia eu em meu coração infantil.
Sentou-se finalmente, e olhava freneticamente para os lados. Tudo foi um sonho! Antes mesmo que eu pudesse ver o aniversariante, ou melhor, antes de começar a programação, senti suas mãos de súbito me agarrarem com força brutal e me enfiaram em sua bolsa surrada de couro áspero, sem dó, como se estivesse roubando alguma coisa. Não se importou em me deformar. Será que ela não gostou de meu aspecto? E o pior, os componentes da mesa vizinha viram e nem chamaram sua atenção. Será que ninguém se engraçou por mim? Ou sou mais uma vítima dos comportamentos de etiqueta!? Dos que veem e fazem de conta que não viram, dos que roubam e fazem de conta que não foram eles, dos que fingem que ensinam enquanto outros fingem que aprendem? Ai! Que dor! E não pude nem gritar.
Fui condenada ao regime do inferno, não pude nem ornamentar uma estante empoeirada, num lugar reservado de sua casa, porque ela achava que não era seguro. Por isso me eliminou no fogo do quintal deste mundo, para não deixar vestígio. Agora falo, como uma alma despetalada, a você que só me escuta: tenha cuidado com os que cobiçam suas virtudes sem medir consequências para usufruí-las, meu mal foi ser bela e acalentar objetivos nobres.
Encaminhamento de percepção
1– Como as motivações podem fabricar as emoções? Dê exemplos:
2– O autor insinua que a Rosa é uma criança em idade escolar, culpando o sistema educacional por seu fracasso social, como legitimar essa leitura?
3– Essa senhora de “fino trato” não correspondeu com as expectativas. Qual deveria ser seu comportamento enquanto professora?
4– Qual foi o pecado dessa bela rosa?
5– É normal alguém carregar um arranjo no final da festa. Por que se faria isso bem no início?
6-Faça uma ilustração para crônica que acabou de ler.
7– Em que parte do texto resvala no social?
(Claudeci Ferreira de Andrade, pós-graduado – Língua Portuguesa; professor – Gramática e Redação/Senador Canedo; funcionário público)
Claudeko
Publicado no Recanto das Letras em 05/07/2009
Código do texto: T1683146

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