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MINHAS PÉROLAS

⁠ENFRENTADO POR MEDO ("Não sei de nada, mas sinto tudo." — Leila Jácomo)
Fico assombrado, quando passo nas ruas e os cachorros latem só para mim. Por que os cachorros latem para uns e outros não? Tentando descobrir o motivo desse fenômeno horripilante, observei que onde estou, se passar um bêbado ou um maltrapilho da rua, eles vêm logo falar comigo. Tentei relacionar essas atrações indeslindáveis. E me veio a pergunta adicional: exalo medo pelo cheiro de minha pele ou são só minhas expressões corporais despropositadas que os convidam? Se o desatinado sou eu, então eles correm para aquilo que o faz sentir-se bem, mas a mim cabe a reação de meu desconforto, então procuro distanciamento imediatamente. Se latem é para se protegerem de mim ou me cumprimentam como um disfarce de sua coragem, enfrentando o fantasma que os ameaçam. Não sei! Mas, sei que talvez eles tenham sentidos tão apurados que percebem, através de meus poderes áureos e sensitivos sobre o que penso deles. Ou ainda os mesmos fluidos correm por nós, anunciando a morte de dentro para fora. Tenho medo deles, por isso morrem de medo de mim. (Cifa

Claudeci Ferreira de Andrade

domingo, 11 de outubro de 2009

AMIGOS, INIMIGOS MELHORES ("A Bíblia nos ensina a amar o próximo e também a amar nossos inimigos provavelmente porque eles em geral são as mesmas pessoas". Mark Twain)




CrÔnica Filosófica

AMIGOS, INIMIGOS MELHORES ("A Bíblia nos ensina a amar o próximo e também a amar nossos inimigos provavelmente porque eles em geral são as mesmas pessoas". Mark Twain)

Por Claudeci Ferreira de Andrade

O pensamento de José Soder sobre renunciar à vingança como uma forma de perdão tem ecoado em minha mente há dias. Há uma nobreza inegável nessa escolha de silêncio diante da ofensa. Contudo, essa postura frequentemente me deixa com uma sensação incômoda, como se, ao evitar confrontar o mal, eu estivesse permitindo sua propagação, prejudicando talvez outros no processo.

"Não obstante, sempre é possível renunciar à vingança, o que já representa uma espécie de perdão", disse Soder. Embora esse caminho pareça virtuoso, questiono-me: ao não interromper alguém que vejo fazendo algo errado, não estaria, paradoxalmente, prejudicando meu próprio inimigo? O sábio Salomão alertou: "Quem ajuda o tolo terá que ajudá-lo novamente" — um lembrete de que certas intervenções podem criar ciclos de dependência nocivos.

Esta dualidade me assombra. Desejo me afastar de quem me deseja mal, criar uma distância segura que me permita respirar em paz, longe das acusações e das tentativas de me moldar a uma imagem distorcida. À medida que mantenho essa distância, percebo que muitos dos "defeitos" que me apontam são, na verdade, projeções de suas próprias sombras — projeções que se dissipam quando o afastamento se torna um escudo protetor.

Martin Luther King nos alertou: "No final, não nos lembraremos das palavras dos nossos inimigos, mas do silêncio dos nossos amigos." Esta observação ressoa forte em mim como um lembrete doloroso de que, por vezes, a omissão daqueles que deveriam nos apoiar pode ser mais cortante do que a hostilidade declarada dos adversários.

Neste labirinto de relações, encontro verdade nas palavras de Alfred de Musset: "As coisas mais desagradáveis que os nossos piores inimigos nos dizem pela frente não se comparam com as que os nossos amigos dizem de nós pelas costas." Esta reflexão encontra eco em Mark Twain, que ironicamente observou: "A Bíblia nos ensina a amar o próximo e também a amar nossos inimigos, provavelmente porque eles, em geral, são as mesmas pessoas."

À medida que prosperamos, nossos desafetos parecem aumentar na mesma proporção, sobrecarregando-nos com expectativas e julgamentos que podem nos levar ao esgotamento. Amigos e inimigos, frequentemente, não contribuem para nossa evolução moral; apenas nos acusam e cobram injustamente além das nossas forças, sem uma compreensão genuína, buscando apenas medir forças para verificar onde podem se sobressair.

E a solidão... Ah, a solidão que se abate quando a bonança se esvai! É curioso como, nos momentos de dificuldade financeira ou emocional, os amigos se afastam e os inimigos desaparecem de vista. O pobre ou o "quebrado" vê-se condenado a uma solidão quase irremediável. Nessas horas, o velho ditado de que "todas as riquezas do mundo não valem um bom amigo" soa como uma piada amarga. Talvez a verdade seja o inverso: todos os bons amigos do mundo não superam a valia da autonomia financeira conquistada, muitas vezes, apesar deles.

Se o dinheiro e o suprimento das necessidades básicas podem proporcionar a segurança e a paz que muitas amizades "verdadeiras" jamais ofereceram, por que suportar sacrifícios e manter o ritual de presentes e obrigações sociais? E, ainda, por que, questiono-me, as amizades na velhice parecem restringir-se a um círculo igualmente envelhecido, como se existisse uma segregação etária nas relações humanas?

Ao final desta reflexão, sinto um misto de cansaço e lucidez. A chave talvez não esteja em decifrar as motivações obscuras de amigos e inimigos, mas em fortalecer minha própria jornada interior. Em construir um refúgio onde as opiniões alheias — sejam de afeto ou hostilidade — não tenham o poder de me desestabilizar.

A verdadeira paz possivelmente reside na aceitação da complexidade das relações humanas e na busca por uma autonomia que me permita seguir meu caminho com serenidade. Aprender a discernir quem merece um lugar em minha jornada e quem é melhor manter à distância talvez seja a sabedoria mais valiosa: aquela que me permite, finalmente, descansar em paz, livre de projeções e expectativas alheias que não me pertencem.


Como seu professor de sociologia, preparei 5 questões discursivas simples, baseando-me nas ideias principais desta crônica:


1. A crônica explora a ambivalência nas relações sociais, tanto com amigos quanto com inimigos. Sob uma perspectiva sociológica, como podemos analisar a complexidade dessas relações, considerando os sentimentos de apoio, traição, competição e isolamento presentes no texto?

2. O autor questiona o valor da amizade, especialmente em momentos de dificuldade e em comparação com a segurança financeira. Do ponto de vista da sociologia das relações sociais, como as necessidades materiais e emocionais influenciam a formação e a manutenção de laços sociais?

3. A crônica aborda a ideia de que o sucesso pode gerar mais "desafetos" e sobrecarregar as relações. Sob uma perspectiva sociológica, como a dinâmica de poder, o status social e a competição podem afetar as interações entre indivíduos, tanto em amizades quanto em inimizades?

4. O texto reflete sobre a solidão e o afastamento de amigos em tempos de crise. Do ponto de vista da sociologia da solidão e do apoio social, como a estrutura social e as relações interpessoais podem contribuir para o sentimento de isolamento e quais são as possíveis consequências sociais e individuais dessa experiência?

5. A crônica conclui com a busca por paz interior e autonomia como forma de navegar nas complexas relações humanas. De que maneira a sociologia pode contribuir para a compreensão da individualização e da busca por bem-estar pessoal dentro de um contexto social marcado por relações muitas vezes ambivalentes?

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