O OUTRO LADO DO PORTFÓLIO AVALIATIVO (Você é o que é seu portfólio!?)
Já não me lembro ao certo quando foi que me disseram que, para ser um bom professor, era preciso ter um portfólio. Não um simples arquivo de lembranças, mas um verdadeiro compêndio da existência profissional. Como se nossa história de sala de aula, nossos erros e acertos, nossas noites mal dormidas preparando aulas e corrigindo provas pudessem ser condensadas em páginas encadernadas e bem diagramadas.
Aceitei o desafio, como tantos outros professores antes de mim. Passei dias mergulhado em gavetas, revirando papéis, resgatando registros amarelados pelo tempo. Juntei fotografias, recortes de jornal, certificados e planos de aula que, de tão remotos, me transportaram a um passado que eu nem lembrava ser meu. Cada papel encontrado era uma pequena arqueologia da própria docência.
Quando finalmente entreguei o portfólio à comissão avaliadora, senti um misto de orgulho e estranheza. Ali estava eu, entre capas plásticas e divisórias coloridas, resumido em documentos que deveriam atestar minha competência. A ironia se apresentou logo depois, no interrogatório informal de um colega curioso:
"Deve ter deixado muita coisa de lado para fazer esse portfólio, hein? Abandonou a família, os amigos, desenterrou defuntos e tudo mais! Valeu a pena tanto sacrifício para algo tão ridículo?"
Meditei um momento antes de responder, deixando que o silêncio incomodasse por um instante. Então, com sinceridade, disse:
"É curioso como sempre me perguntam sobre o que deixei de fazer para cumprir as exigências da escola. Jamais alguém pergunta sobre os benefícios que obtive. Na verdade, deixei de fazer muito pouco, comparado ao que conquistei. Nas páginas abarrotadas de informações, maquiadas ou não, encontra-se tudo que uma comissão pode desejar ver. Não apenas podem avaliar minha trajetória, mas também fornecer orientações para que eu possa alcançar novos objetivos."
O portfólio tornara-se não apenas um repositório de experiências, mas o manancial de revelações sobre nossa prática. Dele fluía luz, esperança, capricho, esforço e, paradoxalmente, certo conforto. Era como se tivesse se transformado em uma verdade quase absoluta: você é o que é seu portfólio.
E assim seguimos, empilhando papéis, organizando memórias e torcendo para que o futuro, ao menos no relatório final, nos devolva o que gastamos nele: tempo, dedicação e um tanto de fé em um sistema que parece querer nos reduzir a um amontoado de documentos bem apresentados.
O portfólio é uma espécie de Curriculum Vitae expandido, e pedi-lo como requisito para contratar é bastante coerente. Mas para nós, já empregados, eis a verdadeira questão: até que ponto essa compilação de papéis pode realmente refletir a essência de nossa prática docente?
1. Qual a principal contradição apontada no texto entre a necessidade de um portfólio para professores e a dificuldade de resumir a complexidade da experiência docente em documentos?
2. De que forma o texto descreve o processo de criação de um portfólio como uma "arqueologia da própria docência", e qual o significado dessa metáfora?
3. Qual a crítica central do colega da professora em relação ao portfólio, e como a resposta da professora revela uma visão irônica sobre a situação?
4. Além do reconhecimento profissional, que outros significados e simbolismos são atribuídos ao portfólio ao longo do texto?
5. Qual a principal reflexão proposta no final do texto sobre a utilidade do portfólio para professores já empregados, e que tipo de questionamentos essa reflexão suscita?
Já não me lembro ao certo quando foi que me disseram que, para ser um bom professor, era preciso ter um portfólio. Não um simples arquivo de lembranças, mas um verdadeiro compêndio da existência profissional. Como se nossa história de sala de aula, nossos erros e acertos, nossas noites mal dormidas preparando aulas e corrigindo provas pudessem ser condensadas em páginas encadernadas e bem diagramadas.
Aceitei o desafio, como tantos outros professores antes de mim. Passei dias mergulhado em gavetas, revirando papéis, resgatando registros amarelados pelo tempo. Juntei fotografias, recortes de jornal, certificados e planos de aula que, de tão remotos, me transportaram a um passado que eu nem lembrava ser meu. Cada papel encontrado era uma pequena arqueologia da própria docência.
Quando finalmente entreguei o portfólio à comissão avaliadora, senti um misto de orgulho e estranheza. Ali estava eu, entre capas plásticas e divisórias coloridas, resumido em documentos que deveriam atestar minha competência. A ironia se apresentou logo depois, no interrogatório informal de um colega curioso:
"Deve ter deixado muita coisa de lado para fazer esse portfólio, hein? Abandonou a família, os amigos, desenterrou defuntos e tudo mais! Valeu a pena tanto sacrifício para algo tão ridículo?"
Meditei um momento antes de responder, deixando que o silêncio incomodasse por um instante. Então, com sinceridade, disse:
"É curioso como sempre me perguntam sobre o que deixei de fazer para cumprir as exigências da escola. Jamais alguém pergunta sobre os benefícios que obtive. Na verdade, deixei de fazer muito pouco, comparado ao que conquistei. Nas páginas abarrotadas de informações, maquiadas ou não, encontra-se tudo que uma comissão pode desejar ver. Não apenas podem avaliar minha trajetória, mas também fornecer orientações para que eu possa alcançar novos objetivos."
O portfólio tornara-se não apenas um repositório de experiências, mas o manancial de revelações sobre nossa prática. Dele fluía luz, esperança, capricho, esforço e, paradoxalmente, certo conforto. Era como se tivesse se transformado em uma verdade quase absoluta: você é o que é seu portfólio.
E assim seguimos, empilhando papéis, organizando memórias e torcendo para que o futuro, ao menos no relatório final, nos devolva o que gastamos nele: tempo, dedicação e um tanto de fé em um sistema que parece querer nos reduzir a um amontoado de documentos bem apresentados.
O portfólio é uma espécie de Curriculum Vitae expandido, e pedi-lo como requisito para contratar é bastante coerente. Mas para nós, já empregados, eis a verdadeira questão: até que ponto essa compilação de papéis pode realmente refletir a essência de nossa prática docente?
1. Qual a principal contradição apontada no texto entre a necessidade de um portfólio para professores e a dificuldade de resumir a complexidade da experiência docente em documentos?
2. De que forma o texto descreve o processo de criação de um portfólio como uma "arqueologia da própria docência", e qual o significado dessa metáfora?
3. Qual a crítica central do colega da professora em relação ao portfólio, e como a resposta da professora revela uma visão irônica sobre a situação?
4. Além do reconhecimento profissional, que outros significados e simbolismos são atribuídos ao portfólio ao longo do texto?
5. Qual a principal reflexão proposta no final do texto sobre a utilidade do portfólio para professores já empregados, e que tipo de questionamentos essa reflexão suscita?
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